Justiça determina que Funai assuma responsabilidade por Indígenas Venezuelanos

Justiça determina que Funai assuma responsabilidade por Indígenas Venezuelanos

Decisão reafirma que a Funai e a União não podem distinguir o tratamento de dados indígenas brasileiros e estrangeiros, como ocorre com imigrantes venezuelanos

A Justiça Federal de Roraima emitiu decisão em que obriga a União e a Funai para garantirem direitos básicos a indígenas venezuelanos. A medida se aplica ao acesso a serviços de saúde, educação e outros tipos de assistência.

A decisão foi tomada depois que as testemunhas narraram ao tribunal que a Funai negou ser responsável pelo atendimento aos indígenas venezuelanos. A decisão reafirma o entendimento de que a Funai e a União não podem distinguir o tratamento dado a indígenas nacionais e estrangeiros, situação que, segundo a instituição, vem sendo observado em Roraima.

O juiz federal da 2ª Vara Federal Cível, Felipe Bouzada Flores Viana, concedeu prazo de 90 dias para que a União e a Funai comprovem que deram início à implementação de um plano de ação.

“Relatos de alcoolismo, consumo de droga por menores, cooptação de indígenas para de práticas ilícitas como tráfico de entorpecentes, indígenas com dificuldade de acesso a serviços de saúde, bem como a superlotação dos abrigos e indígenas em situação de rua, são mazelas que indica a negligência do Poder Público em promover o mínimo necessário para garantir uma vida digna ”, disse o magistrado, em sua decisão.

Degradação

A ação foi criada pelo Ministério Público Federal (MPF). A instituição alertou que sem atendimento necessário, há o risco de degradação rápida das características culturais e da própria saúde dos grupos.

O plano em questão já existe desde 2018 e foi proposto pela própria Funai para atendimento aos povos Warao e E’ñepá, após recomendações emitidas pelo MPF. Ele deveria ter sido concluído no final daquele ano, mas até hoje se encontra em fases preliminares. A Funai afirmou em que defesa as medidas ainda não foram implementadas por falta de orçamento.

Entre as ações desenhadas estão um trabalho de instrumento de diálogo e a realização de oficinas com associações indígenas e não indígenas de Roraima para uma atuação junto aos povos Warao e E’ñepa. Nos depoimentos prestados no processo, integrantes das instituições que participam do acolhimento de migrantes narraram peculiaridades no atendimento a indígenas que tornam indispensável a presença da Funai.

Via Folha Boa Vista

Denúncia dos povos indígenas do Brasil contra Bolsonaro por crime de genocídio repercute em mais de 20 países

Denúncia dos povos indígenas do Brasil contra Bolsonaro por crime de genocídio repercute em mais de 20 países

Imprensa estrangeira também reforça importância dos povos indígenas na luta em defesa do meio ambiente

Brasília, 10 de agosto de 2021 – No dia internacional dos povos indígenas, 9 de agosto, a Articulaçao dos Povos Indígenas Brasil (Apib), encaminhou ao Tribunal Penal Internacional uma denúncia contra Jair Bolsonaro pelo crime de genocídio e ecocídio. Uma ação inédita, pois pela primeira vez na história, uma organização representativa dos povos originários, com seus advogados indígenas, entrou diretamente com uma comunicação ao tribunal de Haia para lutar por seus direitos.

A ação, realizada em conjunto com a Comissão Arns e o Coletivo de Advogados em Direitos Humanos, se soma com outros comunicados feitos ao TPI contra o presidente brasileiro, que desde o início do seu mandato, em 2019, impôs uma agenda anti-indígena com um projeto de morte agravado pela pandemia da Covid-19.

Diante da relevância da denúncia encabeçada pela APIB, jornalistas e portais de notícia de todo o mundo deram destaque para o assunto. Veículos de mais de 20 países da Europa, América Latina e do Norte, e da Ásia repercutiram o assunto em seus sites e jornais impressos. Portais internacionais como Al Jazeera, TeleSur e EuroNews também trataram do tema.

Abaixo, veja os veículos que produziram notícias sobre a denúncia contra Bolsonaro, seus países de origem e também o link para ler as matérias originais:

El País – Espanha:
O advogado que lidera a denúncia contra Bolsonaro por Genocídio em Haia
https://elpais.com/internacional/2021-08-09/el-abogado-indigena-que-lidera-la-denuncia-contra-bolsonaro-por-genocidio-en-la-haya.html

Le Monde – França:
“No Brasil, indígenas demandam ao TPI abrir uma investigação sobre Bolsonaro por Genocídio”

France 24 – França:
“Indígenas brasileiros denunciam Bolsonaro perante a TPI por genocídio”
​​
RFI – França:
“Genocídio: advogados indígenas denunciam Bolsonaro no Tribunal Penal de Haia”

DW – Alemanha:
“Indígenas denunciam Bolsonaro em Haia por genocídio”

Aljazeera – internacional:
“Grupo indígena processa bolsonaro na TPI por genocídio”

TeleSur – Internacional:
“Indígenas brasileiros denunciam Jair Bolsonaro em Haia”

Swiss Info – Suíça:
“Indígenas brasileiros acusam Bolsonaro de genocídio em Haia”

Prensa Latina – Cuba:
“Indígenas brasileiros denunciam Bolsonaro perante Haia por genocídio”

Diário de Notícias – Portugal:
“Indígenas acusam Bolsonaro de genocídio no Tribunal Penal Interancional”

Colina – Portugal:
“Bolsonaro denunciado por genocídio a indígenas”

Naiz – País Basco:
“Povos Indígenas do Brasil apresentam denúncia por genocídio contra Bolsonaro perante a TPI”

Milênio – México:
“Brasil – Indígenas denunciaa Bolsonaro à TPI por genocídio”

Ámbito – Argentina:
“Povos Indígenas do Brasil apresentam denúncia por genocídio contra Bolsonaro perante a TPI”

RT – Canal russo em espanhol:
“Indígenas brasileiros denunciam Bolsonaro por genocídio e ecocídio”

Mercopress – Uruguai:
“Grupo indígena brasileiro APIB inicia denúncia criminal contra Bolsonaro perante a TPI”
​​https://en.mercopress.com/2021/08/10/brazilian-indigenous-group-apib-files-criminal-charges-against-president-bolsonaro-before-icc

Jurist – Estados Unidos:
“Grupo indígena pede ao TPI que investigue o presidente do Brasil por crimes contra a humanidade”

IDN Times – Indonésia:
“Presidente do Brasil denunciado na TPI por crimes de genocídio e ecocídio”

IDNES – República Checa:
“Indígenas culpam presidente brasileiro por genocídio e pelo aumento da mineração na Amazônia”

Teraz – Eslováquia:
“Povos originários brasileiros querem processar Bolsonaro por genocídio”

EjuTV – Bolívia:
“​​Indígenas denunciam Bolsonaro perante a TPI por genocídio”

MMS Kita – Indonésia:
“Grupo indígena brasileiro processa Bolsonaro no ICC por ‘genocídio’”

Nordre – Noruega:
“Povos indígenas pedem tribunal internacional para investigar Bolsonaro”

New Day News – Rússia
“Indígenas brasileiros acusam presidente do país genocídio”

Zuiadedlj – Romênia:
“Grupo indígena processa Bolsonaro por genocídio”

Vietnam Plus – Vietnam:
“Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, enfrenta desafios jurídicos”

Sputnik News – Vietnam:
“Presidente brasileiro acusado de genocídio”

Global Times – China:
“Grupo indígena brasileiro processa Bolsonaro na TPI por ecocídio de genocídio”

Global News – Europa:
“Indígenas do Brasil querem Bolsonaro em Haia”
​​https://pt.euronews.com/2021/08/10/indigenas-do-brasil-querem-bolsonaro-em-haia

Indígenas Tupinambá são ameaçados e tem casas destruídas na Bahia

Indígenas Tupinambá são ameaçados e tem casas destruídas na Bahia

Por Tatiana Scalco, especial para os Jornalistas Livres

Aumenta o nível de tensão no Território Indígena Tupinambá de Olivença, localizado na região do baixo sul da Bahia, entre Ilhéus, Una, Buerarema. Na última semana, homens armados “visitaram” o território, especialmente no entorno da aldeia Cajueiro. Ameaças, destruição de cercas, destruição de casas em construção foram alguns dos resultados. 278 famílias indígenas que utilizam o território e estão impactadas, principalmente àquelas das aldeias Aldeia Cajueiro, Acuipe de Baixo e Lagoa dos Mabaços.

