Normativa da Funai que fragiliza proteção de terras indígenas está suspensa em 8 estados da União

Normativa da Funai que fragiliza proteção de terras indígenas está suspensa em 8 estados da União

O Ministério Público Federal (MPF) vem obtendo liminares na Justiça Federal que suspendem a Instrução Normativa 9, da Fundação Nacional do Índio (Funai), que alterou os critérios para a emissão de Declaração de Reconhecimento de Limites (DRL) por meio do Sistema de Gestão Fundiária (Sigef), gerido pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Com a instrução, proprietários ou possuidores de terras poderiam emitir a declaração para áreas dentro do limite de terras indígenas ainda não homologadas pelo governo federal brasileiro.

O MPF considera que a instrução viola direitos constitucionais dos povos indígenas, favorece a grilagem de terras públicas e agrava conflitos agrários. Ao todo, procuradores da República ajuizaram 28 ações judiciais na 1ª instância da Justiça Federal, pedindo a suspensão da IN 09, com 19 decisões judiciais favoráveis. Atualmente, a norma da Funai está suspensa por ordens judiciais em oito estados da Federação: Pará, Mato Grosso, Amazonas, Acre, Roraima, Rondônia, Bahia e Rio Grande do Sul, o que garante a proteção de mais da metade das terras indígenas brasileiras.

Em recursos à 2ª instância, o governo federal até agora conseguiu reverter três liminares no Mato Grosso do Sul e suspender duas, em Santa Catarina e no Ceará. Duas liminares foram negadas, nas subseções judiciárias de Dourados (MS) e Foz do Iguaçu (PR), e o MPF aguarda decisão sobre recursos nesses dois casos. Das 28 ações civis públicas ajuizadas sobre o tema em todo o país, seis ainda estão pendentes de apreciação, em Belém (PA), São Luís (MA), Carazinho (RS), Vilhena e Ji-Paraná (RO) e São Paulo (SP). Quatro das liminares deferidas já foram confirmadas por sentenças, em Santarém (PA) e Castanhal (PA), Rio Branco (AC) e Boa Vista (RR). Em uma das ações judiciais iniciadas pelo MPF, em Belo Horizonte (MG), houve declínio de competência.

O MPF sustenta nas ações judiciais que a IN 09/2020 contraria o caráter originário do direito dos indígenas às suas terras e a natureza declaratória do ato de demarcação; cria indevida precedência da propriedade privada sobre as terras indígenas, em flagrante ofensa à Constituição; representa indevido retrocesso na proteção socioambiental; incentiva a grilagem de terras e os conflitos fundiários; entre outros problemas. As decisões judiciais obtidas determinam a manutenção das áreas indígenas ainda não homologadas no Sistema de Gestão Fundiária (Sigef) e no Sistema do Cadastro Ambiental Rural (Sicar).

Teor das decisões – Os juízes federais que concederam liminares ao MPF têm apontado o desrespeito da IN 09 ao texto constitucional e a subversão da missão institucional da Funai. Em uma das sentenças, exarada no Pará, a Justiça assinala que “a Funai, de forma pouco usual, adota uma retórica em prol dos não índios, o que causa certa estranheza em razão de seu dever de garantir o cumprimento da política indigenista (artigo 1º, lei nº. 5.371/1967)”

Para a Justiça Federal, ao permitir que particulares recebessem declarações de propriedade sobre áreas já caracterizadas como terras indígenas, a Funai utilizou-se de sua própria “ineficiência” em concluir os processos de demarcação “para onerar os povos tradicionais, retirando deles a segurança jurídica de alcançar o direito originário às terras ocupadas por eles, por meio da homologação, o que lhes é garantido pela Constituição Federal”.

“A instrução normativa da Funai não resolve o problema original enfrentado pelos indígenas no Brasil nem o dos possuidores de lotes rurais, lentidão no processo de demarcação de terra indígena, pelo contrário, com a justificativa de proteger o direito de propriedade de particulares, fere o direito originário de posse dos índios. Ainda transfere o ônus da ineficiência para os povos indígenas”, diz uma das decisões.

Atuação coordenada – Desde a publicação da IN 09/2020, o MPF defende que a regulamentação ameaça os direitos territoriais dos indígenas. Em abril de 2020, 49 procuradoras e procuradores da República de 23 estados assinaram recomendação que foi encaminhada ao presidente da Funai para que o ato administrativo fosse anulado. Com a negativa da Funai em cumprir a recomendação, o MPF precisou recorrer ao poder Judiciário.

Para o MPF a norma é inconstitucional, ilegal e contraria a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a Declaração das Nações Unidas Sobre os Direitos dos Povos Indígenas e a posição do Supremo Tribunal Federal (STF). Além disso, a instrução normativa afetaria, além das populações indígenas, os particulares de boa-fé que adquiram terrenos nas áreas em processo de demarcação, gerando falsa expectativa sobre a propriedade e insegurança jurídica.

Levantamento feito Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do MPF (6CCR/MPF) em junho do ano passado constatou que há quase 10 mil propriedades sobrepostas a terras indígenas que estão em diferentes fases de regularização ou em áreas com restrição de uso. O estudo foi encaminhado a procuradores da República em todo o país e subsidia a atuação no combate à grilagem e aos crimes ambientais em terras indígenas, bem como às violações dos direitos humanos desses povos.

A pesquisa foi feita pela Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise da Procuradoria-Geral da República, a pedido da 6CCR, e considerou dados extraídos do Sistema do Cadastro Ambiental Rural, vinculado ao Serviço Florestal Brasileiro, no período de 21 a 31 de maio de 2020. Ao todo, foram identificados 9.901 registros de propriedades no CAR cujos limites coincidem com territórios indígenas ou com restrição de uso, ou seja, áreas interditadas pela Funai para proteção de povos indígenas isolados, com o estabelecimento de restrição de ingresso e trânsito de terceiros.

Segundo a investigação, o estado com o maior número de imóveis rurais localizados em terras destinadas a povos indígenas é o Pará, com 2.325 registros. Desse total, 1.290 propriedades estão situadas dentro de terras indígenas em processo de regularização e 1.035 em áreas com restrição de uso. Em seguida, aparece o estado de Rondônia, onde foram identificados 1.385 registros de imóveis rurais sobrepostos a áreas indígenas, sendo 1.345 referentes a terras indígenas e 40 a áreas com restrição de uso. No Amazonas, são 1.163 propriedades irregulares registradas no CAR, uma vez que 524 estão dentro de terras indígenas e outras 639 em áreas interditadas para proteção de povos isolados.

Via:  Ministério Público Federal

A Luta da mulher Guarani na defesa dos territórios

A Luta da mulher Guarani na defesa dos territórios

Nós, Kunhangue de Santa Catarina, de 20 tekoa, reunidas nos dias 27 a 31 de julho de 2021 na Tekoa Pira Rupa – Palhoça/SC, compartilhamos histórias de vida, saberes, choros, abraços, risos e cuidados. Escolhemos a carta como ‘um jeitinho bom’ de contar o que aconteceu para aquelas que não puderam estar presentes em nosso encontro, sendo está apenas um dos resultados, pois a maioria deles ficaram gravados em nossos corações, e para os outros, convidamos a todos vocês para nos ajudar a cultivar. Nestes dias, falamos e ouvimos sobre a importância das Kunhangue no dia-a-dia no território, tivemos os momentos sensíveis para relatos das ainda atuais violências que sentimos, e finalizamos com a força milenar da cura e saúde das mulheres, o kunhangue reko.

Iniciamos discutimos sobre a força e as dificuldades das mulheres que são chefes de família, ouvindo as histórias de vida de muitas guerreiras de nosso povo que no cotidiano vem sendo responsáveis por um dos momentos mais sagradas de nossa vida, o momento de nossa alimentação – tanto de nossos corpos quanto nossos espíritos. Afirmamos a problemática das entradas de alimentos industrializados em nossas tekoas, e relatamos como elas tem afligindo nossa saúde e na nossa vida como ser humano a nossa forma de relação comunitária com os alimentos.

Queremos viver bem, com muito mborayu e saúde! Os fundamentos de nosso encontro foram os aconselhamentos com nossas xejaryi, no aprender ouvindo e também fazendo as boas práticas de alimentação, cuidado e resguardo, sobre nossos remédios e curas. Como essas práticas são essenciais para as gestantes e para as crianças, são base para todos nós e nossos territórios.

