27/maio/2025
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil manifesta total solidariedade à Ministra de Estado do Meio Ambiente e Mudança Climática, Marina Silva, que foi alvo de violência política de gênero durante a sessão da Comissão de Infraestrutura do Senado.
Ela foi convidada para a reunião para prestar informações sobre a criação de uma unidade de conservação marinha, porém foi desrespeitada em diversos momentos e teve o direito de fala cortado pelo Senador do PL de Rondônia, Marcos Rogério.
A ministra insistiu na fala, afirmando que não é uma “mulher submissa”, e o senador retrucou: “me respeite, ministra, se ponha no seu lugar”, gerando a reação dos demais presentes. Marina continuou posicionando o trabalho do ministério. “Ao defender o meio ambiente eu estou defendendo os interesses estratégicos do Brasil”, declarou.
Então, o senador Plínio Valério (PSDB-AM), continuou os ataques dizendo que a ministra não merecia respeito. “Olhando para a senhora, estou falando com a ministra, e não com uma mulher”, afirmou. “Eu sou as duas coisas”, retrucou Marina. “A mulher merece respeito, a ministra, não”, concluiu ele. Há dois meses, o mesmo representante da direita disse que gostaria de enforcar Marina. Marina Silva se retirou e, em seguida, a sessão foi encerrada.
O ataque acontece uma semana após a casa aprovar a lei de desmanche do licenciamento ambiental. O chamado PL da Devastação (2159/2021) que tramita agora na Câmara de Deputados. Autoridades classificaram o tratamento direcionado à Ministra como “absurdo” e “misógino”.
Repudiamos os atos desprezíveis e antidemocráticos dentro do Senado. Somamos nossa indignação aos demais representantes dos reais interesses do povo brasileiro.
Os ataques contra a ministra são mais que uma expressão do machismo e racismo enraizados nas instituições brasileiras, eles fazem parte do projeto dominante no poder legislativo, que promove o desmonte das leis e a destruição do meio ambiente em favor do lucro de poucos.
20/maio/2025
O Projeto de Lei nº 2.159/2021, conhecido como “PL da Devastação”, é uma das maiores ameaças aos povos indígenas e ao meio ambiente atualmente em debate no Congresso. O texto pode ser aprovado com rapidez, ainda nesta quarta-feira, nas Comissões e no Plenário do Senado Federal.
Em nota do Observatório do Clima – rede da qual a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) faz parte -, é criticada a permissão para o autolicenciamento e a dispensa de análises técnicas prévias, o que abre caminho para obras de alto impacto sem avaliação adequada dos danos ao meio ambiente, à saúde e aos modos de vida de diversas comunidades.
Isso amplia o risco de contaminação de rios, solos e ar, além de favorecer tragédias como a de Mariana. Mesmo com decisão do STF limitando a Licença por Adesão e Compromisso (LAC) a empreendimentos de baixo risco, o PL propõe aplicá-la também a projetos de médio impacto.
Para nós, povos indígenas, os ataques são ainda mais graves. O projeto restringe a participação de órgãos de proteção aos direitos indígenas ao licenciamento de atividades apenas sobre as terras indígenas já homologadas, gerando insegurança jurídica para inúmeras comunidades indígenas que ocupam tradicionalmente suas terras.
Além de ignorar que o Estado brasileiro deveria ter concluído em 05 anos, após a promulgação da Constituição de 1988, a demarcação de todas nossas terras tradicionais. Assim, se aprovado o PL nº 2159/2021, nós seremos duplamente atacados: pois seremos penalizados diante da omissão do Estado em demarcar nossas terras com a não escuta do órgão indigenista federal, que deveria resguardar nossos direitos, no processo de licenciamento ambiental.
A proposta também esvazia o papel da Funai e de outros órgãos técnicos, tornando seus pareceres apenas consultivos. Na prática, isso permite que decisões sobre os territórios indígenas sejam tomadas sem considerar a opinião técnica do órgão indigenista federal.
Por fim, reafirmamos com firmeza: Nada sobre nós sem nós!
O PL da Devastação ignora completamente nosso Direito à Consulta Livre, Prévia e Informada, assegurado pela Convenção 169 da OIT, tratado internacional do qual o Brasil é signatário. Esse direito é essencial para garantir a participação efetiva das comunidades nas decisões que afetam seus territórios, modos de vida e culturas.
