Indígenas pedem aos EUA para participar de plano para Amazônia

Indígenas pedem aos EUA para participar de plano para Amazônia

Via Valor Econômico  

Representantes de povos indígenas do Brasil estão pedindo ao governo dos Estados Unidos para serem incluídos na elaboração do plano para proteção da Amazônia que está em discussão com o governo brasileiro.

A iniciativa se concretizou em uma carta da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), entidade que agrupa o maior número de organizações indígenas no país, e foi enviada em março ao presidente Joe Biden e à vice- presidente Kamala Harris.

“Há uma grande mobilização para abrir um diálogo com o governo americano sobre as pautas ambientais”, disse ao Valor o advogado Dinaman Tuxá, mestre em desenvolvimento sustentável pela Universidade de Brasília e coordenador da Apib. “É legítimo pedir que os EUA abram este canal com os povos indígenas, que são muito impactados com a pauta de retrocesso ambiental do governo Bolsonaro”, continua.

Na carta, os indígenas lembram que a conservação das florestas é maior nos territórios indígenas, mencionam seu “papel estratégico e fundamental para a preservação da Amazônia” e solicitam um canal direto de comunicação com a equipe responsável por implementar a ordem executiva de Biden de combater a crise climática nos EUA e no exterior.

“Para assegurar e cobrar que o Estado brasileiro volte a fazer uso de suas legislações ambientais e suas diversas agências de proteção, é essencial incluir os povos indígenas na mesa de negociação e elaboração de estratégias”, diz o texto. Segundo a Apib, atualmente 70% dos processos de demarcação de terras indígenas estão paralisados.

“Estamos vivenciando o pior cenário político e que se agrava com a pandemia. Garimpeiros e madeireiros não fizeram home office e foram um dos principais vetores de entrada da doença nas terras indígenas”, ressalta o advogado de origem tuxá, povo indígena que vive na Bahia, Pernambuco e Minas Gerais.

Segundo dados da Apib, até o dia 6 de abril havia 51.988 indígenas contaminados pela covid em 163 povos. Morreram 1.034 Indígenas.

A vacinação alcançou 55% das aldeias até o momento, segundo a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai). Os Indígenas reivindicam que todos sejam vacinados prioritariamente, o que deve incluir os que vivem nas cidades e em áreas não demarcadas. Segundo Dinaman Tuxá, os indígenas receberam 400 mil doses de vacinas. “Mas temos uma população que ultrapassa os 900 mil. Estamos na luta para ter todos os indígenas vacinados, inclusive os que estão em contexto urbano. Sabemos dos riscos desta doença.”

Na carta ao governo americano, os representantes da Apib mencionam o PL-191/2020, que tramita na Câmara e permite mineração e outras atividades econômicas em terras indígenas. Dizem que, se aprovado, “afetaria direta e indiretamente 863.000 km2 de florestas”. Citam, ainda, que a mineração contamina os rios e é vetor de desmatamento.

“Enviamos esta carta apontando os riscos e os retrocessos e trazendo para a discussão pontos cruciais, como a mineração em terras indígenas”, continua o líder tuxá. Na carta da Apib, os indígenas pedem ao Departamento do Tesouro dos EUA e outras agências que monitorem e promovam transparência de instituições financeiras e importadores com “relação direta ou indireta com a Amazônia”. Diz o texto: “Sua administração deve garantir que os produtos importados pelos EUA não contribuam para a destruição da Amazônia ou para violações dos direitos das comunidades indígenas ou tradicionais”.

STF acolhe recurso da comunidade e abre caminho para reverter decisão que anulou demarcação TI Guyraroka

STF acolhe recurso da comunidade e abre caminho para reverter decisão que anulou demarcação TI Guyraroka

O povo Guarani Kaiowá conquistou uma importante vitória nesta quarta-feira, dia 7 de abril: por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que vai analisar a ação rescisória da comunidade da Terra Indígena (TI) Guyraroka, cuja demarcação foi anulada pela Segunda Turma do STF, em 2014, sem que a comunidade fosse ouvida e com base na perversa tese do marco temporal.

