Foto: Wilson Dias/Brasil de Fato
texto atualizado dia 29.08.2022

Sob o mote “Demarcando as Urnas”, campanha indígena da Apib promove candidaturas das bases pela representatividade e enfrentamento das violências  contra os povos originários

O número de candidatos indígenas nas eleições de 2022 registrou um aumento de 115% desde 2014, quando o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) passou a registrar dados como cor e raça dos candidatos. Pelo histórico de registro das candidaturas proporcionais e majoritárias em âmbito estadual e federal, o número de pessoas se afirmaram indígenas passou de 85 em 2014 para 133 em 2018 e 183 este ano, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), divulgados pelo sistema DivulgaCand, na terça-feira, 16.08. Esse já é o maior quantitativo de parentes e parentas concorrendo a vagas eletivas na história do Brasil.

“É muito positivo esse crescimento, que demonstra a organização dos povos indígenas para estar presente nos espaços de tomada de decisão, que afetam nossas vidas. Não significa que façamos e discutamos política somente agora, essa mobilização vem desde a década de 70, mas no cenário da política partidária é mais recente, o que significa o quanto queremos estar nesses espaços que decidem a vida dos cidadãos e cidadãs brasileiros”, afirma Kleber Karipuna, coordenador executivo da Apib e coordenador político da Campanha Indígena. 

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) lança, este ano, mobilização em todo o território nacional por meio da Campanha Indígena (https://campanhaindigena.info/), a fim de fortalecer e apoiar candidaturas indicadas pelas bases em todo o Brasil. Em 2022, a Apib lança pela primeira vez sua Bancada Indígena com 30 candidaturas em todas as regiões do Brasil. Conheça a Bancada Indígena aqui

A Campanha Indígena é uma iniciativa da Apib com o objetivo de ampliar a representação indígena nos espaços de poder. De acordo com Dinaman Tuxá, um dos coordenadores executivos da Apib, a nova legislação eleitoral dificulta a eleição de candidaturas progressistas engajadas nas pautas de direitos humanos, meio ambiente, clima e nas lutas dos povos indígenas.

Tuxá ressalta ainda que as indicações feitas pelas organizações de base passam pelo processo de consulta e validação dos povos, enfrentando desafios continentais como logística e comunicação, para chegar até os espaços de disputa da sociedade brasileira, além de desafios históricos como o registro d que passou a ser feito somente em 2014 pela Justiça Eleitoral.  

“A realidade político partidária é distinta em diversos contextos regionais. Historicamente, cargos de representatividade eleitoral estão ocupados por pessoas que na sua maioria não estão alinhadas com as pautas socioambientais ou mesmo de direitos humanos. Nosso trabalho é demarcar as urnas e eleger lideranças que possam vir a ser agentes de mudança, dentro e fora da política institucional, com ênfase na representatividade e na diversidade que rege o nosso país”, afirma.

Desde 2017, a Apib vem estimulando de forma mais direta a participação de lideranças indígenas na Política. Em 2018, Sonia Guajajara, que era coordenadora executiva da Apib foi candidata ao cargo de vice-presidente em um processo que contribuiu para um aumento de lideranças entrando para disputa eleitoral nos anos seguintes. No mesmo ano, Joenia Wapichana, foi eleita primeira mulher indígena a Deputada Federal, outro fator que colaora com o aumento de candidaturas. Em 2020, mais de 2.000 candidaturas indígenas concorreram às eleições e 200 representantes foram eleitos — entre eles 10 prefeitos e 44 vereadoras.

Segundo Kleber Karipuna, coordenador executivo da Apib, as lideranças dos diversos povos indígenas têm articulado para chegar a candidaturas de consenso. “A APIB fez o chamado para as candidaturas indígenas, mas diferente dos anos anteriores, a gente não está considerando muito a quantidade. A gente não quer [um grande número]. A gente quer candidaturas pelo movimento que sejam consensuais em cada estado”, diz.

Dados

O estado de Roraima é o que apresenta maior número de candidaturas: 27 no total, seguido de Amazonas (18), São Paulo (13), Mato Grosso do Sul (11) e Rio de Janeiro (11). 

Com 5 a 10 candidaturas estão os estados do Acre (10), Ceará (8), Pernambuco (8), Minas Gerais (6), Rio Grande do Sul (6), Rondônia (5), Bahia (5), Paraná (5). 

Com o registro de até 4 candidaturas estão Amapá (4), Maranhão (4), Mato Grosso (4), Santa Catarina (4), Tocantins (4), Distrito Federal (3), Espírito Santo (3), Pará (3), Paraíba (3), Piauí (3),Sergipe (3), além de Rio Grande do Norte (2), Alagoas (1) e Goiás (1). Entre as 175 candidaturas há ainda o registro de  1 candidata a vice-presidente, Raq uel Tremembé, pelo PCB. 

Confira a relação completa aqui: https://bit.ly/CandidaturasIndígenas 

Histórico

O primeiro indígena eleito no Brasil, que o movimento indígena tem registro, foi Manoel dos Santos, seu Coco, do povo Karipuna, em 1969. Ele ocupou o cargo de vereador na cidade de Oiapoque, no Amapá.

Em 1976, o Cacique Angelo Kretã ganhava uma cadeira na Câmara Municipal de Mangueirinha (PR), após lutar na Justiça pelo direito de candidatar-se.

Já o primeiro prefeito indígena eleito, registrado pelo movimento indígena, foi no ano de 1996. João Neves, do povo Galibi-Marworno, comandou o executivo do município de Oiapoque, no Amapá. 

No âmbito federal, somente dois indígenas ocuparam um gabinete na Câmara e nenhum foi eleito para o Senado. Mário Juruna se elegeu pelo PDT/RJ em 1982, seis anos depois os direitos indígenas terem sido reconhecidos na Constituição Federal. A segunda vaga só foi ocupada mais de 30 anos depois, em 2018, com a eleição de Joenia Wapichana, primeira mulher indígena a se tornar deputada federal, pela Rede/RR.

Ainda em 2018, pela primeira vez uma mulher indígena concorreu ao cargo de vice-presidente. Sonia Guajajara, com sua candidatura ocupou novos espaços de visibilidade e impulsionou a chegada de mais lideranças para disputa eleitoral.