​O Brasil, saltou rapidamente da esperança de sequer ser atingido pela pandemia, por conta de sua posição geográfica tropical, a segundo colocado mundial em números de mortes e casos totais de infecção. As causas podem ser muitas e não existe um único culpado. É preciso ter em mente que trata-se de uma pandemia e como tal ela não escolhe as pessoas por conta de sua posição ideológica, cor, raça, etnia ou classe social. O Covid-19 é o agente mais democrático na história do Brasil desde sua invenção.

​O presidente que solicitou que os governadores cancelassem o carnaval por conta dos riscos de contaminação é o mesmo que minimizou esses riscos indo a manifestações e não usando máscaras e chamando a pandemia de “gripezinha” e os governadores que se uniram para salvar vidas são os mesmos que não deram ouvidos sobre os riscos do carnaval e que têm feito do combate ao Covid-19 um verdadeiro balcão de negócios, nem todos eles lícitos. A surpresa é a participação do próprio governo federal que critica os estados e municípios nesses negócios como veremos logo mais.

​Para nós indígenas considerando a gravidade da pandemia e os (des)caminhos da política indigenista do governo atual, o que ainda parece ser o único caminho seguro é mantermos, por nossa própria conta e com nosso esforço, um isolamento social ostensivo em relação aos não indígenas. Essa tem sido a estratégia adotada até aqui, mas ela não tem a sustentabilidade que precisamos porque infelizmente nos tornamos dependentes dos produtos manufaturados dos não indígenas.

​Os primeiros casos de Covid nas nossas aldeias foram “brindes” ofertados pela gestão ruim de pessoal no DSEI Alto Solimões que permitiu que um médico infectado fosse para a aldeia e contaminasse os parentes ali, iniciando uma seqüência de casos de transmissões comunitárias que se alastrou por quase todo o DSEI.

​A pandemia chegou ao Brasil em um momento em que a SESAI começava a tentar se reorganizar após a gestão ruim de Silvia Nobre que desarticulou completamente o pouco que ainda funcionava. Na gestão de Silvia Nobre, o Coronel Robson Silva chegou à SESAI para ser chefe do DEAMB, não por escolha de Silvia, mas por ser homem da confiança do então ministro Mandetta. Corria nos bastidores da SESAI em Brasília que o ministro da saúde procurava uma oportunidade de exonerar a secretária que utilizava o cargo mais para fazer propaganda do presidente e participar de reuniões de mulheres bolsonaristas do que para gerir a saúde indígena e possivelmente estaria envolvida em um grande esquema de desvio de recursos em contratos de horas vôo da saúde indígena, o que não deixava de ser contrasensual, uma vez que a mesma posava de caçadora de corruptos, apesar de trazer de volta à SESAI de forma oficiosa velhos corruptos do tempo do governo petista.

​Robson Silva exercia uma espécie de gestão paralela na SESAI e segundo se comentava à época, era ele que de fato mandava no órgão, até que foi nomeado como Chefe de Gabinete de Mandetta, o que só demonstrava sua ligação com o mesmo.

​Os boatos sobre desvios de recursos públicos começaram a pressionar o ministro Mandetta para que tomasse providências em relação a Silvia Nobre. Silvia e Robson em meio ao decreto chamado revogaço, que revogou diversos colegiados de controle social tiveram a possibilidade de encaminhar a justificativa da necessidade de permanência do Fórum de Presidentes de CONDISI na estrutura central da SESAI, uma vez que o mesmo seria extinto, e apesar de terem recebido da equipe de apoio ao controle social uma justificativa plausível, de comum acordo não o fizeram e é preciso pensar que sem o FPCONDISI a SESAI fica sem acompanhamento dos povos indígenas no nível central e sem possibilidade de acompanhamento e fiscalização, o que talvez fosse o desejo de ambos.

​Com o aumento da pressão por parte do controle social para que o ministro Mandetta exonerasse Silvia por conta de pagamento de propina num contrato de hora vôo e para evitar que o controle social divulgasse as denuncias que já haviam sido encaminhadas aos órgãos de controle. O agora Chefe de Gabinete garantiu que a secretária seria exonerada e que só era necessário esperar um pouco. Nesse momento Robson silva se esforçava por reconstruir a reputação de Mandetta junto aos povos indígenas que havia ficado abalada por conta do desejo manifesto por diversas vezes por Mnadetta de extinguir a SESAI e municipalizar a saúde indígena. Robson garantia que Mandetta havia se arrependido e que queria fortalecer a SESAI.
​Pouco tempo depois Silvia Nobre foi de fato exonerada e o próprio Robson Silva assumiu a SESAI em comum ambos tinham o completo desconhecimento do que fosse saúde indígena e legislação do próprio SUS. Tobson assumiu a SESAI prometendo consertar os desarranjos feitos por Silvia Nobre e apurar as denuncias de desvios, o que de fato até o momento não aconteceu. Ele prometeu que daria um jeito de reorganizar o controle social e reinstituir o FPCONDISI, o que também nunca vez, ao contrário propôs uma reinstituição dos Conselhos Distritais tirando deles o poder de deliberação, o que só não foi levado a cabo por conta da vigilância dos indígenas que participavam da comissão organizadora da VI CNSI.

