Arpinsul repudia a vereadora Cíntia Mendonça, de Florianópolis

Arpinsul repudia a vereadora Cíntia Mendonça, de Florianópolis

A Arpinsul lançou uma nota de repúdio à vereadora Cíntia Mendonça (PSOL) pelo desligamento arbitrário da Covereadora Joziléia Kaingang da Mandata Coletiva Bem Viver. Joziléia foi a primeira mulher indígena eleita na cidade de Florianópolis.

As covereadoras Mayne Goes, Lívia Guilardi e Marina Caixeta também comunicaram os seus desligamentos da Madanta diante do total descumprimento do acordo coletivo da candidatura.

A organização exige uma posição do partido e explicações da vereadora.

Leia a nota completa:

Nós da ARPINSUL – Articulação dos Povos Indígenas do Sul, repudiamos o desrespeito a trabalhadoras e trabalhadores que se dedicaram até aqui para fazer uma mandata coletiva pautada nos princípios do bem Viver dos Povos Originários. Repudiamos também o individualismo irresponsável que gerou um profundo desrespeito e desconsideração as covereadoras, assessores e as pessoas que apostaram nesse projeto.

Na noite da última quarta-feira (09) até então a Covereadora Joziléia Kaingang, juntamente com os assessores indígenas e as demais covereadoras e assessores negros e negras e LGBT foram surpreendidos com o recebimento de um e-mail que informava a demissão e que tinham até o dia seguinte para retirar seus pertences pessoais, com hora marcada. Esse ato não reflete a posição de uma pessoa ou movimento que afirma lutar pelo Bem Viver dos Povos Originários.

Queremos aqui reconhecer a coragem da nossa Covereadora Joziléia Kaingang que foi a primeira mulher indígena eleita em uma Mandata Coletiva na cidade de Florianópolis, e as covereadoras Mayne Goes, Lívia Guilardi e Marina Caixeta que comunicaram os seus desligamentos da Madanta Coletiva Bem viver diante do total descumprimento do acordo coletivo da candidatura.

O movimento intitulado como Bem Viver afirma que vai substituir as covereadoras eleitas e afirma que representação indígena será reconstituída o que nos preocupa bastante, pois não é verdade que as covereadoras abandonaram o mandato, elas foram levadas a fazer isso quando a arbitrariedade da parte que acha que tem o poder alterar tudo sem ao menos aceitar conversar.

Não aceitaremos qualquer movimento que gere conflitos entre parentes e que ataquem as organizações indígenas, principalmente por aqueles que pretendem de alguma forma se promover através das lutas dos povos indígenas.

Deixamos aqui nosso questionamento ao PSOL, o partido vai ser conivente com todo esse golpe e racismo que estar sendo cometido pela sua parlamentar Cintia Mendonça?
Enquanto a branquitude não tiver compromisso com os direitos e as lutas dos Povos Indígenas isso continuará acontecendo por medo da nossa força ancestral.

A ARPINSUL acompanhará todas as instâncias para que a justiça seja feita a quem descumpriu com os acordos coletivos e que vai seguir de forma individual no mandato.

“A ancestralidade sempre ensinou que o sentido da vida é o coletivo”
Sônia Guajajara

Apib integra comissão de movimentos populares que discute a política ambiental do acordo Mercosul-União Europeia

Apib integra comissão de movimentos populares que discute a política ambiental do acordo Mercosul-União Europeia

Uma comissão formada por cinco integrantes de movimentos populares brasileiros está na Europa para debater a política ambiental do acordo Mercosul-União Europeia (UE), até o dia 18 de novembro. A jornada passa por cinco países: Holanda, Bélgica, Alemanha, França e Áustria. Os impactos da mineração em terras indígenas e em áreas ocupadas pela agricultura familiar são uma das principais questões abordadas durante os encontros com as autoridades.

A delegação contempla a diversidade das diferentes regiões do país, com um representante de cada. Kretã Kaingang, coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) representa os povos originários nas agendas para defender a importância da demarcação para garantir a preservação das florestas e a redução do desmatamento nos biomas brasileiros.

Outra integrante é uma vítima de intoxicação por agrotóxicos em 2020. Graciela Almeida, agricultora agroecológica do assentamento Nova Santa Rita de Cássia II, localizado no município de Nova Santa Rita, na Região Metropolitana de Porto Alegre. O assentamento em que ela mora foi atingido por um avião pulverizador que despejou pesticidas em lavouras vizinhas, causando o adoecimento dos moradores.

Nesta terça, 08/11, a delegação realizou uma reunião pública com membros da Comissão Europeia e do Parlamento Europeu. A reunião contou com a presença de Marie Toussaint, deputada pelo Partido Verde, e tratou da luta pela vigilância das empresas europeias que compram e vendem produtos no Brasil. A eleição de Lula e as expectativas com o novo governo também foram tema do diálogo.

A iniciativa faz parte das ações da Amigos da Terra Europa e da rede Seattle to Brussels Network (S2B), entidades dedicadas à proteção do meio ambiente e à promoção do desenvolvimento com sustentabilidade e justiça social. A Frente Brasileira Contra os Acordos Mercosul-União Europeia e Mercosul-EFTA, integrada por mais de 200 coletivos da sociedade civil brasileira, está apoiando a iniciativa. A Frente vem denunciando os impactos da inserção internacional proposta pelo acordo para os países do Mercosul desde 2020.