Saudamos as parteiras, das mitãjaryi, e agradecemos a vida e o trabalho que essas médicas tradicionais realizam. Esse foi um dos temas que trouxeram relatos dolorosos, de como nossas jovens e mães têm sido desrespeitadas em seus momentos de parir. Um dos pontos principais levantados foi o pedido de que as nossas placentas sejam tratadas com os nossos rituais de entregarmos ela para a Terra para que permaneçam nas tekoa, pois assim nossos filhos se tornam jovens e adultos conectados com nosso território, pois permanecem conectados através da placenta e cordão umbilical e com isso capazes de defender nosso povo, o nhandereko. É muito importante que o sistema de saúde que nos atende entenda e respeite as nosso modo de ser.

Nós mulheres Guarani carregamos os conhecimentos milenares sobre a Mata Atlântica e as sementes. Na Tekoa Pira Rupa lembramos que temos remédio, força e sabedoria de sobra. Fizemos uma busca das medicinas da região e pudemos coletar remédio para todos os tipos de doença e males e juntas cozinhamos nosso alimento sagrado que são medicinas para cura do nosso corpo e do nosso espírito. Com o riso solto, fizemos os chás para benzimentos e banhos com as ervas medicinais. Era um cheiro de aromas espalhados no encontro, e a cura estava sendo feita não só dos nossos corpos, mas também na nossa memória. Coletamos nossas medicinas na mata, contando e ouvindo sobre o poder de cada erva medicinal, preparamos o avaxi ku’i, mbojape, kaguijy, entre outros alimentos e lembramos dos nossos avôs, nossas avós, lembramos das histórias que vão sendo contadas, do que faziam antigamente, e assim vamos nos curando, vamos ficando melhores.

Não podemos perder o conhecimento que as xejaryi estão trazendo, para que sirva de alimento, para o que sirva de remédio. Lembrando também que não são todas as mulheres que sabem por exemplo benzer, mas entre nós, sabemos que isso existem mulheres que tem essa licença para fazer a cura. Esse conhecimento é o mínimo que precisamos ter para cuidar e manter. Precisamos disso para que o nhandereko não se perca no futuro. Estamos em uma guerra para que nosso conhecimento, o conhecimento da mulher guarani não seja apagado, desprezado, assediado.

Sabemos que dar essa importância significa também trazer os homens conosco nessa busca. Precisamos lutar juntos para que nosso direito à saúde exista respeitando o nhandereko, o kunhangue reko, sem nunca esquecer das necessidades das mulheres e crianças. Então, decidimos que no final do encontro, escreveremos juntas um documento para a SESAI e outras autoridades, fazendo essa cobrança. Precisamos que o sistema de saúde juruá, nos escute e nos respeite, para isso, precisamos também do apoio dos homens de nossas tekoa, para que levem essas urgências trazidas pelas mulheres para todas as discussões das quais eles participam para discutir política de saúde, seja com SESAI Funai e outras instituições juruá, seja mesmo entre eles da Comissão nhemongueta e outros grupos de caciques.

Temos falado sobre os muitos tipos de violência que nos fazem sofrer, e sempre confirmamos a importância do diálogo entre as mulheres com os homens e seus filhos e filhas. Discutimos sobre como podemos criar esses espaços de fala e entendimento, sem julgamento. Não queremos também que os homens sofram, queremos nos cuidar juntos, fazer juntos nossa luta, andando lado a lado. Não queremos andar atrás. Queremos que as mulheres da comunidade tenham mais participação nas organizações e conselhos, para que que olhem mais para nós todas.
A luta contra a cultura da violência às mulheres, e a importância de reverter este triste quadro que se estende as gerações foi também um dos grandes desafios que tiramos neste encontro. Foi reafirmado por todas que o modo de vida original nhanderu criou a mulher para ser companheira dos homens, não sendo cultural e espiritual a violência contra as mulheres, tema que muitas vezes é ultilizada até no meio jurista erroneamente para defender o abuso e violência contra as mulheres, trazida pelo homem branco, e defender abusadores. Alegando ser cultural, um dos exemplos: os estupros. Não aceitamos mais nada que nós façamos sofrer e sentir dor seja ela física ou psicológica.

As mulheres desde 1500 foram linha de frente na resistência do modo de vida Guarani desde da proteção dos territórios, crianças e vulneráveis à ataques feitos pelos Juruá desde a invasão dos territórios. Foi relatado sobre a cultura juruá machista dentro das aldeias, quando se naturaliza a violência e abuso das mulheres. Foi refletido que um determinado momento o respeito tradicional entre homens e mulheres, ensinado desde criança, foi transgredido, sendo inserido uma ideologia de abusos contra as meninas e mulheres mais novas. A importância da atividade foi direcionar as mulheres que a violência contra a mulher não é algo normal, não é do Nhandereko, principalmente para as mulheres lutar, acompanhar e reverter esses casos dentro das comunidades.

Saímos das atividades fortalecidas para poder se firmar juntas e com as outras parentes das aldeias a denúncia e a luta contra a violência às mulheres. Não precisamos que nos deem voz: nós já temos, precisamos que nos deem ouvidos! Nossos encaminhamentos são: (” porque atrás de um grande homem, existe uma grande mulher”)
Vamos desconstruir as linguagens da inferiorização das mulheres. Vamos desvendar as lendas. Nossa visão de futuro é que ao lado de um grande homem estejam as grandes mulheres. A avós, as mães, as companheiras, as filhas e netas.

1• Realizar um documento direcionado a SESAI feito pela comissão guarani yvyrupa, exigindo para que os hospitais preservem placentas e outras partes do corpo para ser retornado à os territóriospara realização dos trabalhos sagrados da cultura.
2• Foi apontada a importância de valorizar as parteiras tradicionais, ter um espaço para poder realizar os partos nas aldeias e a formação de novas parteiras.
3• Na questão da alimentação,
O diálogo da sesai com as comunidades e hospitais para quando a mulher ter o bebê nos hospitais, que atenda essa dieta do resguardo com alimentação específica para seu resguardo.
4* Que seja contratada mulheres com conhecimentos nutricionistas para poder gerir e atuar na questão alimentar e resgatar os alimentos tradicionais muito importantes para saúde de todas as comunidades do povo Guarani.
5• Que a SESAI contrate agentes de saúde guarani com a entendimento de cura. Para todas as aldeias que ainda não tem agentes feminino.
6* pedimos para seja paritária a participação das kunhangue dentro do controle social de saúde e da gestão da saúde, seja ela dentro dos conselhos locais ou dentro da sesai.

Incentivamos e fortalecemos umas às outras para fazer outros encontros como esse em suas tekoa. Porque falar sobre as nossas vidas, da gestão dos nosso territórios e da manutenção das políticas públicas e nós kunhangue somos donas e gestoras dessas grandezas.

Somos Yvyrupa.

Aguyjevete para quem não bate, não estupra e não humilha.
Demarcação já!

COMISSÃO GUARANI YVYRUPA
Kunhangue Nhemboaty
I Encontro Estadual de Mulheres Guarani
Santa Catarinak

Dois meses após início de conflitos, garimpeiros voltam a atacar indígenas na Terra Yanomami

Dois meses após início de conflitos, garimpeiros voltam a atacar indígenas na Terra Yanomami

Foto:Bruno Kelly

Garimpeiros em três embarcações voltaram a atacar indígenas da comunidade de Palimiú, que vive uma série de ataques desde 10 de maio, na Terra Yanomami, em Roraima.

O novo ataque aconteceu no sábado (24), mas a informação foi divulgada na quinta-feira (29) pelo Conselho de Saúde Indígena Yanomami e Ye’kuanna (Condisi-YY).

Um ofício assinado no último dia 27, pelo presidente do Condisi-YY, Júnior Hekurari Yanomami, informa que servidores do Distrito de Saúde Indígena Yanomami (Dsei-Y) e da Fundação Nacional do Índio (Funai) estavam no local e precisaram fugir durante o ataque.

