Povos indígenas acusam o presidente pela morosidade nas buscas de Bruno e Dom, além de crime de genocídio e crimes contra a humanidade por extermínio, perseguição e outros atos desumanos. 

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) enviou nesta terça-feira (14) uma nova manifestação ao Tribunal Penal Internacional (TPI), o Tribunal de Haia, na Holanda. O documento atualiza a denúncia realizada pela Articulação em 09 de agosto de 2021, que atribui a Jair Bolsonaro a responsabilidade pela prática de crime de genocídio e de crimes contra a humanidade por extermínio, perseguição e outros atos desumanos. Dessa vez os fatos referem-se ao período de janeiro a maio de 2022, incluindo a negligência nas buscas por Bruno da Cunha Araújo Pereira e Dom Phillips e a barbárie no território Yanomami.

A Apib ressalta a persistência e a intensificação da política anti-indígena de Jair Bolsonaro, com agravamento dos seus efeitos sobre os povos indígenas. O Presidente “ataca sistematicamente os povos indígenas brasileiros por meio da destruição intencional das instituições de proteção dos direitos indígenas e socioambientais, além de atacá-los por meio de discursos que têm feito segmentos da sociedade brasileira perceberem os povos indígenas como obstáculo à sua prosperidade”, afirmou comunicado da APIB. As consequências do desmonte institucional estão cada dia mais visíveis, como o recente desaparecimento do jornalista e do indigenista, o aumento da invasão e apropriação de terras indígenas por não indígenas, o desmatamento, o garimpo e a mineração, além do impacto desproporcional da pandemia de Covid-19 entre os povos originários.

A atuação da Nova Funai 

A APIB denunciou também a transformação de instituições e políticas de Estado criadas para defesa de direitos dos povos indígenas em aparato voltado para a destruição e a perseguição destes. De acordo com a retrospectiva das ações da FUNAI sob o governo de Jair Bolsonaro, presentes nesta denúncia, o órgão implementou a “política anti-indígena do Presidente brasileiro, criando medidas administrativas com o objetivo de desproteger indígenas localizados em terras não homologadas, além de atos infralegais que facilitaram o acesso de terceiros às terras, bem como a completa paralisação dos processos demarcatórios”. E ainda, a APIB chama a atenção do Tribunal da Haia para a alteração constante no quadro de trabalhadores da fundação, que vem sendo ocupado por  funcionários abertamente contrários aos interesses dos povos indígenas. 

Yanomamis e Povos indígenas isolados e de recente contato são destaque

Nos últimos meses houve uma ampliação significativa da atividade garimpeira na Terra Indígena Yanomami, segundo relatório elaborado pela Hutukara Associação Yanomami e pela Associação Wanasseduume Ye’kwana. Estudos científicos demonstram que este aumento implica em mais desmatamento, contaminação e assoreamento de rios, aumento da contaminação por malária e mercúrio, o consequente aumento de doenças associadas, da desnutrição, e caos social. O garimpo atualmente é praticado com maquinário pesado, para extração em larga escala e, como a madeira, está integrado a cadeias globais de comércio. 

Jair M. Bolsonaro tem criado condições propícias e incentivado o ingresso às terras indígenas daqueles que fornecem aos povos os meios para que eles se exterminem. Os garimpeiros têm construído alianças com indígenas que agem em prol do garimpo, municiando-os com armas de fogo, modificando o caráter e as consequências de certos conflitos, a exemplo do que ocorreu nas comunidades Yanomami Tirei e Pixanehabi, em Abril.

Já as “portarias de restrição de uso” designadas pela Funai deveriam proibir a entrada de pessoas não autorizadas nos territórios onde se localizam povos indígenas isolados e de recente contato em territórios não demarcados. Era de costume de outros governos prever a validade da portaria por intervalos de no mínimo dois anos, dado se tratar de povos e territórios de difícil acesso e de interação negociada. No entanto, atualmente, o presidente dificulta a renovação dos instrumentos, reduz seus prazos para o insuficiente período de seis meses e, no caso da Terra Indígena Jacareúba/Katawixi (AM), vencida em 12 de dezembro de 2021, nem mesmo o renova. 

Desaparecimento do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips também é noticiado

O desaparecimento do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips no dia 05 de junho também foi noticiado. A Polícia Federal investiga o caso e, de acordo com seus próprios pronunciamentos públicos, no momento trabalha primordialmente com a hipótese de crime. A APIB ressaltou que este desaparecimento, a omissão estatal na realização das buscas e a possível ocorrência de um crime são efeitos da política anti-indígena de Jair Bolsonaro.

O documento entregue  em Haia se junta a outras Comunicações enviadas anteriormente por diversas instituições. Atualmente, os casos contra o Presidente Jair Bolsonaro referentes aos crimes praticados contra os povos indígenas estão em avaliação preliminar de jurisdição. Esta avaliação analisa se há uma base para sugerir que um crime relevante de competência do Tribunal Penal Internacional foi cometido. Trata-se da primeira de três etapas que integram o exame preliminar do Tribunal. Também será feita a análise sobre critérios de admissibilidade e se a investigação servirá aos interesses da justiça. Depois destas etapas, a Procuradoria do TPI poderá abrir oficialmente uma investigação e denunciar o presidente.