Índice
Introdução: A COP Indígena
Destaques da APIB sobre a COP30
Participação Indígena na COP30
Eventos
Marchas e Manifestações
Cúpula dos Povos
Conquistas do movimentos indígena na COP30
- Avanços em Demarcações e Proteção Territorial na COP30
- Documentos finais da COP30: Conquistas a partir da NDC dos Povos Indígenas do Brasil
- Compromisso Intergovernamental de Reconhecimento Territorial da Parceria dos Líderes Florestais e Climáticos (FCLP)
- Anúncio Oficial do Programa de Proteção de Terras Indígenas (PPTI)
- Renovação do Compromisso do Grupo de Financiadores sobre Florestas e Posse da Terra (FTFG)
- O Compromisso dos Povos da Plataforma Shandia: de nós, para nós
- Garantia de 20% de Financiamento Direto no Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF)
- Anúncio do Mecanismo Vítuke para Gestão Ambiental e Territorial
- A Resposta Somos Nós: Resistência e Solidariedade Global
Nossa visão para o futuro: o que esperamos da COP31
Anexo: Menções a Povos Indígenas nos Documentos Oficiais da COP30
Introdução: A COP Indígena
A COP30 ficará registrada mundialmente como a COP Indígena, não apenas pela maior participação indígena da história, mas porque transformamos a Conferência do Clima em um território político onde demarcação, proteção e autodeterminação deixaram de ser margens e se tornaram centro do debate climático.
Desde que Belém foi anunciada como sede da Conferência, construímos uma estratégia coletiva, articulada a partir de nossas bases, para que a COP30 deixasse um legado concreto para os povos indígenas do Brasil. Desse processo nasceu a NDC Indígena: 36 medidas que afirmam que não existe ação climática real sem demarcação, sem financiamento direto, sem zonas livres de exploração e sem a proteção dos povos que há milênios vivem em harmonia com o planeta.
Ocupamos todos os espaços de incidência em Belém: Zona Azul, Zona Verde, Cúpula dos Povos, Aldeia COP, ruas e rios. Também reafirmamos e fortalecemos nossa articulação política com demais movimentos sociais e povos indígenas a nível global.
Enquanto o mundo nos escutava, mais uma vez a violência que denunciamos se impôs: em 16 de novembro, em paralelo à COP, a liderança Vicente Fernandes Kaiowá foi assassinada. Reafirmamos que não há solução climática possível enquanto quem protege os biomas segue sendo perseguido e morto, e enquanto leis inconstitucionais como a 14.701/2023 (Marco Temporal) promovem a violência nos nossos territórios.
A COP30 se conclui com avanços históricos para os povos indígenas: demarcações, compromissos financeiros, programas estruturantes e o reconhecimento de que nossos territórios são política climática. Reconhecemos também o apoio da Ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, nas articulações institucionais que resultaram em alguns dos avanços apresentados na COP30.
Cada conquista foi fruto da mobilização incansável de nossas lideranças, organizações e povos: nada nos foi dado. Ainda assim, os resultados da COP foram insuficientes para o real enfrentamento à crise climática.
Seguiremos lutando por medidas concretas para o fim da exploração dos combustíveis fósseis, do desmatamento e, acima de tudo, pela proteção dos nossos direitos e territórios. Fizemos da conferência um espaço vivo de disputa, coragem e propósito. Mostramos ao mundo que não existe futuro climático sem nós. Seguimos vigilantes e em luta, porque a resposta somos nós.
Destaques da APIB sobre a COP30
| MAIOR PARTICIPAÇÃO INDÍGENA DA HISTÓRIA DAS COPS |
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| OCUPAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL |
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| AVANÇOS EM DEMARCAÇÃO E PROTEÇÃO TERRITORIAL |
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| COMPROMISSOS DE FINANCIAMENTO |
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| AVANÇOS NOS ACORDOS OFICIAIS DA COP30 |
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| OMISSÕES NOS ACORDOS OFICIAIS DA COP30 |
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Participação Indígena na COP30
A COP30 registrou a maior participação indígena da história das Conferências da ONU sobre Clima. Ao todo, aproximadamente 5.000 indígenas estiveram em Belém, sendo mais de 4.000 representantes de aproximadamente 300 povos indígenas do Brasil, e cerca de 1.000 representantes indígenas de mais de 50 países.
O evento também registrou a maior delegação indígena credenciada na Zona Azul, espaço oficial de negociações da COP: obtivemos cerca de 900 indígenas credenciados, dos quais cerca de 400 indígenas brasileiros. Até então, Dubai registrava a maior participação indígena nas COPs, com aproximadamente 350 representantes.
Para além da Zona Azul, nossos povos ocuparam todos os espaços de incidência durante a COP30. Tivemos participação expressiva em eventos paralelos organizados na Zona Verde, espaço oficial da COP30 dedicado à sociedade civil; na Cúpula dos Povos, nosso principal espaço de articulação e convergência política com outros movimentos sociais; em espaços autogestionados pela sociedade civil em Belém; e na Aldeia COP, espaço de referência da delegação indígena durante a COP30, onde a maioria da delegação indígena estava alojada e onde também ocorreram diversos eventos organizados pela APIB e nossas organizações regionais de base, e também pelo Ministério dos Povos Indígenas e outros parceiros e aliados.
Ocupamos as ruas de Belém em duas marchas e inúmeros atos e intervenções, lutando pelos nossos direitos e trazendo visibilidade para nossas demandas e contribuições. A partir de nossa incansável mobilização e incidência, conseguimos que a pauta indígena e a demarcação dos nossos territórios fossem o principal tema debatido nas redes internacionais, e o segundo tema mais comentado a nível nacional, consolidando na opinião pública “a centralidade dos Povos Indígenas como protagonistas das soluções para o enfrentamento da crise climática”.
Apesar de termos conquistado recordes de participação e visibilidade durante a COP30, ainda não temos participação real no processo de negociações da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC, pela sigla em inglês), para que nossas demandas sejam oficialmente incorporadas às decisões formais. Espaços como o Caucus Indígena, a Plataforma de Povos Indígenas e Comunidades Locais e o Círculo dos Povos são conquistas fundamentais do movimento indígena para incidir sobre nossas demandas para o debate climático. Seguimos reivindicando participação direta nas negociações e acordos realizados no âmbito das Conferências do Clima.