​Ao contrário de se aproximar, Robson seguiu o modelo anterior de centralizar todas as compras no nível central, de onde estrategicamente haviam afastado o controle social deixando o caminho livre para que fizessem uma gestão sem participação e sem controle social. É com esse cenário que nos atingiu de forma pesada a pandemia, e é esse hoje o nosso principal problema. Os distritos se tornaram unidades subalternas reféns do que pensam e fazem os gênios de Brasília que pouco ou nada sabem sobre a saúde de nosso povo e cuja prepotência e arrogância impedem sequer de consultar. Sem o Fórum de Presidentes as decisões relacionadas ao combate à pandemia foram todas unilaterais. E foi exatamente isso que aconteceu também em relação ao PL1142 criado para dar condições para a SESAI prestar um melhor atendimento a todos os povos indígenas independente de onde vivam e ainda de atuar na articulação para que populações tradicionais e quilombolas sejam atendidos por seus respectivos órgãos de forma similar.

​Sem controle social o secretário se adiantou em fazer ele próprio observações sobre o PL antes da votação na Câmara, e fez isso sem informar e nem consultar ninguém, sem querer saber o que nós, os povos indígenas pensávamos do projeto e subiu o tom acusando a Deputada Federal indígena Joênia Wapichana de ter sido a relatora de um projeto de lei que propõe a municipalização da saúde de seu povo e que ela sabe se tratar de uma grande luta de resistência dos seus parentes e assumindo ele, o homem de confiança do agora ex-ministro que queria extinguir a SESAI em defensor do que ele mesmo julga ser o nosso direito, quais interesses estão por detrás desse amor repentino à SESAI?

​Na contramão do que afirma o presidente da república Robson viaja o país negociando leitos em hospitais e hospitais de campanha em territórios indígenas a preços que míngüem sabe, porque ele estrategicamente afastou o controle social, com os mesmos prefeitos e governadores que o governo federal que ele representa acusa de superfaturamento e de desvio de dinheiro, resta saber se a mando do governo federal ou por sua própria conveniência. Ao mesmo tempo, sem controle social Robson não encaminha aos órgãos de controle as denuncias que se acumulam sobre tablets, drones e programas fantasmas “alocados nas nuvens” adquiridos pela SESAI e que embora não tenha sido na gestão dele, é de seu conhecimento e o mesmo não faz absolutamente nada para esclarecer estes e outros assuntos que ao destituir o FPCONDISI optou por deixar nas sombras, com que interesses?

​Da mesma forma importa saber os valores dos contratos de horas vôo, os contratos de locação de helicópteros, tudo sem participação e controle social. E importa saber porque isso tem influência direta sobre o posicionamento irresponsável e incoerente do secretário inclusive sobre critérios relacionados a identificação étnica, fazendo terrorismo sobre a municipalização e causando divisão entre o nosso povo exacerbando as divisões relacionadas ao direito à terra em diversas regiões do país.

​As últimas colocações do secretário Robson deixam na berlinda os presidentes de CONDISI que precisam “obedecer” o que mandam o secretário e os coordenadores de DSEI e repudiarem o PL 1142, mesmo que ele signifique um aporte de recursos importante e a possibilidade de aprimoramento do trabalho da SESAI, ou “desobedecerem” os chefes e se posicionarem pelo PL, que a bem da verdade não teve a ampla participação de nosso povo, o que em parte é culpa da própria SESAI que arquitetou esse cenário previamente.
​Todo esse cenário aponta para a possibilidade de que a rejeição da SESAI ao PL 1142 esteja ligada a interesses escusos envolvendo a aquisição de leitos em hospitais de campanha e construção desses mesmos hospitais, a aquisição e negociação de insumos e contratação de horas de vôo para o combate à pandemia, a negócios estranhos de bastidores com prefeitos e governadores na contramão do que faz querer pensar o governo federal e longe dos olhos do controle social afastado do nível central seja por ação ou omissão do secretário que de toda forma parece mais preocupado em, não se sabe o motivo, obstruir que se investiguem os destinos de tablets, drones e programas fantasmas adquiridos pela SESAI.

​Para os parentes vale a pena refletir, porque será que Robson, homem de confiança de Mandetta que queria extinguir a SESAI, se tornou seu principal defensor? Ele está defendendo a SESAI ou seus interesses próprios? Porque insistem em centralizar todas as aquisições em Brasília e tiram, justamente de Brasília o controle social exercido pelo FPCONDISI? Transparência? Porque se posicionar contra um PL que vai colocar mais recursos na SESAI para combate à pandemia e que só vale enquanto durar a pandemia? A que interesses o secretário atende? De Mandetta? De Teich? Do próprio presidente de quem diz ser amigo? Ou os seus próprios em comum acordo com prefeitos, governadores e deputados interessados em contratos de horas vôo, sobretudo no norte? Na SESAI dos sonhos do secretário nunca saberemos disso porque ela não tem controle social. E ao mentir de forma vergonhosa dizendo que o PL municipaliza a saúde indígena, quando o PL sequer menciona isso, ele deixa claro que está disposto a qualquer coisa para conseguir atingir seus objetivos, jogar e trair com a boa fé dos povos que confiaram nele pode ser o menor dos delitos que esteja disposto a cometer.