09/ago/2021
Foto: Matheus Veloso
Neste 9 de agosto, quando se comemora o Dia Internacional dos Povos Indígenas, o Ministério Público Federal (MPF) lança o livro Povos Indígenas: Prevenção de Genocídio e Outras Atrocidades. Trata-se de coletânea digital de artigos, com textos escritos por membros do MPF e especialistas. A publicação discute algumas das maiores violações cometidas contra povos indígenas ao longo da história do Brasil, as formas de reparação e de prevenção de novas atrocidades. A publicação é organizada pelo Grupo de Trabalho Prevenção de Atrocidades Contra Povos Indígenas, da Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do MPF (6CCR).
O objetivo do livro é traçar panorama histórico das atrocidades cometidas contra esses povos e discutir o contexto atual, em que os indígenas seguem ameaçados por grandes empreendimentos, mineração ilegal, grilagem, coronavírus e pela falta de atuação estatal capaz de protegê-los. “Espera-se que a publicação contribua para o avanço desse debate e para que a prevenção de genocídios e de outras atrocidades seja mais um aspecto prioritário na agenda dos direitos dos povos indígenas, de forma a guiar a responsabilização do Estado brasileiro e garantir a efetividade do projeto constitucional”, explica o texto de apresentação da coletânea, assinado pela subprocuradora-geral da República e coordenadora da 6CCR, Eliana Torelly, e pelo procurador da República Julio José Araujo Junior, coordenador do GT Prevenção de Atrocidades Contra Povos Indígenas.
A primeira parte do livro trata da Justiça de Transição para povos indígenas no Brasil, abordando as medidas de reparação às violações sofridas por essas populações no regime militar. Os textos discutem, entre outros aspectos, a dificuldade em se garantir mecanismos de justiça transicional para populações originárias e o fracasso de mecanismos de prevenção de novas atrocidades. Há ainda um artigo específico sobre a remoção forçada do povo Xavante do território indígena Marãiwatsédé, em 1966, numa ação conduzida por agentes do governo militar brasileiro.
A segunda parte da publicação traz o tema Genocídio Indígena: Passado, Presente e Futuro. Os textos discutem a proteção cultural e idiomática indígena, as formas de barrar o etnocídio, a análise do contexto político atual brasileiro e seus impactos para essas populações. A responsabilização do Brasil, perante a Corte Interamericana, pela degradação da Amazônia, mineração e grilagem em terras indígenas também é tema de artigo, assim como a vulnerabilidade dos indígenas diante das grandes corporações, em litígios judiciais envolvendo megaprojetos econômicos em seus territórios.
A terceira parte trata especificamente dos povos indígenas no contexto da covid-19. Isso porque, num cenário de omissão na demarcação de territórios e na consolidação de políticas públicas, a pandemia incrementa os fatores de risco de genocídio e de outras atrocidades, seja por conta da invasão de territórios e disseminação da doença, seja em razão da sujeição de grupos a vulnerabilidades, sem respaldo estatal para suas demandas. Os artigos falam sobre a necessidade de judicializar políticas públicas de atendimento em saúde para indígenas, a atuação do STF e do Sistema Interamericano de Direitos Humanos na pandemia e a construção do protagonismo indígena nos tempos atuais.
Via: Ministério Publico Federal
09/ago/2021
Foto: Ueslei Marcelino/Reuters
Pela primeira vez na história, povos indígenas vão diretamente ao tribunal de Haia, com seus advogados indígenas, para lutar pelos seus direitos.
Brasília, 9 de agosto de 2021 – A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) protocolou, nesta segunda-feira (9), um comunicado no Tribunal Penal Internacional (TPI) para denunciar o governo Bolsonaro por Genocídio. Na data que marca o dia Internacional dos Povos Indígenas, a organização solicita que a procuradoria do tribunal de Haia examine os crimes praticados contra os povos indígenas pelo presidente Jair Bolsonaro, desde o início do seu mandato, janeiro de 2019, com atenção ao período da pandemia da Covid-19.
Com base nos precedentes do TPI, a Apib uma investigação por crimes contra a humanidade (art. 7. b, h. k Estatuto de Roma – extermínio, perseguição e outros atos desumanos) e genocídio (art. 6. B e c do Estatuto de Roma – causar severos danos físicos e mentais e deliberadamente infligir condições com vistas à destruição dos povos indígenas). Pela primeira vez na história, povos indígenas vão diretamente ao TPI, com seus advogados indígenas, para se defenderem desses crimes.
O acervo do comunicado protocolado é composto por denúncias de lideranças e organizações indígenas, documentos oficiais, pesquisas acadêmicas e notas técnicas, que comprovam o planejamento e a execução de uma política anti-indígena explícita, sistemática e intencional encabeçada por Bolsonaro.
“Acreditamos que estão em curso no Brasil atos que se configuram como crimes contra a humanidade, genocídio e ecocídio. Dada a incapacidade do atual sistema de justiça no Brasil de investigar, processar e julgar essas condutas, denunciamos esses atos junto à comunidade internacional, mobilizando o Tribunal Penal Internacional”, destaca Eloy Terena, coordenador jurídico da Apib.
De acordo com trecho do comunicado, “o desmantelamento das estruturas públicas de proteção socioambiental e aos povos indígenas desencadeou invasões nas Terras Indígenas, desmatamento e incêndios nos biomas brasileiros, aumento do garimpo e da mineração nos territórios.”
Para a Apib os ataques às terras e aos povos indígenas foram incentivados por Bolsonaro em muitos momentos ao longo de sua gestão. Os fatos que evidenciam o projeto anti-indígena do Governo Federal, vão desde a explícita recusa em demarcar novas terras, até projetos de lei, decretos e portarias que tentam legalizar as atividades invasoras, estimulando os conflitos.
“A Apib permanecerá em luta pelo direito dos povos indígenas de existirem em sua diversidade. Somos povos originários e não nos renderemos ao extermínio”, enfatiza Eloy que é um dos oito advogados indígenas que assinam o comunicado.
O documento de denúncia, enviado ao TPI, também contou com o apoio do Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos – CADHu e da Comissão Arns, que protocolaram, em 2019, outro comunicado à Procuradoria do TPI contra Bolsonaro, que ainda está sob análise no tribunal.
Agosto Indígena
“Lutamos todos os dias há centenas de anos para garantirmos a nossa existência e hoje a nossa luta por direitos é global. As soluções para este mundo doente vêm dos povos indígenas e jamais nos calaremos diante das violências que estamos sofrendo. Enviamos esse comunicado ao Tribunal Penal Internacional porque não podemos deixar de denunciar essa política anti-indígena de Bolsonaro. Ele precisa pagar por toda violência e destruição que está cometendo”, afirma a coordenadora executiva da Apib, Sonia Guajajara.
Segundo a coordenadora, o mês de agosto será marcado por mobilizações dos povos indígenas na luta por direitos. Ela ressalta o acampamento ‘Luta pela Vida’ que está marcado para acontecer entre os dias 22 e 28 de agosto, em Brasília. “Vamos ocupar mais uma vez os gramados da esplanada para impedir os retrocessos contra os direitos dos nossos povos”, reforça Sonia.