A situação se intensificou no final do mês de julho, após a publicação da decisão da juíza federal substituta, Leticia Daniele Bossonario, suspendendo o processo de reintegração de posse até “o julgamento do Tema 1.031 pelo Supremo Tribunal Federal, ressaltando a cassação da liminar deferida nestes autos” (19.07.2021).

“não é para ter medo, é para ter respeito”

Desde o dia 1ª de agosto, “a gente vêm sofrendo ataques e sofrendo ameaças”, informa o cacique Val. E comenta que “fui ameaçado no domingo, né. Eles no carro, numa Hilux, e que veio tirar foto minha e falando que ele viu que a gente não ia construir nada, que eu ia receber taca se continuasse ocupando aquela área e que eu retirasse todos os índios que moram naquela redondeza”. O Cacique denuncia que as ameaças foram proferidas pelo Sr. Lau Sabino. E complementa que o Sr. Lau disse que “não tinha medo” e o Cacique respondeu: “não é para ter medo, é para ter respeito”

Cacique Val, Valdonisio Pereira dos Santos, é cacique das aldeias Acuipe de Baixo, Cajueiro, Acuipe de Baixo e Lagoa dos Mabaços do Território Tupinambá de Olivença. Sua luta em prol da defesa dos direitos dos povos originários deixou-o exposto e sob ameaças. Atualmente ele é uma das 53 lideranças indígenas da Bahia que são assistidas pelo Programa de Proteção de Defensores de Direitos Humanos (PPDDH), por estarem sob diversos tipos de ameaças, inclusive de morte.

Segundo o Cacique Val, o preposto, “gerente da Ilhéus empreendimentos, conhecido como Lau Sabino, sempre circulou pela área”. E continua dizendo que já haviam feito denúncia junto à Polícia Federal, porque “ele sempre andou com policiais à paisana armados, policiais civis, policiais militares, da redondeza”.

Roselito Cares De Sousa, conhecido como Lau Sabino, foi candidato à vereador nas eleições 2020 pelo PSL, ficando como Suplente na vereança no munícipio de Ilhéus- BA. Em 2016 também foi candidato a vereador, pelo PSB, e também ficou como suplente. Mais informações no site do TSE 

O site Informe Cadastral apresenta a ILHEUS EMPREENDIMENTOS S/A, CNPJ 09.023.508/0002-60, com filial no endereço Fazenda Cajueiro, S/N, Una/BA – CEP 45690-000. Já no site sobre empresas na Bahia, a empresa apresenta-se como tenod sua atividade econômica principal Incorporadora. Interessante que o endereço apresentado está dentro do TI Tupinambá de Olivença.

Desde no domingo, todos os dias, o Sr. Lau e sua equipe tem ido à Aldeia Cajueiro, ameaçando e coagindo os indígenas, “escorraçando o pessoal das casas, derrubando os piquetes, derrubando as cercas, cortando arames”.

Ameaças aos indígenas

Três dos indígenas da aldeia tiveram que sair correndo do local – Érico, Ednaldo e Adelson Barbosa – e foram ameaçados de que seus carros e motos seriam apreendidos.

Ednaldo, um dos indígenas ameaçados comenta que “ninguém sabe se eles são policiais, se eles são pistoleiros”. E continua dizendo que “eu sei que o Seu Lau deixou eles aqui, fazendo ronda aqui” e na sequência eles iniciaram as ameaças e agressões. Ednaldo denuncia que o carro dele está parado lá, sem poder retirar, e continua “eles me agrediram” e tiraram fotos.

Ednaldo passou a tirar fotos daqueles que o estavam ameaçando. Os homens questionaram porque ele estava tirando as fotos, e ele respondeu “porque vocês estão tirando a minha (foto)”. Os homens continuaram ameaçando prender o carro e solicitaram sua habilitação. Ednaldo não entregou, falando que eles não eram polícia, pois se fossem polícia, que apresentassem sua identificação. Eles não quiseram se identificar, mas continuaram as ameaças.

“seis cidadão, com uniforme bege, dizendo que é da polícia (…) disseram que era para parar e saíram chutando tudo”

O indígena Adelson Barbosa do Nascimento denuncia que na segunda-feira, dia 2 de julho, ele estava na Aldeia Mangaba “aterrando o meu terreno, (…) e chegou seis cidadão, com uniforme bege, dizendo que é da polícia”. Eles disseram que “era para parar” e saíram “chutando tudo”, e também tentaram levar sua moto.  Adelson clama por “providencias, porque ali é terra indígena”. E continua dizendo que estão ameaçando pessoas; local que tem muitas crianças, senhores de idade. Complementa dizendo que “estão aterrorizando lá, bateram em três rapaz e ameaçaram uma família que estava lá e já morava lá há muito tempo, ameaçaram tocar fogo na casa do pessoal”.

Adelson finalizando pedindo “por favor, alguém tome alguma providência”.

“um carro da cor vinho está rondando a área indígena”

O indígena Érico Santos dos Reis, Tupinambá de Olivença, denuncia que “um carro de cor vinho está rodando a área indígena, impedindo as pessoas de trabalharem, até mesmo batendo em algumas pessoas”. E continua dizendo que “ derrubaram uma parede da minha construção e a noite, quanto eu estava dormindo tentaram abrir a porta. Foi quando eu liguei a lanterna do celular”. Então, saíram depressa.  Érico conclui dizendo que “um rapaz conhecido como Lau estava nesse carro”.

Lau diz que “isso aqui é dele”

Outra das lideranças da comunidade comenta que Lau tem passado pela manhã e tarde na comunidade. Fala que “todo dia ele (Lau) vem aqui e esculacha os caras que estão construindo, manda parar a obra aqui”, dizendo que “isso aqui é dele”. Completa que “eles ficam aqui com um policial à paisana amedrontando todo mundo” e pede providências ao cacique Val.

Cacique Val informa também que um ancião da Aldeia Cajueiro que vive num barraco de tábua foi ameaçado. Disseram para ele que “se não sair, eles vão queimar com ele (o ancião) dentro”. Já a casa do ancião Pedro, 76 anos, também foi violada, quebraram o telhado e abriram buracos na parede.

No dia 05 de agosto, quinta-feira, mais casas foram derrubadas na aldeia Cajueiro.

“As Lideranças gravaram vídeo mostrando as casas derrubadas, sendo entre as imagensa construção destruída pelos homens do Sr. Lau e falando que eles estão “pagando de polícia”. O Dr. Marcelo Bloizi, advogado sócio do escritório “Pataxó e Bloizi Advogados” , professor de direito e um dos defensores da comunidade, comenta que:

 “ a conduta do Lau Sabino, que se apresenta como preposto da Ilhéus Empreendimentos, é reflexo de uma escalada de violência contra as comunidades e povos tradicionais, (…), principalmente porque esses indivíduos não têm respeitado decisões judiciais que determinam suspensão de processo no nosso país. Eles desafiam a autoridade do Poder Judiciário.”

Eles desafiam a autoridade do Poder Judiciário

Dr. Bloizi continua e destaca que “esse senhor Lau Sabino é da mesma linha do presidente da República”. Observa que Lau Sabino é filiado e concorreu pelo PSL nas últimas eleições a vereador de Ilheus, não tendo se elegido. E explica que o Sr. Lau “mantém o mesmo discurso agressivo do presidente da República, contra os povos indígenas e as comunidades tradicionais no geral”, sendo reverberado por todo o país.

