A organização reforçou que democracia só será plena com justiça e reparação aos povos indígenas pelas violações do Estado

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) participou, no último dia 21 de julho, da audiência pública da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), que abordou a situação das políticas de memória, verdade, reparação e justiça no Brasil, com foco nas violações históricas contra os povos indígenas, principalmente durante a Ditadura cívico-militar e empresarial, do período de 1946 a 1985, e cujos impactos se perpetuam até os dias atuais. Na audiência, a organização indígena defendeu a criação urgente de uma Comissão Nacional Indígena da Verdade (CNIV).

Realizada durante o 193º período de sessões da CIDH, a audiência reuniu representantes da sociedade civil, do Estado brasileiro e do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) para debater os desafios e caminhos para a efetivação da justiça de transição no país.

Em sua intervenção, a Apib, representada pelo coordenador executivo Dinamam Tuxá, e pela advogada indígena Maíra Pankararu, destacou que as violências cometidas pelo Estado contra os povos indígenas não se limitaram ao período da ditadura militar, mas seguem sendo estruturais e contínuas. 

O coordenador relembrou episódios como a perda de territórios para grandes empreendimentos, a exemplo da Usina de Itaipu, e apontou a ausência de políticas de reparação. “A assimilação foi uma estratégia de destruição, resultando em envenenamento de rios, comunidades afetadas e falta de reparação”, disse Dinamam

O relatório final da Comissão Nacional da Verdade (CNV) publicado em 2012, após 2 anos de trabalhos, apontou que pelo menos 8,350 indígenas foram mortos durante o regime. Porém, apenas dez povos foram estudados pela comissão, representando 3,3% dos povos existentes no Brasil, o que indica que esse número pode ser bem maior. 

Na audiência, representantes da Apib também denunciaram a invisibilização dos povos indígenas nos processos oficiais de memória, visto que os povos indígenas não foram incluídos como vítimas da ditadura no relatório principal da CNV. Com isso, em 2024 a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), promoveu a criação dFórum “Povos Indígenas: Memória, Verdade e Justiça”, espaço que tem o objetivo de pressionar e garantir que o Estado brasileiro assegure a reparação integral e a não repetição, com mudanças estruturais, das violações cometidas contra os povos indígenas no país, especialmente durante a ditadura

Liderado em conjunto com o Observatório dos Direitos e Políticas Indigenistas (Obind) da Universidade de Brasília (UnB), o Instituto de Políticas Relacionais (IPR) e o Ministério Público Federal (MPF), o Fórum promove debates entre organizações indígenas, especialistas em direitos humanos e indígenas, entidades indigenistas e socioambientais, instituições acadêmicas nacionais e internacionais e representações de alguns órgãos públicos.

Além da Apib, participaram da audiência com a CIDH representantes da Defensoria Pública da União, organizações indígenas e comunitárias, além de autoridades do Ministério dos Povos Indígenas, Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, Supremo Tribunal Federal e Ministério das Relações Exteriores. Eles Os representantes do movimento indígena e da sociedade civil cobraram o Estado por ações concretas, como a tipificação do crime de desaparecimento forçado, e o avanço na demarcação de terras indígenas e a criação da CNIV, como formas de reparação.

A CIDH reiterou que o enfrentamento das violações passadas é essencial para a construção de uma sociedade democrática. Com forte apoio à proposta de uma comissão específica para os povos indígenas, os comissionados reforçaram que a reparação precisa ir além da compensação individual, atuando para transformar as condições estruturais de vida dessas populações.

Assista a audiência completa: