O movimento de extrema direita, organizado pelo agrobanditismo, chamado Invasão Zero assassinou a Pajé Nega Pataxó, após fazer um cerco à autodemarcação do Povo Pataxó Hã Hã Hãe no território indígena Caramuru-Catarina Paraguassu, município de Potiraguá, no Sul da Bahia, no domingo, 21/01. Exigindo justiça e coerção à organização paramilitar de fazendeiros, o departamento jurídico da Apib acionou a Procuradoria da República na Bahia, a Polícia Federal e o Ministério Público Federal através de uma notícia crime.

O documento denuncia “a prática de organização criminosa, uma vez que, (…) o grupo se associou por meio de entidade jurídica, de forma estruturada e com divisão de tarefas, valendo-se da violência, intimação, corrupção, fraude ou de outros meios assemelhados para cometer crime”.

Três lideranças indígenas Pataxó-hã-hã-hãe foram baleadas, durante a ação dos fazendeiros. O cacique Nailton foi atingido, duas pessoas foram espancadas, uma mulher teve o braço quebrado e um carro foi incendiado. Um vídeo mostra os feridos no chão, ainda sem socorro, sendo cercados pelo grupo paramilitar, que comemorava a violência.

A Polícia Militar da Bahia esteve presente no local, mas nada fez para proteger os indígenas. Ao contrário, segundo o relato do Cacique Nailton, a PM deu apoio e incentivo à ação criminosa mantida pelo grupo. “Os fazendeiros chegaram escoltados, porque chegou umas quinze viaturas e junto com os fazendeiros chegou umas cinco na frente”, conta a liderança, ainda hospitalizada.

O cacique relata que havia policiais reformados e à paisana entre o grupo. “Eu pedi ao comandante porque ele tinha condições de evitar que acontecesse um massacre. Falei para o comandante, tira a gente daqui, leva a gente para o hospital. E outro gritou de longe, acaba de matar”.

O tiro que matou Nega Pataxó partiu da arma de um filho de um dos fazendeiros presente no grupo de Whatsapp do Movimento Invasão Zero. Ele e um Policial Militar reformado, encontram-se presos pelo envolvimento no conflito.

Nega Pataxó era liderança espiritual e professora com importante atuação junto à juventude e às mulheres indígenas e, com seu irmão, integrava redes de saberes tradicionais de Universidades brasileiras, sendo doutora em Educação por Notório Saber pela UFMG, e o cacique Nailton, doutor por Notório Saber em Comunicação Social pela mesma universidade.

Milícia com CNPJ

O grupo “Invasão Zero” se constituiu como entidade privada registrada no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), no Estado da Bahia, em abril de 2023. Eles dizem articular 10 mil produtores rurais baianos em defesa da propriedade privada e contra as “invasões” de terras rurais e urbanas.

Os paramilitares são liderados por Renilda Maria Vitoria De Souza e Luiz Henrique Uaquim Da Silva, conhecidos, respectivamente, como Dida Souza e Luiz Uaquim. O grupo se projetou nacionalmente durante a CPI do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, (MST), articulando-se com parlamentares ruralistas e da extrema-direita.

Além da Bahia, os paramilitares estão articulados nos estados de Goiás, Pará e Mato Grosso desde o ano passado. Recentemente ruralistas do Maranhão, Espírito Santo e Tocantins adentraram na organização criminosa.

De acordo com a representação criminal, a atuação deles “toma forma de agrupamentos paramilitares de produtores rurais para retirar à força movimentos sociais que estão em ocupações rurais (MST) ou retomadas de territórios tradicionais (indígenas)”.

Entre os ruralistas e fascistas apoiadores dos criminosos estão o deputado federal Luiz Ovando (Progressistas/MS), o deputado federal Rodolfo Nogueira (PL/MS) o deputado federal Zucco (PL/RS), o governador de São Paulo Tarcísio de Freitas (Republicanos/SP), o governador de Goiás Ronaldo Caiado (União Brasil/Go) e o ex-presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que já responde perante ao Tribunal Penal Internacional (TPI) pelo genocídio contra os povos indígenas brasileiros entre 2018 e 2022.

Históricos de ataques e assassinatos

Há menos de um mês, em dezembro de 2023, o Cacique Lucas Pataxó, do mesmo povo e da mesma comunidade, foi assassinado enquanto retornava para a aldeia.

Em janeiro de 2023, os Pataxós Samuel Cristiano do Amor Divino, 21, e Nauí Brito de Jesus, 16, foram mortos a tiros no km 787, quando estavam a caminho de uma das retomadas do povo Pataxó, em Itabela.

Em abril, o Pataxó Hã-hã-hãe Daniel de Sousa Santos, 17 anos, foi morto dentro de uma área de reserva, também em Pau Brasil.

Em setembro de 2022, o adolescente Pataxó Gustavo Silva da Conceição, de apenas 14 anos, foi assassinado com um tiro na cabeça após ataque de pistoleiros a uma aldeia no território indígena Comexatibá, em Prado.

As testemunhas relataram que pelo menos cinco homens invadiram o local, portando armas calibre 12, 32, fuzil ponto 40 e bombas de gás lacrimogêneo. A participação de policiais militares nos ataques explica o acesso da organização paramilitar aos armamentos pesados.

A Apib fez reiteradas denúncias sobre a escalada de violência no sul da Bahia, sem obter respostas efetivas das autoridades. Esperamos que o Estado brasileiro faça valer as leis com devida seriedade, para responsabilizar perante a constituição e o código penal os envolvidos, respondendo por organização criminosa e incitação ao crime.

Os povos indígenas do Brasil não suportam mais mortes. Exigimos a demarcação das terras que são nossas por direito, a proteção dos territórios e da vida e a revogação da Lei do genocídio (Lei 14.701), fator primordial de incentivo à matança dos nossos povos no período mais recente.