26/jul/2024
Entre os dias 19 e 23 de julho de 2024, a Aldeia Kaí, situada na Terra Indígena Comexatibá, na Vila de Cumuruxatiba, município de Prado-BA, foi palco da terceira edição do evento “Consciência Negro Índio” e da primeira edição dos Jogos Estudantis Indígenas. Organizado pela Associação Indígena Pataxó e Escola Kijêtxawê Zabelê, o evento reuniu líderes, membros e apoiadores para fortalecer laços, compartilhar conhecimentos e celebrar a cultura originária. Participaram e prestigiaram o evento parentes Pataxó das Aldeias Renascer, Gurita, Dois Irmãos, Tibá, Pequi (Prado) e Pé do Monte e Aldeia Velha (Porto Seguro).

O evento começou com a cerimônia de abertura e ritual do Awê, uma celebração da cultura e educação Pataxó.
Foram realizadas palestras/rodas de conversas; desfile da resistência Negro Índio e arte Pataxó; apresentações musicais (Mipây’ré Pâx Suniatá’Xó, Forroxatiba, Edinho Caraíva, Os Severinos) e oficinas: pintura corporal Pataxó, entalhe e pirogravura e capoeira. As palestras/rodas de conversa foram facilitadas pelo professor Lucas Ledo, que abordou o tema “Cumuruxatiba: entre a história e a memória” e a professora Maria Geovanda Batista (UNEB), que refletiu sobre “Luta e Conscientização dos Direitos Negro e Indígena”. Grupos culturais da Vila de Cumuruxatiba também compareceram e se apresentaram no evento: Curumim Batuque, Maracatiba, Grupo da Puxada de Rede e Capoeira.

Jogos estudantis fizeram parte da programação do evento.
A primeira edição dos Jogos Estudantis Indígenas da Escola Kijêtxawê Zabelê foi realizada nos dois últimos dias do evento, com equipes representando os anexos e a sede da Escola: Aldeia Kaí, Renascer, Alegria Nova, Tibá, Monte Dourado e Dois Irmãos. Um importante momento de celebração, integração intergeracional e intercultural de valorização do hãmyá (ramiar), da cultura tradicional indígena e Pataxó.
Este evento revela-se como um marco na luta e valorização da aliança entre as comunidades indígenas e negras, muito além do território. Através dele, celebramos e rememoramos o encontro de nossos antepassados indígenas, negros, africanos, que no passado se encontraram nas senzalas, nos porões da escravidão e da colonização. Nele, celebramos e rememoramos as novas e velhas alianças, casamentos, lutas e resistência. Terminamos essa jornada exitosa com gosto de quero mais e, a promessa que outros virão.
25/jul/2024
Um juiz do Paraná, da 2ª Vara Federal de Umuarama, expediu um despacho proibindo a Funai de dar assistência ao povo Avá-Guarani, que está em processo de retomada nos municípios de Guaíra/Terra Roxa. A Funai entregaria kits de suprimentos contendo alimentos, água e itens de higiene básica para o povo.
De acordo com a decisão do juiz, o kit também conteria 7 rolos de lona e há ordem expressa para retirada das famílias da área de auto demarcação, por isso a entrega de materiais “vai contra o propósito de desocupação do imóvel”.
O acesso à água e alimentos, bem como o acesso à moradia, são direitos humanos básicos, invioláveis. Impedir os povos indígenas de receber a assistência da Funai é uma clara violação desse direito e um atestado de posicionamento político do juiz, em apoio aos fazendeiros invasores de terra indígena.
A posição do juiz está vinculada à outras investidas dos ruralistas dentro do Estado brasileiro para perseguir os povos indígenas, destruir direitos, exterminar os povos originários e ampliar a colonização sobre os territórios e os bens da natureza que protegemos.
A quantidade de ataques aos nossos direitos e à vida tem aumentado significativamente desde a aprovação da lei 14.701, baseada na tese jurídica inconstitucional do marco temporal. E a tentativa de alterar a constituição com a PEC 48, é mais uma investida do agronegócio neste enredo da morte, que reafirma o jogo sujo da expansão do capitalismo sobre nossas terras.
