A União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja) e a Associação dos Kanamari do Vale do Javari (Akavaja) vêm a público externar sua extrema preocupação com a chegada do coronavírus na aldeia Jarinal, no extremo leste da nossa terra indígena. O primeiro caso de contaminação foi confirmado pela Sesai e expõe o quão despreparado está o Governo para lidar com essa pandemia em nosso território.
A aldeia Jarinal, onde vivem os Kanamari e os Tson wük Dyapah, este povo de recente contato, está localizado no alto curso do rio Jutaí, lugar de grande concentração de diferentes grupos de índios isolados. Também é nessa mesma região que nós estamos denunciando a 5 meses a volta de balsas garimpeiras ilegais na área de ocupação dos índios isolados Korubo e Warikama Dyapah. Diante da negligência do Governo Federal para a situação levamos as provas de nossa denúncia à imprensa1 e, mesmo assim, nada foi feito até agora.
Devemos ressaltar que existe uma ação judicial, de grande repercussão, que aborda a região leste da Terra Indígena (TI) Vale do Javari, exatamente na bacia do rio Jutaí. É a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 709 movida pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e partidos políticos no Supremo Tribunal Federal – STF. No início do último mês de agosto, por unanimidade, o Plenário do STF referendou a liminar do Ministro Luís Roberto Barroso que determinava que o Governo Federal adote providências urgentes para evitar o contágio pelo novo coronavírus entre indígenas no país. Dois dos pedidos da ação da APIB, acatados pelo STF, dizem respeito exclusivamente a proteção dos povos indígenas isolados e de recente contato. São eles: a criação de barreiras sanitárias nas terras indígenas com a presenças desses povos e a criação da Sala de Situação para deliberações das estratégias e ações para proteção dos índios isolados e dos de recente contato.
A Univaja subsidiou a APIB com relevantes informações sobre a importância e urgência da barreira sanitária a serem executadas em nosso território, inclusive com especial atenção a retirada do garimpo ilegal das proximidades do Jarinal e dos índios isolados no rio Jutaí. O excelentíssimo Ministro Luís Roberto Barroso determinou a inclusão da TI Vale do Javari na lista de Terras Indígenas “prioridade 1” para implementação das barreiras sanitárias. O prazo de implementação pela União era dia 30/09/2020 e até agora nem sinal de barreira sanitária e de acampamento de quarentena para os Kanamari no rio Jutaí e em outras localidades importantes do Vale do Javari.
Não aceitaremos o discurso de alguns agentes governamentais locais tentando justificar “onde não é mais necessário instalar barreiras sanitárias”, insistindo em descumprir a decisão do STF. Também não aceitaremos que tente se culpar o povo Kanamari por essa contaminação, como a própria Sesai fez na chegada do coronavírus no Vale do Javari em junho/2020. Alertamos diversas vezes às autoridades que o desabastecimento dessa aldeia de materiais de caça, pesca e alguns gêneros alimentícios, levariam os Kanamari de lá até a cidade mais próxima, no caso, Eirunepé- AM. Sem a devida assistência e preparo para tal situação previsível, foi aberta mais uma porta de contaminação. Estamos mantendo contato pela radiofonia com os Kanamari no Jarinal para ter mais informações sobre como se deu a contaminação.
A situação exige uma atuação rápida e organizada para conter o surto e isolar os doentes para tratamento. Também é urgente que o STF não permita que o Governo protele ainda mais a execução da decisão proferida por seu Plenário na ADPF 709. Enquanto se dialoga no papel, o coronavírus vai fazendo mais vítimas em nosso território.
Atalaia do Norte – AM, 21 de agosto de 2020.
As Coordenações da UNIVAJA e da AKAVAJA