Na quarta-feira (28) um indígena morreu ao ser atropelado por um avião de garimpeiros em uma pista na comunidade Homoxi. O jovem indigena tinha 25 anos e se chamava Edgar Yanomami. O atropelamento foi por volta de 14h30.

A reportagem procurou a Funai para saber se os servidores foram feridos e se uma nova equipe será enviada à região e, aguarda reposta.

“Os garimpeiros ameaçaram que vão entrar na comunidade, matar todos e queimar. Até mandaram recado para os Yanomami, por outro subgrupo, que eles têm que deixar a comunidade, senão vão vir com todo mundo. Vão atacar com mais de 100, 200 homens. O assunto é muito preocupante. O governo tem que fazer a barreira urgente na comunidade Palimiú, para não acontecer algo grave”, comenta Hekurari.

A região fica às margens do rio Uraricoera, em Alto Alegre, Norte de Roraima, e é rota usada por garimpeiros que entram ilegalmente na Terra Yanomami. No primeiro ataque, em maio, invasores à bordo de um barco, abriram fogo contra a comunidade Palimiú, próxima à Walomapi, e a partir daí houve uma sucessão de conflitos.

Em 14 de junho, o Ministério da Justiça autorizou o uso da Força Nacional na região. Mas de acordo Júnior Yanomami, os quatro agentes que estavam em Palimiú, voltaram para Boa Vista.

Segundo o coordenador do D-sei Y, Rômulo Pinheiro, que recebeu o documento do Condisi-YY, há informações que no dia do ataque, os garimpeiros tentaram resgatar um bote. Ele pede que os órgãos de segurança se manifestem, pois além dos indígenas, há também risco para os profissionais de saúde.

“D-sei Yanomami faz saúde, não faz segurança. Da mesma forma que os indígenas se encontram preocupados, com esse sentimento de insegurança, a equipe de saúde também. A equipe estava lá. Estamos fazendo atendimentos. Não abandonamos. No entanto, fazendo saúde, não fazendo segurança. Assim que possível, encaminho outra equipe de saúde, desde que haja segurança. Não somente para os indígenas, mas para os profissionais de saúde”, disse Pinheiro.

O documento com a denúncia foi endereçado à Polícia Federal. O chefe da Delegacia de Repressão a Crime Ambientais, delegado Gilberto Kirsch, disse que os trabalhos da corporação na região de Palimiú, seguem em andamento. Pois as ações da PF não são de caráter ostensivo, mas de investigação.

“Um pouco antes desse ataque, inclusive, uma equipe da PF, esteve na região de Palimiú, conversou com as lideranças da localidade e explicou o papel da Polícia Federal, que em nenhum momento deixa de atuar na região. Como é uma investigação em andamento, nós não podemos abrir aquilo que está sendo feito, até por uma questão de segurança e efetividade da medida a ser tomada”, disse o delegado.

O ofício também foi encaminhado ao Ministério Público Federal (MPF). Ao G1 o órgão informou que recebeu o documento e deu início à apuração. “Assim que forem ouvidos os envolvidos, o MPF definirá as medidas cabíveis”, complementou em nota.

Maior reserva indígena do Brasil, a Terra Yanomami tem quase 10 milhões de hectares entre os estados de Roraima e Amazonas. Cerca de 27 mil indígenas vivem na região, alvo de garimpeiros que invadem a terra em busca da extração ilegal de ouro.

Em 2020, o ano da pandemia, o garimpo ilegal avançou 30% na Terra Yanomami. Só o rio Uraricoera concentra 52% de todo o dano causado pela atividade ilegal.

A invasão garimpeira causa a contaminação dos rios e degradação da floresta, o que reflete na saúde dos Yanomami, principalmente crianças, que enfrentam a desnutrição por conta do escasseamento dos alimentos.

Em 24 de maio, uma decisão do Supremo Tribunal Federal ordenou que o governo federal adotasse medidas para proteger a Terra Yanomami. Antes, uma outra medida judicial determinou o envio de efetivo armado para que ficasse de forma permanente em Palimiú.

Via: G1 Roraima – Rede Amazônica

Funai organiza expedição para localizar isolados após pressão política de evangélicos

Funai organiza expedição para localizar isolados após pressão política de evangélicos

 

A Funai (Fundação Nacional do Índio) está levando adiante um plano de localização de indígenas em contexto de isolamento na terra Ituna-Itatá, no Pará, o que preocupa indigenistas e contraria recomendações do MPF (Ministério Público Federal) e do CNDH (Conselho Nacional de Direitos Humanos).

A portaria que interditou a área tem prazo de validade até janeiro próximo, quando precisa ser reeditada pelo governo federal por mais três anos. Se a Funai declarar que supostamente não localizou os indígenas, isso poderá ser usado pelos adversários políticos da terra indígena para questionar a interdição da área. Por outro lado, um contato pode levar doenças e colocar em risco a vida do grupo isolado, ainda mais no contexto da pandemia do coronavírus.

O país tem hoje 114 registros de indígenas em contexto de isolamento em diversos estados, mas não há notícia de outras expedições com a envergadura da que está sendo organizada para Ituna-Itatá.

A Funai elaborou um processo administrativo com mais de 70 páginas cujo assunto é “Plano de localização de índios isolados (registro no 110- Igarapé Ipiaçava), Terra Indígena Ituna-Itatá”.

Em 13 de abril último, o presidente da Funai, o delegado da Polícia Federal Marcelo Xavier, assinou um despacho pelo qual aprovou o plano de trabalho e um cronograma para a ação que ganhou o nome de “Expedição Locus”. Ele escreveu sobre “a necessidade de concluir sobre a existência ou não de indígenas isolados na referida área”.

Uma tabela produzida pela Funai mostra que a operação primeiramente seria desencadeada em quatro etapas entre o final de 2020 e o início de 2021 ao custo preliminar de R$ 200 mil. O plano foi adiado no ano passado mas, segundo apurou a coluna, já foi retomado.

A Terra Indígena Ituna-Itatá, com cerca de 142 mil hectares, é localizada nos municípios de Altamira e Senador José Porfírio, ambas no Pará. Ela foi interditada pela primeira vez em 2011, já que a proteção a indígenas isolados na região era um dos condicionantes para a licença de construção da usina hidrelétrica de Belo Monte. A cada três anos, a portaria de interdição precisa ser renovada.

As invasões na terra indígena recrudesceram nos últimos anos e o desmatamento atingiu “níveis alarmantes” a partir de 2016, segundo um relatório da Funai, levando o local ao “ranking das terras indígenas mais desmatadas do Brasil em 2019”. Naquele ano, primeiro do governo de Jair Bolsonaro, a terra indígena “passa a ser a terra indígena mais desmatada do país”, com aumento de 700% na taxa de desmatamento em um ano. Em 2020, foi desmatada uma área equivalente a mil campos de futebol.

A interdição da área, contudo, é alvo de pressões de políticos do Pará. Em setembro de 2019, o senador e pastor evangélico Zequinha Marinho (PSC-PA) encaminhou uma carta ao então ministro-chefe da Segov (Secretaria de Governo) da Presidência da República, o general da reserva Luiz Eduardo Ramos. Ele chamou de “grave equívoco” a portaria que, em janeiro de 2019, reeditou a interdição da terra Ituna- Itatá por mais três anos e pediu a anulação da decisão.

Senador pediu expedição para localizar os isolados

Na carta, senador pediu que fosse realizado “um levantamento in loco na região para constatar a existência, ou não, desses índios, que até hoje ninguém daquelas localidades conheceram”. A Funai deu à sua operação o nome de “Locus” (lugar específico), que lembra a expressão in loco usada pelo senador.

Meses depois da carta, o senador gravou um vídeo de apoio a garimpeiros ilegais do Pará que protestavam contra uma operação doIbama que reprimia crimes ambientais no Estado.

Em nota à coluna do UOL em novembro de 2020, o senador afirmou que “caso seja comprovada a existência de índios isolados, aquela área será corretamente decretada como Terra Indígena, caso não se comprove a existência de indígenas, a terra deverá ser finalmente desbloqueada, amenizando os conflitos rurais na região”.