Não há futuro sem terras e povos indígenas!
22/jul/2024
“A constante tentativa de adoção da tese do Marco Temporal, teoria que contraria os compromissos internacionais de direitos humanos assumidos pelo Estado brasileiro (análise técnica) e cuja inconstitucionalidade foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal, gera insegurança jurídica e acirra ainda mais os conflitos fundiários no país, causando dano direto e irreparável aos Povos Indígenas. Garantir que as terras e territórios dos Povos Indígenas estejam reconhecidos, demarcados e protegidos é dever fundamental do Estado – composto por Executivo, Legislativo e Judiciário – para que eles possam desfrutar de todos os demais direitos”.
Esta foi a posição oficial de Jan Jarab, chefe da ONU Direitos Humanos para a América do Sul (CIDH), diante do retorno do debate da tese do Marco Temporal no Congresso brasileiro. A PEC 48 ou PEC da Morte busca descaracterizar o artigo 231 da Constituição Federal, mais especificamente o inciso 1º, que trata do direito originário dos povos indígenas às suas terras. A PEC altera uma cláusula pétrea da constituição.
No último dia 10/07, parlamentares da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal pediram vista coletiva à Proposta. “Reiteramos nossa preocupação sobre qualquer ação que possa enfraquecer ou relativizar a proteção dos direitos dos Povos Indígenas”, afirmou Jarab, em nota publicada no site da ONU.
Para a deputada indígena, Célia Xakriabá, o esforço e a celeridade para debater e aprovar a emenda é a comprovação de os deputados da bancada ruralistas tem plena consciência de que a lei 14.701, aprovada no ano passado, corrobora com uma tese que fere a constituição e por esse motivo, agora eles tentam alterar a constituição.
Ao mesmo tempo, as ações de contestação à lei, protocoladas no Supremo Tribunal Federal (STF), foram encaminhadas ao ministro Gilmar Mendes. O ministro conhecido publicamente por suas posições anti-indígenas, não seguiu o protocolo institucional sobre as ações diretas de inconstitucionalidade (ADI), ignorou as manifestações jurídicas da Apib e por fim, propôs uma câmara de conciliação sobre o caso.
Atropelo em benefício de fazendeiros
Em setembro de 2023, o STF formou maioria sobre a tese, atestando sua inconstitucionalidade. No mês seguinte o Congresso aprovou a lei do marco temporal, que recebeu o número 14.701/2023, ignorando os vetos do presidente Lula. Logo em seguida, o Senador Hiran Gonçalves, criou a PEC 48. A sequência dos fatos aponta para um orquestramento de ações arbitrárias, que manipulam a atuação do Estado para beneficiar interesses do agronegócio e de espoliadores dos bens naturais preservados nos territórios, como a madeira, minérios, água e a própria terra que dão continuidade ao projeto genocida bolsonarista.
A maioria dos senadores que deram seguimento aos trâmites da emenda são vinculados ao PL, à Frente Parlamentar de Agropecuária (FPA) e a partidos da base do ex-presidente.
São eles:
Senador Dr. Hiran (PP/RR)
Senadora Margareth Buzetti (PSD/MT)
Senador Sérgio Petecão (PSD/AC)
Senador Wilder Morais (PL/GO)
Senador Styvenson Valentim (PODEMOS/RN)
Senador Esperidião Amin (PP/SC)
Senador Luis Carlos Heinze (PP/RS)
Senador Hamilton Mourão (REPUBLICANOS/RS)
Senador Izalci Lucas (PSDB/DF)
Senador Mecias de Jesus (REPUBLICANOS/RR)
Senador Marcos do Val (PSDB/ES)
Senador Sergio Moro (UNIÃO/PR)
Senador Plínio Valério (PSDB/AM)
Senador Carlos Viana (PODEMOS/MG)
Senadora Tereza Cristina (PP/MS)
Senador Astronauta Marcos Pontes (PL/SP)
Senador Eduardo Girão (NOVO/CE)
Senador Marcio Bittar (UNIÃO/AC)
Senador Magno Malta (PL/ES)
Senador Jorge Seif (PL/SC)
Senador Chico Rodrigues (PSB/RR)
Senadora Damares Alves (REPUBLICANOS/DF)
Senadora Ivete da Silveira (MDB/SC)
Senador Flávio Bolsonaro (PL/RJ)
Senador Irajá (PSD/TO)
Senador Carlos Portinho (PL/RJ)
Senador Marcos Rogério (PL/RO)
Posição da Apib
Para a Apib, a câmara de conciliação criada por Gilmar Mendes é uma arbitrariedade. Reafirmamos que nossos direitos, conquistados constitucionalmente, não estão em negociação. Ao contrário do que atestam os ruralistas, é a proposta de lei que tramita atualmente, a grande responsável pela insegurança jurídica e pelo aumento substancial de ataques aos povos indígenas.
