A organização também alerta que nenhuma providência foi tomada para uma atuação ativa do Estado Brasileiro em relação à segurança de indígenas e não-indígenas no Vale do Javari 

Em nota publicada na última segunda-feira (18/07), a União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja) denunciou o assédio de garimpeiros a servidores da  Base de Proteção Etnoambiental (BAPE) da Funai, localizada no rio Jandiatuba, no Amazonas. Segundo a organização, no dia 15 de julho, às 17h, homens armados estiveram na Base perguntando quantos funcionários estavam trabalhando no local.

Indígenas do povo Matis estão entre os servidores da Base, que tem como uma das suas principais atribuições a proteção da terra indígena do Vale do Javari. O objetivo é assegurar a integridade física e territorial de grupos indígenas isolados que vivem nos rios Jandiatuba e Jutaí. 

Neste cenário de insegurança, a Univaja alerta que nenhuma providência foi tomada para uma atuação ativa do Estado Brasileiro em relação à segurança de indígenas e não-indígenas. A organização também reivindica do Governo Federal e do Estado do Amazonas a criação de um Plano Emergencial de Proteção para o Vale do Javari e a atuação do Batalhão de Polícia Militar Ambiental na região entre a cidade de Atalaia do Norte e a Terra Indígena Vale do Javari.

Abaixo, leia na íntegra a nota da Univaja:

GARIMPEIROS ARMADOS ASSEDIAM SERVIDORES DA FUNAI NA BASE DE VIGILÂNCIA NO RIO JANDIATUBA, TERRA INDÍGENA VALE DO JAVARI

A União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (UNIVAJA) vem a público informar aos nossos parceiros e à imprensa nacional e internacional que, no dia 15/07/22, às 17:00hs dois homens armados foram à Base de Proteção Etnoambiental (BAPE) da FUNAI, localizada no rio Jandiatuba. Os homens armados perguntaram quantos funcionários (dentre eles, indígenas do povo Matis) estavam trabalhando naquela Base, com clara intenção de assediar os servidores. Uma das principais atribuições dos servidores da FUNAI na Base Jandiatuba é a proteção da terra indígena para assegurar a integridade física e territorial de grupos indígenas isolados que vivem nos rios Jandiatuba e Jutaí. Nessa região do Vale do Javari, existe a maior quantidade de informações e referências confirmadas de índios isolados.

Entre os dias 24/02/22 e 18/03/22, uma equipe da Frente de Proteção Etnoambiental (FPE/FUNAI) Vale do Javari fez uma atividade de vigilância e monitoramento no rio Jandiatuba. Em relatório, a equipe registrou a presença de 19 balsas de garimpo em atividade, com movimentação logística saindo do município de São Paulo de Olivença (AM), e pontos de retirada de madeira para a construção das balsas próximos da localidade dos indígenas isolados. As pessoas que operam as balsas de garimpo no rio Jandiatuba portavam armas de fogo (calibres 16 e 12). O relatório da FUNAI plotou 14 coordenadas de GPS mapeando as atividades de garimpo ilegal no rio Jandiatuba.

No mesmo período, em 16/03/22, através do Ofício nº 019/2022/UNIVAJA, endereçado à Superintendência da Polícia Federal no Amazonas, a UNIVAJA informou o aumento exponencial das atividades de garimpo ilegal no rio Jandiatuba e Jutaí – informações catalogadas e repassadas às autoridades pelo indigenista Bruno Pereira, assassinado no dia 05/06/22 no rio Itaquaí. Nesse ofício, a UNIVAJA registrou coordenadas de GPS sobre a presença de atividades de garimpo ilegal em diferentes rios da terra indígena, dentre eles, o rio Jandiatuba.

O mapa acima, construído a partir das coordenadas de GPS coletadas em campo, mostra a presença concomitante de atividades de garimpo ilegal e os registros confirmados de grupos indígenas isolados no rio Jandiatuba. Apesar das informações técnicas terem sido encaminhadas pela FUNAI e UNIVAJA às autoridades, nenhuma providência foi tomada até o momento. Isso tem sido um dos questionamentos da UNIVAJA durante as audiências realizadas pelas Comissões Externas do Senado e da Câmara dos Deputados, em Brasília (DF), ao longo deste mês de julho. No dia 05/07/22, os servidores da Coordenação Regional da FUNAI em Atalaia do Norte (AM) comunicaram à sede do órgão indigenista, em Brasília (DF), que:

“Diante do risco real de atos de violência física serem cometidos contra esta Coordenação, assim como ao público por esta atendido, resolvemos suspender as atividades de atendimento ao público e restringir nossos trabalhos apenas a questões internas e de caráter emergencial, até que sejam tomadas as devidas providências que assegurem a continuidade dos trabalhos desta coordenação com a garantia da dignidade e do bem estar físico e psicológico de seus servidores e funcionários”.

Nesse contexto de insegurança, após mais de um mês do assassinato de Bruno Pereira e Dominic Phillips, a UNIVAJA vem alertar que nenhuma providência concreta foi tomada para uma atuação ativa e preventiva do Estado Brasileiro através de suas instituições competentes em relação à segurança das pessoas (indígenas e não-indígenas) no Vale do Javari.

Mesmo com a repercussão nacional e internacional do assassinato de Bruno e Dom, mesmo após as reuniões junto a diferentes instâncias (Ministério Público Federal, Supremo Tribunal Federal, Câmara dos Deputados e Senado Federal), as autoridades brasileiras ainda não se conscientizaram de que os infratores continuam invadindo a Terra Indígena Vale do Javari. Agora, de maneira mais intensa, intimidando diretamente os servidores da FUNAI e as lideranças indígenas. O que nós, UNIVAJA, vemos até o momento é um jogo de empurra-empurra entre as instituições em que uma joga a responsabilidade para a outra. Enquanto isso, não há um planejamento sério para o enfretamento da criminalidade no Vale do Javari.

Diante dessa calamidade, reivindicamos ao governo federal brasileiro:

1) a criação de um Plano Emergencial de Proteção para o Vale do Javari.

2) a atuação conjunta da Polícia Federal, do Exército e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) por, no mínimo, 06 meses com a FUNAI nas Bases de Proteção Etnoambiental (BAPEs) localizadas nos rios Ituí, Curuçá, Quixito e Jandiatuba.

Ao governo do Estado do Amazonas, reivindicamos:

3) a atuação do Batalhão de Polícia Militar Ambiental por, no mínimo, 06 meses no trecho do rio Itaquaí – entre a cidade de Atalaia do Norte (AM) e a Terra Indígena Vale do Javari – para combater os crimes ambientais. Parte dos ilícitos ambientais saem da terra indígena através desse trecho, onde Bruno e Dom foram assassinados no início de junho deste ano. Atalaia do Norte/AM, 18 de julho de 2022

Atalaia do Norte/AM, 18 de julho de 2022