Em novembro passado, depois que o UOL revelou que a Funai trabalhava com a possibilidade de reduzir a Ituna-Itatá quase à metade, o MPF de Altamira (PA) recomendou que o órgão se abstivesse de realizar qualquer operação de localização de indígenas isolados na região. A paralisação, segundo o MPF, deveria durar até que o governo federal providenciasse a retirada de invasores, madeireiros e grileiros e a regularização fundiária da área.

Na mesma época, a organização não governamental OPI (Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato) divulgou um relatório de 81 páginas que revelou a “movimentações de atores públicos para a redução da Terra Indígena Ituna-Itatá”. A OPI procurou o MPF.

No relatório, a OPI manifestou preocupação sobre operação de localização de isolados, ainda mais no contexto da pandemia do coronavírus. “As informações levantadas pela equipe da Frente de Proteção Etnoambiental do Médio Xingu formam um conjunto coerente sobre a presença dos isolados, tanto do ponto de vista geográfico (mobilidade através de um corredor situado nas cabeceiras dos igarapés) como do ponto de vista histórico (relação das informações recentes com os registros historiográficos sobre a ocupação indígena)”, aponta o relatório.
Em maio último, o CNDH (Conselho Nacional dos Direitos Humanos) aprovou um relatório pelo qual recomendou à Funai “abster-se de dar prosseguimento nas atividades de localização dos indígenas isolados da TI Ituna/Itatá até que todos os invasores da Área de Restrição de Uso sejam retirados, promovendo a integridade física e territorial dos isolados e garantindo a segurança mínima necessária para a atuação da equipe de campo da Funai”.

Em resposta de dezembro de 2020 à recomendação do MPF, o diretor do DPT (Departamento de Proteção Territorial) da Funai, Cesar Augusto Martinez, respondeu que “não caberia, em nosso entendimento, falar em processo de desintrusão da TI Ituna-Itatá, por ser esse um procedimento posterior à homologação do território devidamente identificado como de ocupação tradicional de povo ou grupo indígena isolado”.

No ofício, Martinez disse ainda ao MPF que entendia “ser essencial que a Funai mantenha a realização da Expedição de Localização, uma vez que se trata de trabalho cuja continuidade e aprofundamento se configura como único mecanismo possível para a efetiva verificação da possível existência de indígenas isolados na TI Ituna-Itatá, partindo, claramente, do pressuposto de garantia de condições de segurança não só pela Funai, mas pelo Estado brasileiro e suas forças de segurança”.

Funai diz que expedições “têm caráter reservado”

Em nota enviada à coluna nesta quinta-feira (29), a Funai disse que, “por meio de sua Coordenação-Geral de Índios Isolados e de Recente Contato (CGIIRC), vem realizando, periodicamente e de forma sistematizada, expedições para esclarecer e consolidar com provas (positivas ou negativas) os registros de índios isolados, bem como realizar o monitoramento e proteção das áreas onde existem tais registros”.

Indagada se recebeu pedidos da Presidência da República ou do senador Zequinha Marinho para realizar a expedição, a Funai respondeu: “Como as expedições têm caráter reservado, visando à proteção de tais comunidades indígenas, a Funai não informa as datas nem o local de sua realização. A fundação esclarece ainda que as expedições são planejadas e realizadas pela CGRIIC com base em critérios técnicos, e jamais por solicitação ou a pedido de terceiros”.

“Com relação às medidas de prevenção ao coronavírus, a Funai esclarece que, na execução dos trabalhos, cumpre todos os protocolos de saúde necessários e estabelecidos pelos órgãos sanitários. Cabe ressaltar também que a Funai, dentro dos limites legais, atende a todas as recomendações do Ministério Público Federal”,  afirmou a nota.

Via Coluna – Rubens Valente do Portal de Noticiais UOL 

 

URGENTE: Indígena Yanomami morre ao ser atropelado por avião de garimpeiros no meio da floresta

URGENTE: Indígena Yanomami morre ao ser atropelado por avião de garimpeiros no meio da floresta

Um indígena morreu ao ser atropelado por um avião de garimpeiros em uma pista na comunidade Homoxi, Terra Indígena Yanomami, em Roraima. A afirmação é do presidente do Conselho de Saúde Indígena Yanomami e Ye’kuanna (Condisi-YY), Júnior Hekurari Yanomami, que, nesta sexta-feira (30), comunicou as autoridades sobre o caso.

A vítima tinha 25 anos e se chamava Edgar Yanomami. O atropelamento foi por volta de 14h30 de quarta-feira (28), informou Hekurari. O jovem indígena morreu na hora. Depois do acidente, pousou no local uma segunda aeronave que foi apreendida pelos indígenas.

Segundo o presidente da Condisi-YY, Homoxi é uma comunidade que foi cercada pelo garimpo ilegal na região, de forma que indígenas vivem no meio dos invasores.

Segundo relatos feitos ao Condisi-YY, após o acidente, os próprios garimpeiros levaram o corpo de Edgar para a comunidade Yamasipiu, região de Haxiu, distante cerca de 15 Km de onde ocorreu o atropelamento.

A pista onde ocorreu o atropelamento foi aberta no meio da floresta por volta de 1980 por garimpeiros. Hoje em dia, ela também é usada pela Sesai para levar servidores que atuam no posto da comunidade.

Um ofício relatando a morte do jovem e cobrando providências, feito pelo Condisi-YY, foi enviado à Polícia Federal, Frente de Proteção Etnoambiental Yanomami e Ye’kuana da Fundação Nacional do Índio (Funai), Polícia Civil, Ministério Público Federal, Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami e Secretaria Especial de Saúde Indígena – subordinados ao Ministério da Saúde.

Procurada, a Polícia Civil informou ao G1 Roraima que não foi registrado boletim de ocorrência e o Instituto Médico Legal (IML) também não foi acionado para remover o corpo. 

Indígenas que vivem em Homoxi disseram que os garimpeiros ainda tentaram suborná-los com ouro para que eles não divulgassem nada sobre o atropelamento.

“Ele foi atropelado 14h30 e disseram que umas 15h20 eles levaram o corpo de helicóptero. Os garimpeiros falaram para os yanomami não denunciar e deram ouro para a família dele. Eu vi o ouro, mas não tinha como tirar foto. Tinham muitos garimpeiros armados no local”, disse Hekurari, acrescentando que os invasores circulam normalmente entre os indígenas que vivem em Homoxi.

Ainda conforme Hekurari, os indígenas e os próprios garimpeiros contaram que o corpo, junto com a esposa e os três filhos da vítima, foi retirado da comunidade em um helicóptero dos garimpeiros. Depois do acidente, um outro avião de pequeno porte pousou na pista e foi retido pelos indígenas. O piloto fugiu.

“O pessoal segurou esse avião pensando que era ele de novo [o piloto] pousando e está lá, retido. Furaram os pneus”, disse. Hekurari identificou que havia manchas de sangue na pista onde ocorreu ao atropelamento.

Durante o tempo em que esteve em Homoxi, Hekurari disse ter notado que o movimento de garimpeiros é intenso na localidade. “Homoxi é uma comunidade que fica dentro do garimpo. Quer dizer, destruíram a comunidade [com a invasão garimpeira]”, disse.

“Enquanto estive lá, vi uns 10 ou 11 helicóptero pousando. […] Os garimpeiros controlam a pista. Antes de descer, demos muitas voltas até liberarem a pista “, afirmou o presidente do Condisi-YY.

Em Homoxi vivem cerca de 254 yanomami. A comunidade é uma das três citadas na denúncia feita pelo Condisi-YY de que servidores da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), ligada ao Ministério da Saúde, vacinaram garimpeiros em troca de ouro. O Ministério da Saúde e o Ministério Público Federal (MPF) investigam.

Maior reserva indígena do Brasil, a Terra Yanomami tem quase 10 milhões de hectares entre os estados de Roraima e Amazonas, e parte da Venezuela. Cerca de 27 mil indígenas vivem na região em mais de 360 comunidades.

A área é alvo do garimpo ilegal de ouro desde a década de 1980. Mas, nos últimos anos, essa busca pelo minério se intensificou, causando além de conflitos armados, a degradação da floresta e ameaça a saúde dos indígenas.

A invasão garimpeira causa a contaminação dos rios e degradação da floresta, o que reflete na saúde dos Yanomami, principalmente crianças, que enfrentam a desnutrição por conta do escasseamento dos alimentos.