A histórica participação indígena na COP30 marcou uma virada política e de paradigma: mostramos para o mundo que não pode haver ação climática sem a inclusão de povos e territórios indígenas no centro das discussões e acordos sobre o clima. Esse é um dos nossos legados para as próximas COPs.
Eventos
A agenda indígena na COP30 foi, em volume e abrangência temática, a maior já registrada em uma Conferência da ONU sobre Clima. Ao longo de duas semanas, nossas lideranças participaram de mais de 500 eventos oficiais e paralelos, dos quais mais de 400 contaram com participação direta da APIB e de nossas organizações regionais de base, sendo que mais de 70 eventos foram organizados diretamente pelo movimento indígena brasileiro.
Esse volume expressivo não foi disperso: foi estratégico e decorre de nossa reivindicação histórica por participação direta no debate climático. A APIB estruturou sua atuação de forma coordenada por temas, territórios e prioridades de debate, garantindo presença qualificada e geograficamente representativa em mesas de alto nível, painéis técnicos, plenárias, espaços da sociedade civil, Aldeia COP, Zona Verde, Cúpula dos Povos e reuniões bilaterais cruciais com governos, fundos multilaterais, filantropias e organismos internacionais.
Cada evento foi uma oportunidade de reivindicar nossas pautas estruturantes: demarcação como política de mitigação; reconhecimento da NDC Indígena; financiamento direto; territórios como zonas livres de exploração; proteção de defensoras e defensores; transição justa, soberana e popular; combate à expansão descontrolada da fronteira agrícola, entre outros temas [ver abaixo Conquistas do Movimento Indígena na COP30 para mais informações].
Esses eixos foram articulados a partir de casos concretos, como os impactos das inundações no Rio Grande do Sul, as grandes secas na Amazônia, o avanço da soja no MATOPIBA, Cerrado e Pampa, a violência sistemática contra os Guarani Kaiowá e Pataxó, os impactos do garimpo para os Kayapó, Munduruku e Yanomami, a pressão do desmatamento e garimpo sobre povos isolados e de recente contato, além de diversos outros casos emblemáticos.
Nossa articulação política nacional e internacional também ganhou escala: em eventos organizados com Aliança Global de Comunidades Territoriais, G9 Amazônico, Centrais Sindicais, movimentos negros, quilombolas e organizações parceiras, fortalecemos alianças políticas e construímos narrativas unificadas, no âmbito de nossa campanha comum, “A Resposta Somos Nós”.
Esses espaços nos permitiram tensionar posições oficiais dos governos, denunciar retrocessos e, ao mesmo tempo, apresentar soluções baseadas em nossos modos de vida tradicionais. Entre as reuniões de alto nível realizadas com a participação de lideranças da APIB durante a COP30, destacamos encontros com:
- Presidente da República Federativa do Brasil, Luís Inácio Lula da Silva
- Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres
- Príncipe de Gales, William Arthur Philip Louis
- Relator Especial das Nações Unidas para Povos Indígenas, Albert K. Barume
- Relatora Especial das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima, Elisa Morgera
- Relatora Especial das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Saudável, Astrid Puentes Riaño
- Ministro da Noruega para Clima e Meio Ambiente, Sr. Andreas Bjelland Eriksen
- Equipe do Alto Comissariado de Direitos Humanos das Nações Unidas.
- Europarlamentares (Noruega: Lars Haltbrekken – Socialist; Frøya Skjold Sjursæther – Greens; Aleksander Stokkebø – Conservatives; Tor Mikkel Wara, Progress Party; Lisa Badum – Greens. Alemanha: Violetta Bock – The Left; Jakob Blankenburg – SD; Lisa Badum – Greens; Anna Aeikens – CDU).
O histórico de resistência e de incidência da APIB pelos direitos territoriais e contra a crise climática foi reconhecido por diversos parceiros durante a COP30, inclusive, pelo grupo Ação Climática da Finlândia, que nos premiou com o “Climate Champion Award”, e pela CAN Internacional, que nos premiou com o “Solidariedade e Justiça para o Povo Indígena da Amazônia”.
Em síntese, não participamos da COP30, moldamos a COP30: transformamos a Conferência em um espaço vivo, crítico e propositivo, consolidando nossas lideranças indígenas como autoridades climáticas e o movimento indígena como um dos pilares centrais da governança climática global.
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Relatório de Monitoramento da Opinião Pública Digital, realizado pela Quaest, entre 10 de novembro de 2025 a 21 de novembro de 2025. O relatório informa que “Lideranças indígenas tornaram-se atores centrais do debate, cobrando coerência climática, demarcação de terras e limites à exploração de fósseis. Suas manifestações foram destaque tanto no Brasil quanto no cenário internacional”.
Marchas e Manifestações
A Conferência do Clima das Nações Unidas não era realizada em países democráticos desde a COP26, em Glasglow, em 2021. Neste sentido, a expressão do direito à livre manifestação por parte do movimento indígena e da sociedade civil como um todo, foi um dos principais destaques da COP30.
Foram inúmeras as intervenções, manifestações, atos e marchas com organização e participação do movimento indígena, como uma ferramenta histórica de reivindicação e luta pelo reconhecimento e proteção de nossos direitos. Entre as principais intervenções realizadas com participação direta da APIB e de nossas organizações regionais de base, destacamos:
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- Marcha Global Indígena – A Resposta Somos Nós (17 de novembro): Marchamos pelas ruas de Belém com mais de 3 mil pessoas, cobrando a demarcação e a proteção de territórios, nossa inclusão e participação efetiva nas mesas de negociação, o fim da exploração dos combustíveis fósseis e declaração dos nossos territórios como zonas livres de exploração.
- Marcha Global pelo Clima (15 de novembro): Organizada pela Cúpula dos Povos, a marcha contou com mais de 70 mil pessoas de diversos segmentos de movimentos sociais e de todas as partes do globo, cobrando por justiça social, ambiental e climática.
- Barqueata da Cúpula dos Povos (12 de novembro): A barqueata reuniu cerca de 200 embarcações e aproximadamente 5.000 pessoas de 60 países na Baía do Guajará, em um ato simbólico pela COP30 e pela justiça climática. Participaram povos indígenas, ribeirinhos, quilombolas, movimentos sociais e organizações de vários países — unidos para denunciar falsas soluções climáticas e reafirmar alternativas baseadas em agroecologia, solidariedade e respeito aos territórios.