Ao flexibilizar o licenciamento ambiental, reduzir a exigência de estudos e omitir a obrigatoriedade da consulta, o PL da Devastação viola compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro, desrespeita acordos históricos e fragiliza ainda mais a proteção dos direitos coletivos. Ao abrir caminho para retrocessos irreparáveis, tenta silenciar as vozes de quem sempre esteve na linha de frente da defesa dos territórios e da vida.
Sem consulta, não há legitimidade!
Saiba mais e ajude a pressionar o Congresso: https://www.pldadevastacao.org/
15/maio/2025
Às autoridades públicas e à sociedade brasileira
Nós, povos indígenas Wapichana, Macuxi, Taurepang, Ingarikó, Sapará, Wai Wai, Yanomami, Yekuana e Patamona, oriundos das regiões da Serra da Lua, Murupu, Wai Wai, Alto Cauamé, Tabaio, Amajari, Serras, Surumu, Yanomami, Baixo Cotingo e Raposa, do estado de Roraima, reunidos no V Acampamento Terra Livre, realizado de 5 a 9 de maio no Centro Ovelário Tames Macuxi, em Boa Vista (RR), viemos manifestar nossa insatisfação, denunciar injustiças e reivindicar, diante do Estado brasileiro, a defesa da vida e dos nossos territórios.
1. Somos povos originários
Somos mais de 100 mil indígenas vivendo em Roraima, conforme o Censo de 2022. Já fomos milhões, mas fomos dizimados por políticas historicamente adotadas pelo Estado brasileiro. A capital Boa Vista foi uma comunidade indígena e está situada em terras ancestrais. Protegemos 46% do território de Roraima, onde estão localizadas fontes de água, rios, florestas, lavrados e demais recursos naturais essenciais ao bem-estar de toda a população. No entanto, nossas terras continuam ameaçadas por invasores, especialmente garimpeiros, monoculturas de soja ao redor das comunidades e leis favorecem a redução dos nossos territórios.
2. Em defesa da Terra Indígena São Marcos
Manifestamos apoio aos nossos parentes da TI São Marcos, que correm o risco de perder parte de sua terra tradicional para a sede do município de Pacaraima – instalada ilegalmente após a demarcação. As lideranças estão sendo induzidas a participar de uma “mesa de conciliação” que, mais uma vez, viola os direitos originários garantidos pela Constituição Federal. Rejeitamos essa proposta de conciliação e a tentativa de redução territorial. Exigimos que o Ministério Público Federal atue na defesa dos direitos constitucionais dos povos indígenas.
3. Contra o Marco Temporal e a Lei 14.701/2023
A Lei 14.701/2023 representa uma grave violação dos direitos indígenas. Desde sua promulgação, observamos o aumento da violência, invasão das terras indígenas e o bloqueio de novos processos de demarcação. Soma-se a isso a “mesa de conciliação” criada em 2024 pelo ministro Gilmar Mendes (STF), que já foi prorrogada três vezes e deve seguir até junho de 2025. A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) n° 48/2023, de autoria do senador Hiran Gonçalves (PP/RR), representa mais um retrocesso. Ao tentar constitucionalizar o marco temporal, busca restringir nossos direitos às terras ocupadas até 5 de outubro de 1988. Isso é inconstitucional e contraria decisão já tomada pelo STF, que reconheceu nossos direitos como originários e cláusulas pétreas, ou seja, não passíveis de alteração, nem mesmo por emenda constitucional.
4. Empreendimentos e ameaças aos territórios
Foi criado recentemente, no Senado, um Grupo de Trabalho (GT) para discutir a regulamentação da mineração em terras indígenas, mais uma grave ameaça aos nossos territórios. Como se não bastassem a Lei do Marco Temporal e outras propostas que atacam nossos direitos, parlamentares continuam incentivando a invasão das nossas terras, movidos por interesses econômicos e busca por lucro. Soma- se a isso os projetos de exploração de petróleo na Bacia do Tacutu e a construção das hidrelétricas Bem Querer e Tamanduá, no rio Cotingo, que causarão impactos ambientais e sociais devastadores. Somos contra esses empreendimentos, que só beneficiam grandes empresários, enquanto milhares de indígenas e comunidades serão diretamente afetados e prejudicados.