O número de casos de Covid entre indígenas que habitam a região, aumentou em razão da presença de garimpeiros. No ano passado, em apenas três meses, as infecções avançaram 250%.

Via: G1 Roraima – Rede Amazônica

Governo Bolsonaro denunciado na ONU por violência contra indígenas

Governo Bolsonaro denunciado na ONU por violência contra indígenas

Documento encaminhado ao Itamaraty em 28 de maio, e só tornado público esta semana, cobra o governo de Jair Bolsonaro a dar explicações sobre o aumento da violência contra os povos Yanomami e Munduruku. A carta é assinada por oito relatores especiais da ONU e alerta para a existência de uma preocupação internacional sobre o que “aparenta ser violações de normas e padrões internacionais”. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e associações indígenas de base têm buscado denunciar e mobilizar instâncias do internacionais para a proteção dos povos indígenas em situação mais vulnerável.

Entre as preocupações listadas na carta estão os ataques contra a Associação de Mulheres Wakoborun, em Jacareacanga (PA), os ataques contra a Terra Indígena Yanomami (RR), a contaminação pelo mercúrio de terras indígenas e o projeto de lei 191/2020, que regulariza a mineração nas reservas. O envio de uma carta conjunta entre um número elevado de relatores da ONU revela a dimensão da preocupação que hoje o Brasil gera na comunidade internacional. No sistema eletrônico da organização, não consta qualquer resposta por parte da diplomacia brasileira. “As alegações aparentam ser, prima facie, violações de normas e padrões internacionais de direitos humanos”, dizem os oito relatores que assinam a denúncia. Entre as leis violadas estaria ao do direito à vida, argumento similar ao apresentado na ADPF 709 (Arguição por Descumprimento de Preceito Fundamental).

Na carta, os relatores pedem que o governo explique o que tem feito para evitar essa violência e os ataques contra indígenas. Além disso, pedem para que as autoridades expliquem como têm lutado contra o garimpo. Brasília também é cobrada sobre a ação do governo para lidar com o desmatamento, a covid-19 em terras indígenas e saúde da população local. Ataques Um dos casos destacados é do garimpo na bacia do Tapajós, no Pará. De acordo com a carta, o Ministério Público Federal foi alertado sobre invasões por conta da exploração de ouro e o potencial confronto entre indígenas e a mineração ilegal. “Mas nenhuma proteção efetiva foi garantida até hoje”, escreveram.

As preocupações presentes na carta dos relatores da ONU estão também na ADPF 709, ajuizada em julho de 2020 pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e por seis partidos, visando à adoção de providências no combate à epidemia da Covid-19 entre a população indígena. Em maio de 2021, foi apresentado pedido de tutela provisória antecipada com base nos relatos de ataques a tiros a indígenas, mortes, desnutrição, anemia, contágio por mercúrio, desmatamento e garimpo ilegal, bem como a prática de ilícitos de toda ordem decorrentes da presença de invasores nas terras indígenas durante a pandemia. Na peça, sustentaram também que a presença de invasores é responsável pelo contágio das comunidades por Covid-19, e pediram o deferimento da medida para assegurar a vida, a saúde e a segurança desses povos no contexto da crise sanitária.

A carta dos relatores da ONU indica como os grupos indígenas têm se organizado de maneira própria para se defender da invasão de garimpeiros, inclusive criando patrulhas, destruindo pontes construídas por invasores e removendo do local máquinas usadas pelo garimpo. Segundo eles, porém, esse grupo enfrenta “ameaças e intimidação”. Diversos incidentes são relatados no documento, entre eles a ação de homens armados que impediram que indígenas desembarcassem de seus barcos em seus próprios territórios. Das 3,7 mil minas de ouro abertas na região do Tapajós desde 2014, um quarto ocorre em áreas protegidas onde a mineração é proibida pela Constituição. Só nas terras do povo Munduruku, são 422 minas ilegais. Mas, entre 2017 e 2019, houve um aumento de 239% no garimpo ilegal em sua região. Em maio de 2021 uma ação da Polícia Federal aumentou a tensão na região.

O documento também aponta como, em junho de 2020, procuradores recomendaram a ação da Polícia Federal. Mas o monitoramento, dois meses depois, teria sido interrompido pelo Ministério da Defesa. Outro ataque destacado na carta ocorreu contra a Associação das Mulheres Munduruku Wakoborũn, em março de 2021. Garimpeiros invadiram o local e colocaram fogo em documentos e escritórios da entidade. A Associação, segundo os relatores, tem sido ativa no monitoramento das invasões de terras indígenas. O documento ainda denuncia como as atividades ilegais dos garimpeiros ainda contaminam com mercúrio os rios locais e afeta a sobrevivência de comunidades. No território Sawré Muybu, testes realizados em três aldeias apontaram que 58% da população apresentava níveis inaceitáveis de mercúrio no sangue.

Os ataques contra grupos Yanomamis, intensificados desde o mês de maio também estão presentes no documento, com destaque para o ataque de 11 de maio, quando policiais que investigavam invasões foram alvo de disparos direcionados contra a comunidade indígena. No dia 16 de maio, mais um ataque de garimpeiros, dessa vez com o uso de 15 barcos e bombas de gás conta a comunidade Palimiu.

“Pesquisas indicam que as atividades de garimpeiros se intensificaram desde 2020, diante do aumento de 30% de aumento da degredado ambiental na região”, afirma o documento. A atuação de milhares de garimpeiros ilegais ocasiona sérios impactos sócio-econômicos, contaminação e proliferação da covid-19.

Outra preocupação da ONU se refere ao projeto de Lei 191 que libera a mineração em terras indígenas. O que chama a atenção dos relatores é de que, ainda que a proposta preveja a “consulta” de grupos indígenas, eles não teriam o poder de vetar. Mais de 863 mil quilômetros quadrados de florestas poderiam ser afetadas. Há ainda a preocupação de que isso pode se transformar em estopim para conflitos de terra, expondo grupos indígenas à violência, mais contaminação e doenças. “Além disso, impacto ambiental substancial devem ser esperados, tal como desmatamento, perda de biodiversidade e contaminação de solos e rios”, completam os relatores.

 

Com informações da coluna de Jamil Chade no UOL, publicada em 28/07/2021: https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2021/07/28/onu-denuncia-escalada-de-violencia-contra-indigenas-nos-anos-bolsonaro.htm

Ferrogrão é modelo de retrocesso na Amazônia

Ferrogrão é modelo de retrocesso na Amazônia

Ferrovia EF-170 MT/PA impactará 48 áreas protegidas, entre terras indígenas e unidades de conservação, e pode fazer o Brasil renunciar à convenções internacionais 

Por Juliana Arini

O direito de ser ouvido antes de um grande projeto de infraestrutura ser construído, novamente, torna-se uma questão para povos indígenas e populações tradicionais da Amazônia. Desta vez, as comunidades contestam o projeto de uma ferrovia: a Ferrogrão ou EF-170 MT/PA.  Projetada para percorrer mil quilômetros entre Itaituba, no Pará, e Sinop, no Mato Grosso, a ferrovia ligará o porto de Miritituba (PA) à maior região produtora de grãos do país, o nortão mato-grossense.

O governo federal afirma que, mesmo sem consulta, o leilão da obra deve acontecer até outubro de 2021. Com 933 km de extensão, a ferrovia está estimada pelo governo federal em  R$ 21,5  bilhões de investimentos ao longo da concessão.  A Ferrogrão, tal qual obras que foram leiloadas e licenciadas sem oitivas aos indígenas como a Hidrelétrica de Belo Monte no Pará, é justificada pelo discurso de prioridade para a economia do Brasil. A redução de custos com o frete das safras é o argumento dos defensores. 

Para ser leiloada no prazo previsto pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), a obra exigirá mudanças na legislação brasileira. A primeira destas modificações  já aconteceu depois da aprovação da lei nº 13.452/2016, que ampliou  a faixa de domínio da Rodovia BR-163, a Cuiabá (MT) e Santarém (PA). Esta alteração foi  feita para estabelecimento do traçado da ferrovia.  

