Organizações denunciam que PL 6093 viola a Constituição, desmonta sistema de demarcação e torna impossível a regularização de quase 100% das áreas com processos ainda em andamento.

Em nota técnica assinada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e Instituto Socioambiental (ISA), movimento indígena e indigenista apontam que  Projeto de Lei nº 6.093/2023 inviabiliza a regularização de quase 98% dos territórios cujos processos ainda não foram concluídos. 

De autoria da deputada federal Coronel Fernanda (PL/MT), o projeto foi aprovado na Comissão de Agricultura da Câmara (CAPADR), no dia 03 de setembro, e agora segue para a Comissão da Amazônia e Povos Originários (CPOVOS). Depois, precisa passar pela de Finanças e Tributação e a de Constituição e Justiça.

O PL propõe uma série de mudanças no procedimento administrativo de demarcação de terras, como a instituição da tese do marco temporal, que estabelece 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, como data-limite para ocupação de territórios. A tese ignora os históricos processos de violência e expulsão forçada sofridos por muitos povos, especialmente durante a ditadura militar, e foi considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2003. 

Além disso, o PL prevê a retirada da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) da coordenação dos processos demarcatórios e quer submeter a homologação das terras ao Congresso Nacional. 

“O PL 6.093/2023, além da instituição da tese inconstitucional do marco temporal, representa um retrocesso em toda a política de demarcação das terras indígenas, uma vez que, por exemplo, substitui o decreto de homologação do presidente da república por uma medida provisória, condicionando um direito fundamental de nós povos indígenas à conveniência política”, diz Ricardo Terena, coordenador jurídico da Apib. 

APIB e ISA destacam que o PL fere diversos dispositivos da Constituição Federal de 1988 e afronta tratados internacionais ratificados pelo Brasil, como a Convenção nº 169 da OIT, ao não prever a realização de consulta livre, prévia e informada aos povos indígenas, medida obrigatória sempre que leis ou ações administrativas afetarem diretamente esses povos.

Em nota, as organizações ainda alertam que a proposta ameaça não apenas os direitos originários dos povos indígenas, mas também a proteção ambiental, ao travar processos de reconhecimento de territórios que são fundamentais para a preservação dos biomas brasileiros e para o enfrentamento da crise climática.