Comenta ainda que as pessoas que seguem o que o presidente da república diz, “agem com a violência própria do discurso do presidente”, o que leva a essas medidas diárias de violência contra a comunidade indígena tupinambá de Olivença, liderada pelo Cacique Val. Ameaças que passam pelos crimes de dano e violência com lesão corporal contra agricultores, com o objetivo de intimidar a comunidade.

Nossa Terra é um lugar sagrado

O Cacique Val reforça que a área em questão, é “um bem natural, histórico e também um bem cultural, porque ali os nossos antepassados sobreviveram e a gente sobrevive até hoje e é um lugar sagrado que a gente pratica nossos rituais. É um lugar sagrado por a gente ter os rios, o mangue, a mata e o mar. E com isso estamos pedindo as autoridades, a imprensa e aos demais colaboradores, que venham fazer justiça, para que a gente não pague mais com a vida, nesse momento que a gente está passando de ameaça”.

A comunidade seguirá firme na luta pela garantia de seus direitos

Dr. Bloizi declara que a “comunidade seguirá firme na luta pela garantia de seus direitos, que não se furtarão a fazer valer, por meio de todas as vias institucionais, a garantia da manutenção de decisão do STF, que é quem dá a palavra final no nosso país. E conclui, declarando que “não vai ser um preposto de uma empresa que está aí iresignada com a decisão judicial que vai dar a última palavra neste caso. Quem dá a última palavra neste caso é o STF e a gente vai recorrer para a força das instituições no nosso país.”

Cronologia das ameaças recentes

Dia 1 de agosto de 2021| Lideranças e membros da comunidade estavam em reunião na área da aldeia Cajueiro e “foram coagidos e ameaçados pelo Sr. Lau Sabino, preposto da Ilhéus Empreendimentos, acompanhados por homens, entre eles um identificado como sendo policial da Companhia de Canavieiras e guardas municipais de Una”. Eles ameaçaram e disseram que (eu) tinha que tirar todos os índios da área, informa Cacique Val.

Dia 2 de agosto | Os mesmos homens retornaram, tiraram os piquetes, quebraram alvenaria das casas construídas e cortaram cercas na Aldeia Cajueiro.

Dia 4 de agosto | Os homens voltaram de novo, invadiram a área, colocaram os indígenas para correr, derrubaram mais cercas, alvenarias, ameaçaram levar as motos dos indígenas e deixaram recado que pegariam todos e dariam surra nos indígenas que lá continuassem.

No mesmo dia, 4 de agosto, esses homens pegaram três jovens agricultores que moram na região e os surraram. Os jovens não foram à delegacia denunciar por medo. Segundo Cacique Val, “eles (os jovens agricultores) estão todos quebrados”.

Dia 6 de agosto| Mais uma vez retornam a terra indígena. Ameaçam. Destroem casas. Quebram telhado e abrem buracos na parede da casa do ancião Pedro, 76 anos.

Entenda o caso

O TI Tupinambá de Olivença é uma das 17 terras indígenas que tiveram seus procedimentos administrativos devolvidos do Ministério da Justiça para a FUNAI para se adequarem ao Parecer 001/AGU (o qual encontra-se suspenso por força de decisão do STF até que seja julgado o processo de repercussão geral – RE 10.17365).

2009

1 –  Foi Publicado o Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação da Terra Indígena Tupinambá de Olivença, em 47.376 hectares. Desde aquele momento não havia impedimentos administrativos ou jurídicos para obstar o andamento do procedimento de demarcação. Até o hoje aguarda-se a emissão da sua portaria declaratória pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública.

2017

2 –Em julho de 2017, a Advocacia Geral da União (AGU) publicou o Parecer Normativo 001/2017, que determinou que toda a administração pública federal adotasse uma série de restrições à demarcação de Territórios Indígenas (Tis). Entre elas, estão as condicionantes do caso da TI Raposa Serra do Sol (RR), de 2009, e a tese do chamado “marco temporal”, segundo a qual os povos indígenas só teriam direito à demarcação das terras que estivessem comprovadamente sob sua posse em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. Na prática, o Parecer 001/2017 serve para inviabilizar e rever demarcações, mesmo aquelas já concluídas ou em estágio avançado. A tese legitima as invasões, expulsões e a violência que vitimaram os povos indígenas antes da promulgação da Constituição Federal, quando eram tutelados pelo Estado e sequer podiam reclamar seus direitos na Justiça. A medida é considerada inconstitucional pelo Ministério Público Federal (MPF) (link nota técnica MPF: http://www.mpf.mp.br/pgr/documentos/NotaParecerAGU1.2017.pdf)

2018

3 – Em junho de 2018, a nota 00100/2018/COAF/PFE/PFE-FUNAI/PGF/AGU, assinada pelo Procurador Federal Marcelo Luis C. Rodopiano de Oliveira informa que o processo relativo à identificação e delimitação do TI Tupinambá de Olivença está pronto e cumpre todos os requisitos para que o Ministro de Estado da Justiça emita a portaria declaratória da Terra Indígena Tupinambá de Olivença (link arquivo notaPFE.pdf)

2019

4 – Em outubro de 2019, o Intercept Brasil publicou reportagem informando sobre pressão da Embratur junto à Fundação Nacional do Índio (Funai) para transformar a terra indígena Tupinambá de Olivença em Hotel de Luxo na Bahia. Em ofício, a presidência da Embratur solicita que a Funai que “a demarcação de sua terra indígena, no sul da Bahia, fosse “encerrada” para que um hotel de luxo da empresa Vila Galé, de Portugal, fosse construído na área”. 

 Link para a reportagem: https://theintercept.com/2019/10/27/documento-revela-pressao-da-embratur-sobre-a-funai-para-transformar-terra-indigena-em-hotel-de-luxo-na-bahia/

5– Em Novembro de 2019, os Tupinambá de Olivença foram à Brasília pedir investigação sobre o projeto de hotel de luxo português em seu território, em específico no entorno da aldeia Cajueiro. Protocolaram carta de denúncia. Fizeram reuniões com órgãos federais, na embaixada de Portugal e na sede da Delegação da União Europeia no Brasil. Também denunciaram a situação em reuniões com parlamentares, integrantes do Ministério Público Federal (MPF), com a Comissão Nacional de Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e com o Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH). Para saber mais veja em CIMI (https://cimi.org.br/2019/11/povo-tupinamba-olivenca-pede-investigacao-projeto-hotel-luxo-territorio/)

6 – Também em Novembro de 2019, após as denúncias dos Tupinambá de Olivença, o grupo hoteleiro português Vila Galé anunciou que iria cancelar a construção de um resort de luxo no litoral da Bahia. 

2020

7 – Em 6 de maio de 2020 o ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin determinou a suspensão nacional de todos os processos e recursos judiciais que tratem de demarcação de áreas indígenas até o final da pandemia da Covid-19 ou até o julgamento final do Recurso Extraordinário (RE) 1017365, com repercussão geral reconhecida (Tema 1.031).

8 – Em 04 de setembro de 2020, a empresa ILHEUS EMPREENDIMENTOS S/A peticionou na Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Ilhéus-BA, solicitando reintegração de posse de parte do território indígena Tupinambá de Olivença, em especial na região da Aldeia Cajueiro, numa disputa pela posse de aproximadamente 30 lotes, justificando que a Terra Indígena em questão ainda está pendente de demarcação. A empresa alega ter a posse destas terras desde 1965.

9 – A FUNAI informou no processo que os estudos técnicos necessários à demarcação do Território Tupinambá de Olivença haviam sido realizados e devidamente aprovados pelo Presidente da FUNAI e pendente apenas da publicação da portaria declaratória

10 – A Comunidade Indígena Tupinambá de Olivença manifestou-se no processo a área do Loteamento Canto das Águas é de aproximadamente 616,9980 hectares, sendo que 326,2050 hectares, ou seja, 52,8% desse empreendimento incide sobre a Terra Indígena em questão, tradicionalmente ocupadas por indígenas. Observou também que os finalizados os estudos técnicos necessários à demarcação devidamente aprovados pelo Presidente da FUNAI e pendente apenas da publicação da portaria declaratória.