Somente nas últimas duas semanas, houve ataques em seis territórios e lideranças indígenas foram feridas, com a propagação das ações do grupo miliciano Invasão Zero. Ocorreram ataques armados na comunidade Pekuruty, no Rio Grande do Sul, do povo Guarani Mbya, na comunidade Guasu Guavirá, no Oeste do Paraná, do povo Avá-Guarani e na comunidade Tekora Kunumi Vera, pertencente a Terra Indígena Dourados-Amambaipeguá I, no Mato Grosso do Sul. Também registramos ataques na retomada Kaingang, Fág Nor, em Pontão, no Rio Grande do Sul, na T.I. Guasu Guavira, Tekoha Arapoty e Arakoé e na T.I. Panambi, em Douradina, no Mato Grosso do Sul.
18/jul/2024
Buripati Barbosa da Conceição, de apenas 24 anos, foi morto a tiros no sábado (13/07), na aldeia Guaxuma, localizada no Km 775 da BR-101, no município de Porto Seguro, Bahia. O autor confessou o crime e foi autuado em flagrante pela polícia.
O não indígena Maxuel Silva de Jesus, 28 anos, estava na aldeia em visita a sogra e encontrou Buripati durante uma confraternização no vizinho. Após uma breve conversa os dois se desentenderam, Maxuel sacou um revólver 38 e atirou à queima roupa.
A vítima, conhecida como “Caboquinho”, não teve chance de se defender. Maxsuel foi autuado por homicídio qualificado. Ele permanece preso na custódia da Polícia Civil de Itamaraju.
Território em conflito
Nos últimos 4 anos cerca de 15 indígenas foram assassinados, em crimes motivados por conflitos no território da Aldeia Mãe e pelo racismo. Além da intrusão de fazendeiros, que lucram sobre terras apropriadas ilegalmente com a produção agropecuária, o lobby do turismo no entorno de Caraíva e Porto Seguro, destinos vizinhos às aldeias, causam o aumento substancial do tráfico, alcoolismo e a deslegitimação dos modos de vida indígena.
“A guerra pela terra que começou em 1.500 nunca acabou. A cada dia os interesses econômicos que cercam e acoam as comunidades, violentam a paz e a sustentabilidade dos povos originários. Se o perigo de antigamente, nas matas, era a onça, hoje em dia são pistoleiros, fazendeiros, grileiros, madeireiros, traficantes e garimpeiros disputam, amedrontam e dominam as populações tradicionais, trazendo pânico, desespero aos silenciados, esquecidos e excluídos da sociedade. É perigoso caçar, é perigoso fachear (pescar) de noite e cada vez mais a sustentabilidade vai ficando ameaçada”, relatou uma das moradoras da Terra Indígena Barra Velha, que aguarda a revisão da demarcação e está ameaçada pelo Marco Temporal.
A cada omissão do Estado sobre os direitos dos povos indígenas e ataques da bancada ruralista sobre os direitos constitucionais conquistados, tais conflitos se acirram e a vida dos povos indígenas é ameaçada.
Enquanto o Senado tenta mudar a constituição para tornar admissível a lei do Marco Temporal, aprovada no Congresso no final do ano passado, os moradores originários das terras brasileiras são deslegitimados como cidadãos de direito, o que gera violências e mortes, como a de Buripati.