Integram a delegação:
• Graciela Almeida, agricultora agroecológica atingida pela deriva de agrotóxicos e representante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST);
• Emiliano Maldonado, da Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares (RENAP) e assessor jurídico da Via Campesina Brasil,que presta suporte a comunidades atingidas por derivas ilegais de agrotóxicos;
• Kretã Kaingang, coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), a maior associação de povos indígenas do país;
• Luana Hanauer, economista e integrante da Amigos da Terra Brasil. Atualmente trabalha na assessoria técnica em casos de violações de direitos humanos relacionados à extração mineral, acompanhando comunidades afetadas pelo desastre-crime da barragem de Brumadinho (MG);
• Larissa Bombardi, Professora Associada do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP) e especialista em agrotóxicos.

O acordo Mercosul e EU

O acordo entre os países do Mercosul (Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai) e da União Europeia (UE) foi assinado em junho de 2019 e prevê o livre comércio entre os dois blocos. Porém, ele não entrou em vigor porque as posturas do governo brasileiro em relação ao meio ambiente não se adequavam às exigências de outros países e geraram entraves para as negociações. Projetos de leis de Bolsonaro, que tramitam no legislativo, são mal vistos por líderes europeus. Por exemplo, a flexibilização do uso de agrotóxicos e a regulamentação da mineração ilegal em terras indígenas.

Na Bahia, Cacique Babau Tupinambá é alvo de campanha difamatória promovida por bolsonaristas

Na Bahia, Cacique Babau Tupinambá é alvo de campanha difamatória promovida por bolsonaristas

A democracia venceu a eleição mais espúria que a população brasileira já enfrentou. Durante o pleito circularam inúmeras notícias falsas e os territórios indígenas sofreram ataques orquestrados resultando no assassinato de indígenas, inclusive de um menino com apenas 14 anos. Bolsonaro perdeu as eleições, mas o bolsonarismo continua vivo, seja nas tragicômicas paralisações de BR pedindo intervenção militar, seja nas perseguições de lideranças dos movimentos sociais.

No sul da Bahia não é diferente. O Cacique Babau Tupinambá, liderança da aldeia Serra do Padeiro, Território Indígena (TI) Tupinambá de Olivença, é alvo de mais uma campanha de difamação bolsonarista. Dessa vez a notícia falsa tenta relacionar o desaparecimento de dois trabalhadores rurais ao território do cacique.

A fake news afirma que Celso Silva Santos, 36 anos, e Paulo Roberto Alves dos Santos, 41 anos, teriam desaparecido antes das eleições, na quarta-feira, 26/10, quando saíram para trabalhar na Fazenda Barro Vermelho, de propriedade de Arlete Silva, que faria divisa com aldeia do Cacique. Com isso eles tentam atribuir aos indígenas, especialmente ao Cacique Babau, a responsabilidade sobre os desaparecimentos. No entanto, essa informação é falsa.

De acordo com informações de moradores locais, a fazenda em questão fica localizada próxima ao Instituto Federal da Bahia de Ilhéus (IFBA), há mais de 70km do TI, entre os municípios de Ilhéus e Itabuna. E para legitimar a informação falsa, foi registrado um boletim de ocorrência no município de Buerarema, única cidade da região em que Bolsonaro obteve a maioria dos votos durante a eleição.

“A gente acha muito estranho também porque esse pessoal sumiu na quarta-feira, antes da eleição, era dia 28 parece. E só foram denunciar ontem. Falaram que a área era no município colado com a Aldeia. Aí corremos atrás para verificar e algumas pessoas informou que na verdade essa propriedade fica em Itabuna na divisa com ilhéus, próximo ao IFBA. Totalmente distante do território, mas para gerar a notícia eles criaram primeiro pela televisão e depois jogaram nas redes sociais. É o modo operacional dos bolsonaristas”, explica o Cacique.

Nas informações que constam nesta ocorrência, a casa dos trabalhadores teria sido encontrada com portas e janelas abertas, a porta dos fundos arrombada, objetos revirados e marcas de sangue no piso. Informações que precisam ser investigadas. Ao mesmo tempo, outro Boletim de Ocorrência sobre o mesmo fato foi registrado no município de Ilhéus.

“Se ocorreu na cidade de Itabuna com Ilhéus porque eles foram prestar essa queixa em Buerarema, dizendo que essa propriedade é em Buerarema? E por que registrar simultaneamente em Ilhéus? É muito estranho! Eles estão fazendo uma campanha como foi de 2016, da minha prisão. Eles estão atacando pessoas, matando pessoas e dizendo que era eu. Agora, estão fazendo a mesma coisa, estão atacando pessoas e jogando na imprensa dizendo que é o Cacique Babau”, constata a liderança.

Para ele, esta é mais uma tentativa de manchar a imagem do movimento indígena por questões políticas. “Isso não tem nada a ver com a comunidade indígena. É uma campanha difamatória em cima da população indígena principalmente porque estava junto com Lula, votando com Lula e não com bolsonarista”.

Babau alerta que se sente ameaçado, porque este tipo de violência serve de justificativa para assassinar pessoas como forma de cobrança, em regiões do interior nas quais a lei não se aplica e a justiça ainda é feita com as próprias mãos.

“Eles planejaram essa questão. Devem ter sumido com esses cidadãos antes. Eles apostavam que Bolsonaro ganhava e que ACM Neto também ganhasse na Bahia. Aí em seguida, eles já vinham com tudo para cima da aldeia e prendia o cacique Babau ou matava. Teoricamente matar, porque é o que eles mais planejam, mas como perderam, eles não tiveram outra coisa a fazer, a não ser jogar isso na imprensa e criar esse factoide”, denuncia.