5. Demarcação e sustentabilidade
A demarcação é um direito constitucional e dever do Estado. Reivindicamos o andamento dos processos de demarcação das terras indígenas Arapuá, Anzol, Pirititi e Lago da Praia, bem como o reconhecimento dos direitos territoriais das comunidades Manoa/Pium, Truaru, Pium e Anaro, cujos processos tramitam na Justiça Federal. Somos produtores de alimentos, embora muitas vezes não reconhecidos pelo Estado. Por exemplo somos maiores produtores de gado, cultivamos centenas de culturas para nossa alimentação e comercialização. Exigimos o financiamento adequado dos nossos Planos de Gestão Territorial e Ambiental (PGTA), com recursos suficientes para sua execução.
6. Políticas públicas
Nosso movimento avalia que as políticas públicas seguem apresentando problemas históricos, especialmente nas áreas de educação e saúde. Na educação, há falta de investimento em construção e reforma de escolas, além do transporte escolar precário. Denunciamos também as ameaças do governo contra professores indígenas que participam do nosso movimento. Na saúde, a falta de coordenação no Distrito Leste há mais de três meses prejudica a gestão e o atendimento. Reiteramos nosso pedido ao governo para a nomeação URGENTE das lideranças indicadas pelo movimento indígena para a coordenação do Distrito Sanitário Especial Indígena Leste de Roraima, a fim de garantir uma gestão legítima, representativa e comprometida com as necessidades de nossas comunidades.
7. Participação na COP 30
Neste ano, será realizada a COP 30 no Brasil, e nós estaremos presentes para levar nossas reivindicações e denunciar as violações dos nossos direitos. Repudiamos qualquer tentativa do Estado brasileiro de instrumentalizar nossa presença no evento como forma de legitimar um suposto respeito aos nossos direitos. Não aceitaremos ser usados como vitrine. Queremos falar por nós mesmos, sem intermediários. Queremos dizer ao mundo o que enfrentamos em nossos territórios e mostrar às autoridades internacionais que nossas terras são essenciais para o enfrentamento da crise climática global.
8. Nosso direito de existir
Durante os cinco dias de mobilização, reunimos mais de 2 mil pessoas das comunidades. O Acampamento Terra Livre é um movimento pacífico em defesa dos nossos direitos e do direito à vida. Estiveram presentes jovens, crianças, mulheres, homens, anciãos, professores, agentes de saúde, estudantes, coordenadores e lideranças. Fomos obrigados a deixar nossas casas para lutar pela continuidade da nossa existência e para denunciar ao mundo as violências que estamos sofrendo em nossos territórios, em razão da Lei do Marco Temporal e dos empreendimentos que ameaçam nossas vidas. Permaneceremos vigilantes. Não recuaremos. E não negociaremos um só centímetro das nossas terras.
Centro Ovelário Tames, Boa Vista, RR, 09 de maio de 2025.
Atenciosamente,
Movimento Indígena de Roraima
28/abr/2025
A Apib repudia a Conafer e sua atuação corrupta dentro dos territórios indígenas. A Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares do Brasil, organização vinculada ao agro, lucrou bilhões desviando ilegalmente os benefícios de aposentados e pensionistas, em grande parte de povos indígenas, conforme foi veiculado em distintos meios de comunicação, após a “Operação Sem Desconto” deflagrada pela Polícia Federal e pela Controladoria-Geral da União, em abril.
Através de convênios que deveriam fornecer serviços como assistência jurídica e odontológica, a confederação descontava valores diretamente do INSS, muitas vezes sem autorização. O esquema gerou R$6,3 bilhões em descontos sobre 6 milhões de pessoas.
Manifestamos apoio às investigações da Polícia Federal e esperamos que a Conafer responda por seus atos, sendo investigada, julgada e punida no rigor da lei. Não compactuamos com esse tipo de atitude, que viola os direitos dos cidadãos, especialmente dos povos indígenas. E não incentivamos nenhum parente a apoiar nenhuma entidade que se usa de fraude para arrancar o dinheiro dos mais necessitados.