“Alertamos o Tribunal Penal Internacional para a escalada autoritária em curso no Brasil. O ambiente democrático está em risco”, afirma Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib lembrando dos projetos de lei que estão na pauta de votação do Congresso e ameaçam os direitos indígena e do julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF), sobre o Marco Temporal, que pode definir o futuro dos povos indígenas.
“Estamos fazendo um chamado de mobilização para Brasília, em plena pandemia, porque hoje a agenda anti-indígena do Governo Federal representa uma ameaça mais letal que o vírus da Covid-19. A vida dos povos indígenas está ligada aos territórios e nossas vidas estão ameaçadas. Estaremos mobilizados nas aldeias, nas cidades, em Brasília e no tribunal de Haia para responsabilizar Bolsonaro e lutar pelos nossos direitos”, destaca Tuxá.
“Os povos indígenas permanecerão vigilantes, como historicamente fizeram. É dever do governo federal brasileiro respeitá-los, como expressão fundacional de um Estado Constitucional de Direito”, aponta trecho do documento encaminhado para o TPI.
DESTAQUES
- Em 19 de novembro de 2019, o Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos – CADHu e Comissão Arns apresentam comunicado por incitação ao genocídio e crimes contra a humanidade perpetrado por Jair Bolsonaro contra povos indígenas.
- Durante o segundo semestre de 2020, a Apib e a Clínica de Litigância Estratégica em Direitos Humanos da Fundação Getúlio Vargas, de São Paulo, fizeram oficinas com advogados indígenas, lideranças, estudantes, especialistas e parceiros da Apib sobre a jurisdição do TPI.
- Logo em seguida, a APIB lançou um chamado para que as lideranças e organizações de base enviassem denúncias de violações de direitos, especialmente no contexto da pandemia. Tais relatos foram em grande medida incorporados no comunicado ao TPI.
- Os encontros abordaram temas como a jurisdição penal internacional e suas críticas, os crimes do Estatuto de Roma, o processo perante o TPI, o papel das vítimas na construção dos casos, a admissibilidade e a agenda da Procuradoria.
- Em dezembro de 2020, a Procuradoria do TPI informou ao Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos – CADHu e Comissão Arns que está formalmente avaliando a comunicação enviada em novembro de 2019.
- Durante o primeiro semestre de 2021, a partir dos debates das oficinas feitas em 2020, a APIB iniciou um processo de coleta de depoimentos e dados sobre o impacto dos atos de Jair Bolsonaro em distintas comunidades indígenas no país.
- Os relatos, emitidos diretamente pelos povos indígenas afetados, documentos oficiais, pesquisas acadêmicas e notas técnicas compõem o acervo probatório do comunicado feito pela Apib, protocolado dia 9 de agosto no TPI com o apoio do Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos – CADHu e da Comissão Arns.
- São 86 páginas apenas com fatos, que se organizam em:
- Uma cronologia dos atos do Presidente Jair Bolsonaro de ataque aos povos indígenas e destruição da infraestrutura pública de garantia dos direitos indígenas e socioambientais, na qual foram compilados os principais atos administrativos, normativos, discursos, reuniões e projetos, direta ou indiretamente praticados pelo presidente Jair Bolsonaro;
- A descrição das principais consequências da destruição da infraestrutura pública de garantia dos direitos indígenas e socioambientais: a invasão e o esbulho de terras indígenas; o desmatamento; o garimpo e a mineração em nos territórios e o impacto da pandemia da Covid-19 sobre os povos indígenas, trazendo pesquisas, relatórios e dados.
- O relato sobre o impacto das invasões, do desmatamento, garimpo e mineração em Terras Indígenas e a propagação da pandemia de Covid-19 tiveram sobre os povos indígenas isolados ou de contato recente e sobre os povos Munduruku, os indígenas que vivem na TI Yanomami, os Guarani-Mbya, Kaingang, os Guarani-Kaiowá, os Tikuna, Kokama, os Guajajara e os Terena.
- A APIB leva à jurisdição penal internacional a voz e a interpretação dos povos indígenas sobre os crimes dos quais vêm sendo vítimas, fato por si só histórico. Com base nos precedentes do TPI, a APIB abriu investigação por crimes contra a humanidade (art. 7. b, h. k Estatuto de Roma – extermínio, perseguição e outros atos desumanos) e genocídio (art. 6. B e c do Estatuto de Roma – causar severos danos físicos e mentais e deliberadamente infligir condições com vistas à destruição dos povos indígenas).
Perguntas e Respostas
P: Várias ações apresentadas na denúncia já aconteciam antes do Governo Bolsonaro (desmatamento e incêndios nos biomas brasileiros, garimpo e mineração em terras indígenas têm sido historicamente comuns, com maior ou menor intensidade, em outros governos.). Por que essa denúncia só agora?R: É secular a violação aos direitos dos povos indígenas, bem como os riscos de desmatamento e exploração da Amazônia. Mas é inédita a construção de uma política anti-indígena, sistemática e intencional. É a primeira vez que se vê a desconstrução da infraestrutura de proteção dos direitos indígenas e dos direitos socioambientais. A Funai, por exemplo, de órgão de garantia dos direitos indígenas, se transformou em órgão de perseguição. Também é a primeira vez que se vê um presidente se posicionar contrariamente à demarcação de terras indígenas e o incentivo da atuação ilegal de garimpeiros e grileiros. Associado à política anti-nindígena, há um discurso discriminatório e violento contra os povos indígenas que surte efeitos concretos. Não se tratam apenas de discursos, mas de ações concretas e concatenadas, todas indicadas na comunicação.
P: Por que o TPI deve discutir este caso?R: Sabemos que é um desafio para o Tribunal Penal Internacional lidar com fatos que envolvam países com algum grau de democracia. Historicamente, o Tribunal tem voltado suas atenções para situações de conflitos deflagrados. Mas o que os povos indígenas mostram ao TPI é que é possível o cometimento dos crimes mais graves em ambiente de desdemocratização, como o brasileiro. Sob o comando do Presidente Jair Bolsonaro foi instituída uma política anti-indígena sistemática a intencional que pde ser tecnicamente enquadrada como genocídio e como crimes contra a humanidade contra povos indígenas e tradicionais do país. É essencial, portanto, que o Tribunal Penal Internacional fique ciente dos relatos específicos desses impactos sobre os povos isolados e de recente contato, sobre os Munduruku, sobre os Yanomami, os Guarani-Mbya e Kaigang, os Guarani-Kaiowá, os Tikuna, os Guajajara e os Terena. Com a apresentação da situação geral do país e dos relatos específicos desses povos é que se espera é que os crimes cessem e que a comunidade internacional possa ficar atenta às violações que ainda estão em curso no país e que podem tomar proporções ainda mais graves caso não haja medidas efetivas.
P: Por que a escolha de levar o caso a uma corte internacional?R: O sistema de justiça brasileiro não tem sido capaz de oferecer respostas, mais especificamente a responsabilização do presidente da República pela sua política anti-indígena. Nenhum destes atos gravíssimos que são apresentados na comunicação sequer foi objeto de investigação ou abertura de investigação formal contra o Presidente Jair Bolsonaro. Para o Tribunal Penal Internacional, é preciso demonstrar que não haja uma efetiva investigação ou que não se espere independência e imparcialidade de investigadores e juízes. O Presidente Jair Bolsonaro tem demonstrado nenhum apreço à independência das instituições, como ficou comprovado pelas sucessivas interferências na Polícia Federal, a forma como controla a Procuradoria Geral da República, com a nomeação de um procurador totalmente alinhado com suas com suas ideias inconstitucionais, e as investidas contra o Supremo Tribunal Federal.