11 – Em 07 de dezembro de 2020, a Juíza Federal Substituta, Leticia Daniele Bossonario, defere a liminar e decide pela reintegração de posse em favor da ILHÉUS EMPREENDIMENTOS S/A e dá prazo de 20 dias para saída dos indígenas do seu território tradicional, em descumprimento da determinação do STF de maio de 2020.

2021

12– Em 29 de março de 2021, o CIMI entre com reclamação (Reclamação nº 45260) com pedido de liminar de suspensão da decisão proferida pela Juíza bossonario, junto ao STF. A reclamação foi distribuída para o Ricardo Lewandowski

13 –  No mesmo, 29 de março de 2021, o Ministro do STF  Ricardo Lewandowski defere o pedido do CIMI e suspende a decisão liminar de reintegração de posse.

14 – Em 22 de abril de 2021, a Defensoria Pública da União entra no processo, e junto aos defensores da comunidade indígena recorre ao STF, apresentando reclamação, solicitando a suspensão de liminar proferida pela Juíza Bossanario e cumprimento da decisão de maio de 2020.

15 – Em 19 de julho de 2021, a juíza federal substituta, Leticia Daniele Bossonario, suspende o processo até “ojulgamento do Tema 1.031 pelo Supremo Tribunal Federal, ressaltando a cassação da liminar deferida nestes autos”.

16 – Em 01 de agosto de 2021, o Sr. Laurindo acompanhado por homens que se identificaram como policiais militares e guardas municipais aumentam o nível do assédio e violência junto aos indígenas. Amplia-se a violência contra os Tupinambá de Olivença.

 

MPF lança coletânea online para discutir prevenção de genocídio e outras atrocidades contra povos indígenas

MPF lança coletânea online para discutir prevenção de genocídio e outras atrocidades contra povos indígenas

Foto: Matheus Veloso

Neste 9 de agosto, quando se comemora o Dia Internacional dos Povos Indígenas, o Ministério Público Federal (MPF) lança o livro Povos Indígenas: Prevenção de Genocídio e Outras Atrocidades. Trata-se de coletânea digital de artigos, com textos escritos por membros do MPF e especialistas. A publicação discute algumas das maiores violações cometidas contra povos indígenas ao longo da história do Brasil, as formas de reparação e de prevenção de novas atrocidades. A publicação é organizada pelo Grupo de Trabalho Prevenção de Atrocidades Contra Povos Indígenas, da Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do MPF (6CCR).

O objetivo do livro é traçar panorama histórico das atrocidades cometidas contra esses povos e discutir o contexto atual, em que os indígenas seguem ameaçados por grandes empreendimentos, mineração ilegal, grilagem, coronavírus e pela falta de atuação estatal capaz de protegê-los. “Espera-se que a publicação contribua para o avanço desse debate e para que a prevenção de genocídios e de outras atrocidades seja mais um aspecto prioritário na agenda dos direitos dos povos indígenas, de forma a guiar a responsabilização do Estado brasileiro e garantir a efetividade do projeto constitucional”, explica o texto de apresentação da coletânea, assinado pela subprocuradora-geral da República e coordenadora da 6CCR, Eliana Torelly, e pelo procurador da República Julio José Araujo Junior, coordenador do GT Prevenção de Atrocidades Contra Povos Indígenas.

A primeira parte do livro trata da Justiça de Transição para povos indígenas no Brasil, abordando as medidas de reparação às violações sofridas por essas populações no regime militar. Os textos discutem, entre outros aspectos, a dificuldade em se garantir mecanismos de justiça transicional para populações originárias e o fracasso de mecanismos de prevenção de novas atrocidades. Há ainda um artigo específico sobre a remoção forçada do povo Xavante do território indígena Marãiwatsédé, em 1966, numa ação conduzida por agentes do governo militar brasileiro.

A segunda parte da publicação traz o tema Genocídio Indígena: Passado, Presente e Futuro. Os textos discutem a proteção cultural e idiomática indígena, as formas de barrar o etnocídio, a análise do contexto político atual brasileiro e seus impactos para essas populações. A responsabilização do Brasil, perante a Corte Interamericana, pela degradação da Amazônia, mineração e grilagem em terras indígenas também é tema de artigo, assim como a vulnerabilidade dos indígenas diante das grandes corporações, em litígios judiciais envolvendo megaprojetos econômicos em seus territórios.

A terceira parte trata especificamente dos povos indígenas no contexto da covid-19. Isso porque, num cenário de omissão na demarcação de territórios e na consolidação de políticas públicas, a pandemia incrementa os fatores de risco de genocídio e de outras atrocidades, seja por conta da invasão de territórios e disseminação da doença, seja em razão da sujeição de grupos a vulnerabilidades, sem respaldo estatal para suas demandas. Os artigos falam sobre a necessidade de judicializar políticas públicas de atendimento em saúde para indígenas, a atuação do STF e do Sistema Interamericano de Direitos Humanos na pandemia e a construção do protagonismo indígena nos tempos atuais.

 

Via: Ministério Publico Federal

INÉDITO: APIB denuncia Bolsonaro, em Haia, por genocídio indígena

INÉDITO: APIB denuncia Bolsonaro, em Haia, por genocídio indígena

Foto: Ueslei Marcelino/Reuters

Pela primeira vez na história, povos indígenas vão diretamente ao tribunal de Haia, com seus advogados indígenas, para lutar pelos seus direitos.

Brasília, 9 de agosto de 2021 – A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) protocolou, nesta segunda-feira (9), um comunicado no Tribunal Penal Internacional (TPI) para denunciar o governo Bolsonaro por Genocídio. Na data que marca o dia Internacional dos Povos Indígenas, a organização solicita que a procuradoria do tribunal de Haia examine os crimes praticados contra os povos indígenas pelo presidente Jair Bolsonaro, desde o início do seu mandato, janeiro de 2019, com atenção ao período da pandemia da Covid-19.

Com base nos precedentes do TPI, a Apib uma investigação por crimes contra a humanidade (art. 7. b, h. k Estatuto de Roma – extermínio, perseguição e outros atos desumanos) e genocídio (art. 6. B e c do Estatuto de Roma – causar severos danos físicos e mentais e deliberadamente infligir condições com vistas à destruição dos povos indígenas). Pela primeira vez na história, povos indígenas vão diretamente ao TPI, com seus advogados indígenas, para se defenderem desses crimes.

O acervo do comunicado protocolado é composto por denúncias de lideranças e organizações indígenas, documentos oficiais, pesquisas acadêmicas e notas técnicas, que comprovam o planejamento e a execução de uma política anti-indígena explícita, sistemática e intencional encabeçada por Bolsonaro.

“Acreditamos que estão em curso no Brasil atos que se configuram como crimes contra a humanidade, genocídio e ecocídio. Dada a incapacidade do atual sistema de justiça no Brasil de investigar, processar e julgar essas condutas, denunciamos esses atos junto à comunidade internacional, mobilizando o Tribunal Penal Internacional”, destaca Eloy Terena, coordenador jurídico da Apib.

De acordo com trecho do comunicado, “o desmantelamento das estruturas públicas de proteção socioambiental e aos povos indígenas desencadeou invasões nas Terras Indígenas, desmatamento e incêndios nos biomas brasileiros, aumento do garimpo e da mineração nos territórios.”

Para a Apib os ataques às terras e aos povos indígenas foram incentivados por Bolsonaro em muitos momentos ao longo de sua gestão. Os fatos que evidenciam o projeto anti-indígena do Governo Federal, vão desde a explícita recusa em demarcar novas terras, até projetos de lei, decretos e portarias que tentam legalizar as atividades invasoras, estimulando os conflitos.

“A Apib permanecerá em luta pelo direito dos povos indígenas de existirem em sua diversidade. Somos povos originários e não nos renderemos ao extermínio”, enfatiza Eloy que é um dos oito advogados indígenas que assinam o comunicado.

