Nós, da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – Apib, lamentamos informar que ultrapassamos 1 mil óbitos indígenas por Covid-19. Desde o começo da pandemia, fomos incansáveis na luta para conter os avanços do novo coronavírus, pois não esquecemos o histórico de genocídios dos povos originários provocado por doenças trazidas pelos colonizadores. Sabíamos que enfrentar a pandemia de um vírus desconhecido seria devastador para nossos povos e, por isso, fomos à luta para a proteção dos nossos.
Em abril de 2020, já incentivando o distanciamento social como forma de prevenção, realizamos pela primeira vez o Acampamento Terra Livre (ATL) totalmente online. Demarcando as telas, nos unimos a pesquisadores e profissionais da saúde para discutir vulnerabilidade, impactos e enfrentamentos à Covid-19 no contexto indígena. Em maio, organizamos a Assembleia Nacional da Resistência Indígena, com intuito de construir um plano de ação emergencial para conter a disseminação e os impactos da pandemia. Outro resultado muito importante da assembleia foi a criação do Comitê pela Vida e Memória Indígena que, desde então, coleta e publica dados sobre o avanço do vírus.
Nos meses seguintes, enquanto liderávamos a construção do plano Emergência Indígena e a mobilização global Maracá, lutamos junto à organizações parcerias pela implementação da Lei 1142/2020 que dispõe sobre medidas de proteção social para prevenção do contágio e da disseminação da Covid-19, fomos ao Supremo Tribunal Federal com a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n.º 709 exigindo a elaboração de um plano do Governo Federal que atenda as necessidades de proteção integral dos povos originários (a elaboração deste plano se arrasta por quase um ano, considerações de especialistas sobre problemas estruturais nos territórios seguem sendo ignoradas pelo governo). Finalizamos 2020 lançando o relatório “Nossa luta é pela vida”, um documento robusto que reúne informações sobre os primeiros oito meses de pandemia no contexto indígena em todo Brasil. Nele apontamos todos os vetores de disseminação, vulnerabilidades, negligências e violações dos nossos direitos.
Em 2021, com o início da imunização, o Governo usou de um critério racista para definir quem teria direito à vacina, nós também lutamos e continuamos lutando pela vacinação universal. Criamos a campanha “Vacina, parente!” para pressionar o poder público a garantir imunização de todo e qualquer indígena em território brasileiro – independente de onde esteja, para combater a desinformação sobre vacinas, para denunciar casos de violações e negligência na implementação do plano de imunização com os povos indígenas como grupo prioritário.
Completamos um ano de pandemia com nossos esforços voltados, principalmente, para o enfrentamento da Covid-19. Seja nas barreiras sanitárias nas aldeias, seja nas instâncias de poder do país, nós não paramos, nós não esperamos, nós não nos conformamos com nenhuma vida indígena perdida para o vírus. Hoje, é com imenso pesar e buscando forças na nossa ancestralidade, que comunicamos que apesar de todas as nossas lutas, chegamos à marca de mil vidas interrompidas. Interrompidas pela doença, sim, mas também pelo descaso, pela violência, pelo genocídio orquestrado por quem deveria prezar pela garantir do nosso direito de viver.
Por cada uma das 1.001 vidas indígenas que ancestralizaram, por cada parente que continua na luta contra esse vírus: seguimos.
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – Apib
12 de março de 2021