A Apib orienta aos povos indígenas que não gravem vídeos, não manifestem apoio à entidade e evitem vincular sua imagem a qualquer símbolo ligado à Conafer. Nós não compactuamos com a postura criminosa e oportunista de mais esta entidade do Agro e temos suspeitas de existem outros crimes mais graves escondidos sob a fachada de organização sem “ideologias políticas”.
O presidente da Conafer, Carlos Roberto Ferreira Lopes, é um empresário mineiro da área de melhoramento genético de gado, possui uma holding nos EUA (Concepto Vet e da holding Farmlands) e gosta de aparecer usando cocar, dizendo ser descendente de indígenas. Seu filho tem uma empresa de mineração no norte de Minas Gerais (Lagoa Alta).
A Conafer foi fundada em 2011 afirmando representar agricultores familiares sem vínculos “político-ideológicos”, o que sabemos ser um discurso amplamente utilizado pela direita quando quer iludir cidadãos brasileiros.
Para entrar nos territórios eles oferecem caminhonete locada e salário às lideranças, patrocinam assembleias, torneios de futebol, entregam cestas básicas, e promovem mutirões previdenciários, através dos quais fazem os desvios financeiros.
A organização se aproveitou da crise causada pela reforma trabalhista, promovida durante o governo golpista de Michel Temer, em 2016. E aprofundou sua atuação durante o governo fascista de Bolsonaro, após uma normativa de 2022. A atuação dentro das comunidades indígenas se intensificou a partir de 2018.
Conhecendo as reais intenções da entidade, temos a certeza de que os povos indígenas do Brasil não permitirão mais a entrada da Conafer em seus territórios.
Brasília – DF, 28 de abril de 2025.
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB
24/abr/2025
Nota de Apoio ao Deputado Federal Glauber Braga
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) manifesta total solidariedade ao deputado federal Glauber Braga (PSOL/RJ), que teve aprovado pedido de cassação de seu mandato aprovada de forma arbitrária e injusta pelo Conselho de Ética da Câmara dos Deputados no dia 09 de abril de 2025.
Trata-se de um parlamentar do campo progressista que, ao longo de seu mandato, demonstrou firme compromisso com a luta dos povos indígenas, sendo presença constante em reuniões, mobilizações, marchas e sucessivas edições do Acampamento Terra Livre (ATL). Mais do que isso, ofereceu seu mandato como instrumento coletivo de resistência, apoiando pautas fundamentais para a defesa dos direitos indígenas e da democracia.
O processo conduzido contra o parlamentar é temeroso e evidencia a seletividade política que paira sobre o Conselho de Ética. Enquanto inúmeros casos de flagrante quebra de decoro permanecem engavetados ou sequer são apreciados, o caso em questão foi levado adiante com celeridade suspeita e ausência de critérios justos. A decisão adotada, além de sinalizar uma tentativa de silenciar vozes dissidentes, inaugura um perigoso precedente: a possibilidade de perseguição institucional contra mandatos populares e, em especial, indígenas.
Não aceitaremos retrocessos. O processo de cassação de Glauber é mais do que um ataque individual — é uma afronta à própria democracia e aos direitos conquistados também com suor e luta dos povos indígenas. A APIB reafirma que não permitirá que este golpe se consolide. Resistiremos com a força de nossos ancestrais, nas ruas, nas redes e em todos os espaços de disputa. Nenhum passo atrás.
Demarcação já!
Glauber fica!
24/abr/2025
Brasília, 23 de abril de 2025
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) , a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), a Articulação das Organizações e Povos Indígenas do Amazonas (APIAM), a Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN) e o Conselho Indígena de Roraima (CIR) vêm a público expressar seu total repúdio aos ataques racistas, machistas e coloniais dirigidos à Deputada Federal Célia Xakriabá (PSOL-MG), na última terça-feira (22/04/25), na Comissão da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais da Câmara dos Deputados (CPOVOS).
O deputado Coronel Chrisóstomo (PL-AM) autodeclarado Tukano, ao lado da deputada Silvia Nobre (PL-AP), que ainda usa indevidamente o nome do povo Waiãpi e aqui não reprisaremos tal absurdo, buscaram hierarquizar identidades, negar pertencimentos e disputar narrativas para servir a um projeto político que tenta criminalizar a luta indígena e legitimar o genocídio dos nossos povos.