03/jul/2024
Uma mulher indígena grávida passou mal e morreu no Mato Grosso do Sul, depois de uma aplicação de agrotóxicos em propriedade vizinha à aldeia Jaguapiru, no dia 12 de março. Vários integrantes da mesma família também adoeceram. A gestante de dois meses chegou a ser hospitalizada, foi transferida de unidade de saúde, mas morreu no dia seguinte.
Após quatro dias de fiscalização nas terras indígenas Jaguapiru, Panambizinho e Guyraroká, localizadas nos municípios de Dourados e Caarapó, foi encontrado um galpão que armazenava 750 litros de agrotóxicos vencidos.
O Ministério Público Federal (MPF) suspeita de que a contaminação esteja relacionada ao aumento do cultivo de soja e milho na região. “No pedido feito aos órgãos e que resultou na ação de conscientização, o MPF salientou que a fiscalização se faz necessária diante do incremento das áreas destinadas ao plantio de lavouras comerciais nas terras indígenas, em especial de soja e milho, com impacto à saúde e ao meio ambiente das comunidades”, afirmou o órgão em nota à imprensa.
Em consequência, foram aplicadas multas no valor de 1 milhão de reais. A operação será feita novamente neste semestre “para monitorar o cumprimento das notificações emitidas em razão das irregularidades constatadas”.
As investigações apuraram que parte dos produtos agrícolas utilizados nas lavouras são adquiridos sem receitas agronômicas ou são contrabandeados do Paraguai. A operação envolveu o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas), Iagro/MS (Agência Estadual de Defesa Sanitária Animal e Vegetal) e contou com o apoio da PRF (Polícia Rodoviária Federal.
O uso intensivo de venenos agrícolas nas monoculturas do agronegócio são responsáveis por diversos tipos de doenças como câncer, depressão, lesões no fígado, pele, pulmão e alergias. Estima-se que cada brasileiro consuma cerca de 7 litros de veneno por ano.
O estado de Mato Grosso do Sul tem intensificado o uso. Entre 2007 e 2012, a taxa de consumo aumentou de 4,44 kg por hectare para 10,69 kg por hectare, sobre a mesma área de plantio. O MS também é um dos estados brasileiros com maior incidência de conflitos no campo relacionados à invasão das terras indígenas, em especial do povo Guarani e Kaiowá.
25/jun/2024
A Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS) da Câmara de Deputados aprovou o Projeto de Lei da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI).
O PL 4347/21 tem como objetivo garantir e promover a proteção, a recuperação, a conservação e o uso sustentável dos recursos naturais das terras e territórios indígenas, assegurando a integridade do patrimônio indígena, a melhoria da qualidade de vida e as condições plenas de reprodução física e cultural das atuais e futuras gerações dos povos indígenas, respeitando sua autonomia sociocultural.
Atualmente, a Política é regulamentada via decreto e transformá-la em lei é mais uma forma de garantir a proteção dos direitos e das vidas indígenas. Agora o PL segue para a análise da Comissão da Amazônia e Povos Originários. A presidência da Câmara determinou a apreciação conclusiva da casa no âmbito das comissões e se aprovada, irá direto para a revisão no Senado.
O departamento jurídico da Apib preparou uma nota técnica sobre a matéria no qual analisa três eixos de destaque na futura lei: Proteção Territorial e Recursos Naturais; Governança e Participação Indígena; e Capacitação, Formação, Intercâmbio e Educação Ambiental.
A nota do departamento jurídico destaca a necessidade de “garantia ao protagonismo e à autonomia sociocultural dos povos indígenas, com observância ao direito à consulta prévia, livre e informada, nos termos da Convenção nº 169 (OIT) e ao fortalecimento das organizações e da participação indígena na governança da PNGATI”.
Também ressalta a urgência de um pacto interinstitucional entre os povos indígenas e os poderes executivo, legislativo e judiciário para enfrentar a exploração de garimpo ilegal em Terras Indígenas na Amazônia brasileira, diante da sobreposição de rotas pelo tráfico de drogas, de madeira e da presença de organizações criminosas em todos os municípios de fronteira na região.