Babau já foi alvo de outras acusações falsas. Em 2014, ele chegou a ser preso arbitrariamente, acusado pelo assassinato de um produtor rural chamado Juraci do Ipiranga. Babau nunca foi intimado a depor no processo e foi surpreendido em Brasília, quanto precisou tirar o passaporte. Logo em seguida foi solto por meio de uma liminar concedida pelo Superior Tribunal de Justiça. A perseguição impediu Babau de participar de uma reunião com o Papa e pouco tempo depois seu nome foi retirado dos autos.

Até hoje, esse processo é usado contra o Cacique. Durante estas eleições, foram distribuídos inúmeros panfletos na cidade de Buerarema relembrando o caso, como se ele fosse culpado, bem como vídeos que circularam amplamente nas redes sociais.

Em resposta, os indígenas buscaram o Ministério Público para esclarecer os fatos e pedir indenização por danos morais. Tanto o crime, quanto a campanha difamatória estão sendo apuradas pelas instituições responsáveis, no entanto, as informações falsas continuam circulando impunemente nas mídias e redes sociais bolsonaristas.

Indígenas participam de ato em memória às vítimas da Covid

Indígenas participam de ato em memória às vítimas da Covid

Centenas de corações, nomes e mensagens foram desenhados num painel de 20 metros de comprimento, em memória às vítimas da pandemia. O ato foi realizado neste domingo, 23, na Avenida Paulista, pela Associação de Vítimas e Familiares de Vítimas da Covid-19 (Avico) e pelo projeto de produção audiovisual “Eles poderiam estar vivos”. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e as Organizações Indígenas da Região Sudeste do Brasil (Arpin-Sudeste) participaram com a presença de indígenas Terena e Guarani.

Entre as lágrimas e a saudade, foram feitas críticas ao governo Bolsonaro, que se aproveitou da crise de saúde pública durante a pandemia para cobrar propina de 1 dólar por dose de vacina. A demora do atual governo em garantir a vacinação e a campanha feita por Bolsonaro em favor de medicamentos ineficientes no tratamento da doença, como a Cloroquina, custou a vida de milhares de pessoas. Entre os indígenas, a doença afetou 162 povos do Brasil, matando 1324.

“Não podemos esquecer que enquanto chorávamos a perda das nossas pessoas mais amadas – eu, por exemplo, perdi minha mãe -, o presidente zombava de quem estava morrendo com falta de ar porque não havia respiradores suficientes para atender a todos os internados, duvidava da ciência, espalhava informações falsas, incentivava a aglomeração de pessoas e desaconselhava o uso de máscara”, diz Paola Falceta, presidente da Avico.

Em áudio, militares na Funai prometem atropelar Ibama e liberar garimpo em terras indígenas

Em áudio, militares na Funai prometem atropelar Ibama e liberar garimpo em terras indígenas

 

Por João Peres, Marcos Hermanson Pomar, Tatiana Merlino
O Joio e o Trigo em parceria com o Intercept.
18 de outubro de 2022.

 

O COORDENADOR REGIONAL da Funai de Barra do Garças, no Mato Grosso, afirmou em reunião fechada que o presidente do órgão, Marcelo Xavier, pretende legalizar o garimpo e a extração de madeira em terras indígenas. Em gravação obtida com exclusividade pelo O Joio e o Trigo em parceria com o Intercept, o capitão da reserva Álvaro Carvalho Peres diz que Xavier está estudando duas instruções normativas: “Uma que permite o indígena a fazer o manejo florestal, vender a madeira, cultivar a madeira. E a segunda é o garimpo em terra indígena, que já existe hoje de forma irregular”.

As declarações foram dadas em uma reunião realizada em 23 de agosto entre servidores de alto nível da Funai e indígenas ligados ao projeto Independência Indígena – que desenvolvem, junto a fazendeiros vizinhos, plantio de soja, milho e arroz dentro da Terra Indígena Sangradouro, no leste do Mato Grosso.

“E é isso aí que o indígena quer. Indígena não quer mais a roça de toco, não, eles ficarem no sol com a enxada, não”, afirmou Peres, em outro momento. “Ele quer é o maquinário, ele quer a colheitadeira, ele quer a plantadeira, ele quer o trator”.

Marcelo Xavier também defendeu a liberação da mineração nas TIs em entrevista à Rádio Jovem Pan em agosto, dizendo que “a vontade da mineração em terras indígenas” consta na Constituição Federal, que estaria sendo descumprida. O artigo 231 o contradiz. “A lavra das riquezas minerais em terras indígenas só pode ser efetivada com autorização do Congresso Nacional”, afirma o texto constitucional – que dá ainda aos povos indígenas “usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes”.

A Funai foi procurada para comentar as afirmações, mas não se manifestou até o fechamento da reportagem.

Em 2020, o governo federal encaminhou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei 191, que abre espaço para atividades de mineração em terras indígenas e coloca a Funai na posição de mediadora entre comunidades indígenas e empreendedores – o PL também prevê compensação financeira e participação das comunidades nos lucros.

“Esse projeto não é impositivo”, declarou o presidente Jair Bolsonaro durante visita a uma estação de garimpo ilegal na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, em outubro do ano passado. “Se vocês quiserem plantar, vão plantar. Se vão garimpar, vão garimpar. Se quiserem fazer algumas barragens no vale do rio, vão poder fazer”.

Ouvida sob sigilo, uma fonte que atuou na Diretoria de Promoção ao Desenvolvimento Social da Funai de Brasília durante a gestão Xavier lembrou que a autarquia estava sim trabalhando em uma instrução normativa de liberação da extração de madeira nas terras indígenas, mas que o entendimento geral no órgão era de que a liberação de garimpo dependeria da aprovação de uma lei complementar no Congresso Nacional.