“Ao ser proposta dentro das faixas de domínio da BR-163, os proponentes do projeto afirmam que a ferrovia não trará mais impactos, uma vez que não irá alterar o que já foi alterado pela estrada. O que é altamente contestável. Outro ponto é que o projeto se auto intitula um investimento verde, mas não há muitas explicações no projeto sobre isso”, afirma Paulo Zahan Taques, advogado do Instituto Antônio Augusto de Leverger (IAAL), uma das entidades que contesta a ausência de oitivas aos povos impactados.  

Recentemente, o governo federal  busca registrar a Ferrogrão como uma obra que evitará emissões de até 77% de CO2 no transporte da safra de grãos. Caso isso ocorra, será possível inclusive vender crédito de carbono com o projeto.  Porém, no cálculo apresentado pelo governo federal não está contabilizado  o aumento do desmatamento em decorrência da Ferrogão,   que será, justamente, nos dois dos estados  que representam mais de 61,89% do que foi desmatado na Amazônia em 2020, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

 A segunda modificação proposta para possibilitar a construção da Ferrogrão segue  em análise no Supremo Tribunal Federal (STF). A Medida Provisória 758/216 prevê a redução do Parque Nacional do Jamanxim, no Pará, que fica em uma região líder em queimadas e desmatamentos, segundo o Imazon. Em março, o ministro do STF, Alexandre de Moraes,  suspendeu a Lei 13.452/17, originada da MP, que excluía 862 hectares do parque. A decisão final será votada no plenário do STF. Nesta decisão também segue suspenso todo o licenciamento da ferrovia.

 Outro possível impacto  da Ferrogrão pode afetar o direito dos povos e comunidades tradicionais do país todo. . ​​A construção da ferrovia  pode ser um dos propulsores para o Brasil abandonar a Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho (OIT). O artigo 60 deste acordo internacional, do qual o país é signatário desde 2002, prevê a  obrigação de realizar consultas prévias, livres e informadas com povos indígenas e demais populações tradicionais afetadas por qualquer projeto, seja do Legislativo ou do Executivo.

 Tramita no Congresso Nacional o projeto de lei  177/2021, quepropõe que o Brasil deixe de ser signatário da  a Convenção 169. O PL está para análise na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados. De autoria do deputado federal Alceu Moreira (MDB – RS), a proposta permite que o presidente Jair Bolsonaro abandone a Convenção 169 da OIT.  

Se o PL não for aprovado, a adesão do Brasil à Convenção segue automática  até setembro de 2032, quando novamente  poderá ser revista. Se for aprovado, os indígenas e demais populações tradicionais, como os quilombolas, perdem voz nas decisões sobre a ferrovia e outros projetos que possam ser propostos e afetem seus territórios ou direitos.

 O Ministério Público Federal divulgou uma nota sobre   a possibilidade do país deixar a Convenção em junho.  “A eventual saída do Brasil da Convenção 169 da OIT só demonstraria a nossa incapacidade de lidar com a diversidade que sempre foi uma das nossas principais características como nação. É dizer: ao invés de dialogar com os nossos povos tradicionais, vamos simplesmente calá-los”. A afirmação foi feita pela coordenadora da Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal (6CCR/MPF), Eliana Torelly, durante um webinário no qual foi discutida a importância do tratado internacional para a defesa dos direitos das comunidades tradicionais brasileiras. O evento – promovido pelo MPF em parceria com a Associação Brasileira de Antropologia (ABA) – teve como foco o debate sobre a tramitação do projeto de lei  que pretende autorizar o presidente da República a retirar o Brasil do rol de nações que fazem parte da Convenção 169.A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e a Associação Nacional dos Procuradores e Procuradoras do Trabalho (ANPT), entidades que congregam e representam os Procuradores e as Procuradoras da República e do Trabalho de todo o país, publicaram nota técnica contra a aprovação do PDL. 

No dia 15 de agosto, uma delegação internacional chega ao Brasil  para pressionar contra a construção da Ferrogrão. A comitiva é ligada à Internacional Progressista, entidade criada no ano passado pelo senador americano Bernie Sanders e pelo ex-ministro das Finanças da Grécia Yanis Varoufakis, e que reúne políticos, ativistas e celebridades de diferentes países.

Consultas prévias, livres e informadas

O direito de ser ouvido e comunicado sobre os impactos  é a principal demanda dos povos indígenas em relação à Ferrogrão. Ao  menos cinco nações indígenas reivindicam oitivas, como os povos Munduruku, Kayapó, Apiacá, Terena e Panará. Eles alertam que a ferrovia pode afetar 49 terras protegidas, entre indígenas e unidades de conservação. O impacto  mais grave é o aumento do desmatamento na Amazônia. Se forem considerados os impactos sinérgicos da construção de novos portos fluviais, terminais de navegação e silos, essa pressão sobre a Amazônia e o Cerrado aumenta.

 Áreas protegidas são fundamentais para a conservação de floresta, segundo estudo da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, publicado em junho de 2021, “Povos Tradicionais e Biodiversidade: Contribuições dos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais para a biodiversidade, políticas e ameaças”. O artigo dos pesquisadores Antonio Oviedo, do Instituto Socioambiental (ISA), e Juan Doblas, do Inpe, mostra que as terras indígenas são os territórios tradicionais que mais preservam a floresta: apenas 2% da cobertura foi perdida em 33 anos. 

 A luta para que o direito a consulta seja respeitado  fez a Ferrovia EF-170 MT/PA  ser um dos temas dos protestos indígenas, que aconteceram em Brasília durante o Levante pela Terra, encontro que durou até o dia 20 de julho e reuniu etnias de todo o Brasil. A Ferrogrão também motivou  reuniões entre caciques e representantes dos três poderes.  

“Não é apenas uma ferrovia, pois abre precedentes para discutir a necessidade de se ouvir os indígenas  e trás junto a necessidade de novas hidrelétricas para gerar a energia que o agronegócio demanda. Eles também não estão discutindo os impactos de mais silos de grãos, desmatamento e a pressão por mineração nas terras indígenas e no entorno.”, diz Alessandra Munduruku, liderança do território mais próximo da área onde será o terminal final da Ferrogrão, em Itaituba, no Pará.  

  “Mas  não vamos desistir dos nossos direitos. Nos reunimos com os ministros do Tribunal de Contas da União e do Supremo Tribunal Federal . Temos esperança de que a lei e os acordos internacionais dos quais o Brasil faz parte não serão desrespeitados”, diz.

 Outro lado 

Agência Nacional de Transportes  Terrestres (ANTT), a proponente da Ferrogrão, defende que as consultas aos indígenas já aconteceram. “É preciso lembrar que a ANTT realizou a Audiência Pública nº 14 de 2017 para que a população e interessados em geral, como um todo, pudessem se manifestar. As sessões públicas presenciais sobre a Ferrogrão foram realizadas em Cuiabá/MT, Belém/PA, Brasília/DF, Itaituba/PA e Novo Progresso/PA, com a presença e a participação efetiva de diversas lideranças indígenas. Durante a audiência pública mencionada foram ouvidas as etnias do Parque Indígena do Xingu, Munduruku, Kayapó, além de outras, tanto nas sessões públicas presenciais da Audiência Pública como em reuniões privadas na ANTT, em Brasília”, respondeu os representantes da ANTT, através de sua assessoria.

 “Esse é o problema. Eles acreditam que as audiências são consultas e não é o que diz a lei. Eles deveriam ter realizado visitas aos territórios indígenas. As audiências nem aconteceram, nós protestamos quando descobrimos que muitos não poderiam participar. E mesmo assim eles disseram, em 2019, que o processo tinha acontecido.”, diz o cacique Francisco Munduruku. “Na época nem o traçado da Ferrovia foi apresentado”, conclui.

 A ANTT assume que as informações transmitidas na audiência pública estavam incompletas.  “À época da audiência ocorrida, não se dispunha de informações concretas para se delimitar quais Terras Indígenas seriam impactadas e, com a maturação desse traçado, foi possível realizar as plotagens e assim determinar quais Terras Indígenas teriam a presunção de serem afetadas. Sobre esse assunto, cabe esclarecer que a delimitação dos povos indígenas participantes do processo de licenciamento ambiental é definido pelos parâmetros da Portaria Interministerial MMA/MC/MJ/MS nº 060/2015, a partir de provocação do órgão licenciador, e encontra-se especificada no Termo de Referência Específico (TRE) da Ferrovia, expedido pela Fundação Nacional do Índio (Funai) à Empresa de Planejamento e Logística (EPL), em setembro de 2019.”, afirma a assessoria da ANTT em nota à reportagem.