Os onze ministros da Corte votaram a favor do recurso movido pela comunidade Guarani Kaiowá, reconhecendo que houve violação ao seu direito de acesso à justiça e, portanto, da própria Constituição Federal. Apesar da importante vitória, a luta continua. Com a decisão desta semana, o julgamento do mérito da ação rescisória iniciará, desta vez com a participação da comunidade da TI Guyraroka – e tem chances reais de reverter a anulação da terra indígena.

As 26 famílias do tekoha Guyraroka, que batalham há décadas pela demarcação de seu território, ainda vivem numa pequena parte da terra que já foi identificada como sua, cercados por monoculturas, sofrendo com os agrotóxicos despejados nas lavouras e frequentemente ameaçadas por fazendeiros.

A luta continua, e a decisão desta semana é uma vitória de todos os povos indígenas do Brasil, que lutam pelo reconhecimento de seu direito de acesso à justiça e pela garantia daquilo que a Constituição Federal lhes garantiu em 1988: o direito originário às suas terras tradicionais, sem nenhum marco temporal.

Acordo com Bolsonaro é endosso à tragédia, dizem ONGs a Biden

Acordo com Bolsonaro é endosso à tragédia, dizem ONGs a Biden

Em carta, quase 200 organizações brasileiras alertam presidente americano sobre risco de negociação a portas fechadas com o Brasil.

Um grupo de 199 organizações da sociedade civil brasileira publicou nesta terça-feira (6/4) uma carta ao governo americano, alertando sobre o risco que um acordo de cooperação iminente entre os Estados Unidos e o governo Bolsonaro traz para o meio ambiente, os direitos humanos e a democracia.

O governo de Joe Biden vem mantendo há mais de um mês conversas a portas fechadas com a administração de Jair Bolsonaro sobre meio ambiente. Um acordo entre os dois países deverá ser anunciado na cúpula sobre o clima convocada por Biden para os próximos dias 22 e 23. Fontes próximas à negociação afirmam que o acordo deve envolver transferência de recursos para o Brasil — na campanha, Biden chegou a falar em levantar US$ 20 bilhões para a Amazônia.

Segundo a carta, as negociações com Bolsonaro — negacionista da pandemia de Covid-19 que desmontou a política ambiental brasileira e que foi processado por indígenas no Tribunal Penal Internacional por crimes contra a humanidade — colocam sob teste a narrativa de Biden, que prometeu em sua gestão lidar com a pandemia, o racismo, a mudança do clima e o lugar dos EUA na promoção da democracia no mundo. “O presidente americano precisa escolher entre cumprir seu discurso de posse e dar recursos e prestígio político a Bolsonaro. Impossível ter ambos”, afirma o texto.

Ainda de acordo com a carta, qualquer negociação com o Brasil sobre a Amazônia deveria envolver a sociedade, os governos subnacionais, a academia e o setor privado. E nenhuma tratativa deveria prosseguir antes de o Brasil reduzir o desmatamento aos níveis determinados pela Política Nacional sobre Mudança do Clima e da retirada dos retrocessos ambientais encaminhados pelo governo ao Congresso. “Negociações e acordos que não respeitem tais pré-requisitos representam um endosso à tragédia humanitária e ao retrocesso ambiental e civilizatório imposto por Bolsonaro” dizem as ONGs. “Não é razoável esperar que as soluções para a Amazônia e seus povos venham de negociações feitas a portas fechadas com seu pior inimigo.”

“O governo Bolsonaro tenta a todo custo legalizar a exploração da Amazônia, trazendo prejuízos irreversíveis para nossos territórios, povos e para a vida no planeta. Estamos unidos para mobilizar todo o apoio nacional e internacional que fortaleça as lutas pela defesa das nossas vidas e da mãe Terra. Seguimos mobilizados contra o projeto genocida que tenta nos eliminar há mais de 520 anos no Brasil e que também destrói a nossa biodiversidade. E é por isso que jamais deixamos de afirmar: Sangue indígena, nenhuma gota a mais”, disse Alberto Terena, coordenador- executivo da Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), uma das organizações signatárias da carta.

“Quando o Cerrado, a Amazônia ou o Pantanal queimam, é o nosso povo que queima. O governo Bolsonaro faz acordos bilaterais de destruição da natureza que não cumprem o que está na Constituição; ele não respeita e não demarca nossos territórios. Mesmo neste momento de pandemia, em que não podemos enterrar nem chorar nossos mortos, Bolsonaro continua a querer nos derrotar, destruindo nossa biodiversidade”, declarou Biko Rodrigues, articulador nacional da Conaq (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas).