O presidente da ONG Indigenistas Associados, que reúne funcionários da Funai, nos disse que não se surpreenderia caso a cúpula da fundação tentasse editar uma instrução normativa liberando o garimpo em terras indígenas. “Se encaixaria nessa tendência mais geral de infralegalismo autoritário que tem sido a marca do governo Bolsonaro”, afirmou Fernando Vianna.

Para o secretário-executivo do Conselho Indigenista Missionário, o Cimi, Antônio Eduardo de Oliveira, a atual administração da Funai tem se excedido na edição de normas infralegais que vão, em sua opinião, contra os direitos dos povos indígenas. “Esse procedimento é ilegal”, criticou. “Permite que os territórios sejam totalmente desprovidos de vida, inviabilizando a existência das gerações presentes e futuras”.

‘Cai em dois tempos’
O encontro de 23 de agosto durou três horas e foi realizado em um galpão da cooperativa Cooigrandesan, criada para viabilizar o projeto de lavoura mecanizada em Sangradouro. O objetivo era discutir a multa e o embargo impostos pelo Ibama, em julho, aos fazendeiros ligados à lavoura, por desmatamento ilegal e construção de empreendimentos potencialmente poluidores em área protegida.

Estavam lá o Capitão Álvaro Carvalho Peres, responsável por coordenar as atividades da Funai em seis terras indígenas da etnia Xavante; o coordenador de Promoção à Cidadania da Funai, Tenente Coronel Jorge Claudio Gomes; o superintendente de Assuntos Indígenas do Governo do Mato Grosso, Agnaldo Santos; o fazendeiro Ary Ferrari; indígenas ligados à Cooigrandesan e o Coronel Fernando Fantazzini.

Nomeado em outubro do ano passado para a chefia da Direção de Promoção ao Desenvolvimento Sustentável da Funai, um dos principais cargos do órgão, Fantazzini não tem no currículo, registrado na rede social Linkedin, qualquer experiência com a questão indígena. Durante a reunião, ele afirmou ter ficado “extremamente preocupado” ao receber a autuação do Ibama e ver o embargo.

“Por quê? Porque nós acreditamos no trabalho da cooperativa. Nós acreditamos no trabalho dos parceiros e viemos aqui de perto saber o que está acontecendo. E, no final das contas, eu estou vendo que houve um mal entendido por parte do Ibama”.

Os contratos entre fazendeiros e indígenas foram assinados em março de 2020, mas o projeto, idealizado por Bolsonaro, já era uma promessa desde 2017, quando o então deputado federal esteve em Primavera do Leste. A iniciativa, também conhecida como “Agro Xavante”, é uma das prioridades da presidência da Funai no mandato de Bolsonaro – que, no último dia 7 de outubro, acabou com os comitês regionais da Funai, frentes que tinham participação de indígenas.

Durante a conversa, o presidente da Cooigrandesan, Gerson Wa Raiwe, relatou que o superintendente do Ibama no Mato Grosso, Coronel Gibson Almeida, teria prometido apoio à empreitada. “Ele falou o que podíamos fazer”, disse Wa Raiwe. “Ele até falou para nós que ele está à disposição para quando nós decidirmos, ou agendarmos uma audiência junto à Funai, ao Ibama de Brasília”. O Ibama foi procurado pela reportagem, mas não encaminhou resposta.

Gomes e Fantazzini explicaram que viajaram de Brasília ao Mato Grosso para averiguar se “o que chegava para eles” na sede da Funai era verdadeiro e dizem ter se convencido, depois de conversas com indígenas, que a área de fato já estava antropizada, ou seja, já havia sido desmatada antes da abertura da lavoura – o que é desmentido por imagens de satélite levantadas pela área técnica local da Funai. Como o Joio revelou em setembro, a área técnica da Funai de Barra do Garças mostrou que apenas 20% da área da lavoura sofreu ação humana antes do início do projeto.

Mesmo que a área já fosse antropizada, a cooperativa precisaria ter protocolado junto ao Ibama, antes do início do projeto, uma ficha de caracterização de atividade pedindo dispensa de licenciamento ambiental. É o que determina a Instrução Normativa nº1 Funai/Ibama – criada justamente para facilitar esse tipo de empreendimento. A FCA foi protocolada 11 meses depois da abertura da lavoura.

Fantazzini e Gomes se comprometeram, contudo, a produzir documentos atestando que a área embargada já havia sofrido ação humana por projetos de lavoura mecanizada desenvolvidos durante a ditadura e no fim da década de 1990. Com isso, convenceriam o Ibama a cancelar as sanções. Gomes chega a prometer que, ao chegar em Brasília, vai “pedir para ele [pessoa não identificada] me trazer a situação de que a área já foi antropizada, já foi plantada arroz, já foi trabalhado anteriormente” para que a versão chegue logo à Coordenação Geral de Meio Ambiente e a produção possa recomeçar.

A versão é semelhante à do presidente da Cooigrandesan. Em conversa com a reportagem por telefone no dia anterior, 22 de agosto, Wa Raiwe disse que, em alguns dias, o Ibama retiraria o embargo. “O Xavante é diferente. Quando fica bravo, esquece tudo. Não pensa em outra coisa a não ser partir para cima. Para quem não conhece, é arriscado se arriscar também”, ameaçou.

“Eu vou pegar lá, que tem uma coordenação [da Funai] que cuida justamente dessa parte de licenciamento ambiental, pegar os dados que já foi provado que ela [a área] já foi antropizada, e isso aí cai em dois tempos”, afirmou Gomes antes da chegada de Fantazzini. “Aí esse embargo termina na hora”.

Clima de violência

A gravação também registra uma série de ataques a servidores de carreira da Funai, apontados como responsáveis pelos revezes sofridos pelo Independência Indígena. “O governo entende que a comunidade indígena é a dona da trilha que ela vai abrir”, Fantazzini afirmou. “Estando dentro da legalidade, nós [a Funai] vamos sempre apoiar”.