O documento de denúncia, enviado ao TPI, também contou com o apoio do Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos – CADHu e da Comissão Arns, que protocolaram, em 2019, outro comunicado à Procuradoria do TPI contra Bolsonaro, que ainda está sob análise no tribunal.

Agosto Indígena

“Lutamos todos os dias há centenas de anos para garantirmos a nossa existência e hoje a nossa luta por direitos é global. As soluções para este mundo doente vêm dos povos indígenas e jamais nos calaremos diante das violências que estamos sofrendo. Enviamos esse comunicado ao Tribunal Penal Internacional porque não podemos deixar de denunciar essa política anti-indígena de Bolsonaro. Ele precisa pagar por toda violência e destruição que está cometendo”, afirma a coordenadora executiva da Apib, Sonia Guajajara.

Segundo a coordenadora, o mês de agosto será marcado por mobilizações dos povos indígenas na luta por direitos. Ela ressalta o acampamento ‘Luta pela Vida’ que está marcado para acontecer entre os dias 22 e 28 de agosto, em Brasília. “Vamos ocupar mais uma vez os gramados da esplanada para impedir os retrocessos contra os direitos dos nossos povos”, reforça Sonia.

“Alertamos o Tribunal Penal Internacional para a escalada autoritária em curso no Brasil. O ambiente democrático está em risco”, afirma Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib lembrando dos projetos de lei que estão na pauta de votação do Congresso e ameaçam os direitos indígena e do julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF), sobre o Marco Temporal, que pode definir o futuro dos povos indígenas.

“Estamos fazendo um chamado de mobilização para Brasília, em plena pandemia, porque hoje a agenda anti-indígena do Governo Federal representa uma ameaça mais letal que o vírus da Covid-19. A vida dos povos indígenas está ligada aos territórios e nossas vidas estão ameaçadas. Estaremos mobilizados nas aldeias, nas cidades, em Brasília e no tribunal de Haia para responsabilizar Bolsonaro e lutar pelos nossos direitos”, destaca Tuxá.

“Os povos indígenas permanecerão vigilantes, como historicamente fizeram. É dever do governo federal brasileiro respeitá-los, como expressão fundacional de um Estado Constitucional de Direito”, aponta trecho do documento encaminhado para o TPI.

DESTAQUES

  • Em 19 de novembro de 2019, o Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos – CADHu e Comissão Arns apresentam comunicado por incitação ao genocídio e crimes contra a humanidade perpetrado por Jair Bolsonaro contra povos indígenas.

 

  • Durante o segundo semestre de 2020, a Apib e a Clínica de Litigância Estratégica em Direitos Humanos da Fundação Getúlio Vargas, de São Paulo, fizeram oficinas com advogados indígenas, lideranças, estudantes, especialistas e parceiros da Apib sobre a jurisdição do TPI.

 

  • Logo em seguida, a APIB lançou um chamado para que as lideranças e organizações de base enviassem denúncias de violações de direitos, especialmente no contexto da pandemia. Tais relatos foram em grande medida incorporados no comunicado ao TPI.  

 

  • Os encontros abordaram temas como a jurisdição penal internacional e suas críticas, os crimes do Estatuto de Roma, o processo perante o TPI, o papel das vítimas na construção dos casos, a admissibilidade e a agenda da Procuradoria.

 

  • Em dezembro de 2020, a Procuradoria do TPI informou ao Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos – CADHu e Comissão Arns que está formalmente avaliando a comunicação enviada em novembro de 2019.

 

  • Durante o primeiro semestre de 2021, a partir dos debates das oficinas feitas em 2020, a APIB iniciou um processo de coleta de depoimentos e dados sobre o impacto dos atos de Jair Bolsonaro em distintas comunidades indígenas no país.

 

  • Os relatos, emitidos diretamente pelos povos indígenas afetados, documentos oficiais, pesquisas acadêmicas e notas técnicas compõem o acervo probatório do comunicado feito pela Apib, protocolado dia 9 de agosto no TPI com o apoio do Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos – CADHu e da Comissão Arns.

 

  • São 86 páginas apenas com fatos, que se organizam em:

 

  1. Uma cronologia dos atos do Presidente Jair Bolsonaro de ataque aos povos indígenas e destruição da infraestrutura pública de garantia dos direitos indígenas e socioambientais, na qual foram compilados os principais atos administrativos, normativos, discursos, reuniões e projetos, direta ou indiretamente praticados pelo presidente Jair Bolsonaro;
  2. A descrição das principais consequências da destruição da infraestrutura pública de garantia dos direitos indígenas e socioambientais: a invasão e o esbulho de terras indígenas; o desmatamento; o garimpo e a mineração em nos territórios e o impacto da pandemia da Covid-19 sobre os povos indígenas, trazendo pesquisas, relatórios e dados.
  3. O relato sobre o impacto das invasões, do desmatamento, garimpo e mineração em Terras Indígenas e a propagação da pandemia de Covid-19 tiveram sobre os povos indígenas isolados ou de contato recente e sobre os povos Munduruku, os indígenas que vivem na TI Yanomami, os Guarani-Mbya, Kaingang, os Guarani-Kaiowá, os Tikuna, Kokama, os Guajajara e os Terena.

 

  • A APIB leva à jurisdição penal internacional a voz e a interpretação dos povos indígenas sobre os crimes dos quais vêm sendo vítimas, fato por si só histórico. Com base nos precedentes do TPI, a APIB abriu investigação por crimes contra a humanidade (art. 7. b, h. k Estatuto de Roma – extermínio, perseguição e outros atos desumanos) e genocídio (art. 6. B e c do Estatuto de Roma – causar severos danos físicos e mentais e deliberadamente infligir condições com vistas à destruição dos povos indígenas).

