Prezados parentes,
Diante deste dia 19 de abril, que para nós representa dia de luta e de resistência dos povos indígenas, vale lembrar que os ataques aos nossos direitos se intensificaram.
Os ataques aos direitos dos nossos povos se intensificaram nos últimos seis anos. Aliada a ameaças de diferentes setores do Estado, a gestão do ilegítimo governo Temer agrava ainda mais essas investidas, conforme relatos da maioria das nossas organizações e lideranças de base. Junta-se a isso, a ofensiva orquestrada pela bancada ruralista no Congresso Nacional, setores do judiciário e o poder econômico que lhes dão sustentação.
Para reagir a esse pacote de agressões, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) chama suas bases – inclusive as que já estão concentradas, ocupando instalações da Funai em varias regiões – a intensificarem suas ações de repúdio, preferencialmente na semana do dia 19 de abril, data na qual nossos povos nada têm a comemorar.
Do mesmo modo, ficam convocados os povos e organizações indígenas de todas as regiões do país para a maior mobilização nacional indígena do ano – o Acampamento Terra Livre (ATL), que será realizado em Brasília – DF, no período de 24 a 28 de abril de 2017. Para aqueles que não puderem se deslocar à capital, sugerimos que organizem atos de apoio nas suas próprias regiões.
Listamos a seguir uma série de motivos para manter os nossos povos e organizações em estado de alerta:
1. Minuta de decreto sobre a reestruturação da Funai, inviabilizada no final de 2016 em razão do vazamento do texto em jornais de grande circulação;
2. Paralisação total das demarcações, implicando, entre outras coisas, na devolução da lista de terras sem empecilho jurídico da Casa Civil para o Ministério da Justiça e a para a Funai, para supostos novos estudos;
3. Falta de registro na Secretaria de Patrimônio da União (SPU), ou em cartórios, de terras já homologadas;
4. Edição, pelo então Ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, da Portaria 68, que pretendia mudar o procedimento de demarcação das terras indígenas, logo revogada e substituída pela Portaria 80, que instituía Grupo de Trabalho com a função de rever – isto é, desqualificar – as análises técnicas da Funai a respeito de processos demarcatórios;
5. Nomeação para o Ministério da Justiça e Cidadania de um dos principais dirigentes da bancada ruralista na Câmara dos Deputados: Osmar Serraglio, relator da Proposta de Emenda Constitucional (PEC 215), defensor da revisão das demarcações. Serraglio chegou a afirmar, em uma de suas primeiras entrevistas a jornais de circulação nacional, que os povos indígenas não precisam de suas terras tradicionais pois “terra não enche barriga de ninguém”;
6. Desmonte da Funai. Em outubro de 2016 a instituição teve uma redução drástica no seu orçamento, mesmo trabalhando com apenas 36% da capacidade de servidores. No último mês de março, o órgão indigenista sofreu corte de 347 cargos de coordenação e assessoria, impactando principalmente as Coordenações Regionais e Coordenações Técnicas Locais (CTLs), em prejuízo das comunidades, inclusive de povos voluntariamente isolados;
7. Edição de Portarias de desarticulação do subsistema de saúde indígena, na tentativa de esvaziar a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), em favor da terceirização, municipalização ou privatização do atendimento básico aos povos e comunidades indígenas. Em razão da reação das organizações e lideranças indígenas, o Ministério da Saúde revogou as portarias e instituiu um Grupo de Trabalho para discutir o aprimoramento do subsistema, que lamentavelmente não avançou a contento nos propósitos reivindicados pelo movimento indígena. Assim, há por parte do governo, sob influência de interesses políticos, a tentativa de mudar os rumos da atenção diferenciada e limitar os espaços do controle social;
8. Nomeação para a Presidência da Funai de Antonio Fernandes Toninho Costa, indicado pelo Partido Social Cristão (PSC), agrupamento aliado à Frente Parlamentar Agropecuária – a bancada ruralista, no ataque sistemático aos direitos constitucionais dos povos indígenas no Congresso Nacional. O partido ainda indicou, para o cargo de Diretor de Promoção ao Desenvolvimento Sustentável, o general Franklimberg Ribeiro de Freitas, cujo nome foi rotundamente rechaçado pelo movimento indígena quando pretendia ser presidente da Funai. Tudo leva a crer que há, na direção da Funai, uma forte visão assimilacionista a respeito dos povos indígenas;
9. Mesmo com o desmonte do órgão indigenista, a direção da Funai permitiu o loteamento de cargos em coordenações regionais para atender ingerências políticas, contrariando a vontade dos povos e organizações indígenas;
10. Prorrogação, por mais 60 dias, dos trabalhos da CPI da Funai/ Incra, na perspectiva de desqualificar o papel do órgão indigenista, além de criminalizar e desmoralizar os povos indígenas e as organizações da sociedade civil que os apoiam;
11. Inclusão, na Pauta do Congresso Nacional, de Medidas Provisórias, PECs e Projetos de Lei antipopulares (como a da reforma da previdência e da lei trabalhista) e antiindígenas, destinados a retroceder nos direitos conquistados na Constituição de 1988, especialmente os relacionados com a demarcação e proteção dos territórios e com a flexibilização – ou o fim – do licenciamento ambiental para grandes empreendimentos de infraestrutura (hidrelétricas, estradas, linhas de transmissão) e de mineração, e de expansão do agronegócio, em detrimento dos povos indígenas e outros povos e organizações do campo;
12. Anulação de casos consolidados de demarcação, como o da terra indígena Limão Verde em Mato Grosso do Sul, sob a ótica da tese do marco temporal, mesmo sem ter sido aprovada pelo pleno do Supremo Tribunal Federal (STF), o que constitui uma grave ameaça para o conjunto das terras indígenas – o direito originário dos povos- independentemente do estágio de regularização em que se encontram;
13. Suspensão arbitrária dos trabalhos do Conselho Nacional de Política Indigenista – CNPI;
14. Intensificação de manifestações e práticas de racismo institucional, associadas ao aumento da criminalização e assassinato de lideranças indígenas, e a negação de acesso dos povos indígenas à justiça;
15. Indicação do ex-ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, para assumir uma vaga de ministro no Supremo Tribunal Federal (STF), de onde não só ajudará a minimizar os impactos de casos de corrupção envolvendo seus colegas do governo e políticos que o apoiaram, mas terá também a responsabilidade de analisar casos de demarcação que estavam sob sua autoridade enquanto ministro de Estado;
16. Finalmente, há o sarcasmo contra a dignidade e os direitos dos povos indígenas por parte da bancada evangélica: o deputado Presbítero Marco Feliciano, do PSC/SP, apresentou e conseguiu a aprovação do requerimento 5861/2017 para a realização de uma Sessão Solene, no dia 19 de abril, no Plenário da Câmara dos Deputados, “em homenagem aos 50 anos da Fundação Nacional do Índio – FUNAI”. A APIB tem informações de que algumas lideranças foram convidadas e pretendem vir para participar desta audiência. Entendendo que o PSC é parte das forças inimigas que buscam suprimir os direitos indígenas da Constituição Federal e, inclusive, acabar com a FUNAI, a APIB recomenda a suas bases a não entrarem em jogos desse tipo, montados para legitimar os distintos ataques de que são vítimas os nossos povos e comunidades. Portanto, a orientação é que ninguém, dos povos e organizações que resistem na luta por defender os seus territórios, participem do ato promovido por Marco Feliciano.
Por essas e muitas outras razões, mais do que nunca, é preciso unificar as lutas em defesa do Brasil Indígena e pela garantia dos direitos originários dos nossos povos.
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB Mobilização Nacional Indígena