“Há alguns anos atrás, havia até embate dentro da Funai, porque a maioria não pensava dessa maneira, era coisa de 5%”, ele seguiu. “Os outros 95% querem que os indígenas continuem como há 522 anos”.

Para Fernando Vianna, presidente da INA, a fala de Fantazzini é “absolutamente fantasiosa”. “Eles [direção da Funai] esticaram a corda até o limite e, quando a corda arrebentou, colocaram a culpa nas pessoas que estão fazendo a coisa da maneira correta”, disse ainda o indigenista, em referência aos servidores da Funai que apontaram irregularidades no projeto.

O secretário-executivo do Cimi, Antônio Eduardo de Oliveira, lembrou que a Funai vem retomando a proposta integracionista que marcou a política indigenista até a Constituição de 1988. “Querem retirar os funcionários de carreira mais compromissados com os direitos indígenas e colocar pessoas comprometidas com esse assédio aos povos originários”, diz o missionário. “Muitos [funcionários] tiveram que se aposentar, outros estão fazendo tratamento de saúde. É um clima de pressão e violência”.

Além de Fantazzini, indígenas presentes na reunião também fizeram duras críticas aos servidores de carreira da Funai que atuam na Coordenação Regional Xavante. “A Funai velha, manda para São Paulo, interior. Tem que ficar lá. Para que ficar aqui fazendo confusão? Manda lá [Nome de servidor 1], aqueles outros, [Nome de servidora], anti-indígena. Manda lá no Roraima, São Paulo, para trabalhar, fazer projetinho da roça de toco [roça tradicional]”, criticou Graciano Pronhopa, cacique em Sangradouro e um dos cooperados presentes no encontro.

Em outro momento, o presidente da cooperativa, Gerson Wa Raiwe, afirmou: “Quem nos procurou uma vez foi o [Nome de servidor 2, ex-coordenador local da Funai]. Aquele cara é um baita parasita”. Wa Raiwe ainda afirmou que um servidor, único funcionário de carreira presente na reunião, estava mentindo ao dizer que a Cooperativa não respondeu aos pedidos de informações emitidos pela CR Xavante.

“Se você quiser ver lá os termos, é tudo transparente. Que eu não vejo nesses 12 anos que você está na Funai, nunca vi transparência, nunca vi. Agora você vem me dizer aqui que está faltando transparência. Isso é mentira”, afirmou o presidente da Cooperativa. O Joio já mostrou que sucessivos pedidos de fornecimento de informações foram ignorados pela cooperativa, com a conivência do coordenador regional, capitão da reserva Álvaro Peres – muito elogiado, aliás, durante a reunião.

Procuramos Wa Raiwe por telefone e aplicativo de mensagens, mas ele preferiu não se manifestar.

Durante o encontro, Fantazzini também afirmou que os projetos de lavoura em terra indígena estariam sofrendo perseguição da justiça. “A gente pode ajudar, a gente pode articular, nós podemos fazer várias coisas para ajudar a virar o jogo, porém ela [Funai] sozinha, com a quantidade de pessoas no Judiciário que querem que dê errado, não vai conseguir”, afirmou. “A cooperativa precisa estar com o pé no chão, porque senão vai vir o pessoal da capa preta e lascar em cima”.

Apib aciona TSE e repudia a fala de Bolsonaro sobre canibalismo

Apib aciona TSE e repudia a fala de Bolsonaro sobre canibalismo

Petição afirma que candidato à reeleição tem “história política de desprezo e estímulo à morte aos povos tradicionais brasileiros”

A Apib entrou com uma petição no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em repúdio ao candidato à reeleição, Jair Messias Bolsonaro. O documento foi agregado ao processo que solicita a retirada de circulação do vídeo divulgado pela campanha de Luiz Inácio Lula da Silva, no qual Bolsonaro afirma que “comeria um índio sem problema nenhum”. O vídeo mostra trechos de uma entrevista concedida ao jornal New York Times em 2016. O processo será julgado nesta quinta-feira, 13/10.

Os Advogados de Bolsonaro alegaram ao TSE que se trata de “descontextualização” da entrevista, além de “constituir fato ofensivo à honra do candidato”. O processo ainda defende a fala do então deputado: “longe de comportamento repulsivo e desumano que busca construir artificialmente a Representada, consubstancia, na realidade, a deferência do Representante à cultura indígena”.

Para a Apib, o conteúdo da entrevista e as alegações da defesa do candidato, são absolutamente mentirosas e ofensivas à cultura e à história do Povo Yanomami. A petição registra que “durante os anos de 2019 a 2021, período de mandato de Jair Bolsonaro na presidência do país e de Marcelo Xavier na presidência da Funai – Fundação Nacional do Índio, nenhuma terra indígena foi identificada, declarada ou homologada. Ao contrário, nessa gestão, o governo federal retardou pelo menos 27 processos de demarcação de Terras Indígenas que já estavam em fase avançada de andamento”.

As políticas conduzidas por Bolsonaro durante sua gestão e as mudanças feitas na Funai, tiveram como consequência uma escalada de violências contra os indígenas, a invasão de territórios e a ampliação de crimes ambientais como desmatamento e mineração ilegal. Conforme relatório Violência Contra os Povos Indígenas do Brasil, publicação anual do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), apenas até agosto deste ano foram registrados 355 casos de violência contra indígenas em 2021, enquanto que em todo o ano de 2020 foram registrados 304 casos. Além disso, pelo mesmo estudo, enquanto que em 2020 foram registradas 263 invasões aos territórios dos povos originários, em 2021 foram 305, um crescimento de 16%.