- Vigília Somos Todos Guarani Kaiowá (17 de novembro): A APIB e a Aty Guasu organizaram a vigília Somos Todos Guarani Kaiowá, em solidariedade ao povo Guarani Kaiowá devido ao assassinato brutal da liderança Vicente Fernandes Kaiowa, que em paralelo à COP30 (16 de novembro), na retomada do território Pyelito Kue, expondo a violência que segue atingindo quem mais protege nossos territórios.
- Além destas manifestações, lideranças indígenas organizaram e participaram de dezenas de atos diários reivindicando nossas demandas (como a manifestação pacífica liderada pelo Povo Munduruku na entrada da Zona Azul), que pressionaram os Estados e resultaram em medidas específicas adotadas pelo governo brasileiro (como a garantia de Consulta Prévia, Livre e Informada sobre o projeto de construção de uma hidrovia no Rio Tapajós).
Essas mobilizações geraram pressão direta sobre negociadores, países e sobre a ONU. A partir de nossa pressão e visibilidade, conseguimos pautar a opinião pública e tensionar as negociações da COP30 em relação aos acordos que estavam sendo realizados sem nossa participação direta.
Cúpula dos Povos
A APIB compõe a articulação política da Cúpula dos Povos desde sua criação em março de 2023. Durante a COP30, a Cúpula dos Povos se consolidou como o principal espaço de referência e convergência da sociedade civil organizada, reunindo mais de 70 mil pessoas, representantes de mais de 1.300 movimentos sociais, organizações da sociedade civil e coletivos de todo o mundo.
O processo de unidade na diversidade representado pela Cúpula dos Povos é estratégico para além da COP30, pois fortalece a resistência do nosso campo social contra interesses econômicos e políticos que há séculos dizimam nossos povos e destroem nossos territórios e biomas.
A APIB assina a Declaração Final da Cúpula dos Povos, a qual denuncia as falsas soluções de mercado, a insuficiência do acordo final apresentado na COP30, o papel do capitalismo e do colonialismo na crise climática, e a omissão dos governos diante da emergência planetária. A Declaração também incorporou reivindicações centrais do movimento indígena, como a exigência da demarcação e proteção dos nossos territórios, financiamento direto e o fim da exploração de combustíveis fósseis.
Conquistas do movimentos indígena na COP30
A APIB e nossas organizações regionais de base articularam estratégias para os resultados da COP30 desde novembro de 2022, quando o então presidente-eleito, Luís Inácio Lula da Silva, anunciou durante a COP27, realizada em Sharm el-Sheikh, a proposta de que a cidade de Belém sediasse a 30ª Conferência do Clima das Nações Unidas, proposta confirmada em dezembro daquele ano.
Desde então, o movimento indígena brasileiro definiu que nosso principal objetivo para a COP30 seria garantir que a demarcação e proteção dos territórios indígenas fossem oficialmente reconhecidas como política climática e que a COP30 deixasse um legado concreto de proteção territorial, entre outras demandas específicas à agenda de negociação da UNFCCC. Esta definição parte do acúmulo histórico da luta indígena em defesa dos nossos territórios e direitos, consolidada a partir de nossas assembleias nacionais, o Acampamento Terra Livre (ATL).
Assim, a COP30 apresentou, sim, avanços significativos para os povos indígenas do Brasil e do mundo, com reconhecimento dos nossos territórios como política de mitigação climática, anúncios de demarcação e compromissos de reconhecimento territorial e financiamento direto. Reconhecemos também o papel importante e o protagonismo do Ministério dos Povos Indígenas, na figura da Ministra Sonia Guajajara, em promover a articulação institucional necessária para vários dos resultados anunciados, e na construção desse processo ao longo dos últimos anos.
No entanto, o panorama geral da COP30 ainda demonstra que os países e a UNFCCC estão distantes de reconhecer e implementar o que nos é de direito nacional e internacional, e de promoverem uma agenda com a devida ambição climática diante da emergência que vivenciamos – seja em nossos territórios, seja a nível global. Sem negar avanços setoriais, acreditamos que muito mais poderia ter sido feito, sobretudo se os Estados tivessem, realmente, a mesma ambição de proteção que nós temos pela vida, pelos ecossistemas, pelas próximas gerações e pelo planeta.
Nesse cenário, estamos plenamente conscientes de que os avanços que conseguimos alcançar não foram voluntários ou proativamente concedidos pelos Estados ou organismos internacionais. Reafirmamos que cada uma das conquistas que celebramos é resultado de nossa luta histórica em nossos territórios, de nossa articulação política desde nossas bases para o nível regional, nacional e internacional, e de nossa incansável incidência política pela defesa dos nossos direitos.
1. Avanços em Demarcações e Proteção Territorial na COP30
Consideramos os anúncios nas demarcações como a principal conquista do movimento indígena na COP30, onde tivemos avanços de demarcação em 27 Terras Indígenas (TI). O processo administrativo de demarcação de Terras Indígenas no Brasil, ocorre em sete etapas.