No terceiro eixo, o Projeto de Lei prevê a garantia de participação de homens e mulheres indígenas em espaços de tomada de decisão e de governança, uma garantia fundamental para que os povos indígenas do Brasil conquistem efetivamente sua “autodeterminação” e possam construir livremente o “desenvolvimento econômico, social e cultural” através do “autogoverno” em relação aos assuntos internos e locais, conservando suas próprias “instituições políticas, jurídicas, econômicas, sociais e culturais, sem prejuízo de participar da vida política, econômica, social e cultural do Estado brasileiro”.
Leia a nota completa aqui: Nota Técnica – PNGATI
25/jun/2024
Com o grito de “Sangue indígena LGBT, nenhuma gota a mais”, o encontro foi realizado dos dias 20 a 23 de junho, no CEPEGE, em Sidrolândia, Mato Grosso do Sul.
Com os objetivos de fortalecer a identidade e a auto-organização das LGBTQIA+ indígenas Guarani Kaiowá, promover a visibilidade e valorização da diversidade sexual e de gênero, criar um espaço seguro para diálogo e troca de experiências, e construir estratégias de autoproteção contra discriminação, esta é a primeira vez que os sujeitos e sujeitas da regional de base da Apib, Aty Guasu, se reúne para debater o tema.
O encontro também abordou a promoção da saúde integral e mental, contou com oficinas de formação sobre HIV/Aids e outras DSTs, articulou redes de apoio e advocacy, visando influenciar políticas públicas para garantir os direitos da população indígena LGBTQIA+.
O evento se configura como um marco na luta pela igualdade e pela visibilidade dos indígenas LGBTQIA+ Guarani Kaiowá. Através do diálogo intercultural, da construção de redes de apoio e da incidência política, buscando garantir os direitos e a dignidade da comunidade. A união e a mobilização social são essenciais para construir um futuro mais justo e inclusivo para todos os povos indígenas.
O encontro contou com a realização e articulação do Distrito Drag, MPI e MDHC. Apoio: UNPA, MS, FUNAI, CESE, UNAIDS, Embaixada da Nova Zelândia, CFP, DPU.
20/jun/2024
O levantamento feito pelo projeto MapBiomas sobre os níveis de desmatamento no Brasil em 2023 mostrou que as Terras Indígenas continuam sendo as áreas mais preservadas do país. De acordo com os dados da pesquisa, fomentada pelo Observatório do Clima, cerca de 90% das áreas degradadas ocorreu em menos de 1% das propriedades rurais, indicando que os maiores focos estão em grandes propriedades. 64% do total desmatado se localiza em áreas privadas e a agropecuária é responsável por 97% dessa devastação no Brasil.
Enquanto isso, as Terras Indígenas apresentaram 27% de redução na perda da vegetação nativa em relação ao ano passado e contabilizam apenas 1,1% do total de desmatamento no Brasil.
A novidade é que o Cerrado ultrapassou o bioma Amazônico no índice de desmatamento pela primeira vez. No Cerrado foram perdidos 3.042 hectares de vegetação nativa por dia. Enquanto na Amazônia, se contabilizou 1.245 hectares por dia ou cerca de 8 árvores por segundo. Os estados do Maranhão, Tocantins e Bahia são os mais devastados, correspondem a quase metade de todos os hectares.
O foco está na região chamada de Matopiba, onde estão os 10 municípios com maiores índices. O Matopiba é a região de fronteira entre os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, amplamente anunciada como nova fronteira do agronegócio.
Os conflitos relacionados ao território e meio ambiente no local não começaram no ano passado. O Maranhão, por exemplo, foi o estado brasileiro líder em número de hectares de fazendas sobrepostas a áreas de Terra Indígena e em assassinatos no campo em 2021.
Invasão e devastação em Terra Indígena
A Terra Indígena Porquinhos dos Canela-Apãnjekra está localizada no Matopiba, na área de maior incidência de desmatamento em território indígena, onde empresas e fazendeiros invadiram e constituíram latifúndios, registrados como propriedade durante o governo Bolsonaro. O que foi possibilitado pela Instrução Normativa nº 9/2020 da Funai, que liberou o registro no Sigef de imóveis rurais sobre terras indígenas em processo de demarcação.