Bolsonaro espalha desinformação e preconceito sobre rituais indígenas sagrados

Bolsonaro espalha desinformação e preconceito sobre rituais indígenas sagrados

Na primeira semana de campanha deste segundo turno, se espalhou nas redes sociais um vídeo do candidato a reeleição Jair Messias Bolsonaro, no qual ele afirma que “comeria um índio sem problema nenhum”. A entrevista foi concedida ao New York Times em 2016.

De acordo com o candidato, ele teria visitado o território Surucucu, dos Yanomami. Na ocasião teria morrido um indígena e o povo estava realizando o ritual de passagem. “Morreu o índio e eles estão cozinhando, eles cozinham o índio, é a cultura deles. Cozinha por dois três dias, e come com banana. Daí eu queria ver o índio sendo cozinhado, e um cara falou, ‘se for ver, tem que comer’, daí eu disse, eu como”.

E completa, dizendo que só não comeu a carne humana porque ninguém da comitiva quis ir junto. As declarações demonstram total desconhecimento da cultura indígena, são um amontoado de desinformação e preconceito, que causaram grande indignação entre os povos originários do Brasil. A coligação de Jair entrou com ação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para tentar impedir a veiculação desse trecho da entrevista, mas o vídeo continua disponível na internet.

Para Junior Hekurari, que vive em Surucucu, toda a história contada por Bolsonaro no vídeo “é mentira”. “É sem cabeça, eu fiquei muito chateado. Presidente candidato mentiroso.”
“Nós, Yanomami do Surucucu, não somos canibais, nunca tivemos isso. Não tem um relato [sobre isso]. Nem relatos ancestrais nem atuais. Esse presidente não tem respeito com o ser humano. Ele inventa da cabeça, porque não tem preocupação com o Brasil. No Sucurucu tem pelotão do Exército e tem parceria boa com os Yanomami. Isso de ‘comer indígena’, isso não existe”, sentenciou Hekurari.
Hekurari explica que um grupo indígena Yanomami, já localizado na Venezuela e conhecido como Xamathari, pratica o ritual fúnebre de cremar o corpo, o que pode durar dias ou semanas, triturar e pulverizar os ossos e, por fim, misturar as cinzas, em pequenas quantidades, como se fosse sal ou pimenta, a um caldo de banana, que somente então é consumido pelos familiares do morto.

Mas esse ritual não prevê o consumo da carne humana e só ocorre eventualmente, “com algumas pessoas, geralmente pessoas muito importantes na comunidade”. Nos rituais fúnebres realizados na região de Surucucu, de acordo com Hekurari, as cinzas são enterradas, e não consumidas com a banana.

O pesquisador Rogerio Pateo, doutor em antropologia pela Universidade de São Paulo (USP) e professor do departamento de antropologia e arqueologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), também desmentiu Jair. Para o antropólogo Rogerio Pateo, o que Bolsonaro faz é reproduzir uma imagem de desenho animado.

“Os relatos que existem são sobre guerreiros tupinambás, no litoral e no século 16, capturarem e assarem inimigos”, afirma. “Os yanomamis não comem nem carne de onça, porque dizem que onça come gente.” Segundo Pateo, as afirmações de Bolsonaro são a manifestação de um “preconceito num nível baixíssimo”. “Ele tem na cabeça aquela imagem que assustou a Europa 500 anos atrás. É preconceito e racismo. Atualmente, não há resquício dessa imagem de canibalismo entre indígenas brasileiros.”

O mito mente, cria mitos para esconder suas reais intenções como agenciador do garimpo e do desmatamento ilegal, especialmente com o povo em questão. No início deste ano o relatório da Hutukara Associação Yanomami expôs as calamidades causadas por invasores do território indígena, entre os crimes, há relatos de estupros de mulheres e crianças, além da queimada e o desaparecimento de uma comunidade inteira, que fugiu para se proteger das violências. Os casos têm acontecido com a conivência da Funai, que opera sistematicamente contra os direitos indígenas desde que Bolsonaro assumiu o governo.

Constituição Federal: 34 anos de pluralismo democrático e direitos indígenas

Constituição Federal: 34 anos de pluralismo democrático e direitos indígenas

 

No dia 5 de outubro de 1988 foi promulgada a Constituição Federal do Brasil, um passo fundamental para a consolidação da democracia e para o reconhecimento dos direitos dos povos indígenas. A Carta Magna baliza os valores da sociedade brasileira, explicitados em suas primeiras linhas: “assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus (…)”.

A definição dos princípios fundamentais da sociedade brasileira e as leis que a regem, foi resultado de grandes lutas, mobilizações contra o regime militar e construção de consensos entre os diversos setores que compõem o país, de diversidade sociocultural em proporções continentais.
O constituinte José Carlos Sabóia relata que “era a subcomissão mais desvalorizada que tinha em toda constituinte, subcomissão de índios, negros e pessoas portadoras de deficiências. E para surpresa de toda casa, o grande mérito disso foi a organização das populações indígenas, que nenhum dia, durante toda constituinte, deixaram de estar presentes no Congresso Nacional”.

Assim, para conquistar os artigos 231 e 232, que garantem os direitos aos povos originários do Brasil, foi preciso ir até Brasília, acampar e pressionar os deputados um a um. O presidente da casa, Ulysses Guimarães, recebeu um cocar para ser lembrado das exigências. Os povos levaram a tinta preta do jenipapo e se pintaram diante de todo plenário, enquanto defendiam as pautas.