Celebramos cada território que avança em cada etapa de demarcação, como um passo adicional em prol do usufruto exclusivo e posse plena de nossos territórios, conforme nosso direito constitucionalmente garantido. Os 27 anúncios de demarcação realizados na COP30 são:
- 4 Homologações:
- TI Kaxuyana Tunayana (localizada nos estados do Pará e Amazonas)
- TI Uirapuru (Mato Grosso)
- TI Estação Parecis (Mato Grosso)
- TI Manoki (Mato Grosso)
- 10 Portarias Declaratórias:
- TI Vista Alegre (Amazonas)
- TI Tupinambá de Olivença (Bahia)
- TI Comexatiba (Bahia)
- TI Ypoi Triunfo (Mato Grosso do Sul)
- TI Sawre Ba’pim (Pará)
- TI Pankará da Serra do Arapuá (Pernambuco)
- TI Sambaqui (Paraná)
- TI Ka’aguy Hovy (São Paulo)
- TI Pakurity (São Paulo)
- TI Ka’aguy Mirim (São Paulo)
- 6 Aprovações de Relatórios Circunstanciados de Identificação e Delimitação (RCID):
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- TI Curriã (Amazonas)
- TI Riozinho Iaco (Acre)
- TI Kulina do Rio Ueré (Amazonas)
- TI Aracá-Padauiri (Amazonas)
- TI Gaviãozinho (Amazonas)
- TI Pindó Poty (Rio Grande do Sul)
- 7 Portarias de Constituição de Grupos Técnicos (GT) para formalização de estudos multidisciplinares
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- Nadëb (Amazonas)
- Maraguá-Mawé (Amazonas)
- Tuyuka (Amazonas)
- Rio Paracuní e Curupira (Amazonas)
- Deni do Rio Cuniuá (Amazonas)
- Chandless (Acre)
- Kanamari do Jutaí (Amazonas)
Além de avanços concretos no processo de demarcação dessas 27 terras indígenas, também tivemos conquistas na proteção de outros 11 territórios:
- 10 Portarias de constituição de Reservas Indígenas:
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- TI Kanela do Araguaia (Mato Grosso)
- TI Crim Patehi (Tocantins)
- TI Lakiãnõ Xokleng (Santa Catarina)
- TI Valparaíso (Amazonas)
- TI Uty-Xunaty (Rondônia)
- TI Guajanaíra (Pará)
- TI Juruna do Km 17 (Pará)
- TI Jenipapeiro (Bahia)
- TI Maturêba (Bahia)
- TI Nazário e Mambira (Ceará)
- 1 Portaria de Restrição de uso: TI Tanaru (Rondônia)
Esses anúncios respondem à nossa demanda central de que a COP30 deixasse um legado concreto de demarcação e proteção territorial. Entretanto, ainda há um passivo de centenas de territórios indígenas que aguardam seu reconhecimento e proteção. E o Estado brasileiro tem o dever de promover a demarcação com a máxima celeridade possível, considerando que o prazo constitucional para que a União demarcasse todos os territórios indígenas acabou em 1993.
Além disso, conforme denunciamos em diversos momentos durante a COP30, a aplicabilidade da Lei 14.701/2023, que normativa o Marco Temporal e outros desmontes de nossos direitos, bloqueou o avanço na demarcação de outros territórios. O Marco Temporal, já julgado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, tem se demonstrado como um dos principais fatores que limita avanços na demarcação de nossos territórios. Caso a Lei 14.701/2023 não estivesse em vigor, seguramente teríamos mais anúncios de demarcações de outros territórios durante a COP30. Exigimos revogação imediata da Lei 14.701/2023 e de todo o pacote de retrocessos de direitos indígenas.
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As sete etapas administrativas de demarcação de terras indígenas no Brasil incluem, em resumo: 1) Identificação: Funai realiza estudos antropológicos e técnicos para identificar e delimitar a Terra Indígena. 2) Aprovação: Presidente da Funai aprova o relatório e publica seu resumo no Diário Oficial. 3) Contestações: Interessados têm até 90 dias para contestar; Funai analisa em mais 60 dias e envia ao Ministério da Justiça. 4) Declaração: Ministro da Justiça tem 30 dias para declarar limites, pedir diligências ou rejeitar a identificação. 5) Demarcação física: Funai executa a demarcação; Incra reassenta ocupantes não indígenas. 6) Homologação: Presidente da República homologa a Terra Indígena por decreto. 7) Registro: Área demarcada é registrada em cartório e na Secretaria de Patrimônio da União.
2. Documentos finais da COP30: Conquistas a partir da NDC dos Povos Indígenas do Brasil
A APIB participa das Conferências do Clima da ONU desde a COP15, realizada em 2009, em Copenhagen. Entretanto, para além das COPs, nossas lideranças denunciam há décadas as transformações no clima causadas pelo modelo predatório de desenvolvimento adotado pelos Estados, pelo capitalismo desenfreado e pela ganância do lucro financeiro sobre a vida.
Se bem é verdade que vivemos há milênios em harmonia com a natureza e de forma indissociável aos nossos territórios, também é verdade que nossos povos denunciam a emergência climática que vivemos hoje bem antes da criação da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), e da instituição das COPs.
Para fazer frente ao atual modelo multilateral de negociações sobre a mudança do clima, criamos as Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC) dos Povos Indígenas do Brasil, como nosso documento orientador de reivindicações e propostas a serem adotadas pelos países durante as negociações da COP30.
A NDC Indígena apresenta 36 propostas divididas em sete eixos, e foi criada a partir dos nossos territórios ao longo de vários encontros ocorridos em 2025, em um processo construtivo tal como é feito em todas as propostas criadas pelo movimento indígena: representativo, coletivo, politicamente validado em amplo debate, e de baixo para cima.
A NDC dos Povos Indígenas do Brasil foi um documento pioneiro, sendo o primeiro registro deste instrumento proposto por uma entidade que não seja estatal. Nos orgulhamos de que a NDC Indígena tenha inspirado a criação de NDCs de outros segmentos sociais, além de NDCs de povos indígenas de outros países.
Nesse sentido, a NDC Indígena é nosso parâmetro para avaliar os acordos, documentos e decisões adotados pelos países na COP30. De forma geral, reconhecemos os avanços que foram conquistados a partir da articulação e incidência indígena para a COP30, incluindo o progresso de aderir nos documentos oficiais algumas de nossas demandas específicas.
Porém, denunciamos a falta de ambição e as omissões dos Estados que, por decisões insuficientes, continuam a promover o colapso climático e a colocar em xeque a possibilidade de vida das próximas gerações em nosso planeta. Assim, em relação aos acordos finais da COP30:
Celebramos as seguintes medidas nos acordos adotados pelas Partes na COP30:
- Reconhecimento dos territórios e conhecimento tradicional dos povos indígenas como uma política de mitigação climática.
- Reconhecimento da participação dos povos indígenas na criação dos caminhos de transição justa, e de nossos direitos serem promovidos e cumpridos nas iniciativas de transição justa.
- Garantia da implementação do nosso direito ao consentimento livre, prévio e informado e do nosso direito à autodeterminação.
- Proteção dos Povos Indígenas em Isolamento Voluntário e de Recente Contato.
- Garantia de que a adaptação e a resiliência climática são parte integrante das transições justas e devem ser inclusivas e empoderar os povos indígenas.
- Reconhecimento explícito dos povos Afrodescendentes em documentos oficiais.
Denunciamos a omissão das seguintes medidas nos acordos adotados pelas Partes na COP30:
- Ausência de um Mapa do Caminho para o Fim da Exploração dos Combustíveis Fósseis e para o Fim do Desmatamento.