Perguntas e Respostas

 P: Várias ações apresentadas na denúncia já aconteciam antes do Governo Bolsonaro (desmatamento e incêndios nos biomas brasileiros, garimpo e mineração em terras indígenas têm sido historicamente comuns, com maior ou menor intensidade, em outros governos.). Por que essa denúncia só agora?R: É secular a violação aos direitos dos povos indígenas, bem como os riscos de desmatamento e exploração da Amazônia. Mas é inédita a construção de uma política anti-indígena, sistemática e intencional. É a primeira vez que se vê a desconstrução da infraestrutura de proteção dos direitos indígenas e dos direitos socioambientais. A Funai, por exemplo, de órgão de garantia dos direitos indígenas, se transformou em órgão de perseguição. Também é a primeira vez que se vê um presidente se posicionar contrariamente à demarcação de terras indígenas e o incentivo da atuação ilegal de garimpeiros e grileiros.  Associado à política anti-nindígena, há um discurso discriminatório e violento contra os povos indígenas que surte efeitos concretos. Não se tratam apenas de discursos, mas de ações concretas e concatenadas, todas indicadas na comunicação.
P: Por que o TPI deve discutir este caso?R: Sabemos que é um desafio para o Tribunal Penal Internacional lidar com fatos que envolvam países com algum grau de democracia. Historicamente, o Tribunal tem voltado suas atenções para situações de conflitos deflagrados. Mas o que os povos indígenas mostram ao TPI é que é possível o cometimento dos crimes mais graves em ambiente de desdemocratização, como o brasileiro. Sob o comando do Presidente Jair Bolsonaro foi instituída uma política anti-indígena sistemática a intencional que pde ser tecnicamente enquadrada como genocídio e como crimes contra a humanidade contra povos indígenas e tradicionais do país. É essencial, portanto, que o Tribunal Penal Internacional fique ciente dos relatos específicos desses impactos sobre os povos isolados e de recente contato, sobre os Munduruku, sobre os Yanomami, os Guarani-Mbya e Kaigang, os Guarani-Kaiowá, os Tikuna, os Guajajara e os Terena. Com a apresentação da situação geral do país e dos relatos específicos desses povos é que se espera é que os crimes cessem e que a comunidade internacional possa ficar atenta às violações que ainda estão em curso no país e que podem tomar proporções ainda mais graves caso não haja medidas efetivas.
P: Por que a escolha de levar o caso a uma corte internacional?R: O sistema de justiça brasileiro não tem sido capaz de oferecer respostas, mais especificamente a responsabilização do presidente da República pela sua política anti-indígena. Nenhum destes atos gravíssimos que são apresentados na comunicação sequer foi objeto de investigação ou abertura de investigação formal contra o Presidente Jair Bolsonaro. Para o Tribunal Penal Internacional, é preciso demonstrar que não haja uma efetiva investigação ou que não se espere independência e imparcialidade de investigadores e juízes. O Presidente Jair Bolsonaro tem demonstrado nenhum apreço à independência das instituições, como ficou comprovado pelas sucessivas interferências na Polícia Federal, a forma como controla a Procuradoria Geral da República, com a nomeação de um procurador totalmente alinhado com suas com suas ideias inconstitucionais, e as investidas contra o Supremo Tribunal Federal. 
P: Tendo em vista a morosidade do TPI diante de casos de grande relevância, quais impactos concretos vocês esperam a partir da denúncia?R: Há uma responsabilidade da APIB, como associação representativa dos povos indígenas brasileiros, de acionar todos os mecanismos disponíveis para prevenir, reparar ou responsabilizar o genocídio dos povos tradicionais e as demais violações de direitos humanos que estamos sofrendo. Essa comunicação, em conjunto com as que já foram apresentadas, reforça o alerta ao sistema internacional de que o que estamos passando no Brasil é intolerável. Nosso principal objetivo é demonstrar à Procuradoria do Tribunal Penal Internacional a gravidade do que está acontecendo no Brasil em relação aos povos indígenas, tradicionais e ao meio ambiente, apresentando relatos específicos da gravíssima situação vivida por alguns povos (Munduruku, Yanomami, Guarani-Mbya e Kaigang, Guarani-Kaiowá, Tikuna, Guajajara e Terena).  
P: Não seria um exagero falar em genocídio?R: Não. O crime de genocídio exige um ato típico com a intenção especial de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso enquanto tal, seja por ofensas graves à integridade física e mental (artigo 6.b) ou pela sujeição intencional a condições de vida com vista a provocar sua destruição total ou parcial (artigo 6.c). A existência de uma política anti-indígena sistemática e intencionalmente promovida pelo Presidente Jair Bolsonaro causa severos danos físicos e mentais e procura sujeitar os povos indígenas a condições tais que podem gerar sua destruição, seja pela desassistência de saúde, insegurança alimentar, contaminação por Covid ou por metais em razão da expansão do garimpo ilegal e da invasão de terras. 

As consequências dessa política anti-indígena estão especificamente descritas para os povos isolados e de recente contato, para os Munduruku, os Yanomami, os Guarani-Mbya e Kaigang, os Guarani-Kaiowá, os Tikuna, os Guajajara e os Terena.
P: Que tentativas foram promovidas previamente pelos autores da denúncia junto ao sistema de justiça do Brasil?

R: Os povos indígenas atuam diretamente em diversas instâncias, mas a ação penal contra o Presidente da República é de competência privativa do Procurador-Geral da República.


P: Por que a comunicação menciona ecocídio, que não é um tipo previsto no Estatuto de Roma?

R: Ecocídio já é interpretado pela Procuradoria do TPI como uma forma por meio da qual se pode dar o cometimento de crimes contra a humanidade e genocídio, ou seja, a destruição do meio ambiente e dos recursos naturais como forma de atacar sistematicamente um grupo. Há, de fato, o debate sobre a sua tipificação. A comunicação da APIB pode colaborar para ambos os casos: avançar na interpretação já dada pela Procuradoria do TPI e estimular o debate internacional sobre uma possível tipificação.

A menção ao ecocídio é feita para apontar que os ataques ao meio-ambiente, às matas, às águas, às florestas, ferem de morte a humanidade. Ainda que não haja um tipo penal que o defina no ordenamento jurídico do TPI, o debate decolonial que o apresenta no mundo da vida é urgente. E ele servirá de pano de fundo para comprovar a gravidade do que está acontecendo no Brasil em relação aos crimes tipificados e cometidos contra os povos indígenas (genocídio e crimes contra a humanidade).
P: Por que nenhum ministro (do Meio Ambiente, por exemplo) foi incluído?

R: Porque quem manda e é responsável pelas ordens cumpridas pelo Ministro do Meio Ambiente e outros órgãos do governo federal é o Presidente Jair Bolsonaro, mentor da política anti-indígena em curso no Brasil.
P: Como foi a construção deste Comunicado?

R: O Comunicado apresentado pela APIB foi construído coletivamente, desde o início. Uma peça judicial com essa complexidade demanda a convergência de profissionais diversos para que fosse elaborada.

No início do segundo semestre de 2020, representantes da APIB e do Coletivo Advocacia em Direitos Humanos – CADHu e da Comissão Arns (que apresentaram uma denúncia em novembro de 2019 ao TPI, e que segue em avaliação) estiveram em contato com o objetivo de tratar do Comunicado autônomo que a APIB desejava construir.

A partir disso, definiu-se uma metodologia para que os advogados e advogadas indígenas pudessem aprender sobre o funcionamento da jurisdição do TPI, os crimes ali previstos, os requisitos de uma denúncia etc.. A APIB convocou lideranças indígenas e organizações parceiras para participar de uma agenda de formação sobre o tema. As oficinas foram realizadas em parceria com a Clínica de Litigância Estratégica da FGV/SP, e contou com vários especialistas sobre temas distintos afetos ao TPI.

A partir dessas oficinas, construiu-se um roteiro e houve a formação de grupo de profissionais da APIB, do CADHu, da Comissão Arns e consultores de organizações parceiras para a elaboração da minuta do Comunicado. Esse grupo analisou fontes documentais, normativas, jornalísticas, bem como colheu depoimentos testemunhais para a elaboração da peça. A construção coletiva desse Comunicado durou um período de aproximadamente um ano.

 

JUSTIÇA PARA DAIANE KAINGANG

JUSTIÇA PARA DAIANE KAINGANG

Na última quarta-feira (04), um crime bárbaro foi cometido no Setor Estiva, na Terra Indígena do Guarita, em Redentora, no Rio Grande do Sul, contra uma jovem parenta de 14 anos. Daiane Griá Sales, do povo Kaingang, foi encontrada morta em uma plantação nos arredores da comunidade, suas partes íntimas estavam dilaceradas.

A violência contra os povos indígenas tem se intensificado a cada dia. Assassinam nossos jovens, nossas mulheres, nossas lideranças; roubam nossas terras e querem tirar nossos direitos. A violência contra as mulheres indígenas é intensa desde a invasão portuguesa. Mulheres que são a vida do nosso povo, mulheres que curam mulheres guerreiras.

A Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpinsul) e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), em conjunto com todas as organizações regionais de base, repudiam toda e qualquer violência contra mulheres indígenas e exige que a justiça seja feita a quem cometeu tal atrocidade.

Não podemos aceitar que nossas vidas continuem sendo ceifadas, e que nossos direitos sejam retirados, ainda mais quando falamos do nosso direito maior, o direito à vida!

Somos Daiane Griá Kaingang
Exigimos justiça!

#vidasindígenasimportam
#emergênciaindígena

Manifesto das Mulheres Indígenas do Brasil contra a barbárie cometida à jovem Daiane Kaingang, de 14 anos

Manifesto das Mulheres Indígenas do Brasil contra a barbárie cometida à jovem Daiane Kaingang, de 14 anos

A Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (ANMIGA), viemos por meio deste manifesto repudiar e denunciar o crime de barbárie cometida na tarde desta quarta-feira (04), no Setor Estiva, da Terra Indígena do Guarita, no município de Redentora, contra a jovem de apenas 14 anos, Daiane Griá Sales, indígena Kaingáng, moradora do Setor Bananeiras da Terra Indígena do Guarita. A jovem Daiane foi encontrada em uma lavoura próxima a um mato, nua e com as partes inferiores (da cintura para baixo) arrancadas e dilaceradas, com pedaços ao lado do corpo.