P: Tendo em vista a morosidade do TPI diante de casos de grande relevância, quais impactos concretos vocês esperam a partir da denúncia?R: Há uma responsabilidade da APIB, como associação representativa dos povos indígenas brasileiros, de acionar todos os mecanismos disponíveis para prevenir, reparar ou responsabilizar o genocídio dos povos tradicionais e as demais violações de direitos humanos que estamos sofrendo. Essa comunicação, em conjunto com as que já foram apresentadas, reforça o alerta ao sistema internacional de que o que estamos passando no Brasil é intolerável. Nosso principal objetivo é demonstrar à Procuradoria do Tribunal Penal Internacional a gravidade do que está acontecendo no Brasil em relação aos povos indígenas, tradicionais e ao meio ambiente, apresentando relatos específicos da gravíssima situação vivida por alguns povos (Munduruku, Yanomami, Guarani-Mbya e Kaigang, Guarani-Kaiowá, Tikuna, Guajajara e Terena).
P: Não seria um exagero falar em genocídio?R: Não. O crime de genocídio exige um ato típico com a intenção especial de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso enquanto tal, seja por ofensas graves à integridade física e mental (artigo 6.b) ou pela sujeição intencional a condições de vida com vista a provocar sua destruição total ou parcial (artigo 6.c). A existência de uma política anti-indígena sistemática e intencionalmente promovida pelo Presidente Jair Bolsonaro causa severos danos físicos e mentais e procura sujeitar os povos indígenas a condições tais que podem gerar sua destruição, seja pela desassistência de saúde, insegurança alimentar, contaminação por Covid ou por metais em razão da expansão do garimpo ilegal e da invasão de terras.
As consequências dessa política anti-indígena estão especificamente descritas para os povos isolados e de recente contato, para os Munduruku, os Yanomami, os Guarani-Mbya e Kaigang, os Guarani-Kaiowá, os Tikuna, os Guajajara e os Terena.
P: Que tentativas foram promovidas previamente pelos autores da denúncia junto ao sistema de justiça do Brasil?
R: Os povos indígenas atuam diretamente em diversas instâncias, mas a ação penal contra o Presidente da República é de competência privativa do Procurador-Geral da República.
P: Por que a comunicação menciona ecocídio, que não é um tipo previsto no Estatuto de Roma?
R: Ecocídio já é interpretado pela Procuradoria do TPI como uma forma por meio da qual se pode dar o cometimento de crimes contra a humanidade e genocídio, ou seja, a destruição do meio ambiente e dos recursos naturais como forma de atacar sistematicamente um grupo. Há, de fato, o debate sobre a sua tipificação. A comunicação da APIB pode colaborar para ambos os casos: avançar na interpretação já dada pela Procuradoria do TPI e estimular o debate internacional sobre uma possível tipificação.
A menção ao ecocídio é feita para apontar que os ataques ao meio-ambiente, às matas, às águas, às florestas, ferem de morte a humanidade. Ainda que não haja um tipo penal que o defina no ordenamento jurídico do TPI, o debate decolonial que o apresenta no mundo da vida é urgente. E ele servirá de pano de fundo para comprovar a gravidade do que está acontecendo no Brasil em relação aos crimes tipificados e cometidos contra os povos indígenas (genocídio e crimes contra a humanidade).
P: Por que nenhum ministro (do Meio Ambiente, por exemplo) foi incluído?
R: Porque quem manda e é responsável pelas ordens cumpridas pelo Ministro do Meio Ambiente e outros órgãos do governo federal é o Presidente Jair Bolsonaro, mentor da política anti-indígena em curso no Brasil.
P: Como foi a construção deste Comunicado?
R: O Comunicado apresentado pela APIB foi construído coletivamente, desde o início. Uma peça judicial com essa complexidade demanda a convergência de profissionais diversos para que fosse elaborada.
No início do segundo semestre de 2020, representantes da APIB e do Coletivo Advocacia em Direitos Humanos – CADHu e da Comissão Arns (que apresentaram uma denúncia em novembro de 2019 ao TPI, e que segue em avaliação) estiveram em contato com o objetivo de tratar do Comunicado autônomo que a APIB desejava construir.
A partir disso, definiu-se uma metodologia para que os advogados e advogadas indígenas pudessem aprender sobre o funcionamento da jurisdição do TPI, os crimes ali previstos, os requisitos de uma denúncia etc.. A APIB convocou lideranças indígenas e organizações parceiras para participar de uma agenda de formação sobre o tema. As oficinas foram realizadas em parceria com a Clínica de Litigância Estratégica da FGV/SP, e contou com vários especialistas sobre temas distintos afetos ao TPI.
A partir dessas oficinas, construiu-se um roteiro e houve a formação de grupo de profissionais da APIB, do CADHu, da Comissão Arns e consultores de organizações parceiras para a elaboração da minuta do Comunicado. Esse grupo analisou fontes documentais, normativas, jornalísticas, bem como colheu depoimentos testemunhais para a elaboração da peça. A construção coletiva desse Comunicado durou um período de aproximadamente um ano. |
05/ago/2021
Na última quarta-feira (04), um crime bárbaro foi cometido no Setor Estiva, na Terra Indígena do Guarita, em Redentora, no Rio Grande do Sul, contra uma jovem parenta de 14 anos. Daiane Griá Sales, do povo Kaingang, foi encontrada morta em uma plantação nos arredores da comunidade, suas partes íntimas estavam dilaceradas.
A violência contra os povos indígenas tem se intensificado a cada dia. Assassinam nossos jovens, nossas mulheres, nossas lideranças; roubam nossas terras e querem tirar nossos direitos. A violência contra as mulheres indígenas é intensa desde a invasão portuguesa. Mulheres que são a vida do nosso povo, mulheres que curam mulheres guerreiras.
A Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpinsul) e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), em conjunto com todas as organizações regionais de base, repudiam toda e qualquer violência contra mulheres indígenas e exige que a justiça seja feita a quem cometeu tal atrocidade.
Não podemos aceitar que nossas vidas continuem sendo ceifadas, e que nossos direitos sejam retirados, ainda mais quando falamos do nosso direito maior, o direito à vida!
Somos Daiane Griá Kaingang
Exigimos justiça!
#vidasindígenasimportam
#emergênciaindígena
05/ago/2021
A Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (ANMIGA), viemos por meio deste manifesto repudiar e denunciar o crime de barbárie cometida na tarde desta quarta-feira (04), no Setor Estiva, da Terra Indígena do Guarita, no município de Redentora, contra a jovem de apenas 14 anos, Daiane Griá Sales, indígena Kaingáng, moradora do Setor Bananeiras da Terra Indígena do Guarita. A jovem Daiane foi encontrada em uma lavoura próxima a um mato, nua e com as partes inferiores (da cintura para baixo) arrancadas e dilaceradas, com pedaços ao lado do corpo.