- Avanços insuficientes em relação ao financiamento para adaptação climática.
- Ausência de recomendação para que as políticas climáticas nacionais incorporem demarcação, fiscalização, governança territorial e manejo indígena como pilares de cumprimento de suas metas territoriais.
- Ausência de salvaguardas concretas e mecanismos seguros de denúncia contra projetos de mercado de carbono e JREDD+ que avançam em nossos territórios sem o devido processo de consentimento livre, prévio e informado.
Em resumo, avaliamos que os documentos finais consensuados pelos países apresentam importantes avanços em reconhecimento de nossos direitos, destacando o reconhecimento dos nossos territórios e conhecimento tradicional como uma política de mitigação climática, o que era uma das nossas demandas centrais para a COP30.
Esperamos que esse reconhecimento seja traduzido em políticas públicas a nível nacional, e que resulte em avanços de proteção territorial também a partir da perspectiva climática. No caso do Brasil, onde o desmatamento e a mudança do uso do solo são responsáveis por mais de ¾ das emissões de gases do efeito estufa do país, e dado que os territórios indígenas são as áreas menos desmatadas no território nacional, é evidente que tal medida é central e deve ser priorizada na ação climática brasileira.
Porém, os Estados fracassam ao não adotar uma proposta concreta para o fim dos combustíveis fósseis e, sendo este o principal vetor da mudança do clima a nível global, é impossível considerar que a 30ª Conferência do Clima foi um sucesso se ela não traz resultados concretos para lidar com a raiz da questão. Além disso, os avanços em relação ao fim do desmatamento e adaptação se demonstraram tímidos, muito aquém do necessário para enfrentar com honestidade a emergência climática que vivenciamos.
Aos países, falta ambição. Os povos indígenas demonstraram na COP30 que temos urgência e coragem em enfrentar quem de fato está colocando em risco a possibilidade de vida digna das próximas gerações. Exigimos ser parte oficial das negociações do clima, antes que seja tarde demais.
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Tese ruralista que impõe que os povos indígenas só teriam direito aos territórios que comprovadamente ocupassem na data de 05 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição Federal do Brasil – desconsiderando décadas de perseguição e genocídio perpetrados contra nossos povos, fazendo com o que muitos de nossos povos fossem forçadamente deslocados de nossos territórios, sobretudo durante à ditadura militar que antecedeu a atual Constituição.
3. Compromisso Intergovernamental de Reconhecimento Territorial da Parceria dos Líderes Florestais e Climáticos (FCLP)
A Parceria dos Líderes Florestais e Climáticos (FCLP) é uma coalizão governamental lançada em 2021, durante a COP26 de Glasgow, que reúne mais de 30 países e a União Europeia. A FCLP foi criada com o objetivo de fomentar compromissos de alto nível desses países em relação a florestas, uso da terra e clima, e em relação aos direitos dos Povos Indígenas e Comunidades Locais.
Durante a COP30, a FCLP anunciou o primeiro Compromisso Intergovernamental de Reconhecimento Territorial, no qual 15 países se comprometeram com uma meta coletiva e global para reconhecer e garantir 160 milhões de hectares de territórios indígenas e de comunidades locais até 2030.
Deste total, 63 milhões de hectares são um compromisso assumido pelo Governo Brasileiro, mais de um terço da meta global, por meio da demarcação, regularização jurídica, proteção territorial e implementação da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental (PNGATI). A meta brasileira inclui 4 milhões de hectares para quilombolas e 59 milhões de hectares para territórios indígena.
A APIB, via Aliança Global de Comunidades Territoriais (GATC), compõe a Plataforma de Povos Indígenas e Comunidades Locais da FCLP (lançada na COP28, em Dubai) e, via Plataforma, incidimos desde 2024, para que o Compromisso Intergovernamental de Reconhecimento Territorial se tornasse uma realidade na COP30.
4. Anúncio Oficial do Programa de Proteção de Terras Indígenas (PPTI)
O Programa de Proteção de Terras Indígenas (PPTI) foi anunciado oficialmente na COP30 como um dos principais legados para o pós-Conferência, concebido para acelerar a demarcação, fortalecer a gestão territorial e consolidar a autonomia das organizações indígenas e de seus mecanismos financeiros.
O PPTI nasce com abrangência nacional e gestão tripartite — movimento indígena, Governo Brasileiro e cooperação internacional — estruturado em três eixos centrais: demarcação de terras indígenas, gestão territorial e ambiental, e fortalecimento institucional das organizações e mecanismos financeiros indígenas. Sua missão é alinhar instituições, organizar fluxos de recursos e orientar investimentos públicos, internacionais e filantrópicos — incluindo os anunciados na COP30 — para garantir que a proteção territorial avance com coerência, eficiência e protagonismo indígena.
A proposta retoma e atualiza referências bem-sucedidas dos anos 1990, especialmente a experiência do PPG7 e seus subprogramas, como o PDPI e o PPTAL — este último responsável pela demarcação de cerca de 90 Terras Indígenas e mais de 60 milhões de hectares na Amazônia Legal. Essa trajetória demonstra que mecanismos robustos, construídos com participação direta dos povos indígenas, são capazes de produzir resultados estruturantes e duradouros.
Inspirada nesse legado, a APIB conduziu ao longo de 2025 um processo participativo de construção do PPTI, em parceria com o MPI, Funai e organizações regionais de base. O resultado é um programa pensado para responder às lacunas históricas do Estado na demarcação e proteção territorial (insuficiência de recursos financeiros e humanos), acelerar processos, fortalecer governanças indígenas e garantir que novos aportes financeiros — como os do TFFF e do FTFG — cheguem aos territórios de forma coordenada, transparente e alinhada às prioridades dos povos indígenas. O PPTI representa, assim, a retomada de uma política estruturante de proteção territorial e um passo estratégico para consolidar a demarcação como política climática no Brasil.