“O Brasil é hoje um país dividido. De um lado, estão os indígenas, quilombolas, cientistas, ambientalistas e pessoas que atuam contra o desmatamento e pela vida. De outro, está o governo Bolsonaro, que ameaça os direitos humanos, a democracia e coloca em risco a Amazônia. Biden precisa escolher de que lado ficará”, afirmou Marcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima.

Direitos dos guarani kaiowá em risco

Direitos dos guarani kaiowá em risco

Por Eloy Terena* e Rafael Modesto**

O cacique Tito Vilhalva tem mais de 100 anos e já testemunhou toda sorte de selvageria contra o seu povo. As hostilidades começaram a se intensificar justamente na década de 20 do século passado, quando ele nasceu. A partir dali, as terras dos guarani kaiowá começaram a lhes ser tomadas sistematicamente, sempre com o uso da intimidação ou da violência.
Em maio de 2019, aconteceu o inimaginável: 15 crianças foram atingidas em cheio por uma nuvem de agrotóxicos lançada numa fazenda vizinha. A história horrorizou o mundo. Se foi proposital ou não, o fato é que os guarani kaiowá foram encurralados. Vivem em meio a um deserto verde e são submetidos a condições desumanas. Agora, o Supremo Tribunal Federal (STF) terá a oportunidade de fazer a Justiça prevalecer e lhes proporcionar uma vida mais digna.
A área reivindicada pelos guarani laiowá para a terra indígena Guyraroka, que fica no Mato Grosso do Sul, é de pouco mais de 11 mil hectares — para efeito de comparação, a Fazenda Nova Piratininga, o maior latifúndio do país, tem 135 mil hectares. Mas o processo de demarcação da terra, que se encontrava em estágio avançado, foi anulado em 2014 pela Segunda Turma do STF. De uma hora para outra, perderam seu chão. Atualmente, eles ocupam uma área de apenas 55 hectares. São 26 famílias. A decisão foi levada a cabo por um mandado de segurança e levou em consideração a tese absurda do “marco temporal”. Há anos a Ação Rescisória (AR) 2686, que reverte aquele veredicto, aguarda sua apreciação final. O principal argumento da AR é que falta consultar os Guarani Kaiowá. Esse direito lhes é garantido pelo artigo 232 da Constituição.
O “marco temporal” prega que os indígenas só teriam direito de reivindicar as terras que tivessem sob sua posse, comprovadamente, no dia da promulgação da Constituição Cidadã, 5 de outubro de 1988. Mesmo aqueles que tivessem sido expulsos com o uso da violência, fato corriqueiro na História do Brasil. É considerado inconstitucional pelo Ministério Público Federal e por juristas de renome, como Dalmo de Abreu Dallari e José Afonso da Silva, por ferir frontalmente o artigo 231 da Carta Magna — que anula qualquer título de propriedade localizada em terras tradicionalmente ocupadas por povos originários. A tese cai por terra também porque até 1988 os indígenas eram tutelados pelo Estado; logo, estavam impedidos de propor ações na Justiça.
O “marco temporal” foi mencionado pela primeira vez na Petição 3388/RR, que tratava da homologação da Raposa Serra do Sol, em 2012. Entretanto, o dispositivo não foi usado sequer naquele caso. O tribunal decidia se propriedades de não indígenas deveriam, ou não, constar da área demarcada. O segundo conceito prevaleceu, e todas as posses não indígenas no interior da terra indígena foram anuladas, incluindo a Fazenda Guanabara, cuja posse datava de 1918. Como escreveu o ministro Luís Roberto Barroso nos embargos de declaração da Petição 3388/RR, “ainda que algumas áreas abrangidas pela demarcação sejam ocupadas por não índios há muitas décadas, estando situadas em terras de posse indígena, o direito de seus ocupantes não poderá prevalecer sobre o direito dos índios”. Depois de um século dedicado à defesa de seu território, já passou da hora de o cacique Tito Vilhalva ter um pouco de paz.

*Assessor jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil
**Assessor jurídico do Conselho Indigenista Missionário e advogado dos guarani e kaiowá de Guyraroká

Artigo orginalmente publico no Jornal O Globo, em 05/04/2021. Disponível para assinantes.