Temos visto dia após dia o assassinato de indígenas. Mas, parece que não é suficiente matar. O requinte de crueldade é o que dilacera nossa alma, assim como literalmente dilaceraram o jovem corpo de Daiane, de apenas 14 anos. Esquartejam corpos jovens, de mulheres, de povos. Entendemos que os conjuntos de violência cometida a nós, mulheres indígenas, desde a invasão do Brasil é uma fria tentativa de nos exterminar, com crimes hediondos que sangram nossa alma. A desumanidade exposta em corpos femininos indígenas, precisa parar!
Estamos aqui, reivindicando justiça! Não deixaremos passar impune e nem nos silenciarão. Lutamos pela dignidade humana, combatendo a violência de gênero e tantas outras violações de direitos. As violências praticadas por uma sociedade doente não podem continuar sendo banalizadas, naturalizadas, repleta de homens sem respeito e compostura humana, selvageria, repugnância e macabrismo. Quem comete uma atrocidade desta com mulheres filhas da terra, mata igualmente a si mesmo, mata também o Brasil.
Mas saibam que o ÓDIO não passará! Afinal, a violência praticada não pode passar impune, nossos corpos já não suportam mais ser dilacerados, tombado há 521 anos. Que o projeto esquartejador empunhado pela colonização, violenta todas nós, mulheres indígenas há mais de cinco séculos.
Somos 448 mil Mulheres Indígenas no Brasil que o estrupo da colonização não conseguiu matar e não permitiremos que a pandemia da violência do ódio passe por cima de nós.
Parem de nos matar! A cada mulher indígena assassinada, morre um pouco de nós.
Vidas indígenas importam. Gritaremos todos os dias, a cada momento, vidas indígenas importam. E a vida de Daiane importa. Importa para sua família, para seu povo. Importa para nós mulheres indígenas.
04/ago/2021
O Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU) obtiveram, na última segunda-feira (2), decisão liminar determinando que a União inclua, no prazo máximo de dez dias, os indígenas do Estado de Mato Grosso que vivem em áreas urbanas ou em outros locais em que não estejam cadastrados pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) na fase de vacinação prioritária contra a covid-19.
Foi determinado, ainda, que a União e o Estado de Mato Grosso assegurem, no prazo de dez dias, a destinação de doses de vacina contra covid-19 e procedam à articulação imediata junto aos municípios para efetivação da vacinação prioritária de todos os indígenas do estado que vivem em contextos urbanos ou em outros locais em que não estejam cadastrados pela Sesai. Atualmente apenas os indígenas “aldeados” estão sendo vacinados dentro do grupo prioritário.
Conforme a ação civil pública (ACP) ajuizada pelo MPF, em atuação conjunta com a DPU, e que resultou na concessão da liminar, foram requisitadas informações ao secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (SVS/MS) e à Secretaria Estadual de Saúde de Mato Grosso sobre a vacinação dos indígenas que vivem em áreas urbanas. Provas foram reunidas no sentido de que os indígenas residentes em áreas urbanas estavam excluídos do plano de vacinação contra covid-19, tanto por não serem considerados como seu público alvo pelos Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei’s) quanto por não serem atendidos pelos municípios e pelo estado no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).
As informações reunidas junto aos Dsei’s revelaram que mais de 3,6 mil indígenas em Mato Grosso estão excluídos da vacinação prioritária por não serem “aldeados”. Além disso, apurou-se que o Dsei/Cuiabá devolveu à Secretaria Estadual de Saúde 840 doses de vacina não utilizadas, enquanto que o Dsei/Xingu tem à sua disposição 800 doses prestes a serem devolvidas também. Esse total de 1.640 doses de vacina poderia ter sido utilizado para imunização de indígenas residentes em áreas urbanas, mas seu uso não foi autorizado pelo órgão central (Sesai).
O MPF e a DPU frisaram que, historicamente, os povos indígenas sempre estiveram mais vulneráveis biologicamente a viroses, em especial a infecções respiratórias. “Estas doenças sempre apresentaram altos índices de mortalidade causados pelas doenças transmissíveis que contribuíram com a redução do número de indígenas que vivem no território brasileiro. Os efeitos da pandemia somam-se, portanto, às circunstâncias históricas e peculiaridades biológicas desses grupos”, segundo consta da petição inicial. Dados apontados na ação demonstram uma letalidade maior da pandemia entre os indígenas se comparados aos demais grupos.
Também se apontou na ação que o Ministério da Saúde não vinha cumprindo a legislação que elencou os indígenas, sem distinção, entre os integrantes dos grupos prioritários de vacinação, assim como a decisão do Supremo Tribunal Federal na ADPF n. 709.
A Justiça Federal, na decisão liminar, citou a Lei n. 14.021/2020, que versa sobre medidas de proteção social para prevenção do contágio e da disseminação da covid-19 nos territórios indígenas. A lei coloca os indígenas isolados e de recente contato, os indígenas aldeados e os que vivem fora das terras indígenas, em áreas urbanas ou rurais no mesmo patamar de proteção prioritária, sem distinção de domicílio, e “é assim que a política pública de imunização deve tratá-los, essa deve ser a premissa a partir da qual tudo deve suceder”, segundo o magistrado.
“Se a lei não os distinguiu, é vedado que uma norma infralegal o faça. Se a lei não condicionou a proteção à região em que vivem, as políticas públicas não podem limitar essa proteção com base nesse critério, realizando distinções discriminatórias e não amparadas em elementos técnicos para priorizar a imunização de indígenas aldeados em descompasso com aqueles que vivem em zona urbana ou rural, não aldeados”, destaca também a decisão.
Dessa forma, além da inclusão dos indígenas não aldeados no plano de imunização, a União e o Estado de Mato Grosso devem assegurar, no prazo de dez dias, a destinação de doses de vacina contra a Covid-19 e proceder à articulação imediata junto aos municípios do estado para fins de efetivação da vacinação prioritária de todos os indígenas de Mato Grosso que vivem em contextos urbanos ou em outros locais em que não estejam cadastrados pela Sesai.
Via: Ministério Público Federal do Mato Grosso
04/ago/2021
No início da noite desta terça-feira (03 de agosto), deputados ligados ao agronegócio e à base do governo Bolsonaro, aprovaram o Projeto de Lei 2633, conhecido como PL da Grilagem. A proposta votada aumenta a violência contra povos indígenas, quilombolas e agricultores familiares e não foi apresentada anteriormente à sociedade civil, postura típica de regimes antidemocráticos. Agora, o projeto segue para votação no Senado e o movimento indígena continua na luta por direitos.
A justificativa apresentada para a aprovação deste Projeto de Lei seria a necessidade de regulamentar terras para pequenos agricultores. Entretanto, o Brasil já dispõe de políticas para reforma agrária e destinação de terras que precisam apenas ser implementadas de forma efetiva. O fato é que o texto aprovado, legaliza o ilegal: regulariza terras apropriadas de maneira criminosa, em processos que muitas vezes incluem atos violentos contra povos indígenas e comunidades tradicionais.
Grilagem, para quem não conhece a expressão, é o nome dado à invasão, ocupação e comércio ilegal de áreas públicas. É esse tipo de ato que o Projeto de Lei aprovado ontem legaliza no Brasil. A prática está ligada ao desmatamento e à destruição da biodiversidade e ameaça diretamente povos originários que ocupam tradicionalmente as terras usurpadas pelos grileiros.