5. Renovação do Compromisso do Grupo de Financiadores sobre Florestas e Posse da Terra (FTFG)
Durante a COP30, o Grupo de Financiadores sobre Florestas e Posse da Terra (FTFG, pela sigla em inglês) anunciou seu segundo compromisso em apoio aos direitos territoriais dos povos indígenas, comunidades locais e comunidades afrodescendentes, por sermos atores centrais na interrupção e reversão do desmatamento, proteção da biodiversidade, e no avanço da resiliência e adaptação climática. Portanto, o FTFG anunciou investimento de US$ 1,8 bilhão entre 2026 a 2030 (a nível global) para promover iniciativas que:
- Reconheçam, garantam, fortaleçam e sustentem nossos direitos territoriais
- Promovam estratégias comunitárias de conservação, restauração e clima
- Fortaleçam instituições locais, incluindo aquelas que representam mulheres e jovens, promovendo sua participação em iniciativas relacionadas ao clima, biodiversidade e direitos
- Apoiem os governos em reformas políticas e planejamento do uso da terra, bem como nas condições institucionais, financeiras e sociais que protejam e aprimorem esse trabalho
- Facilitem mecanismos internacionais e nacionais que promovam nossos direitos
Este anúncio representa uma continuidade do primeiro compromisso financeiro de US$ 1,7 bilhão anunciado pelo FTFG em 2021, durante a COP26 em Glasgow, para o período de 2022 a 2025. O compromisso surgiu como resposta a um fato amplamente reconhecido: à época, menos de 1% da Ajuda Oficial ao Desenvolvimento (AOD) global havia sido direcionada a iniciativas relacionadas a Povos Indígenas e Comunidades Locais, apesar de nosso reconhecido papel essencial na conservação dos biomas, mitigação climática e proteção da biodiversidade (Rainforest Norway, 2021).
Com a conclusão do primeiro compromisso do FTFG em 2025, a APIB, por meio da Aliança Global de Comunidades Territoriais (GATC) e de nossa Plataforma Shandia, incide desde 2024, pelo anúncio deste segundo compromisso que foi concretizado na COP30. A partir de nossa incidência, garantimos que este novo compromisso financeiro não se destine apenas a ecossistemas florestais, mas se destine a todos os biomas, reconhecendo nossa presença em todas as regiões e também a interdependência entre todos os ecossistemas. Também celebramos a inclusão dos povos Afrodescendentes no segundo compromisso do FTFG.
Finalmente, ainda que saudemos os países e organizações filantrópicas que promoveram este segundo anúncio, reiteramos nosso posicionamento de que os aportes financeiros destinados a quem está na linha de frente do enfrentamento aos vetores da crise climática deve ser mais ambicioso. Além disso, tais anúncios devem estipular metas específicas de financiamento direto, que sejam proporcionais às nossas contribuições no combate à crise climática e pela proteção da biodiversidade.
6. O Compromisso dos Povos da Plataforma Shandia: de nós, para nós
A APIB é um dos cinco membros-fundadores da Aliança Global de Comunidades Territoriais (GATC, pela sigla em inglês), uma plataforma política de Povos Indígenas e Comunidades Locais que representa 36 milhões de pessoas que vivem em territórios de 24 países na Ásia, África e América Latina. Juntos, somos defensores de mais de 958 milhões de hectares de terra. Em 2022, criamos nossa Plataforma Shandia para promover o acesso direto das organizações indígenas e de comunidades locais ao financiamento climático.
Durante o Fórum Shandia 2025, realizado durante a COP30, nossa Plataforma Shandia anunciou o primeiro Compromisso dos Povos, um compromisso histórico de financiar US$500 milhões até 2030, a partir dos nossos próprios mecanismos territoriais de financiamento e para os nossos próprios territórios. A destinação desses recursos se dará por parte dos nossos próprios fundos indígenas que integram a Plataforma Shandia. No caso do Brasil, nossos fundos indígenas são: Jaguatá, Podáali, FIRN, Rutî, Maracá, Timbira e Pacará.
Para que os compromissos assumidos nesta COP tenham significado, devemos fazer parte deles — não como beneficiários, mas como parceiros que garantirão que os recursos cheguem realmente aos territórios e comunidades. Nossos mecanismos territoriais já demonstraram que são capazes disso. Desenvolvemos políticas, métricas e indicadores inovadores com base em nosso próprio conceito de financiamento direto. O que resta é que os recursos cheguem até nossos territórios, e o Compromisso dos Povos é nossa resposta e nosso modelo para os demais compromissos financeiros anunciados na COP30.
7. Garantia de 20% de Financiamento Direto no Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF)
A principal proposta do governo brasileiro para a COP30, o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês) foi oficialmente lançado durante a Cúpula do Clima de Belém (6/11), que reuniu os chefes de estado e antecedeu a COP30 na capital do Pará. Ao todo, 53 países assinaram sua Declaração de Lançamento. O objetivo do TFFF é criar um mecanismo financeiro permanente capaz de garantir pagamentos recorrentes aos países e comunidades que mantêm suas florestas em pé, contribuindo assim para a mitigação das mudanças climáticas, a preservação da biodiversidade e o fortalecimento das economias locais sustentáveis.
Até o momento, US$6,6 bilhões foram anunciados para o TFFF, o qual garantiu a alocação de 20% dos pagamentos do TFFF destinados a cada país a serem direcionados diretamente para organizações indígenas e de comunidades locais. A APIB, através da Aliança Global de Comunidades Territoriais (GATC) e sua Plataforma Shandia, decidiu se engajar ativamente no processo de co-desenho do TFFF em fevereiro de 2025, por considerar que a iniciativa é uma oportunidade concreta de transformar a arquitetura do financiamento climático.
Essa transformação requer a inclusão explícita e o compromisso com o financiamento direto para organizações e mecanismos liderados por povos Indígenas e comunidades locais, garantindo que novas iniciativas globais de financiamento sejam construídas com base nos princípios da autodeterminação e do direito à participação significativa.
Além disso, buscamos garantir que todos os recursos mobilizados por meio do TFFF sejam orientados por uma visão que respeite e integre plenamente os conhecimentos, práticas e direitos dos Povos Indígenas, que são fundamentais para a proteção dos ecossistemas tropicais. Ao longo do processo de concepção, a APIB, em conjunto com a GATC, atuou diretamente para a inclusão de duas modalidades específicas de financiamento direto, garantindo que pelo menos 20% dos recursos do TFFF sejam alocados a fundos e mecanismos territoriais liderados por Povos Indígenas e Comunidades Locais.