 Para a ANTT, nem as terras indígenas que estão a menos de 40 quilômetros do  traçado dos trilhos serão incluídas no licenciamento ambiental da obra. “Com as informações disponíveis até o momento no processo de licenciamento ambiental, não se presume a ocorrência de afetação às terras indígenas Baú e Menkragnoti, do povo Caiapó, que, segundo análise cartográfica oficial realizada pela Funai (Informação Técnica nº 110/2020/COTRAM/CGLIC/DPDS-FUNAI), estão distantes, respectivamente, 29,91 km e  47,7 km da Ferrogrão.”, diz a nota da Agência.

 Os povos que reivindicam o direito à consulta afirmam que o anúncio da Ferrogrão já traz impactos. Desde que começou a ser debatido o projeto, o fluxo de caminhões nas estradas que contornam as aldeias teria duplicado. “Eu imagino quando liberarem esse trem. Toda soja que vem da região de Querência (MT) pelo Xingu vai acabar aqui pela MT-322. Da forma como esta hoje muitos animais já morreram atropelados. Isso também acaba incentivando os produtores a arrendar sítios, e com isso vem os pesticidas e queimadas. E isso tudo sempre impacta nosso território. É isso que precisamos debater.”, reivindica Messias Clemente Rondon, liderança do povo Terena.

 Lembranças de horror

Os Terena, originalmente do Mato Grosso do Sul, têm uma história marcada pelos planos nacionais de infraestrutura. A abertura de grandes fazendas e estradas em seus territórios ancestrais os relegou à condição de “povos sem terra” por mais de vinte anos. Eles acabaram perdendo suas terras para esses empreendimentos.

 Depois de um processo contra o governo federal, o povo Terena ganhou uma indenização (ainda não paga) de 2 mil hectares de terras demarcadas, em outro estado e bioma, no Norte de Mato Grosso. É nesse novo território, vizinho à área Caiapó e Panará, que eles aguardam com apreensão os desdobramentos sobre a Ferrogrão.

 Os Caiapó discordam da ANTT sobre as oitivas e impactos. Em agosto de 2020, um grupo Caiapó parou a BR-163, na altura de Novo Progresso (PA), em protesto contra a ferrovia. Foram cinco dias até que a Advocacia Geral da União (AGU) entrasse com um pedido à Polícia Federal para retirada dos indígenas da rodovia.

 “Nossa terra é a mais próxima do trilho e o estudo diz que não vai impactar. Basta olhar e lembrar da história da BR-163 e ver as plantações de soja que já estão beirando a reserva. Imagina com essa Ferrogrão. Já tem agrotóxico matando todos os nossos peixes. Depois desse projeto, os empresários vão vir com mais força e cortar mais floresta.  Precisamos ser ouvidos sobre os problemas que já existem e os que ainda irão aparecer.”, reclama Mydjere Kayapó, presidente do Instituto Kabu, organização que reúne 11 aldeias das terras indígenas Baú e Mekrãgnotire. 

 Segundo as lideranças, há cinco anos os Caiapó tentam debater a Ferrogrão. Em de 2017, o povo Caiapó Mekragnotire enviou um ofício ao Ministério de Transportes, Portos e Aviação Civil solicitando participarem da consulta. Em março de 2021, após descobrirem que a ANTT pediu ao TCU liberação do leilão, novamente uma comitiva indígena visitou Brasília. O grupo formado pelos líderes Munduruku e Caiapó foi recebido pelo ministro Aroldo Cedraz,  relator do processo sobre o leilão da Ferrogrão, e pela  ministra Ana Arraes, presidente do TCU. 

 Atualmente, o TCU e o STF são as instâncias que irão definir o futuro da Ferrogrão.  Segundo resposta da assessoria do tribunal , dois processos correm sobre a EF-170, ambos de relatoria do ministro Aroldo Cedraz. “O TC 037.044/2020-6 tem por objeto uma representação do Ministério Público Federal acerca de possíveis violações de direitos de povos indígenas no projeto da Estrada de Ferro EF -170 (Ferrogrão). O relator, ministro Aroldo Cedraz, ouvirá o Ministério Público junto ao TCU antes de se pronunciar nos autos. Já no TC 025.756/2020-6 o Tribunal vai analisar a Concessão da EF-170 (Ferrogrão)”, explicou em nota à reportagem.

 Nenhum dos processos teve decisão do TCU publicada até o fechamento desta reportagem.

 Outros impactos

Além dos indígenas, pescadores e moradores das cidades por onde os trilhos irão passar contestam o projeto. A ação movida pelo IAAL tem como foco grande parte dos povos indígenas e das comunidades tradicionais impactadas, entre estes os Caiapó de Mato Grosso, Apyaká, Panará, Terena e a colônia de pescadores Z53 do Pará, entre outros.  “Além do impacto nas comunidades, muitos locais de importância histórica e cultural serão literalmente rasgados pelos trilhos”, explica o representante jurídico do IAAL, Paulo Taques. 

Em maio, o Ministério Público Federal também publicou um pedido reforçando a necessidade das oitivas. 

 Pró-ferrovia

A obra segue movimentando polêmicas. Apesar de tantas vozes contrárias, a Ferrogrão conta com um defensor de peso, o presidente Jair Bolsonaro e membros do primeiro escalão do governo. No início de junho, o ministro da infraestrutura, Tarcísio de Freitas, declarou durante o Fórum Brasil de Investimentos 2021 que tem segurança jurídica para leiloar a ferrovia.

“[A Ferrogrão] Tem o poder de jogar a tarifa para baixo e tornar os nossos produtores extremamente competitivos em relação aos nossos pares ao redor do mundo. E a ferrovia faz sentido porque vai atender um estado que vai produzir em 9 anos 120 milhões de toneladas de grãos por ano. Quando nós começamos a estruturar esse projeto o Mato Grosso produzia 50 milhões de toneladas, hoje produz 70 [milhões de toneladas] três anos depois”, afirmou. 

O projeto

A ferrovia AEF-170/MT/PA, a Ferrogrão – como foi denominada pelo grupo Estação da Luz Participações Ltda (EDLP), proponente dos estudos, integra o Programa de Parcerias de Investimento e a criação do novo corredor ferroviário de exportação do Brasil pelo Arco Norte. A proposta é fazer a conexão do Porto de Miritituba, em Itaituba, no Pará, com Sinop, em Mato Grosso, percorrendo 933 quilômetros com trilhos.  

Estão previstos, também, o ramal de Santarenzinho, entre Itaituba e Santarenzinho, no município de Rurópolis/PA, com 32 km, e o ramal de Itapacurá, com 11 km. 

 Segundo a ANTT, o investimento público previsto é de R$ 6,2 bilhões, deste montante o investimento para custos socioambientais seriam de R$ 756 milhões, o que inclui obtenção de licenças e compensações socioambientais.