A pressão deu resultado e o artigo 231 reconheceu “aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”. Já o artigo 232, acabou com a tutela do Estado sobre os povos, que não eram tratados como cidadãos capazes de defender seus direitos, sendo representados somente pela voz da Fundação Nacional do Índio (Funai). Está na redação que “os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo”.

Atualmente, muito da constituição ainda precisa ser efetivado. Os povos indígenas lutam pela consolidação das demarcações e enfrentam forças retrógradas, que capitaneadas por Bolsonaro, defendem a volta da ditadura militar e querem impor o marco temporal, distorcendo o direito originário previsto na Carta Magna.

“A constituição foi fundamental para reconhecer o nosso direito originário, mas nossa luta nunca acabou. Até hoje precisamos retomar territórios e resistir nos territórios para que nossos direitos sejam cumpridos e respeitados. E agora essa gente cheia de ódio quer impor uma lei absurda que data a nossa existência, mas com a força dos ancestrais e do povo organizado, vamos derrotar eles nas urnas e em seguida na justiça”, anunciou o coordenador executivo da Apib, Dinaman Tuxá.

Povo Guarani Kaiowá repudia assassinatos e emboscadas na retomada de Guapoy e reserva de Amambai

Povo Guarani Kaiowá repudia assassinatos e emboscadas na retomada de Guapoy e reserva de Amambai

 

 

A Aty Guasu – Grande Assembleia Guarani e Kaiowá – divulgou uma nota de revolta e pesar, cobrando às autoridades alguma solução para os constantes ataques ao Território Indígena. Nesta terça-feira, 13/09, o indígena Vitorino Sanches, foi alvejado no centro de Amambai (MS). Vitor já havia sofrido um atentado em agosto, mas sobreviveu.

A nota denuncia que os Kaiowá estão sendo assassinados, vêm sofrendo emboscadas e perseguições na região de Guapoy, onde aconteceu o massacre no dia 24 de junho, durante o violento e ilegal despejo executado pela PM do Mato Grosso do Sul. A desastrosa operação resultou no assassinato de Vitor Fernandes e deixou dezenas de feridos, inclusive crianças e idosos. Os agressores seguem impunes. “Não sabemos exatamente o que está acontecendo, quem são os mandantes e os mandados, o que exatamente tem ligação, mas sabemos que as duas vítimas têm em comum estarem ligados à nossa retomada”, afirmam.

Os Guarani e Kaiowá apontam que há integrantes das forças de segurança envolvidos e policiais locais têm atuado para incriminar as vítimas da violência. “A polícia ataca, o Estado permite, o público e o privado funcionam em uma única direção. Ampliar a monocultura sobre os cemitérios que um dia foram nossas terras”.

A relação de promiscuidade entre instituições de segurança, pistolagem e fazendeiros vem criando uma campanha nacional de extermínio dos povos indígenas, bradada pelo governo genocida de Bolsonaro. Em diversos momentos, o atual presidente discursou incitando o agro banditismo e autorizando invasores de Terra Indígenas a propagarem o terror para assegurar os territórios dos quais se apropriaram indevidamente. As consequências disso são inúmeras mortes de inocentes, ameaças e caos no interior do país. Os povos indígenas clamam por alguma intervenção das instituições que possa barrar a onda de genocídio.

Leia a nota na íntegra:

Amambai, MS, 14 de setembro de 2022.

NOTA DE REVOLTA E PESAR PELOS ASSASSINATOS E EMBOSCADAS CONTRA OS GUARANI E KAIOWÁ DA RETOMADA DE GUAPOY E DA RESERVA DE AMAMBAI APÓS O MASSACRE. EXIGIMOS INVESTIGAÇÃO SÉRIA E SEGURANÇA PARA AS FAMILIAS JÁ.

É com dor e preocupação que recebemos ontem a notícia do assassinato de Vitorino Sanchez em pleno centro da cidade de Amambai, a luz do dia, na vista de todos. Vitorino é o segundo assassinado em três emboscadas ocorridas em Amambai após o Massacre de Guapoy – ação ilegal e violenta da Polícia Militar contra a retomada Guarani e Kaiowá. No massacre o indígena Vitor Fernandes foi assassinado e dezenas de pessoas, sobretudo crianças e idosos ficaram feridas. Após o Massacre as emboscadas começaram a acontecer. Primeiro Marcio Moreira foi convidado a prestar serviço, abordado por pessoas em motocicleta e executado com arma de fogo e arma branca.

Depois Vitorino Sanchez sofreu atentado dentro da Reserva de Amambai, onde teve seu carro alvejado por pelo menos 15 disparos vindos novamente de dois sujeitos de motocicleta. Vitorino foi acertado por dois disparos, foi hospitalizado, mas sobreviveu. Agora, em nova emboscada, novamente contra Vitorino, o que demonstra que os agressores não desistiriam enquanto não o executassem, ele foi assassinado com vários disparos, testemunhas falaram novamente em duas pessoas em uma moto.

Esta situação de terror nos faz temer pela vida das famílias que estão na Retomada ou na Reserva. Não sabemos exatamente o que está acontecendo, quem são os mandantes e os mandados, o que exatamente tem ligação, mas sabemos que as duas vítimas têm em comum estarem ligados à nossa retomada. Marcio era liderança importante de Guapoy, Vitorino um apoiador do movimento de recuperação de nossa Terra, ano aderindo ao boicote sugerido a nossa retomada e fornecendo alimento as famílias. É difícil saber se as forças de segurança também não estão envolvidas uma vez que foram os protagonistas do Massacre que sofremos e que acabaram expostos pelas denúncias deste terrível episódio. Também precisamos saber se os fazendeiros da região estão envolvidos e até mesmo aproveitando de questões internas, como as eleições da aldeia, para atacar nossas famílias.

