Plenária LGBTQIA+ no 18° acampamento terra Livre. Fotos: Juliana Pesqueira / Apib / Coletivo Proteja
Indígenas lançam manifesto na primeira plenária nacional LGBTI+ da história do Acampamento Terra Livre.
“Colorindo a luta em defesa do território”, este é o tema que orientou os debates da primeira plenária nacional dos indígenas LGBTI+ realizada na manhã desta segunda-feira, 11/04, no 18° Acampamento Terra Livre. Com intervenções que reuniram cocares e bandeiras do arco-íris, indígenas de todos os biomas do país lançaram um manifesto pelo reconhecimento e respeito aos seus corpos-territórios.
A mediação da mesa foi feita por Erisvan Guajajara, da Mídia Índia, que anunciou “esse momento para nós é histórico. Após 18 anos, viemos aqui com a diversidade de nossos corpos-territórios erguer a bandeira colorida, pois o momento se faz necessário. Para que as LGBTIs não sigam morrendo com o preconceito, impregnado no discurso de ódio. Estamos nas aldeias, nos campos, na rua, na cidade e vamos continuar ocupando todos os espaços pois o nosso colorido da resistência está aqui para afirmar que nossa a luta é pela VIDA, pelos nossos direitos, basta de racismo, basta de transfobia, basta de violência. Tire seu preconceito do meu caminho que irei passar com o meu cocar”.
O Brasil é o país que mais mata LGBTIs no mundo. A cada 23h uma pessoa trans é assassinada no país. E os casos de suicídio tem aumentado diariamente com a promoção institucional da LGBTfobia, papel que o governo Bolsonaro vem cumprindo. Quando se trata de indígenas nos deparamos com uma situação de dupla vulnerabilidade. É o que destaca Natan Paracá, do levante indígena da Universidade de São Paulo (USP). “É importante ressaltar a nossa vulnerabilidade dentro do contexto universitário, além de ser indígenas, somos LGBTs. E no espaço urbano não recebemos o acolhimento podemos ter no território. As pautas indígenas LGBTI+ não são as mesmas dos brancos. Também temos questões da hiper sexualização, mesmo dentro do contexto universitário, do ensino superior. Por isso precisamos fortalecer nosso canto, nossa identidade, entender que não somos anormais, diferentes dos outros, mas todos somos povos indígenas e precisamos resistir juntos”.
O Coletivo Tibira é uma das organizações de base dos LGBTIs indígenas. Ele leva o nome do primeiro indígena morto pela LGBTfobia, em 1614. Representado por Neimar, eles reafirmaram a transversalidade das pautas, que precisam ser defendidas de forma concomitante. “Nós não falamos somente sobre a diversidade, mas também sobre saúde, educação, território. Não estamos fazendo uma segregação do movimento, mas a gente sabe que ainda existe muito preconceito dentro de vários povos. Acreditamos que são resquícios desse processo de colonização que precisamos combater. Não adianta lutar com a causa indígena e não se importar com a questão LGBTI, a gente também tem o direito de existir”.
Jéssica de Crateús, Ceará, trouxe um antigo canto que inspirou o nome do Coletivo Caboclas, o primeiro do estado. “Na minha aldeia mora uma cabocla, eu não sei se é homem ou se ela é mulher, é uma cabocla índia da pele morena, mora na aldeia de Tapinaré.”
Arthur Guajajara, que também compõe o Coletivo Tibira, ressaltou a importância de tirar a questão LGBTI+ da invisibilidade nos territórios. “Nós não somos povos diferentes, nós lutamos pela mesma causa que é nosso território, o que a gente quer é respeito nas bases, nas nossas aldeias. Nós não vamos mais aceitar que passem pano, sofrer violência e deixar isso passar só naquele momento. Que o povo colorido seja respeitado. Não estamos aqui só para aparecer, estamos para dizer basta dessa violência. Se você não aceita, pelo menos respeita. O respeito é a base de tudo, a educação é a base de tudo”.
Em seguida Yaponã Guajajara e Fred Potiguara realizaram a leitura do manifesto que destaca o papel do capitalismo na mercantilização dos corpos e no aumento da violência. “Não aceitamos o avanço capitalista e mercantilista representados pelo interesse do agronegócio, mineração, madeireiros, grileiros e os mais diversos tipos de especuladores em nossos territórios, explorando nossa biodiversidade, violando o direito de ser e existir de nossa gente. Reafirmamos que sempre estivemos aqui, sempre existimos enquanto indígenas LGBTI+ e lutamos contra essa sociedade que ainda mantém as raízes profundas da colonização”, afirma o documento.
Os coordenadores da APIB, Dinamam Tuxá e Sônia Guajajara, receberam o manifesto. “Esse momento que traz na programação oficial a discussão LGBTI+ vem para demonstrar que o ATL acolhe e respeita todas as pautas e formas que as pessoas se entendam ser. Para nós, todas as formas de vida importam. É muito importante para demonstrar que, nós povos indígenas, exigimos respeito por nossa diversidade de povos e culturas. Cada um é o que é, e como se entende ser. E o acampamento acolhe com muita alegria para oferecer esse apoio, essa liberdade de expressão. Essa luta é nossa”, apoiou Sônia. A plenária encerrou com uma performance de Joelma Guarani, cantando Calypso.
Leia aqui o manifesto “Colorindo a vida em defesa do território”.