Segundo o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), cerca de 30% dos desmatamentos e queimadas na Amazônia ocorreram em terras públicas não destinadas, que foram possivelmente alvo de grilagem. Ainda, estudos do Imazon estimam que caso o PL 2633 entre em vigor como lei, poderá ocasionar um desmatamento adicional de até 16 mil quilômetros quadrados, área quase 3 vezes o tamanho do Distrito Federal.
O roubo de terra pública não é novidade no Brasil. O que é inédito é que o Poder Público, que deveria zelar pelo bem comum, resolva descaradamente premiar ladrões e usurpadores com a regularização da terra fruto de roubo. Esta aberração ética e jurídica coloca nossas florestas, nossa biodiversidade e os povos que delas dependem – especialmente os povos indígenas, comunidades tradicionais e agricultores familiares – de joelhos frente à violência que são típica dos processos de invasão e apropriação ilegal de terras.
No momento em que o mundo todo discute formas de manter as florestas em pé como uma solução para as mudanças climáticas, o governo brasileiro segue “passando a boiada”, abrindo caminho para o aumento das taxas de desmatamento, o que vai contra seus próprios compromissos para zerar o desmatamento ilegal.
Os povos indígenas manifestam seu repúdio frente a este absurdo e irresponsável sinal emanado daquela que se auto-nomeia “Casa do Povo”. Com a aprovação deste projeto, a Câmara demonstra que está se convertendo na casa dos ruralistas, dos desmatadores, dos grileiros – de todos estes, menos do povo.
03/ago/2021
O Ministério Público Federal (MPF) vem obtendo liminares na Justiça Federal que suspendem a Instrução Normativa 9, da Fundação Nacional do Índio (Funai), que alterou os critérios para a emissão de Declaração de Reconhecimento de Limites (DRL) por meio do Sistema de Gestão Fundiária (Sigef), gerido pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Com a instrução, proprietários ou possuidores de terras poderiam emitir a declaração para áreas dentro do limite de terras indígenas ainda não homologadas pelo governo federal brasileiro.
O MPF considera que a instrução viola direitos constitucionais dos povos indígenas, favorece a grilagem de terras públicas e agrava conflitos agrários. Ao todo, procuradores da República ajuizaram 28 ações judiciais na 1ª instância da Justiça Federal, pedindo a suspensão da IN 09, com 19 decisões judiciais favoráveis. Atualmente, a norma da Funai está suspensa por ordens judiciais em oito estados da Federação: Pará, Mato Grosso, Amazonas, Acre, Roraima, Rondônia, Bahia e Rio Grande do Sul, o que garante a proteção de mais da metade das terras indígenas brasileiras.
Em recursos à 2ª instância, o governo federal até agora conseguiu reverter três liminares no Mato Grosso do Sul e suspender duas, em Santa Catarina e no Ceará. Duas liminares foram negadas, nas subseções judiciárias de Dourados (MS) e Foz do Iguaçu (PR), e o MPF aguarda decisão sobre recursos nesses dois casos. Das 28 ações civis públicas ajuizadas sobre o tema em todo o país, seis ainda estão pendentes de apreciação, em Belém (PA), São Luís (MA), Carazinho (RS), Vilhena e Ji-Paraná (RO) e São Paulo (SP). Quatro das liminares deferidas já foram confirmadas por sentenças, em Santarém (PA) e Castanhal (PA), Rio Branco (AC) e Boa Vista (RR). Em uma das ações judiciais iniciadas pelo MPF, em Belo Horizonte (MG), houve declínio de competência.
O MPF sustenta nas ações judiciais que a IN 09/2020 contraria o caráter originário do direito dos indígenas às suas terras e a natureza declaratória do ato de demarcação; cria indevida precedência da propriedade privada sobre as terras indígenas, em flagrante ofensa à Constituição; representa indevido retrocesso na proteção socioambiental; incentiva a grilagem de terras e os conflitos fundiários; entre outros problemas. As decisões judiciais obtidas determinam a manutenção das áreas indígenas ainda não homologadas no Sistema de Gestão Fundiária (Sigef) e no Sistema do Cadastro Ambiental Rural (Sicar).
Teor das decisões – Os juízes federais que concederam liminares ao MPF têm apontado o desrespeito da IN 09 ao texto constitucional e a subversão da missão institucional da Funai. Em uma das sentenças, exarada no Pará, a Justiça assinala que “a Funai, de forma pouco usual, adota uma retórica em prol dos não índios, o que causa certa estranheza em razão de seu dever de garantir o cumprimento da política indigenista (artigo 1º, lei nº. 5.371/1967)”
Para a Justiça Federal, ao permitir que particulares recebessem declarações de propriedade sobre áreas já caracterizadas como terras indígenas, a Funai utilizou-se de sua própria “ineficiência” em concluir os processos de demarcação “para onerar os povos tradicionais, retirando deles a segurança jurídica de alcançar o direito originário às terras ocupadas por eles, por meio da homologação, o que lhes é garantido pela Constituição Federal”.
“A instrução normativa da Funai não resolve o problema original enfrentado pelos indígenas no Brasil nem o dos possuidores de lotes rurais, lentidão no processo de demarcação de terra indígena, pelo contrário, com a justificativa de proteger o direito de propriedade de particulares, fere o direito originário de posse dos índios. Ainda transfere o ônus da ineficiência para os povos indígenas”, diz uma das decisões.
Atuação coordenada – Desde a publicação da IN 09/2020, o MPF defende que a regulamentação ameaça os direitos territoriais dos indígenas. Em abril de 2020, 49 procuradoras e procuradores da República de 23 estados assinaram recomendação que foi encaminhada ao presidente da Funai para que o ato administrativo fosse anulado. Com a negativa da Funai em cumprir a recomendação, o MPF precisou recorrer ao poder Judiciário.
Para o MPF a norma é inconstitucional, ilegal e contraria a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a Declaração das Nações Unidas Sobre os Direitos dos Povos Indígenas e a posição do Supremo Tribunal Federal (STF). Além disso, a instrução normativa afetaria, além das populações indígenas, os particulares de boa-fé que adquiram terrenos nas áreas em processo de demarcação, gerando falsa expectativa sobre a propriedade e insegurança jurídica.
Levantamento feito Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do MPF (6CCR/MPF) em junho do ano passado constatou que há quase 10 mil propriedades sobrepostas a terras indígenas que estão em diferentes fases de regularização ou em áreas com restrição de uso. O estudo foi encaminhado a procuradores da República em todo o país e subsidia a atuação no combate à grilagem e aos crimes ambientais em terras indígenas, bem como às violações dos direitos humanos desses povos.
A pesquisa foi feita pela Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise da Procuradoria-Geral da República, a pedido da 6CCR, e considerou dados extraídos do Sistema do Cadastro Ambiental Rural, vinculado ao Serviço Florestal Brasileiro, no período de 21 a 31 de maio de 2020. Ao todo, foram identificados 9.901 registros de propriedades no CAR cujos limites coincidem com territórios indígenas ou com restrição de uso, ou seja, áreas interditadas pela Funai para proteção de povos indígenas isolados, com o estabelecimento de restrição de ingresso e trânsito de terceiros.
