A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) enviou petição ao STF solicitando ingresso como amicus curiae na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n. 6553, em trâmite no STF, sob relatoria do ministro Alexandre de Moraes. A ação foi proposta pelo PSOL, visando suspender os processos administrativos da Ferrovia EF-170, a Ferrogrão. O traçado previsto para os trilhos passa por dentro da área hoje ocupada pelo Parque Nacional do Jamanxim, uma Unidade de Conservação (UC) localizada no Pará. Para viabilizar economicamente o projeto é preciso alterar os limites do Parque. É mais uma agressão à floresta e ao meio ambiente, sem os cuidados e sem as consultas aos povos indígenas. No dia 15 de março de 2021, o ministro relator concedeu a liminar e suspendeu a eficácia da Lei 13.452/2017, resultante da conversão da Medida Provisória 758/2016, bem assim dos processos relacionados à Ferrogrão, em especial os em trâmite na Agência Nacional dos Transporte Terrestres – ANTT (50500.036505/2016-15 ou outro qualquer), no Ministério da Infraestrutura (50000.025009/2020-53 ou qualquer outro) e no Tribunal de Contas da União (025.756/2020-6).

A APIB chama atenção para três pontos importantes da decisão do ministro relator:

  • A construção da ferrovia no Parque do Jamanxim é inconstitucional

O governo alterou os limites do Parque Nacional por meio de uma Medida Provisória (MP). E as Unidades de Conservação Ambiental, como a do Jamanxim, só podem ser alteradas por lei. Os limites do Parque Nacional do Jamanxim foram alterados pela Medida Provisória n. 758/2016, o que contraria a previsão do art. 225, § 1º, III, da Constituição. Ele diz que Unidades de Conservação só podem ser alteradas dessa maneira por meio de lei. Em casos anteriores semelhantes, o STF entendeu por unanimidade que esse procedimento fere a Constituição da República. O fato de a MP ter sido posteriormente convertida em lei não altera a inconstitucionalidade do ato. Uma lei resultante de MP não passa pelas Comissões permanentes do Congresso Nacional. Isso elimina todo o processo legislativo de uma lei ordinária, que exige o debate parlamentar e a participação social necessários para que a lei seja legítima e favorável à sociedade.

  • A Ferrogrão é nociva ao meio ambiente

Estudos de instituições, como a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), apontam que a ferrovia do governo federal poderá causar imensos danos ambientais. As obras poderão rasgar a mata nativa do bioma amazônico e prejudicar centenas de nascentes e rios. O desmatamento será incentivado, e milhares de quilômetros de vegetação nativa poderão ser destruídos por conta da inevitável ampliação da fronteira agrícola para dentro da região amazônica, com direção ao centro do Pará. A enorme pressão por terras cultiváveis terá um preço muito alto para a Amazônia.

  • Os povos indígenas não foram consultados

Desde o início do processo da Ferrogrão, os povos indígenas estão sendo colocados à margem. Há um direito de Consulta e Consentimento Livre, Prévio e Informado (CCLPI), ainda na fase de planejamento da Ferrogrão, para possibilitar que os povos indígenas impactados pela obra exerçam seu direito de participar da avaliação de custo-benefício na etapa de Planejamento de Longo Prazo. Adicionalmente, uma vez escolhido um projeto de infraestrutura a ser implementado em região de influência de terras indígenas, deve-se garantir aos povos diretamente afetados o direito de influenciar a avaliação de viabilidade socioeconômica e ambiental do projeto escolhido, na etapa da Estruturação do Projetos e de licenciamento ambiental do mesmo, conforme lhes garante os artigos 6º e 7º da Convenção 169 da OIT. Neste caso não houve a CCLPI. O traçado da ferrovia vai prejudicar 48 comunidades indígenas. Em dezembro de 2020 o Ministério Público Federal (MPF) iniciou ação judicial exigindo respeito à consulta prévia dos povos atingidos. Na ação, o MPF acusa o governo de tentar aliciar um indígena para obter anuência sem cumprir os protocolos de consulta e viabilizar o licenciamento do projeto.

O STF está no caminho certo. Pedimos ao Plenário, ao julgar a ADI 6553, para manter a decisão de que a alteração no Parque Nacional do Jamanxim é inconstitucional e que o projeto da Ferrogrão deve seguir suspenso para evitar danos irreparáveis aos povos indígenas e à região amazônica.