O presidente Lula vetou parcialmente o PL 2903, do Marco Temporal, na última sexta-feira, 20 de outubro. Alguns pontos centrais da lei do genocídio indígena foram vetados, no entanto, aqueles que permaneceram continuam apresentando ameaças às vidas dos povos indígenas. Na tentativa de elucidar as consequências dos artigos que não foram vetados pelo Presidente, o departamento jurídico da Apib, preparou uma avaliação da atual redação do projeto de lei.

Foram vetados o artigo que fixava a tese do marco temporal em 05 de outubro de 1988; a flexibilização da política de não contato com povos isolados e de recente contato; da retomada de áreas indígenas reservadas em caso de “perdas de traços culturais” (perspectiva racista e assimilacionista); da previsão de instalação de postos, bases e equipamentos públicos sem consulta prévia, livre e informada à comunidade indígena afetada; a permissão de cultivo de transgênicos em terras indígenas; e a celebração de contratos entre indígenas e não indígenas para exploração de atividades agrossilvopastoris.

No entanto, três trechos foram sancionados e já estão compondo a nova lei de número 14.701/20232903. O Artigo 5º, trata da participação efetiva de Estados e Municípios em todas as fases do procedimento de demarcação, o que pode protelar as demarcações. O Artigo 26° regulamenta a cooperação entre indígenas e não indígenas para exploração de atividades econômicas e pode ampliar assédios de terceiros não indígenas sobre as TIs para fins de “cooperação” ou exploração econômica. E o artigo 20° dispõe que o direito de usufruto exclusivo não pode se sobrepor ao interesse da política de defesa e soberania nacional. Este último trecho é perigoso porque pode, igualmente, abrir margem para violar o usufruto exclusivo, diante de conceito genérico de “interesse de política de defesa”. Os povos indígenas sabem que, em geral, a posição dos militares brasileiros é contra a demarcação das terras indígenas e este artigo justifica intervenções nos territórios. Contudo, somos resguardados pelo Artigo 231, §6º, da Constituição, que prevê que o relevante interesse da União deverá ser disposto por Lei Complementar, ou seja, o usufruto previsto na constituição não pode ser suplantado por esta lei.

Além disso, em que pese o trecho de indenização tenha sido vetado pelo Presidente Lula, o julgamento do marco temporal no STF concedeu a abertura de um novo regime de indenização, garantindo indenização prévia e por terra nua em caso de ausência de ocupação tradicional ou de renitente esbulho na época da promulgação da Constituição de 1988.

Agora o que mais preocupa o movimento indígena é a promessa dos ruralistas de derrubar todos os vetos, lançada publicamente à imprensa através de nota da Frente Parlamentar de Agropecuária. Os vetos serão apreciados numa sessão conjunta entre Senado e Câmara dos deputados. Para cumprir a ameaça, são necessários 257 votos de Deputados Federais e 41 votos de Senadores. Os integrantes da FPA somam mais de 350 políticos, maioria suficiente para dar seguimento aos desmandos dos seus interesses econômicos próprios.

Vamos seguir mobilizados e pressionando as instituições para que nossos direitos sejam garantidos e se mantenha o veto parcial!