Segundo a investigação, o estado com o maior número de imóveis rurais localizados em terras destinadas a povos indígenas é o Pará, com 2.325 registros. Desse total, 1.290 propriedades estão situadas dentro de terras indígenas em processo de regularização e 1.035 em áreas com restrição de uso. Em seguida, aparece o estado de Rondônia, onde foram identificados 1.385 registros de imóveis rurais sobrepostos a áreas indígenas, sendo 1.345 referentes a terras indígenas e 40 a áreas com restrição de uso. No Amazonas, são 1.163 propriedades irregulares registradas no CAR, uma vez que 524 estão dentro de terras indígenas e outras 639 em áreas interditadas para proteção de povos isolados.
Via: Ministério Público Federal
02/ago/2021
Nós, Kunhangue de Santa Catarina, de 20 tekoa, reunidas nos dias 27 a 31 de julho de 2021 na Tekoa Pira Rupa – Palhoça/SC, compartilhamos histórias de vida, saberes, choros, abraços, risos e cuidados. Escolhemos a carta como ‘um jeitinho bom’ de contar o que aconteceu para aquelas que não puderam estar presentes em nosso encontro, sendo está apenas um dos resultados, pois a maioria deles ficaram gravados em nossos corações, e para os outros, convidamos a todos vocês para nos ajudar a cultivar. Nestes dias, falamos e ouvimos sobre a importância das Kunhangue no dia-a-dia no território, tivemos os momentos sensíveis para relatos das ainda atuais violências que sentimos, e finalizamos com a força milenar da cura e saúde das mulheres, o kunhangue reko.
Iniciamos discutimos sobre a força e as dificuldades das mulheres que são chefes de família, ouvindo as histórias de vida de muitas guerreiras de nosso povo que no cotidiano vem sendo responsáveis por um dos momentos mais sagradas de nossa vida, o momento de nossa alimentação – tanto de nossos corpos quanto nossos espíritos. Afirmamos a problemática das entradas de alimentos industrializados em nossas tekoas, e relatamos como elas tem afligindo nossa saúde e na nossa vida como ser humano a nossa forma de relação comunitária com os alimentos.
Queremos viver bem, com muito mborayu e saúde! Os fundamentos de nosso encontro foram os aconselhamentos com nossas xejaryi, no aprender ouvindo e também fazendo as boas práticas de alimentação, cuidado e resguardo, sobre nossos remédios e curas. Como essas práticas são essenciais para as gestantes e para as crianças, são base para todos nós e nossos territórios.
Saudamos as parteiras, das mitãjaryi, e agradecemos a vida e o trabalho que essas médicas tradicionais realizam. Esse foi um dos temas que trouxeram relatos dolorosos, de como nossas jovens e mães têm sido desrespeitadas em seus momentos de parir. Um dos pontos principais levantados foi o pedido de que as nossas placentas sejam tratadas com os nossos rituais de entregarmos ela para a Terra para que permaneçam nas tekoa, pois assim nossos filhos se tornam jovens e adultos conectados com nosso território, pois permanecem conectados através da placenta e cordão umbilical e com isso capazes de defender nosso povo, o nhandereko. É muito importante que o sistema de saúde que nos atende entenda e respeite as nosso modo de ser.
Nós mulheres Guarani carregamos os conhecimentos milenares sobre a Mata Atlântica e as sementes. Na Tekoa Pira Rupa lembramos que temos remédio, força e sabedoria de sobra. Fizemos uma busca das medicinas da região e pudemos coletar remédio para todos os tipos de doença e males e juntas cozinhamos nosso alimento sagrado que são medicinas para cura do nosso corpo e do nosso espírito. Com o riso solto, fizemos os chás para benzimentos e banhos com as ervas medicinais. Era um cheiro de aromas espalhados no encontro, e a cura estava sendo feita não só dos nossos corpos, mas também na nossa memória. Coletamos nossas medicinas na mata, contando e ouvindo sobre o poder de cada erva medicinal, preparamos o avaxi ku’i, mbojape, kaguijy, entre outros alimentos e lembramos dos nossos avôs, nossas avós, lembramos das histórias que vão sendo contadas, do que faziam antigamente, e assim vamos nos curando, vamos ficando melhores.
Não podemos perder o conhecimento que as xejaryi estão trazendo, para que sirva de alimento, para o que sirva de remédio. Lembrando também que não são todas as mulheres que sabem por exemplo benzer, mas entre nós, sabemos que isso existem mulheres que tem essa licença para fazer a cura. Esse conhecimento é o mínimo que precisamos ter para cuidar e manter. Precisamos disso para que o nhandereko não se perca no futuro. Estamos em uma guerra para que nosso conhecimento, o conhecimento da mulher guarani não seja apagado, desprezado, assediado.
Sabemos que dar essa importância significa também trazer os homens conosco nessa busca. Precisamos lutar juntos para que nosso direito à saúde exista respeitando o nhandereko, o kunhangue reko, sem nunca esquecer das necessidades das mulheres e crianças. Então, decidimos que no final do encontro, escreveremos juntas um documento para a SESAI e outras autoridades, fazendo essa cobrança. Precisamos que o sistema de saúde juruá, nos escute e nos respeite, para isso, precisamos também do apoio dos homens de nossas tekoa, para que levem essas urgências trazidas pelas mulheres para todas as discussões das quais eles participam para discutir política de saúde, seja com SESAI Funai e outras instituições juruá, seja mesmo entre eles da Comissão nhemongueta e outros grupos de caciques.
Temos falado sobre os muitos tipos de violência que nos fazem sofrer, e sempre confirmamos a importância do diálogo entre as mulheres com os homens e seus filhos e filhas. Discutimos sobre como podemos criar esses espaços de fala e entendimento, sem julgamento. Não queremos também que os homens sofram, queremos nos cuidar juntos, fazer juntos nossa luta, andando lado a lado. Não queremos andar atrás. Queremos que as mulheres da comunidade tenham mais participação nas organizações e conselhos, para que que olhem mais para nós todas.
A luta contra a cultura da violência às mulheres, e a importância de reverter este triste quadro que se estende as gerações foi também um dos grandes desafios que tiramos neste encontro. Foi reafirmado por todas que o modo de vida original nhanderu criou a mulher para ser companheira dos homens, não sendo cultural e espiritual a violência contra as mulheres, tema que muitas vezes é ultilizada até no meio jurista erroneamente para defender o abuso e violência contra as mulheres, trazida pelo homem branco, e defender abusadores. Alegando ser cultural, um dos exemplos: os estupros. Não aceitamos mais nada que nós façamos sofrer e sentir dor seja ela física ou psicológica.
As mulheres desde 1500 foram linha de frente na resistência do modo de vida Guarani desde da proteção dos territórios, crianças e vulneráveis à ataques feitos pelos Juruá desde a invasão dos territórios. Foi relatado sobre a cultura juruá machista dentro das aldeias, quando se naturaliza a violência e abuso das mulheres. Foi refletido que um determinado momento o respeito tradicional entre homens e mulheres, ensinado desde criança, foi transgredido, sendo inserido uma ideologia de abusos contra as meninas e mulheres mais novas. A importância da atividade foi direcionar as mulheres que a violência contra a mulher não é algo normal, não é do Nhandereko, principalmente para as mulheres lutar, acompanhar e reverter esses casos dentro das comunidades.