Temos visto dia após dia o assassinato de indígenas. Mas, parece que não é suficiente matar. O requinte de crueldade é o que dilacera nossa alma, assim como literalmente dilaceraram o jovem corpo de Daiane, de apenas 14 anos. Esquartejam corpos jovens, de mulheres, de povos. Entendemos que os conjuntos de violência cometida a nós, mulheres indígenas, desde a invasão do Brasil é uma fria tentativa de nos exterminar, com crimes hediondos que sangram nossa alma. A desumanidade exposta em corpos femininos indígenas, precisa parar!

Estamos aqui, reivindicando justiça! Não deixaremos passar impune e nem nos silenciarão. Lutamos pela dignidade humana, combatendo a violência de gênero e tantas outras violações de direitos. As violências praticadas por uma sociedade doente não podem continuar sendo banalizadas, naturalizadas, repleta de homens sem respeito e compostura humana, selvageria, repugnância e macabrismo. Quem comete uma atrocidade desta com mulheres filhas da terra, mata igualmente a si mesmo, mata também o Brasil.

Mas saibam que o ÓDIO não passará! Afinal, a violência praticada não pode passar impune, nossos corpos já não suportam mais ser dilacerados, tombado há 521 anos. Que o projeto esquartejador empunhado pela colonização, violenta todas nós, mulheres indígenas há mais de cinco séculos.

Somos 448 mil Mulheres Indígenas no Brasil que o estrupo da colonização não conseguiu matar e não permitiremos que a pandemia da violência do ódio passe por cima de nós.
Parem de nos matar! A cada mulher indígena assassinada, morre um pouco de nós.

Vidas indígenas importam. Gritaremos todos os dias, a cada momento, vidas indígenas importam. E a vida de Daiane importa. Importa para sua família, para seu povo. Importa para nós mulheres indígenas.

Justiça Federal determina inclusão de indígenas residentes em áreas urbanas em grupo prioritário de vacinação contra a covid-19 em Mato Grosso

Justiça Federal determina inclusão de indígenas residentes em áreas urbanas em grupo prioritário de vacinação contra a covid-19 em Mato Grosso

O Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU) obtiveram, na última segunda-feira (2), decisão liminar determinando que a União inclua, no prazo máximo de dez dias, os indígenas do Estado de Mato Grosso que vivem em áreas urbanas ou em outros locais em que não estejam cadastrados pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) na fase de vacinação prioritária contra a covid-19.

Foi determinado, ainda, que a União e o Estado de Mato Grosso assegurem, no prazo de dez dias, a destinação de doses de vacina contra covid-19 e procedam à articulação imediata junto aos municípios para efetivação da vacinação prioritária de todos os indígenas do estado que vivem em contextos urbanos ou em outros locais em que não estejam cadastrados pela Sesai. Atualmente apenas os indígenas “aldeados” estão sendo vacinados dentro do grupo prioritário.

Conforme a ação civil pública (ACP) ajuizada pelo MPF, em atuação conjunta com a DPU, e que resultou na concessão da liminar, foram requisitadas informações ao secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (SVS/MS) e à Secretaria Estadual de Saúde de Mato Grosso sobre a vacinação dos indígenas que vivem em áreas urbanas. Provas foram reunidas no sentido de que os indígenas residentes em áreas urbanas estavam excluídos do plano de vacinação contra covid-19, tanto por não serem considerados como seu público alvo pelos Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei’s) quanto por não serem atendidos pelos municípios e pelo estado no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).

As informações reunidas junto aos Dsei’s revelaram que mais de 3,6 mil indígenas em Mato Grosso estão excluídos da vacinação prioritária por não serem “aldeados”. Além disso, apurou-se que o Dsei/Cuiabá devolveu à Secretaria Estadual de Saúde 840 doses de vacina não utilizadas, enquanto que o Dsei/Xingu tem à sua disposição 800 doses prestes a serem devolvidas também. Esse total de 1.640 doses de vacina poderia ter sido utilizado para imunização de indígenas residentes em áreas urbanas, mas seu uso não foi autorizado pelo órgão central (Sesai).

O MPF e a DPU frisaram que, historicamente, os povos indígenas sempre estiveram mais vulneráveis biologicamente a viroses, em especial a infecções respiratórias. “Estas doenças sempre apresentaram altos índices de mortalidade causados pelas doenças transmissíveis que contribuíram com a redução do número de indígenas que vivem no território brasileiro. Os efeitos da pandemia somam-se, portanto, às circunstâncias históricas e peculiaridades biológicas desses grupos”, segundo consta da petição inicial. Dados apontados na ação demonstram uma letalidade maior da pandemia entre os indígenas se comparados aos demais grupos.

Também se apontou na ação que o Ministério da Saúde não vinha cumprindo a legislação que elencou os indígenas, sem distinção, entre os integrantes dos grupos prioritários de vacinação, assim como a decisão do Supremo Tribunal Federal na ADPF n. 709.

A Justiça Federal, na decisão liminar, citou a Lei n. 14.021/2020, que versa sobre medidas de proteção social para prevenção do contágio e da disseminação da covid-19 nos territórios indígenas. A lei coloca os indígenas isolados e de recente contato, os indígenas aldeados e os que vivem fora das terras indígenas, em áreas urbanas ou rurais no mesmo patamar de proteção prioritária, sem distinção de domicílio, e “é assim que a política pública de imunização deve tratá-los, essa deve ser a premissa a partir da qual tudo deve suceder”, segundo o magistrado.

“Se a lei não os distinguiu, é vedado que uma norma infralegal o faça. Se a lei não condicionou a proteção à região em que vivem, as políticas públicas não podem limitar essa proteção com base nesse critério, realizando distinções discriminatórias e não amparadas em elementos técnicos para priorizar a imunização de indígenas aldeados em descompasso com aqueles que vivem em zona urbana ou rural, não aldeados”, destaca também a decisão.

Dessa forma, além da inclusão dos indígenas não aldeados no plano de imunização, a União e o Estado de Mato Grosso devem assegurar, no prazo de dez dias, a destinação de doses de vacina contra a Covid-19 e proceder à articulação imediata junto aos municípios do estado para fins de efetivação da vacinação prioritária de todos os indígenas de Mato Grosso que vivem em contextos urbanos ou em outros locais em que não estejam cadastrados pela Sesai.

Via: Ministério Público Federal do Mato Grosso

DEPUTADOS LEGALIZAM O ROUBO DE TERRAS E MOVIMENTO INDÍGENA SEGUE NA LUTA POR DIREITOS

DEPUTADOS LEGALIZAM O ROUBO DE TERRAS E MOVIMENTO INDÍGENA SEGUE NA LUTA POR DIREITOS

No início da noite desta terça-feira (03 de agosto), deputados ligados ao agronegócio e à base do governo Bolsonaro, aprovaram o Projeto de Lei 2633, conhecido como PL da Grilagem. A proposta votada aumenta a violência contra povos indígenas, quilombolas e agricultores familiares e não foi apresentada anteriormente à sociedade civil, postura típica de regimes antidemocráticos. Agora, o projeto segue para votação no Senado e o movimento indígena continua na luta por direitos.

A justificativa apresentada para a aprovação deste Projeto de Lei seria a necessidade de regulamentar terras para pequenos agricultores. Entretanto, o Brasil já dispõe de políticas para reforma agrária e destinação de terras que precisam apenas ser implementadas de forma efetiva. O fato é que o texto aprovado, legaliza o ilegal: regulariza terras apropriadas de maneira criminosa, em processos que muitas vezes incluem atos violentos contra povos indígenas e comunidades tradicionais.

Grilagem, para quem não conhece a expressão, é o nome dado à invasão, ocupação e comércio ilegal de áreas públicas. É esse tipo de ato que o Projeto de Lei aprovado ontem legaliza no Brasil. A prática está ligada ao desmatamento e à destruição da biodiversidade e ameaça diretamente povos originários que ocupam tradicionalmente as terras usurpadas pelos grileiros.