Através de nossa atuação via o Comitê Gestor Global de Povos Indígenas e Comunidades Locais do TFFF, buscaremos garantir que esse compromisso seja efetivamente implementado por meio de critérios de elegibilidade claros, salvaguardas sociais e ambientais adequadas, e arranjos de governança que respeitem a autodeterminação e a liderança dos Povos Indígenas. Somente assim o TFFF poderá realizar seu potencial transformador e consolidar um novo paradigma para o financiamento climático global.
Também continuaremos a incidir para que os 80% de pagamentos do TFFF destinados aos Estados sejam aplicados em políticas públicas indigenistas e socioambientais, como as políticas de demarcação de terras indígenas e de proteção territorial. Continuaremos vigilantes para que os rendimentos dos investimentos do TFFF não sejam vinculados a economias que historicamente promovem a invasão dos nossos territórios e violação dos nossos direitos.
Finalmente, reiteramos que, ainda que reconheçamos o potencial do TFFF em promover financiamento direto aos verdadeiros protetores dos biomas, iniciativas de cunho exclusivamente financeiro e econômico não devem ser priorizadas como as únicas soluções possíveis para o combate à crise climática. Os Estados precisam urgentemente adotar medidas que priorizem os direitos territoriais dos protetores dos ecossistemas, e fiscalizar e banir incentivos fiscais e subsídios para os setores econômicos responsáveis pelo desmatamento e violação de direitos.
8. Anúncio do Mecanismo Vítuke para Gestão Ambiental e Territorial
Durante a COP30, o Ministério dos Povos Indígenas (MPI), a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e o Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (FUNBIO), anunciaram o novo fundo VÍtuke – mecanismo financeiro inédito feito para impulsionar a Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial Indígena (PNGATI). Até o momento, foram anunciados aportes de aproximadamente R$150 milhões, sendo que o fundo busca mobilizar R$550 milhões.
O mecanismo busca destinar recursos a projetos que promovam a consolidação da gestão territorial e ambiental nos territórios indígenas, considerando seis eixos de atuação: proteção territorial e dos recursos naturais; governança indígena e participação; prevenção e restauração de danos ambientais; uso sustentável dos recursos naturais e iniciativas produtivas; capacitação, formação e intercâmbio de conhecimentos e infraestrutura de gestão.
A APIB participou de oficinas de construção do fundo Vítuke e espera que este mecanismo possa integrar o segundo eixo do Programa de Proteção de Terras Indígenas, o qual está destinado à Gestão Territorial e Ambiental de Territórios Indígenas.
9. A Resposta Somos Nós: Resistência e Solidariedade Global
Durante a COP30, nossa campanha A Resposta Somos Nós se consolidou como uma das principais articulações globais pela justiça climática. Lançada em 2024, a campanha ganhou ainda mais projeção internacional em Belém, sendo vista em marchas, atos da Cúpula dos Povos, plenárias da Aldeia COP, paineis do Círculo dos Povos, eventos paralelos internacionais, e materiais gráficos dentro e fora da Zona Azul. Para conhecer mais sobre a campanha e nossas seis demandas centrais, acesse o site A Resposta Somos Nós.
Nossa campanha promove demandas comuns, unidade e solidariedade global entre todos atores realmente interessados em lutar contra a crise climática, incluindo povos indígenas, povos e comunidades tradicionais, camponeses, quilombolas, pescadores, extrativistas, marisqueiras, trabalhadores da cidade, sindicalistas, população em situação de rua, quebradeiras de coco babaçu, povos de terreiro, mulheres, comunidade LGBTQIAPN+, jovens, afrodescendentes, o povo palestino, pessoas idosas, dos povos da floresta, do campo, das periferias, dos mares, rios, lagos e mangues.
Em relação aos seis eixos centrais de nossa campanha, a APIB avalia que conquistamos avanços significativos na COP30 em relação a “Direitos Territoriais = Ação Climática”, pelo reconhecimento oficial dos territórios indígenas como política de mitigação climática; e em relação a “Financiamento Direto”, devido aos anúncios e compromissos assumidos na COP30, principalmente em relação aos 20% de financiamento direto garantido no mecanismo do TFFF, em relação ao Compromisso dos Povos da Plataforma Shandia e, em certa medida, em relação ao segundo compromisso financeiro de US$1,8 bilhão assumido pelo FTFG.
Porém, não obtivemos progressos consideráveis em relação a “Desmatamento Zero”, “Não aos Fósseis, Não à Mineração”, “Proteção de Defensores” e “Participação com Poder Real”. De todo modo, conseguimos visibilizar nossas pautas nas áreas de negociação e nas ruas, e continuaremos lutando e pressionando os Estados para que nossas vozes sejam ouvidas e nossas mensagens sejam adotadas. Afinal, sabemos que mais do que nunca, a resposta para a crise climática, somos nós.
Nossa visão para o futuro: o que esperamos da COP31
A COP30 marcou um ponto de virada: mostramos ao mundo que os povos indígenas não são apenas participantes do debate climático – somos a linha de frente e a principal fonte de soluções reais. Construímos conquistas históricas em demarcação, proteção territorial e financiamento direto, e transformamos Belém no epicentro global da luta pela justiça climática. Mas sabemos que, para enfrentar a crise climática com a seriedade e urgência necessárias, a COP31 precisa ir muito além.
A transição da COP30 para a COP31 ocorre em um momento crítico: Belém mostrou a força de uma COP em ambiente democrático, onde movimentos sociais e povos indígenas influenciaram decisões e colocaram a demarcação no centro da agenda climática. Mas a realização da COP31 na Turquia, em co-presidência com a Austrália, gera preocupações sobre restrições à participação social, riscos à segurança de defensores e influência do lobby petrolífero nas negociações, indicando uma mudança estrutural nas condições políticas do processo climático. Por isso, seguiremos vigilantes para impedir retrocessos e preservar a força conquistada em Belém.
Nossa expectativa é que a COP31 consolide a mudança de paradigma que iniciamos. O reconhecimento de que territórios indígenas são política climática deve se traduzir em ações concretas: mais demarcações, proteção efetiva e políticas públicas que tratem nossos territórios como pilares centrais de mitigação e adaptação. A COP31 deve cobrar dos Estados metas específicas, cronogramas claros e mecanismos de responsabilização para cumprir os compromissos assumidos – inclusive apresentar resultados de implementação da meta de reconhecimento territorial previsto no âmbito da FCLP.