Saímos das atividades fortalecidas para poder se firmar juntas e com as outras parentes das aldeias a denúncia e a luta contra a violência às mulheres. Não precisamos que nos deem voz: nós já temos, precisamos que nos deem ouvidos! Nossos encaminhamentos são: (” porque atrás de um grande homem, existe uma grande mulher”)
Vamos desconstruir as linguagens da inferiorização das mulheres. Vamos desvendar as lendas. Nossa visão de futuro é que ao lado de um grande homem estejam as grandes mulheres. A avós, as mães, as companheiras, as filhas e netas.
1• Realizar um documento direcionado a SESAI feito pela comissão guarani yvyrupa, exigindo para que os hospitais preservem placentas e outras partes do corpo para ser retornado à os territóriospara realização dos trabalhos sagrados da cultura.
2• Foi apontada a importância de valorizar as parteiras tradicionais, ter um espaço para poder realizar os partos nas aldeias e a formação de novas parteiras.
3• Na questão da alimentação,
O diálogo da sesai com as comunidades e hospitais para quando a mulher ter o bebê nos hospitais, que atenda essa dieta do resguardo com alimentação específica para seu resguardo.
4* Que seja contratada mulheres com conhecimentos nutricionistas para poder gerir e atuar na questão alimentar e resgatar os alimentos tradicionais muito importantes para saúde de todas as comunidades do povo Guarani.
5• Que a SESAI contrate agentes de saúde guarani com a entendimento de cura. Para todas as aldeias que ainda não tem agentes feminino.
6* pedimos para seja paritária a participação das kunhangue dentro do controle social de saúde e da gestão da saúde, seja ela dentro dos conselhos locais ou dentro da sesai.
Incentivamos e fortalecemos umas às outras para fazer outros encontros como esse em suas tekoa. Porque falar sobre as nossas vidas, da gestão dos nosso territórios e da manutenção das políticas públicas e nós kunhangue somos donas e gestoras dessas grandezas.
Somos Yvyrupa.
Aguyjevete para quem não bate, não estupra e não humilha.
Demarcação já!
COMISSÃO GUARANI YVYRUPA
Kunhangue Nhemboaty
I Encontro Estadual de Mulheres Guarani
Santa Catarinak
31/jul/2021
Foto:Bruno Kelly
Garimpeiros em três embarcações voltaram a atacar indígenas da comunidade de Palimiú, que vive uma série de ataques desde 10 de maio, na Terra Yanomami, em Roraima.
O novo ataque aconteceu no sábado (24), mas a informação foi divulgada na quinta-feira (29) pelo Conselho de Saúde Indígena Yanomami e Ye’kuanna (Condisi-YY).
Um ofício assinado no último dia 27, pelo presidente do Condisi-YY, Júnior Hekurari Yanomami, informa que servidores do Distrito de Saúde Indígena Yanomami (Dsei-Y) e da Fundação Nacional do Índio (Funai) estavam no local e precisaram fugir durante o ataque.
Na quarta-feira (28) um indígena morreu ao ser atropelado por um avião de garimpeiros em uma pista na comunidade Homoxi. O jovem indigena tinha 25 anos e se chamava Edgar Yanomami. O atropelamento foi por volta de 14h30.
A reportagem procurou a Funai para saber se os servidores foram feridos e se uma nova equipe será enviada à região e, aguarda reposta.
“Os garimpeiros ameaçaram que vão entrar na comunidade, matar todos e queimar. Até mandaram recado para os Yanomami, por outro subgrupo, que eles têm que deixar a comunidade, senão vão vir com todo mundo. Vão atacar com mais de 100, 200 homens. O assunto é muito preocupante. O governo tem que fazer a barreira urgente na comunidade Palimiú, para não acontecer algo grave”, comenta Hekurari.
A região fica às margens do rio Uraricoera, em Alto Alegre, Norte de Roraima, e é rota usada por garimpeiros que entram ilegalmente na Terra Yanomami. No primeiro ataque, em maio, invasores à bordo de um barco, abriram fogo contra a comunidade Palimiú, próxima à Walomapi, e a partir daí houve uma sucessão de conflitos.
Em 14 de junho, o Ministério da Justiça autorizou o uso da Força Nacional na região. Mas de acordo Júnior Yanomami, os quatro agentes que estavam em Palimiú, voltaram para Boa Vista.
Segundo o coordenador do D-sei Y, Rômulo Pinheiro, que recebeu o documento do Condisi-YY, há informações que no dia do ataque, os garimpeiros tentaram resgatar um bote. Ele pede que os órgãos de segurança se manifestem, pois além dos indígenas, há também risco para os profissionais de saúde.
“D-sei Yanomami faz saúde, não faz segurança. Da mesma forma que os indígenas se encontram preocupados, com esse sentimento de insegurança, a equipe de saúde também. A equipe estava lá. Estamos fazendo atendimentos. Não abandonamos. No entanto, fazendo saúde, não fazendo segurança. Assim que possível, encaminho outra equipe de saúde, desde que haja segurança. Não somente para os indígenas, mas para os profissionais de saúde”, disse Pinheiro.
O documento com a denúncia foi endereçado à Polícia Federal. O chefe da Delegacia de Repressão a Crime Ambientais, delegado Gilberto Kirsch, disse que os trabalhos da corporação na região de Palimiú, seguem em andamento. Pois as ações da PF não são de caráter ostensivo, mas de investigação.
“Um pouco antes desse ataque, inclusive, uma equipe da PF, esteve na região de Palimiú, conversou com as lideranças da localidade e explicou o papel da Polícia Federal, que em nenhum momento deixa de atuar na região. Como é uma investigação em andamento, nós não podemos abrir aquilo que está sendo feito, até por uma questão de segurança e efetividade da medida a ser tomada”, disse o delegado.
O ofício também foi encaminhado ao Ministério Público Federal (MPF). Ao G1 o órgão informou que recebeu o documento e deu início à apuração. “Assim que forem ouvidos os envolvidos, o MPF definirá as medidas cabíveis”, complementou em nota.
Maior reserva indígena do Brasil, a Terra Yanomami tem quase 10 milhões de hectares entre os estados de Roraima e Amazonas. Cerca de 27 mil indígenas vivem na região, alvo de garimpeiros que invadem a terra em busca da extração ilegal de ouro.
Em 2020, o ano da pandemia, o garimpo ilegal avançou 30% na Terra Yanomami. Só o rio Uraricoera concentra 52% de todo o dano causado pela atividade ilegal.
A invasão garimpeira causa a contaminação dos rios e degradação da floresta, o que reflete na saúde dos Yanomami, principalmente crianças, que enfrentam a desnutrição por conta do escasseamento dos alimentos.
Em 24 de maio, uma decisão do Supremo Tribunal Federal ordenou que o governo federal adotasse medidas para proteger a Terra Yanomami. Antes, uma outra medida judicial determinou o envio de efetivo armado para que ficasse de forma permanente em Palimiú.
Via: G1 Roraima – Rede Amazônica
30/jul/2021
A Funai (Fundação Nacional do Índio) está levando adiante um plano de localização de indígenas em contexto de isolamento na terra Ituna-Itatá, no Pará, o que preocupa indigenistas e contraria recomendações do MPF (Ministério Público Federal) e do CNDH (Conselho Nacional de Direitos Humanos).