A transnacional de origem chinesa e suíça, Syngenta, é dona de um quarto do mercado global de agrotóxicos e foi uma das invasoras desta TI. A empresa aparecia como dona, até 2021, da Fazenda Olho D’Água, no município de Fernando Falcão (MA), um imóvel de 900,87 hectares inteiramente sobreposto à área demarcada para ampliação da Terra Indígena Porquinhos dos Canela-Apãnjekrá*.
O território Memortumré e a TI Porquinhos dos Canela-Apãnjekra foram os territórios mais afetados pelo governo anti-indígena. Mais de 117 mil hectares de fazendas foram registradas nas duas TIs. Entre 2008 e 2021 foram devastados 34.131,81 hectares nas TIs Porquinhos dos Canela-Apãnjekra, Kanela Memortumré e Bacurizinho — as três em processo de reestudo para ampliação da demarcação original – o que totaliza 72% do desmatamento em TIs.
Marco Temporal gera desmatamento
A aprovação do Marco Temporal pelo congresso colocou em vigor a lei 14.701/23, que mesmo sendo inconstitucional, se tornou um obstáculo à demarcação da Terra Indígena Porquinhos dos Canela-Apãnjekra. Isso ampliou os conflitos locais e a devastação do bioma, visado para a produção de soja e a agropecuária.
Os dados apontam como a região do Matopiba vem sendo palco de uma disputa territorial entre o agronegócio e as populações originárias. O avanço do capital financeiro no campo sobre as Terra Indígena resulta em números de devastação a cada ano maiores. O lobby no Congresso para aprovação do Marco Temporal beneficiou os investidores das áreas sobrepostas e a lei atual se impõe como mais um obstáculo para o avanço da demarcação e a preservação do bioma Cerrado.
*Dados do relatório Os Invasores I, do De Olho nos Ruralistas.
14/jun/2024
O Projeto de Lei 1904/2024, que ficou conhecido como “PL da gravidez infantil”, está tramitando no Congresso e teve seu requerimento de urgência colocado em votação surpresa nesta quarta-feira (13) pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP).
Está assegurada na Constituição o direito ao aborto em casos de estupro, risco de morte da gestante e anencefalia do feto. Caso esse PL seja aprovado, o aborto após 22 semanas de gestação será equiparado a homicídio simples.
A cada 24 horas são registradas 124 denúncias de violência sexual infantil. Para cada quarto vítimas de violência sexual, três são crianças e adolescentes. Entre 2015 e 2021, de acordo com boletim produzido pelo Ministério da Saúde, houve mais de 200 mil casos de violência sexual contra crianças e adolescentes no Brasil. Em 68% desses casos o abusador está entre familiares ou pessoas próximas aos familiares das vítimas.
O PL da gravidez infantil inocenta o estuprador e criminaliza a vítima, dificultando o acesso ao direito de interromper a gravidez. “Nós repudiamos o PL 1904/24, porque estupro é inaceitável e imputar qualquer barreira à vítima de interromper essa gestação é violentar seus corpos mais uma vez”, afirma a carta.
LEIA O MANIFESTO COMPLETO
Nós mulheres indígenas, viemos nos manifestar sobre o Projeto de Lei 1904/24, que teve urgência aprovada nesta quarta-feira (13) na Câmara dos Deputados. O PL pretende fixar um teto para o aborto legal em 22 semanas, com punições penais severas imputadas à vítimas de estupros e penas inclusive aos profissionais da saúde que prestarem atendimentos.
Desde 1500 anos, nós, Corpos Territórios dos mais diversos biomas do país, tivemos nossos direitos violados e nossos corpos violentados. Hoje, no século XXI, aqueles que dizem representar o povo, mais uma vez nos violentam e pretendem encarcerar as vítimas.
Estes homens e mulheres que não sabem valor de gerar, do partejar, de criar e amar, tentam acabar com todo e qualquer direito digno de nós mulheres indígenas e não indígenas do Brasil.
A legislação atual prevê 3 tipos de procedimentos que são permitidos no país: gestação decorrente de estupro, risco a vida mulher e anencefalia, sem prazos.