 Juliana Arini é jornalista

 

COIAB DENUNCIA SERVIDOR DA FUNAI POR INCITAR GENOCÍDIO

COIAB DENUNCIA SERVIDOR DA FUNAI POR INCITAR GENOCÍDIO

Mediante ao ataque de ódio do tenente Henry Charlles aos povos isolados, advogados indígenas entraram com requerimento nesta quinta-feira (22) na 6º Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal (MPF)
Nesta quinta-feira, 22 de julho, por meio de uma notícia publicada no jornal “Folha de São Paulo”, chegou ao conhecimento da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), um áudio do Coordenador da Coordenação Regional (CR) Vale do Javari, da Fundação Nacional do Índio (Funai), no Amazonas, o tenente da reserva do exército Henry Charlles Lima da Silva, onde claramente incita terceiros a atentarem contra a vida e integridade física dos indígenas que vivem em isolamento naquela região. Além de incitar terceiros a atacarem os povos indígenas isolados, o servidor do órgão indigenista se coloca à disposição para abrir fogo contra os isolados. Segundo o áudio, cuja a autenticidade foi apurada pela reportagem, o representado disse: “Eu vou entrar em contato com o pessoal da Frente [de Proteção Etnoambiental] e pressionar: ‘Vocês têm de cuidar dos índios isolados, porque senão eu vou, junto com os marubos, meter fogo nos isolados’”, disse durante uma reunião na aldeia Paulinho, em 23 de junho deste ano. Diante do ocorrido, nossos advogados indígenas entraram com requerimento nesta quinta-feira (22) na 6º Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal (MPF), para instauração de inquérito para apurar o cometimento de crime de genocídio contra povos isolados, para determinar o afastamento imediato de Henry Charlles Lima da Silva da sua função de Coordenador Regional da Funai no Vale do Javari. Um mês e meio atrás, a Funai acusava o movimento indígena de furar a quarentena ao tentar resolver um conflito que estava latente na região do Vale do Javari. Na gravação que circulou nesta quinta-feira (22) na imprensa e nas redes sociais, ficou claro que o coordenador regional, responsável Terra Indígena Vale do Javari, além de não ter cumprido a quarentena para participar da reunião, sugeriu “meter fogo” nos Korubo para resolver uma situação de iminência de conflito que se desenrola desde o final do ano passado. A fala do gestor público reflete uma situação muito grave: revela a posição genocida e anti-indígena desta nova gestão da Funai e, além disso, demonstra um posicionamento inaceitável em qualquer situação, pois incita um povo indígena contra outro, agravando uma situação que já estava tensa. Em outro momento do áudio, o servidor demonstra sua completa ignorância dos temas indigenistas, pois parece não saber que os indígenas isolados são povos que não estabelecem contatos esporádicos com outros grupos (indígenas ou não), vivendo de forma autônoma, e sem a necessidade de receberem cestas básicas. O gestor público afirma que entregará cestas básicas para um povo indígena isolado. Uma situação totalmente inadmissível! Sabemos que não é o caso, porque o coordenador deve ter feito confusão com os Korubo de recente contato. O que mais uma vez reflete a desarticulação existente na gestão daquele território, pois o coordenador regional deveria apoiar as atividades das Frentes de Proteção Etnoambiental, que normalmente tem vários cuidados na relação mantida com os povos sob sua atenção, evitando interferências e influências que possam comprometer a autonomia desses povos. Assim, a COIAB se soma às manifestações da Organização das Aldeias Marubo do Rio Ituí (OAMI) e da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (UNIVAJA), que já se posicionaram contra essa incitação de violência promovida por um servidor do órgão indigenista que deveria proteger a vida dos povos indígenas e daqueles que optaram por viver sem contato com as sociedades nacionais na floresta.
Manaus, Amazonas, 23 de julho de 2021. Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB).

Veja a nota na íntegra : Coiab denuncia

 

Lideranças Marubo divulgam carta de repúdio contra coordenador da Funai no Vale do Javari

Lideranças Marubo divulgam carta de repúdio contra coordenador da Funai no Vale do Javari

Henry Charlles, tenente de reserva do Exército, ameaçou e incentivou indígenas do Povo Marubo a “meter fogo” em indígenas isolados da região

Após divulgação de um áudio do Coordenador da Coordenação Regional (CR) Vale do Javari, da Fundação Nacional do Índio (Funai), o tenente da reserva do Exército Henry Charlles Lima da Silva, onde ameaça “meter fogo” em indígenas isolados da região, a Organização das Aldeias Marubo do Rio Itui (OAMI) divulgou uma carta de repúdio contra o coordenador onde afirma que “o extermínio nunca será a solução” e denuncia o descaso do órgão com os povos indígenas.

A ameaça aos indígenas isolados por meio de áudio foi obtida e divulgada pelo jornal Folha De São Paulo nesta quinta-feira (22). Segundo a matéria, o coordenador encorajou líderes do Povo Marubo a disparar contra indígenas isolados caso eles fossem “importunados” por eles. A imprensa confirmou a veracidade dos áudios.

Em carta assinada pela diretoria da OAMI, as lideranças explicam que a política interna do Povo Marubo é proteger toda coletividade que habita o Vale do Javari.

“A orientação de guerra declarada pelo atual Coordenador da CR-Vale do Javari não será processada em nossas mentes, pois temos ciência que o Javari é um território compartilhado por distintos povos, e a nossa maior guerra é combater o descaso e a inoperância da Funai. E a arma que os povos indígenas usam é o diálogo”, destaca a carta.

A diretoria da OAMI cobra ainda que “o mesmo entusiasmo declarado pelo Coordenador da CR do Vale do Javari fosse usado para combater a invasão de nosso território pelos madeireiros, caçadores, narcotraficantes que usam nosso território para suas práticas ilícitas”.

Sobre um sequestro de uma mulher da aldeia dos Marubo por indígenas isolados ocorrido há pouco mais de 15 dias, a OAMI afirma no documento que “por inúmeras vezes” informou a coordenação regional do Vale do Javari e à Frente de Proteção Etnoamabiental, sobre a presença de índios isolados próximo às aldeias do Alto Rio Ituí, porém a morosidade institucional não permitiu o pronto atendimento das demandas em pauta.

“Infelizmente, nossos argumentos sobre o assunto não foram recepcionados pelos órgãos indigenista como prioridade, e, somente após o ocorrido no dia 07/06/2021 (quando os índios isolados levaram uma mulher da aldeia Paulinho) foi que a Coordenação Regional Vale do Javari/Funai, resolveu acreditar”, afirma a diretoria no documento.

Confiram o documento na íntegra aqui.

Associações de procuradores emitem nota conjunta contra PDL que pode retirar Brasil de convenção que protege povos indígenas

Associações de procuradores emitem nota conjunta contra PDL que pode retirar Brasil de convenção que protege povos indígenas

Duas associações de procuradores manifestaram-se contrariamente à aprovação do Projeto de Decreto Legislativo (PDL) nº 177/2021, que pretende autorizar o Presidente da República a denunciar a Convenção nº 169, da  Organização Internacional do Trabalho (OIT). A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e  a Associação Nacional dos Procuradores e Procuradoras do Trabalho (ANPT), entidades que congregam e representam os Procuradores e as Procuradoras da República e do Trabalho de todo o país, publicaram nota técnica contra o projeto. A justificativa do PDL sustenta que a legislação brasileira de proteção aos povos indígenas e tribais não necessitaria ser complementada por norma internacional .

A Convenção nº 169 da OIT resultou da mobilização de grupos étnicos culturalmente diferenciados,  que também influenciou cartas constitucionais de diversos países, inclusive a brasileira. Apesar de ter sido aprovada em 1989, somente passou a vigorar no Brasil em 25 de julho de 2003. O Supremo Tribunal Federal estabeleceu jurisprudência do entendimento de que a Convenção nº  169, por dispor sobre direitos fundamentais, integra o ordenamento jurídico brasileiro com  status de supralegalidade.

O texto de justificativa faz referência ainda ao entendimento do STF no julgamento do Caso Raposa Serra do  Sol. A proposta parte da premissa de que as restrições à atuação do Poder Público nos territórios desses povos inviabilizam o crescimento econômico do Brasil. Cita, como exemplos de “inconvenientes” causados pela Convenção nº 169, a paralisação de  obras como o Linhão de Tucuruí, o Terminal Mar Azul, em Santa Catarina, e a BR 080, que  atravessa os Estados de Goiás e Mato Grosso. Assevera, ainda, que a Convenção seria  incongruente ao adotar, no item 2 do art. 1º, os critérios de “autoatribuição” “autoidentificação”, pois poderia dar razão a ações oportunistas de pessoas e/ou grupos para a  aplicação em benefício próprio. Por fim, insinua que o texto, ao impedir a extração de recursos  hídricos, naturais e minerais, viola a soberania nacional.

A Nota da ANPR e da ANPT demonstra que o PDL carece de substrato jurídico e destoa da realidade, listando como o exemplo o fato de o país não poder ser denunciado no âmbito da convenção antes de 25 de julho de 2023, e portanto “encaminhada pelo Brasil para o Diretor Geral da OIT neste sentido é absolutamente intempestiva e por tanto inócua”, cita a nota.

Leia o texto das associações na íntegra: Nota Técnica – PDL 177 – C 169 – final