Esperamos também que a COP31 avance naquilo que a COP30 não teve coragem de enfrentar: a interrupção da exploração de combustíveis fósseis e a adoção de um mapa do caminho para sua eliminação. Não haverá futuro possível enquanto petróleo, gás e carvão continuarem movendo a economia global. Iremos incidir na Primeira Conferência Internacional sobre a Transição Justa para o Fim dos Combustíveis Fósseis, indicada para ocorrer em abril de 2026, e exigimos que a COP31 estabeleça metas vinculantes, salvaguardas socioambientais robustas e a centralidade dos direitos humanos no processo de transição energética.
O financiamento direto precisa deixar de ser promessa e se tornar prática estruturante do sistema climático internacional. A COP31 deve garantir o acesso pleno e desburocratizado a mecanismos financeiros para povos indígenas, comunidades locais e povos tradicionais, fortalecendo nossos próprios fundos, governança e prioridades territoriais. Não aceitamos mais modelos que nos tratem como beneficiários: somos implementadores, gestores e formuladores de soluções.
Também esperamos que a COP31 seja o momento de corrigir lacunas graves: salvaguardas para impedir abusos em projetos de carbono e JREDD+; reconhecimento vinculante do consentimento livre, prévio e informado; proteção efetiva para defensores e defensoras; e mecanismos formais de participação indígena nos processos de decisão da UNFCCC. A maior participação da história registrada na COP30 precisa ser constante nas próximas COPs e ter representação direta nas tomadas de decisões oficiais.
O mundo já compreendeu que não existe futuro climático sem territórios protegidos, e que não existem territórios protegidos sem direitos indígenas respeitados. Seguiremos levando nossa mensagem: não há tempo para omissões, para falsas soluções ou para acordos tímidos. A crise climática exige coragem, e nós já demonstramos a nossa. Agora, os Estados precisam demonstrar a sua. Porque, como afirmamos em Belém e afirmaremos novamente na COP31, a resposta somos nós, todos nós.
Anexo: Menções a Povos Indígenas nos Documentos Oficiais da COP30
A APIB compartilha abaixo as principais menções aos povos indígenas incluídas nos documentos oficiais da COP30.
Programa de Trabalho da ambição e implementação da mitigação
- Reconhece o papel vital dos povos indígenas e das comunidades locais e a necessidade de apoiá-los na gestão e utilização sustentável das florestas, bem como a importância de reconhecer seus direitos à terra e seus conhecimentos tradicionais, inclusive como parte das políticas de mitigação de longo prazo.
Programa de Trabalho de Transição Justa
- Determina a importância de garantir uma participação ampla e significativa envolvendo todas as partes interessadas relevantes, incluindo povos indígenas, para permitir caminhos de transição que sejam justos, eficazes, inclusivos e participativos.
- Determina a importância de caminhos de transição justos que respeitem, promovam e cumpram todos os direitos dos povos indígenas.
- Reconhece a importância dos direitos dos povos indígenas e da obtenção do seu consentimento livre, prévio e informado, em conformidade com a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, e a importância de garantir que todas as vias de transição justa respeitem e promovam os direitos coletivos e individuais internacionalmente reconhecidos dos povos indígenas, incluindo os direitos à autodeterminação, e reconheçam os direitos e proteções dos povos indígenas em isolamento voluntário e contato inicial, em conformidade com os instrumentos e princípios internacionais relevantes em matéria de direitos humanos; que a adaptação e a resiliência climática são parte integrante das transições justas e devem ser inclusivas e empoderar os povos indígenas, as comunidades locais, as mulheres e as pessoas em situações vulneráveis.
- Sublinha que os instrumentos e iniciativas relevantes podem fornecer elementos a ter em conta na conceção e implementação de percursos de transição justa determinados a nível nacional, incluindo as diretrizes da Organização Internacional do Trabalho para uma transição justa para economias e sociedades ambientalmente sustentáveis para todos, o Acelerador Global das Nações Unidas para o Emprego e a Proteção Social para Transições Justas, os Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos e a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, e exorta os parceiros em iniciativas e organizações relevantes fora do processo da UNFCCC a terem em conta as mensagens-chave do programa de trabalho nos seus esforços de implementação.
Declaração de Belém sobre o Combate ao Racismo Ambiental
- Recorda os compromissos assumidos no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima e do Acordo de Paris adotado sob seus auspícios, de respeitar, promover e considerar os direitos humanos, os direitos dos Povos Indígenas, a igualdade de gênero, a equidade intergeracional e as necessidades das pessoas em situação de vulnerabilidade na ação climática.
- Reconhece que o racismo ambiental — frequentemente manifestado por políticas e práticas que resultam em exposição desproporcional de pessoas e comunidades, incluindo afrodescendentes, Povos Indígenas e comunidades locais, a danos ambientais e riscos climáticos — contraria os princípios de igualdade e de não discriminação previstos no direito internacional dos direitos humanos, reconhecendo, ao mesmo tempo, o compromisso e os avanços alcançados pelos Estados na abordagem desse tema.
- Conclama todas as Nações a cooperar na tarefa essencial de combater o racismo ambiental, reconhecendo que o desenvolvimento sustentável somente será alcançado quando forem eliminadas as desigualdades que afetam de forma desproporcional pessoas afrodescendentes, Povos Indígenas, comunidades tradicionais e outros grupos e minorias vulneráveis em todas as regiões do mundo.
- Convida todos os Estados a fortalecer os esforços coletivos voltados à construção de sociedades justas e inclusivas por meio do combate ao racismo ambiental, assegurando plena participação de pessoas afrodescendentes, Povos Indígenas e comunidades locais, e a elevar progressivamente a ambição coletiva, de modo a reduzir as disparidades nos padrões de vida e atender melhor às necessidades da maioria da população mundial.
Mutirão Global: Unindo a humanidade em uma mobilização global contra as mudanças climáticas
- Determina que os países devem, ao tomar ações para enfrentar as mudanças climáticas, respeitar, promover e considerar suas obrigações em relação aos direitos dos povos indígenas, assim como seus direitos territoriais e de conhecimento tradicional.
- Destaca que os países devem considerar o papel e envolvimento ativo dos povos indígenas no apoio às Partes e na contribuição para o progresso coletivo significativo no sentido dos objetivos a longo prazo do Acordo de Paris, bem como na abordagem e resposta às alterações climáticas e no reforço da ambição e da implementação, incluindo os progressos alcançados através de outros processos intergovernamentais relevantes.