O fato é que os Kaiowá têm morrido, emboscados, massacrados, perseguidos enquanto os agressores seguem impunes. Até agora nada foi feito com o Estado e com os policiais que nos atacaram de forma ilegal e cheia de violência. Até agora, o assassinato de Márcio ficou como sempre sem explicação. Os ataques contra Marcio e Vitorino foram iguais, elaborados da mesma forma e isso exige uma investigação. Parte das polícias locais tem se esforçado nos inquéritos e investigações para criminalizar as vítimas, nos indígenas, ao invés de encontrar nossos violadores. Queremos ajuda das autoridades. Que o MPF, DPU, DPE, possam nos ajudar a garantir os processos de investigação e buscar apoio para proteger nossa comunidade. Que a CNDH, CDDH, CNJ, 6cc, parlamentares e demais órgãos possam vir a nosso estado cobrar que as investigações sejam feitas como se deve e assim evitar que novas vidas sejam tiradas, porque temos muitas razoes para acreditar que ainda matarão muita gente.

Precisamos também garantir a segurança das pessoas da Reserva e em especial das famílias que estão na retomada. O acesso a eles é fácil e eles não tem nenhuma proteção. Muitas estradas vicinais dão acesso ao território que inclusive fica muito próximo de outras fazendas. Tememos pela vida e integridade de todos, homens, mulheres, idosos e crianças.

Exigindo justiça e investigação em relação a estes crimes, a Aty Guasu pede ajuda das autoridades para que não haja mais parentes nossos mortos nos próximos dias. Aqui no Estado do MS, como demonstrado durante o Massacre são todos contra os Kaiowá. A polícia ataca, o Estado permite, o público e o privado funcionam em uma única direção. Ampliar a monocultura sobre os cemitérios que um dia foram nossas terras. Assim eles pensam, mas não permitiremos nem deixaremos de lutar.

Que Nhanderu nos proteja e que os senhores autoridades possam nos ajudar.

Coletivo de Caciques e Lideranças do extremo sul da Bahia denuncia em Brasília os ataques aos Pataxó

Coletivo de Caciques e Lideranças do extremo sul da Bahia denuncia em Brasília os ataques aos Pataxó

 

Uma comissão de lideranças indígenas da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme) está em Brasília, acionando diversas instituições para defender o Território Indígena Pataxó dos ataques da milícia bolsonarista, que há meses ameaça as comunidades do extremo sul da Bahia. Os cercos armados já levaram ao assassinato de um menino de 14 anos. A comissão busca ampliar as denúncias da situação e cobrar a justiça sobre os envolvidos, mandantes e pistoleiros. “A comissão continuará com as denúncias, até que sejam punidos os responsáveis pelos atos de violências e mortes que ocorreram nos últimos dias”, afirma a nota.

Um relatório sobre o histórico de ataques foi entregue à Comissão Nacional de Direitos Humanos, à Subprocuradoria Geral da República e à Procuradoria Regional da República da 1° Região. O documento também será encaminhado à ONU e outras organizações internacionais.

Confira a nota:

Nota das Organizações do Coletivo de Caciques e Lideranças Pataxó do entorno do Monte Pascoal das Terras Indígenas Comexatibá, Barra Velha e o Território Pataxó de Coroa Vermelha.

Comissão de lideranças Pataxó do Sul e do Extremo Sul da Bahia, representados pelas suas organizações dos territórios Comexatibá, Barra Velha e Território Coroa Vermelha, realizaram diversas reuniões em Brasília-DF, onde a pauta dessas agendas para denunciarem os ataques de pistolagem (milicianos) a mando de fazendeiros (grileiros) e suas organizações.

Os descasos que vem ocorrendo nas aldeias, que covardemente resultou na morte do um jovem indígena pataxó de 14 anos (Gustavo Silva da Conceição), fato que ocorreu no dia 04 de setembro de 2022.

As ameaças continuam constantemente através dos ataques violentos, na tentativa de tirar nosso povo de suas terras tradicionais, onde os mesmos alegam ser donos.

As denúncias foram feitas na Comissão Nacional de Direitos Humanos, onde foi entregue um relatório dos descasos violentos contra nosso povo.

Os mesmos documentos foram entregues na Subprocuradoria Geral da República, na Coordenação da 6° Câmara e na Procuradoria Regional da República da 1 Região. O documento será traduzido do português para o inglês, para ser entregue às organizações internacionais, através da ONU, para que o mundo fique sabendo, das ameaças e da violência que vem ocorrendo contra nosso povo.

A comissão continuará com as denúncias, até que sejam punidos os responsáveis pelos atos de violências e mortes que ocorreram nos últimos dias.

“O direito à diferença, previsto no art. 231, da atual Constituição, explicita que a nós, indígenas, não podem ser negados direitos deferidos aos demais cidadãos brasileiros, assegurando a todos os povos originários do Estado brasileiro os diversos direitos decorrentes de sua peculiar situação”.

Atenciosamente,

Conselho de Caciques e Lideranças Pataxó de Santa Cruz Cabrália – COLIPA
Conselho de Caciques e Lideranças Pataxó da Terra Indígena de Barra Velha- CONPACA
Federação indígena das Nações Pataxó e Tupinambá do Extremo Sul da Bahia- FIMPAT
Movimento Unidos dos Povos e Organizações indígenas da Bahia- MOPOIBA
Movimento Indígena da Bahia- MIBA
Conselho da Juventude Pataxó da Bahia- CONJUPAB
Conselho Local de Lideranças Pataxó do Território Pataxó Ponta Grande – COLIPAG
Coordenação Local de Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (APOINME)