Foto: (Valter Campanato / Agência Brasil.)
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) apresentou informações ao Supremo Tribunal Federal (STF) a respeito de três medidas cautelares concedidas pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), no contexto da pandemia de Covid-19, em favor dos povos indígenas Yanomami, Ye’kwana, Munduruku, Guajajara e Awá e ,também, sobre a recente escalada de conflitos na Terra Indígena (TI) Yanomami em razão da invasão garimpeira nesta terra.
A manifestação se deu no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n. 709, na qual o STF determinou ao governo federal, em 2020, a adoção de medidas para conter o avanço da pandemia nos territórios indígenas. Ocorre que a ADPF 709 vem se estendendo por ineficiência e falta de vontade política do Governo Federal em garantir a devida proteção dos povos originários durante a crise sanitária.
Os proponentes dessa ação, dentre os quais figuram a APIB e diversos partidos políticos, já haviam nela mencionado os povos acima referidos ao tratarem da urgência sanitária da retirada de invasores não indígenas de suas terras, devido ao desmatamento, à Covid-19 e ao genocídio.
No mesmo sentido, os solicitantes dos três pedidos de cautelares perante à CIDH expuseram: i) a especial situação de risco face à pandemia de COVID-19, considerando sua particular suscetibilidade a doenças respiratórias e o rápido crescimento de contágios no seu território; ii) as falhas no sistema de saúde para a população indígena, agudizadas pela pandemia; e iii) a presença de terceiros não autorizados em suas terras, fomentando o fluxo do vírus.
A Comissão Interamericana é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA). Seu mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, ambos tratados ratificados pelo Brasil, a qual tem como objetivo promover a observância e defesa dos direitos humanos na região, bem como atuar como órgão consultivo da OEA na temática.
Em casos de gravidade e urgência, sempre que necessário e de acordo com as informações disponíveis, como nesses apresentados, a Comissão pode requerer ao Estado em questão a adoção de medidas cautelares para evitar danos irreparáveis, conforme previsto no artigo 25 de seu Regulamento.
Diante dessas atribuições, em 17 de julho de 2020 a CIDH emitiu a Resolução 35/2020, outorgando medidas cautelares de proteção a favor dos membros dos povos indígenas Yanomami e Ye’kwana. Já em 11 de dezembro de 2020, a CIDH adotou sua Resolução 94/2020, por intermédio da qual outorgou medidas cautelares a favor dos membros do Povo Indígena Munduruku. Por fim, em 4 de janeiro de 2021, a CIDH emitiu a Resolução 1/2021, por meio da qual concedeu medidas cautelares em favor dos membros dos Povos Indígenas Guajajara e Awá da Terra indígena Araribóia.
Em todos os casos, a Comissão considerou que as informações prévias apresentadas pelo Estado brasileiro eram generalistas, pelo que não permitiram verificar sua real efetividade para a proteção de tais povos. Também foi solicitado ao Brasil que:
- a) adote as medidas necessárias para proteger os direitos à saúde, à vida e à integridade pessoal dos membros desses povos, implementando, sob uma perspectiva culturalmente adequada, medidas de prevenção contra a disseminação da COVID-19, além de fornecer assistência médica adequada em condições de disponibilidade, acessibilidade, aceitabilidade e qualidade, de acordo com os parâmetros internacionais aplicáveis;
- b) acorde as medidas a serem adotadas com as pessoas beneficiárias e seus representantes; e
- c) relate as ações adotadas para investigar os fatos que levaram à adoção dessa medida cautelar e, assim, evitar sua repetição.
O objetivo da APIB em levar estes casos ao STF é deixar a Corte ciente da preocupação externada pela CIDH, órgão especializado na proteção dos direitos humanos no entrecho interamericano.
Reforça-se, assim, a necessidade de urgente elaboração de um plano eficaz para a contenção da propagação da Covid-19 em territórios indígenas, agravada pela presença massiva de invasores ilegais, cuja retirada imediata dessas terras se faz indispensável.
Como mencionado, tais urgências já foram reconhecidas pelo STF. No entanto, até agora nada foi feito para remediá-las, devido à incapacidade do Governo Federal em apresentar um plano eficaz para o enfrentamento e monitoramento da Covid-19 entre os povos indígenas brasileiros. Após quase um ano, o Planalto já levou ao STF quatro propostas de plano de combate, todas ignoraram considerações de especialistas sobre problemas estruturais nos territórios.
Especificamente quanto à TI Yanomami, houve adensamento do número de invasores, gerando as possibilidades de iminente conflito com os indígenas. Recentemente, a Hutukara Associação Yanomami, relatou um grave conflito entre garimpeiros, que invadiram a comunidade indígena de Helepi, na noite do 25 de fevereiro. Diante desse cenário, a associação pede urgência na atuação dos órgãos de segurança pública para investigar o ocorrido e proteger a comunidade.