Disse o deputado Chrisóstomo, dentre outros absurdos: “A outra colega, que se diz in… de comunidade indígena… parece que os indígenas de Minas Gerais não são os mesmos da Amazônia, parece que não são indígenas… acho que de indígena aqui só eu e você, Silvia… em Minas Gerais é meia dúzia de índios só.”
Esse tipo de violência política não é apenas inaceitável — é criminosa. É racista!
Não é a primeira vez que tentam apagar nossas identidades. Não é a primeira vez que o Congresso Nacional se transforma em trincheira contra os corpos e as vozes indígenas que ousam ocupar o poder. Mas que fique claro: não aceitaremos mais nenhum ataque em silêncio.
A deputada Célia Xakriabá é uma das maiores referências vivas da resistência indígena no Brasil. Nascida no Cerrado, é defensora de todos os biomas do Brasil, sua voz ecoa os saberes de muitas avós e muitos anciãos, sua presença no parlamento é fruto da força de gerações que tombaram na luta. Quando atacam Célia, atacam a nós, povos indígenas do Brasil. Atacam nossas mulheres, nossos territórios, nossos modos de existir.
Por isso, convocamos com urgência todas as lideranças, organizações indígenas e indigenistas da Amazônia e de todo Brasil: levantem suas vozes, seus maracás, suas redes de resistência!
Não podemos mais permitir que parlamentares como Coronel Chrisóstomo e Silvia Nobre, que se autodeclaram indígenas e usam desse fato para apoiar projetos anti-indígenas, sigam agindo impunemente. Seus votos, seus discursos e suas alianças são contra a vida dos povos indígenas, contra a floresta em pé, contra o futuro.
O tempo da submissão acabou.
O tempo do medo acabou.
É tempo de ocupar, denunciar e reagir.
Não vamos recuar diante da violência institucional. Seguiremos com nossos cocares, com nossos corpos-território, com nossas palavras ancestrais. E se eles acham que podem nos dividir, verão que nossa unidade é feita de raízes profundas.
Toda solidariedade à Deputada Célia Xakriabá.
Toda força aos povos indígenas em luta. Todo repúdio aos que tentam nos calar.
A NOSSA RESISTÊNCIA É MAIOR QUE O CONGRESSO.
ELA É DO TAMANHO DO NOSSO TERRITÓRIO.
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB
Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB
Articulação das Organizações e Povos Indígenas do Amazonas – APIAM
Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro – FOIRN
Conselho Indígena de Roraima – CIR
10/abr/2025
O Ministério Público Federal publicou uma nota técnica fundamentando a urgência das emissões das portarias declaratórias das Terras Indígenas Tupinambá de Olivença, Tupinambá de Belmonte e Barra Velha de Monte Pascoal, na tarde desta terça-feira, 08/04. O documento é assinado por sete procuradores gerais da república, do MPF/BA e do Grupo de Trabalho sobre Demarcação da 6.ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, responsável pela temática de Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais.
A nota destaca os fundamentos para a demarcação das TIs. Além disso, eles também orientam a aplicação efetiva das políticas públicas do Governo Federal para a proteção das áreas (com manutenção de forças de segurança especializadas na região) e para reparação dos danos socioambientais causados pela morosidade nas demarcações, o que potencializou os conflitos territoriais na região do extremo sul da Bahia.
As três TIs já tiveram todas as etapas técnicas concluídas, com os Relatórios Circunstanciados de Identificação e Delimitação (RCIDs) publicados no Diário Oficial da União há mais de uma década.
Nos três estudos, os documentos técnicos dos processos administrativos da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI) apontam para o aumento gradual do “esbulho imposto ao território”, especialmente nos anos 50 e 60 na TI Tupinambá de Olivença. A “dispersão de núcleos familiares extensos” em Barra Velha. E “expropriações violentas”, no caso Tupinambá de Belmonte. No entanto, os povos mantiveram a posse constante dos seus territórios, mesmo diante da pressão colonizadora e dos interesses econômicos na região.
Por esse motivo, os processos não se enquadram na tese do marco temporal, nem poderiam ter as demarcações impedidas pela Lei 14.701/2023, como justificou o Ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski.
O documento também ressalta a inconstitucionalidade da tese. “A respeito, é válido enfatizar que o novo diploma legal: a) é inconstitucional ao afrontar a Constituição da República de 1988 e a própria decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que reconheceu a inconstitucionalidade do marco temporal e fixou teses de repercussão geral; b) nasceu com presunção juris tantum de inconstitucionalidade por ter sido posterior ao julgamento do tema 1031 (RE 1017365) pela Corte Suprema”, afirma.