Por isso, é imoral fixar um prazo para que a vítima consiga denunciar, ser acolhida e conseguir buscar ajuda médica para encerrar parte do processo da violência. É imoral também, condenar a vítima à PRISÃO, criminalizando as mulheres e meninas caso realize o procedimento.
Entendemos que é uma violência este PL 1904/24 e nós, enquanto mulheres indígenas não apoiamos qualquer tipo de abuso com nossas meninas e mulheres, é inaceitável que o estuprador seja julgado a
“PENAS que podem ser de 8 anos a 14 anos” de prisão e a vítima, que sofreu tamanha atrocidade, seja condenada a até 20 anos.
Nós repudiamos o PL 1904/24, porque estupro é inaceitável e imputar qualquer barreira à vítima de interromper essa gestação é violentar seus corpos mais uma vez.
Somos Guerreiras da Ancestralidade, defensoras dos direitos humanos, das causas ambientais e sociais, mas principalmente defensoras da vida, da vida das nossas meninas e mulheres vítimas de estupros.
Assinam esta carta manifesto:
ANMIGA, APIB e nossas organizações de base.
05/jun/2024
Oito ações em andamento no judiciário buscam anular o procedimento demarcatório do povo Tapeba, no Ceará. O argumento utilizado pelos fazendeiros, especuladores imobiliários e empresas autoras dos processos é a ausência de notificação pessoal dos interessados para participar do procedimento administrativo da demarcação da terra indígena.
Todos os processos foram indeferidos em primeira instância, no entanto, com a apelação eles chegaram à segunda instância. O Tribunal Regional Federal da 5ª Região determinou a anulação do procedimento demarcatório. E o Ministério Público Federal no estado seguiu o mesmo parecer. Ao mesmo tempo, o Tribunal vem concedendo reintegrações de posse em favor aos fazendeiros, sob a justificativa de que a Portaria Declaratória seria irrelevante e não autoriza o uso da “força”.
Os povos indígenas não foram ouvidos pelo tribunal estadual. A interferência da justiça em tais instâncias são arbitrariedades, visto que, o art. 109 inciso XI, 231 e 232 da constituição federal de 1988, determina que a justiça federal deve decidir sobre os interesses coletivos indígenas.
Marco Temporal
Processos como este vêm se multiplicando impulsionados pela aprovação da lei do marco temporal (14.701) no Congresso. Enquanto o STF não se posiciona novamente, declarando a violação da constituição pela lei, fazendeiros, mineradores, especuladores utilizam de suas influências econômicas e políticas nos Estados, para ameaçar e atacar os territórios indígenas.
A tese do marco temporal foi declarada inconstitucional por nove dos onze ministros do STF. No entanto, a relatoria da lei aprovada no legislativo está sob as mãos do Ministro Gilmar Mendes, publicamente conhecido por sua posição anti-indígena.
Defesa da Demarcação
A Funai entrou com dois recursos ao mesmo tempo: um no Superior Tribunal de Justiça e outro diretamente no Supremo Tribunal Federal. Atualmente os recursos encontram-se em análise de admissibilidade, ou seja, o TRF5 ainda vai dizer se cabe encaminhar os recursos para o STJ e STF.
Duas das reintegrações de posse estão sob o nome da empresa Mineração Água Suja Ltda e de uma fazendeira. Nestes casos, o mesmo tribunal determinou a imediata saída do povo Tapeba, com o argumento de que é irrelevante saber se a área tem abrangência da portaria declaratória. Isto porque, mesmo com a conclusão do processo demarcatório, não seria legítimo o desapossamento dos supostos proprietários por meio da força.
As decisões ainda estão vigentes e a Funai está se organizando para realizar a retirada referente a decisão de um processo, pois no outro houve a determinação de suspensão por 120 (cento e vinte) dias para conciliação.
A Defensoria Pública da União (DPU), então, ajuizou um processo chamado Suspensão de Tutela Provisória diretamente no Supremo Tribunal Federal, no intuito de anular as decisões de reintegração de posse. O processo aguarda a decisão do da Presidência do STF, ou seja, o Ministro Luís Roberto Barroso, que deve abarcar todos os processos envolvendo o Povo Tapeba.