Segundo o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), cerca de 30% dos desmatamentos e queimadas na Amazônia ocorreram em terras públicas não destinadas, que foram possivelmente alvo de grilagem. Ainda, estudos do Imazon estimam que caso o PL 2633 entre em vigor como lei, poderá ocasionar um desmatamento adicional de até 16 mil quilômetros quadrados, área quase 3 vezes o tamanho do Distrito Federal.

O roubo de terra pública não é novidade no Brasil. O que é inédito é que o Poder Público, que deveria zelar pelo bem comum, resolva descaradamente premiar ladrões e usurpadores com a regularização da terra fruto de roubo. Esta aberração ética e jurídica coloca nossas florestas, nossa biodiversidade e os povos que delas dependem – especialmente os povos indígenas, comunidades tradicionais e agricultores familiares – de joelhos frente à violência que são típica dos processos de invasão e apropriação ilegal de terras.

No momento em que o mundo todo discute formas de manter as florestas em pé como uma solução para as mudanças climáticas, o governo brasileiro segue “passando a boiada”, abrindo caminho para o aumento das taxas de desmatamento, o que vai contra seus próprios compromissos para zerar o desmatamento ilegal.

Os povos indígenas manifestam seu repúdio frente a este absurdo e irresponsável sinal emanado daquela que se auto-nomeia “Casa do Povo”. Com a aprovação deste projeto, a Câmara demonstra que está se convertendo na casa dos ruralistas, dos desmatadores, dos grileiros – de todos estes, menos do povo.

Normativa da Funai que fragiliza proteção de terras indígenas está suspensa em 8 estados da União

Normativa da Funai que fragiliza proteção de terras indígenas está suspensa em 8 estados da União

O Ministério Público Federal (MPF) vem obtendo liminares na Justiça Federal que suspendem a Instrução Normativa 9, da Fundação Nacional do Índio (Funai), que alterou os critérios para a emissão de Declaração de Reconhecimento de Limites (DRL) por meio do Sistema de Gestão Fundiária (Sigef), gerido pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Com a instrução, proprietários ou possuidores de terras poderiam emitir a declaração para áreas dentro do limite de terras indígenas ainda não homologadas pelo governo federal brasileiro.

O MPF considera que a instrução viola direitos constitucionais dos povos indígenas, favorece a grilagem de terras públicas e agrava conflitos agrários. Ao todo, procuradores da República ajuizaram 28 ações judiciais na 1ª instância da Justiça Federal, pedindo a suspensão da IN 09, com 19 decisões judiciais favoráveis. Atualmente, a norma da Funai está suspensa por ordens judiciais em oito estados da Federação: Pará, Mato Grosso, Amazonas, Acre, Roraima, Rondônia, Bahia e Rio Grande do Sul, o que garante a proteção de mais da metade das terras indígenas brasileiras.

Em recursos à 2ª instância, o governo federal até agora conseguiu reverter três liminares no Mato Grosso do Sul e suspender duas, em Santa Catarina e no Ceará. Duas liminares foram negadas, nas subseções judiciárias de Dourados (MS) e Foz do Iguaçu (PR), e o MPF aguarda decisão sobre recursos nesses dois casos. Das 28 ações civis públicas ajuizadas sobre o tema em todo o país, seis ainda estão pendentes de apreciação, em Belém (PA), São Luís (MA), Carazinho (RS), Vilhena e Ji-Paraná (RO) e São Paulo (SP). Quatro das liminares deferidas já foram confirmadas por sentenças, em Santarém (PA) e Castanhal (PA), Rio Branco (AC) e Boa Vista (RR). Em uma das ações judiciais iniciadas pelo MPF, em Belo Horizonte (MG), houve declínio de competência.

O MPF sustenta nas ações judiciais que a IN 09/2020 contraria o caráter originário do direito dos indígenas às suas terras e a natureza declaratória do ato de demarcação; cria indevida precedência da propriedade privada sobre as terras indígenas, em flagrante ofensa à Constituição; representa indevido retrocesso na proteção socioambiental; incentiva a grilagem de terras e os conflitos fundiários; entre outros problemas. As decisões judiciais obtidas determinam a manutenção das áreas indígenas ainda não homologadas no Sistema de Gestão Fundiária (Sigef) e no Sistema do Cadastro Ambiental Rural (Sicar).

Teor das decisões – Os juízes federais que concederam liminares ao MPF têm apontado o desrespeito da IN 09 ao texto constitucional e a subversão da missão institucional da Funai. Em uma das sentenças, exarada no Pará, a Justiça assinala que “a Funai, de forma pouco usual, adota uma retórica em prol dos não índios, o que causa certa estranheza em razão de seu dever de garantir o cumprimento da política indigenista (artigo 1º, lei nº. 5.371/1967)”

Para a Justiça Federal, ao permitir que particulares recebessem declarações de propriedade sobre áreas já caracterizadas como terras indígenas, a Funai utilizou-se de sua própria “ineficiência” em concluir os processos de demarcação “para onerar os povos tradicionais, retirando deles a segurança jurídica de alcançar o direito originário às terras ocupadas por eles, por meio da homologação, o que lhes é garantido pela Constituição Federal”.

“A instrução normativa da Funai não resolve o problema original enfrentado pelos indígenas no Brasil nem o dos possuidores de lotes rurais, lentidão no processo de demarcação de terra indígena, pelo contrário, com a justificativa de proteger o direito de propriedade de particulares, fere o direito originário de posse dos índios. Ainda transfere o ônus da ineficiência para os povos indígenas”, diz uma das decisões.

Atuação coordenada – Desde a publicação da IN 09/2020, o MPF defende que a regulamentação ameaça os direitos territoriais dos indígenas. Em abril de 2020, 49 procuradoras e procuradores da República de 23 estados assinaram recomendação que foi encaminhada ao presidente da Funai para que o ato administrativo fosse anulado. Com a negativa da Funai em cumprir a recomendação, o MPF precisou recorrer ao poder Judiciário.

Para o MPF a norma é inconstitucional, ilegal e contraria a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a Declaração das Nações Unidas Sobre os Direitos dos Povos Indígenas e a posição do Supremo Tribunal Federal (STF). Além disso, a instrução normativa afetaria, além das populações indígenas, os particulares de boa-fé que adquiram terrenos nas áreas em processo de demarcação, gerando falsa expectativa sobre a propriedade e insegurança jurídica.

Levantamento feito Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do MPF (6CCR/MPF) em junho do ano passado constatou que há quase 10 mil propriedades sobrepostas a terras indígenas que estão em diferentes fases de regularização ou em áreas com restrição de uso. O estudo foi encaminhado a procuradores da República em todo o país e subsidia a atuação no combate à grilagem e aos crimes ambientais em terras indígenas, bem como às violações dos direitos humanos desses povos.

A pesquisa foi feita pela Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise da Procuradoria-Geral da República, a pedido da 6CCR, e considerou dados extraídos do Sistema do Cadastro Ambiental Rural, vinculado ao Serviço Florestal Brasileiro, no período de 21 a 31 de maio de 2020. Ao todo, foram identificados 9.901 registros de propriedades no CAR cujos limites coincidem com territórios indígenas ou com restrição de uso, ou seja, áreas interditadas pela Funai para proteção de povos indígenas isolados, com o estabelecimento de restrição de ingresso e trânsito de terceiros.

Segundo a investigação, o estado com o maior número de imóveis rurais localizados em terras destinadas a povos indígenas é o Pará, com 2.325 registros. Desse total, 1.290 propriedades estão situadas dentro de terras indígenas em processo de regularização e 1.035 em áreas com restrição de uso. Em seguida, aparece o estado de Rondônia, onde foram identificados 1.385 registros de imóveis rurais sobrepostos a áreas indígenas, sendo 1.345 referentes a terras indígenas e 40 a áreas com restrição de uso. No Amazonas, são 1.163 propriedades irregulares registradas no CAR, uma vez que 524 estão dentro de terras indígenas e outras 639 em áreas interditadas para proteção de povos isolados.

Via:  Ministério Público Federal