Em relação aos processos administrativos, estão relacionadas as Portarias Declaratórias das Terras Indígenas, que deveriam ter recebido as assinaturas dos Ministros(as) de Estado, o que simplesmente não ocorreu. “Terra Indígena Tupinambá de Olivença: 03 minutas, sendo uma de 21/09/2016; outra de junho de 2018 e a última de meados de 2023; Terra indígena Tupinambá de Belmonte: 01 minuta, de 18/05/2023; e Terra Indígena Barra Velha do Monte Pascoal: 02 minutas, de 2013 e de março de 2023. Ou seja, 3 Terras Indígenas e 6 Minutas de Portarias Declaratórias”.
Assim como o Ministério dos Povos Indígenas remeteu todos os casos ao MJSP em setembro de 2023, ou seja, antes da entrada em vigor da Lei 14.701/2023.
Portanto, os povos Tupinambá e Pataxó, não podem ter seu direito originário negado, uma vez que, a despeito da tramitação da lei inconstitucional faltava apenas a assinatura do Ministro(a) de Estado para a conclusão das demarcações.
A morosidade do MJSP afronta à própria justiça, visto que há decisões judiciais específicas determinando a finalização dos processos demarcatórios tanto da Terra Indígena Tupinambá de Belmonte quanto da Terra Indígena Barra Velha do Monte Pascoal. Ao mesmo tempo que não há nenhuma decisão judicial específica proibindo a emissão da Portaria Declaratória da Terra Indígena Tupinambá de Olivença.
O impasse tomou dimensão internacional. A Organização das Nações Unidas (ONU) emitiu 354 recomendações sobre os direitos dos Povos Indígenas direcionadas ao Estado brasileiro. Entre elas, “concluir os processos pendentes de demarcação de terras, rejeitar a tese do ‘marco temporal’ e garantir que os Povos Indígenas sejam protegidos de ameaças, ataques e despejos forçados”. Bem como as Nações Unidas recomendaram por quatro vezes a rejeição e interrupção do emprego institucional da tese.
Ainda de acordo com a nota, “não é razoável, tampouco constitucional, que os Povos Indígenas sejam prejudicados, por mais de década, em razão da inércia do Poder Executivo”.
Por todas estas razões, o parecer conclui que “é absolutamente urgente e essencial” a assinatura das portarias, ainda mais “em se tratando de ano da COP30 (Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025), a ser realizada no Brasil”.
Leia a nota completa aqui.
09/abr/2025
Em homenagem aos 20 anos da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, a embaixada da Noruega e a Apib, realizaram um jantar, na noite desta terça-feira, 08/04. A embaixada foi a primeira parceria institucional na articulação do movimento nacional indígena.
Além da coordenação executiva da Apib e regionais, participaram a ministra dos povos indígenas, Sonia Guajajara, a deputada Célia Xakriabá, o embaixador Odd Magne Ruud e Marianne Karlsen, negociadora chefe da Noruega para a COP30.
O coordenador executivo da Apib, Alberto Terena, apresentou nossas expectativas para os próximos anos. “Esperamos que os demais países sigam este exemplo de confiança na capacidade das organizações indígenas como protagonistas na proteção de seus povos e na defesa dos nossos territórios e biomas, sendo atores centrais no debate contra as mudanças climáticas”.
Marianne Karlsen, reforçou o compromisso com os povos indígenas afirmando a construção, na COP 30, de um espaço que realmente importe para o clima e para as pessoas, concebendo uma plataforma necessária para a vida e para o combate ao aquecimento global.
Já a ministra Sonia Guajajara, afirmou que seu papel é “trazer todas as vozes coletivas dos povos indígenas do Brasil” e alertou que estamos prestes a realizar a COP do Brasil, mas ainda “não estamos conseguindo acordos suficientes para evitar o aumento da temperatura global. A gente continua dizendo que nós temos a solução, apresentamos a demarcação de terras indígenas como uma das soluções, a melhor solução para isso”, garantiu.