A portaria que interditou a área tem prazo de validade até janeiro próximo, quando precisa ser reeditada pelo governo federal por mais três anos. Se a Funai declarar que supostamente não localizou os indígenas, isso poderá ser usado pelos adversários políticos da terra indígena para questionar a interdição da área. Por outro lado, um contato pode levar doenças e colocar em risco a vida do grupo isolado, ainda mais no contexto da pandemia do coronavírus.
O país tem hoje 114 registros de indígenas em contexto de isolamento em diversos estados, mas não há notícia de outras expedições com a envergadura da que está sendo organizada para Ituna-Itatá.
A Funai elaborou um processo administrativo com mais de 70 páginas cujo assunto é “Plano de localização de índios isolados (registro no 110- Igarapé Ipiaçava), Terra Indígena Ituna-Itatá”.
Em 13 de abril último, o presidente da Funai, o delegado da Polícia Federal Marcelo Xavier, assinou um despacho pelo qual aprovou o plano de trabalho e um cronograma para a ação que ganhou o nome de “Expedição Locus”. Ele escreveu sobre “a necessidade de concluir sobre a existência ou não de indígenas isolados na referida área”.
Uma tabela produzida pela Funai mostra que a operação primeiramente seria desencadeada em quatro etapas entre o final de 2020 e o início de 2021 ao custo preliminar de R$ 200 mil. O plano foi adiado no ano passado mas, segundo apurou a coluna, já foi retomado.
A Terra Indígena Ituna-Itatá, com cerca de 142 mil hectares, é localizada nos municípios de Altamira e Senador José Porfírio, ambas no Pará. Ela foi interditada pela primeira vez em 2011, já que a proteção a indígenas isolados na região era um dos condicionantes para a licença de construção da usina hidrelétrica de Belo Monte. A cada três anos, a portaria de interdição precisa ser renovada.
As invasões na terra indígena recrudesceram nos últimos anos e o desmatamento atingiu “níveis alarmantes” a partir de 2016, segundo um relatório da Funai, levando o local ao “ranking das terras indígenas mais desmatadas do Brasil em 2019”. Naquele ano, primeiro do governo de Jair Bolsonaro, a terra indígena “passa a ser a terra indígena mais desmatada do país”, com aumento de 700% na taxa de desmatamento em um ano. Em 2020, foi desmatada uma área equivalente a mil campos de futebol.
A interdição da área, contudo, é alvo de pressões de políticos do Pará. Em setembro de 2019, o senador e pastor evangélico Zequinha Marinho (PSC-PA) encaminhou uma carta ao então ministro-chefe da Segov (Secretaria de Governo) da Presidência da República, o general da reserva Luiz Eduardo Ramos. Ele chamou de “grave equívoco” a portaria que, em janeiro de 2019, reeditou a interdição da terra Ituna- Itatá por mais três anos e pediu a anulação da decisão.
Senador pediu expedição para localizar os isolados
Na carta, senador pediu que fosse realizado “um levantamento in loco na região para constatar a existência, ou não, desses índios, que até hoje ninguém daquelas localidades conheceram”. A Funai deu à sua operação o nome de “Locus” (lugar específico), que lembra a expressão in loco usada pelo senador.
Meses depois da carta, o senador gravou um vídeo de apoio a garimpeiros ilegais do Pará que protestavam contra uma operação doIbama que reprimia crimes ambientais no Estado.
Em nota à coluna do UOL em novembro de 2020, o senador afirmou que “caso seja comprovada a existência de índios isolados, aquela área será corretamente decretada como Terra Indígena, caso não se comprove a existência de indígenas, a terra deverá ser finalmente desbloqueada, amenizando os conflitos rurais na região”.
Em novembro passado, depois que o UOL revelou que a Funai trabalhava com a possibilidade de reduzir a Ituna-Itatá quase à metade, o MPF de Altamira (PA) recomendou que o órgão se abstivesse de realizar qualquer operação de localização de indígenas isolados na região. A paralisação, segundo o MPF, deveria durar até que o governo federal providenciasse a retirada de invasores, madeireiros e grileiros e a regularização fundiária da área.
Na mesma época, a organização não governamental OPI (Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato) divulgou um relatório de 81 páginas que revelou a “movimentações de atores públicos para a redução da Terra Indígena Ituna-Itatá”. A OPI procurou o MPF.
No relatório, a OPI manifestou preocupação sobre operação de localização de isolados, ainda mais no contexto da pandemia do coronavírus. “As informações levantadas pela equipe da Frente de Proteção Etnoambiental do Médio Xingu formam um conjunto coerente sobre a presença dos isolados, tanto do ponto de vista geográfico (mobilidade através de um corredor situado nas cabeceiras dos igarapés) como do ponto de vista histórico (relação das informações recentes com os registros historiográficos sobre a ocupação indígena)”, aponta o relatório.
Em maio último, o CNDH (Conselho Nacional dos Direitos Humanos) aprovou um relatório pelo qual recomendou à Funai “abster-se de dar prosseguimento nas atividades de localização dos indígenas isolados da TI Ituna/Itatá até que todos os invasores da Área de Restrição de Uso sejam retirados, promovendo a integridade física e territorial dos isolados e garantindo a segurança mínima necessária para a atuação da equipe de campo da Funai”.
Em resposta de dezembro de 2020 à recomendação do MPF, o diretor do DPT (Departamento de Proteção Territorial) da Funai, Cesar Augusto Martinez, respondeu que “não caberia, em nosso entendimento, falar em processo de desintrusão da TI Ituna-Itatá, por ser esse um procedimento posterior à homologação do território devidamente identificado como de ocupação tradicional de povo ou grupo indígena isolado”.
No ofício, Martinez disse ainda ao MPF que entendia “ser essencial que a Funai mantenha a realização da Expedição de Localização, uma vez que se trata de trabalho cuja continuidade e aprofundamento se configura como único mecanismo possível para a efetiva verificação da possível existência de indígenas isolados na TI Ituna-Itatá, partindo, claramente, do pressuposto de garantia de condições de segurança não só pela Funai, mas pelo Estado brasileiro e suas forças de segurança”.
Funai diz que expedições “têm caráter reservado”
Em nota enviada à coluna nesta quinta-feira (29), a Funai disse que, “por meio de sua Coordenação-Geral de Índios Isolados e de Recente Contato (CGIIRC), vem realizando, periodicamente e de forma sistematizada, expedições para esclarecer e consolidar com provas (positivas ou negativas) os registros de índios isolados, bem como realizar o monitoramento e proteção das áreas onde existem tais registros”.
Indagada se recebeu pedidos da Presidência da República ou do senador Zequinha Marinho para realizar a expedição, a Funai respondeu: “Como as expedições têm caráter reservado, visando à proteção de tais comunidades indígenas, a Funai não informa as datas nem o local de sua realização. A fundação esclarece ainda que as expedições são planejadas e realizadas pela CGRIIC com base em critérios técnicos, e jamais por solicitação ou a pedido de terceiros”.
“Com relação às medidas de prevenção ao coronavírus, a Funai esclarece que, na execução dos trabalhos, cumpre todos os protocolos de saúde necessários e estabelecidos pelos órgãos sanitários. Cabe ressaltar também que a Funai, dentro dos limites legais, atende a todas as recomendações do Ministério Público Federal”, afirmou a nota.
Via Coluna – Rubens Valente do Portal de Noticiais UOL