Maior encontro das nações indígenas do Brasil se reinventa virtualmente e reúne indígenas de todo Brasil em 04 dias de atividades com foco na luta por direitos
Termina hoje à noite, 30/04, o maior encontro das nações indígenas do Brasil, Acampamento Terra Livre (ATL), que este ano acontece em formato virtual nas redes sociais da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), por conta do isolamento social contra a pandemia da COVID-19.
De 27 a 30 de abril, centenas de indígenas e não-indígenas, em muitos pontos do País, dentro de suas casas e aldeias, se conectaram virtualmente para a realização da já considerada a mais histórica edição do evento. Foram 32 mesas de discussões em formato live, dezenas de apresentações artísticas, entre rituais e cantos tradicionais; mais de 300 mil visualizações, milhares de compartilhamentos e a participação de lideranças indígenas de diferentes gerações de norte a sul do país, parlamentares, artistas, antropólogos, juristas, indigenistas, pesquisadores, acadêmicos, jornalistas, procuradores, organizações de base e especialistas de muitos outros âmbitos.
A edição é considerada histórica, porque foi a primeira vez que povos dos mais diversos territórios se encontram no ambiente online para construir o que acontece há 15 anos presencialmente em Brasília – DF.
“Neste momento de crescimento dos ataques aos direitos indígenas e de nossa extrema vulnerabilidade frente à pandemia, a reinvenção na estratégia foi fundamental para continuarmos mobilizados. A sociedade precisa entender o papel dos povos indígenas no combate às mudanças climáticas, para garantir a água, o clima, a alimentação mundial. Até o momento, o Brasil registra 16 óbitos de indígenas no Brasil pela COVID-19. O estado brasileiro precisa ter ações concretas para evitarmos um novo genocídio. A luta indígena é de todos, e somente juntos iremos derrubar este governo genocida”, alerta Sonia Guajajara, coordenadora executiva da APIB.
O uso da tecnologia colocou, mais uma vez, o movimento indígena na vanguarda da resistência, pois permitiu não só a troca de saberes, promoveu emocionantes falas (como o diálogo entre mulheres), reforçou a espiritualidade, a tradição e a união de diferentes etnias; como levantou importantes encaminhamentos para as ações necessárias para garantir o cumprimento de medidas para a proteção territorial e da saúde dos povos ancestrais no contexto da pandemia.
Essa articulação é importantíssima num cenário onde o governo federal torna-se seu maior inimigo, com recentes determinações que incentivam a grilagem de suas terras (MP 910), a normativa 09 da FUNAI (que permite a ocupação de territórios indígenas não homologados), a retirada de órgãos protetivos como IBAMA e FUNAI do Conselho da Amazônia, entre falas do presidente da República que inferiorizam e reforçam o preconceito contra essas nações.
Os vídeos dos debates podem ser consultados na página da APIB, contendo painéis jurídicos com debates extremamente qualificados, com a opinião de importantes nomes do direito e também do fortalecimento da rede de advogados indígenas, em temas urgentes como mineração em terras indígenas, demarcação de territórios, povos isolados, mudanças climáticas, política indigenista, entre muitos outros.
“É difícil dizer qual é a ameaça mais gritante que o governo federal faz contra os povos indígenas, mas uma delas é a edição da Instrução Normativa 09/2020 da FUNAI, que fulmina o direito básico dessas nações, que é o direito ao território. A possibilidade de que mais mortes aconteçam, é imensa. Contra isso, expedimos ontem, pelo MPF, a recomendação para que essa Instrução seja imediatamente revogada. Ela foi assinada por 49 procuradores de 23 Estados do Brasil”, declarou o procurador Felício Pontes, do MPF-PA.
No mesmo painel (Frente Parlamentar Mista em defesa dos Direitos Indígenas), a deputada federal Joenia Wapichana, primeira parlamentar indígena do Brasil, também anunciou a expedição de uma carta assinada por diversas organizações, dirigida à Organização Mundial da Saúde (OMS), com o pedido para que os povos originários (do mundo todo) sejam considerados como o de maior risco e vulnerabilidade de contaminação pela COVID-19, e portanto, devem receber atendimento prioritário no enfrentamento da pandemia.
“Trazemos a preocupação das grandes lideranças indígenas, que lutam pelos seus modos de viver (…). Pedimos a vossa atenção quanto ao pleito de integrantes da aliança de parlamentares indígenas da América Latina, estendendo a todos os povos originários, para orientar aos governos do mundo que implementem políticas públicas que garantam a segurança física, alimentar, territorial e cultural desses povos”, diz um trecho da carta.