04/abr/2025
“Krenak não era um povo, mas uma cadeia. Até hoje o povo Krenak tem seu nome vinculado a um aspecto negativo, embora seja um nome sagrado (kren: cabeça; nak: terra)”, lembra Douglas Krenak. O depoimento consta no processo do Ministério Público Federal contra o Estado, aberto em 2015. Há anos o povo indígena Krenak cobra justiça pelas violações de direitos, torturas, trabalho forçado e maus tratos da ditadura, entre 1957 e 1980. O julgamento finalmente foi marcado para a próxima semana, dia 8 de abril de 2025.
O processo relata que os governos militares se caracterizaram pelo desrespeito às instituições indígenas, pela sistemática expulsão dos indígenas de suas terras, e pela vulnerabilização, destruição biológica e cultural de comunidades.
Uma das ferramentas do etnocídio e genocídio criadas pela ditadura foi o Reformatório Agrícola Indígena Krenak, mais conhecido como Presídio Krenak, para onde eram sequestrados indígenas de vários povos. “Ninguém podia falar a língua indígena; só podia falar a língua “do branco”; se falasse língua indígena, apanhava e ficava preso. […] Não podia beber, não podia ir em festa”, relembra Dejanira Krenak. O presídio dentro do território transformou a vida de todo o povo Krenak, que passava os dias em constante vigilância, sendo submetidos a torturas de acordo com a vontade dos militares.
O Presídio Krenak foi criado em 1969, dentro da Terra Indígena Krenak, na área do Posto Indígena Guido Marlière, na margem esquerda do Rio Doce, entre os municípios de Resplendor e Conselheiro Pena, no estado de Minas Gerais. Povos de todo o país foram aprisionados. Porém, no dia 15 de dezembro de 1972, todos os Krenak e todos os confinados no presídio foram forçados a se deslocarem para a Fazenda Guarani, no município de Carmésia (MG), outro centro de detenção arbitrária. O episódio é chamado pelo povo de Exílio.
As terras do povo Krenak foram demarcadas em 1920, pelo Estado de Minas Gerais. Com o tempo, fazendeiros foram cercando a terras indígena, tanto por meio de arrendamentos incentivados pelo SPI (Serviço de Proteção aos Índios), como por meio de invasões. O aumento de não-indígenas foi acompanhado por conflitos com os fazendeiros que pressionavam pela retirada do povo de sua própria terra.
Os Krenak ganharam na justiça, através da Funai, o direito de reintegração de posse na área do PIGM contra os posseiros da região, em 1970. Contudo, os fazendeiros invasores se mobilizaram e enviaram até telegramas ao presidente Médici. O governo militar atendeu prontamente aos pedidos dos invasores. O povo Krenak foi conduzido para a Fazenda Guarani, que havia sido doada pela PM de Minas à Funai, com o objetivo de que a Fundação repassasse a área do Posto Indígena no município de Resplendor para o governo estadual para que esse, por sua vez, as doasse para os fazendeiros.
No município de Carmésia, o povo Krenak foi obrigado a conviver com etnias rivais, poucas terras férteis, clima frio a que não estavam habituados, a falta do cipó, que era matéria prima para a artesanato, e a ausência do Rio Doce, que era o centro de suas atividades culturais. Eles passaram fome, sobrevivendo à custa de banana verde cozida ou assada com angu e farinha.
Oito anos após a remoção, os Krenak decidiram fugir da Fazenda e começaram a retornar às suas terras, a despeito do grande temor de serem recebido com violência pelos fazendeiros e pelos agentes do Estado.
Assim, cerca de 25 indígenas Krenak retomaram suas terras, mas encontraram um intenso processo de devastação, impossibilitando a caça e a coleta, as terras tomadas por fazendeiros com títulos emitidos pelo governo de Minas Gerais. Eles ficaram reclusos a uma pequena faixa na beira do Rio Doce.
Somente em 10 de março de 1983 a Funai ajuizou uma ação sobrea nulidade dos títulos dos imóveis locais. Em 1993, o STF julgou procedente a ação, declarando nulos os documentos dos fazendeiros. Estes, por sua vez, defenderam a posse afirmando que a “etnia” Krenak estava praticamente extinta.
Vinte cinco anos após o Exílio, em 1997, os Krenak conseguiram retomar uma pequena parte de seu território e, em 2001, por meio de Decreto de 19 de abril, foi homologada a demarcação da Terra Indígena do Povo Krenak.
Finalmente, a Comissão Nacional da Verdade, reconheceu a ocorrência da sistemática e brutal violação de direitos pelo regime militar. Agora, a ação do MPF procura o reconhecimento pelo Estado Brasileiro, através de um pedido público de desculpas e a reparação econômica coletiva, por tal desagregação social e cultural que colocou em risco a própria existência dos Krenak enquanto povo.
*Com informações do processo do Ministério Público Federal
02/abr/2025
O Ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, determinou, no dia 11/03, que os povos indígenas afetados pela Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, tenham participação nos lucros da usina.
Os lucros não serão repassados diretamente, mas chegarão às comunidades através de políticas públicas como: o incremento especial do Bolsa-Família no território afetado; projetos de produção sustentáveis que gerem benefícios diretos para a coletividade; melhoria da infraestrutura educacional e sanitária nos territórios indígenas; segurança dos territórios, e projetos de reflorestamento em terras indígenas. E uma parte dos recursos, de valor não definido, será destinada a um Fundo Nacional para demarcações.
Os povos das terras indígenas Paquiçamba, Arara da Volta Grande do Xingu e Trincheira Bacajá denunciam a diminuição da vazão do Rio Xingú; o prejuízo à pesca e à navegabilidade; diminuição da caça; a mortandade de peixes; a poluição e a impossibilidade de consumo da água.
Porém, a decisão surpreendeu o movimento indígena, ao exigir que o Congresso Nacional regulamente os artigos da Constituição Federal sobre a realização de empreendimentos hidrelétricos e minerais em terras indígenas no prazo de vinte e quatro meses.
O departamento jurídico da Apib avalia que a determinação do Ministro, embora aparente ser um benefício para os povos indígenas, não garante que os recursos financeiros dos empreendimentos, como é o caso de Belo Monte, cheguem direto até as comunidades, associações ou organizações indígenas. Ou seja, sua aplicação ficará à mercê de cada governo eleito.
A decisão é preocupante porque se amplia a novos empreendimentos e abre precedentes para o lobby de mineradoras e hidrelétricas. Ela inicia um debate sem propor que o tema seja amplamente discutido e consultado às comunidades, desconsiderando o entendimento próprio dos povos sobre o recebimento de compensação financeira oriunda da destruição/exploração dos seus territórios.
O ministro determina que o Congresso Nacional, hoje dominado pelo agrobanditismo, regulamente os artigos da Constituição Federal no tema da pesquisa e lavra de recursos minerais, recursos hídricos e potenciais energéticos. Não há ressalvas em relação aos territórios de povos indígenas isolados e de recente contato, o que os coloca seriamente em risco.
Essa determinação fragiliza a concepção de usufruto exclusivo, sem considerar qual será o impacto sobre tal instituto, com a ordem para permitir pesquisa de lavra mineral, bem como dos recursos hídricos, em terras indígenas. Esse apontamento mantém a discussão sobre “relevante interesse da União” nas mãos do Ministro Gilmar Mendes na ADO 86, o qual é amplamente desfavorável aos direitos constitucionais dos povos indígenas.
Assim, Dino parece ignorar os entendimentos sobre memória, verdade e reparação, tendo em vista que a construção de hidrelétricas ocorreu, principalmente, durante a ditadura cívico-militar brasileira, de forma a ser necessária, também, a discussão sobre indenização e não somente sobre recebimento de royalties (o que, inclusive, é o que determina a Convenção 169 da OIT).
A decisão aparenta ser benéfica, mas estamos diante da possibilidade de fragilização de diversos direitos fundamentais dos povos indígenas a partir da maior oferta de exploração econômica dos territórios, como a vida e segurança pública (aumento da violência, incremento do garimpo ilegal), saúde (contaminação de rios e perda da caça), usufruto exclusivo do território (pelos impactos gerais e o trânsito de não indígenas no território), dentre diversos outros salvaguardados na Constituição Federal.
A Apib segue comprometida com a mobilização contínua frente a tantas tentativas de fragilizar nossos direitos fundamentais previstos na constituição. Compreendemos que somente a atuação jurídica é insuficiente para barrar o lobby predatório e destrutivo de mineradoras com interesses nos territórios tradicionais.