UNIÃO E LUTA DOS POVOS INDÍGENAS CONTRA OS VÍRUS QUE NOS MATAM

UNIÃO E LUTA DOS POVOS INDÍGENAS CONTRA OS VÍRUS QUE NOS MATAM

Declaração do Abril Indígena – Acampamento Terra Livre 2021

Há 520 anos a invasão europeia aos nossos territórios tradicionais dizimou milhões de habitantes originários e fez desaparecer milhares de povos, culturas e línguas. Um genocídio que é uma das mais trágicas calamidades conhecidas na história da humanidade. 

 

Para os colonizadores e seus descendentes, no entanto, o projeto de morte foi compreendido como bem sucedido, onde os assassinos  foram premiados com a ocupação das nossas terras e territórios. Desde então somos vítimas do despojo, do esbulho, da destruição, da violência, do preconceito, da discriminação, do racismo,  enfim, de políticas e práticas etnocidas e genocidas.

 

Em todas as fases da história brasileira, a política indigenista, acompanhando o processo contínuo de metamorfose do capitalismo, serviu para nos extinguir física ou culturalmente, por meio do assimilacionismo e integracionismo, das expedições de “caça de índios”, guerras forjadas, remoções, do regime civil-militar, da expulsão dos nossos territórios, perseguições, assassinatos e massacres.

 

A Constituição Federal de 1988 deu um basta a essa  história escrita com o sangue dos nossos ancestrais. Após intensas mobilizações e lutas dos nossos povos e lideranças, a principal lei do Brasil passou a  reconhecer que o país é diverso, multiétnico e pluricultural, consagrando o nosso direito a existir como partes do Estado, com autonomia e mantendo nossa identidade e nossas diferenças. A Constituição reconheceu, assim, aos povos, os nossos costumes, línguas, crenças, tradições e direito às terras que tradicionalmente ocupamos. Sendo este o direito original, nato, congênito, ou seja, de origem anterior  à constituição do Estado nacional. Em decorrência desses reconhecimentos, os nossos povos conquistaram o direito a políticas públicas diferenciadas, tais como a demarcação e proteção das terras, a educação escolar indígena e o atendimento à saúde, por meio do subsistema gerido, atualmente, pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) e os Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs).

Porém, o Estado Brasileiro, as suas elites e sucessivos governantes, sempre nos trataram como empecilhos a seus projetos de desenvolvimento, de ocupação e de morte. Daí pode ser compreendido o porquê do Estado nunca ter se estruturado para cumprir e tornar realidade os preceitos constitucionais.

Durante a vida democrática do Brasil, até  a ruptura institucional como golpe de 2016, conquistamos alguns avanços, sempre com muita luta, tais como: a demarcação de terras indígenas, a participação em instâncias de deliberação e controle social das políticas que nos dizem respeito, tendo como máxima expressão a Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI); a criação da SESAI; a construção e promulgação da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental das Terras Indígenas (PNGATI) e a inviabilização de iniciativas legislativas anti-indígenas como a PEC 215 e o PL de mineração em terras indígenas.

Com a eleição do atual presidente, Jair Bolsonaro, os nossos povos foram mais uma vez alvejados por um projeto de morte, que, como nos tempos da invasão colonial europeia, destina-se a usurpar, esbulhar e nos enxotar dos nossos territórios.. Tal projeto se dá em favor do império do capital: do agronegócio, da mineração, da pecuária, da exploração madeireira e tantas outras modalidades de destruição da Mãe Natureza, com a qual correremos o risco de morrer juntos, física e/ou culturalmente, uma vez que fazemos parte dela. 

Essa política, que nós temos denunciado reiteradamente como genocida e ecocida, encontrou na Pandemia da Covid-19 um solo fértil para “passar a boiada”, o que tem levado ao aumento da violência e dos conflitos, inclusive entre parentes, conflitos esses alimentados pelo próprio governo com objetivo de dividir, enfraquecer e desmobilizar os nossos povos, organizações e lideranças na batalha contínua de defender e garantir o respeito a direitos fundamentais.

Os vírus que nos matam!

Denunciamos a campanha difamatória, de intimidação e criminalização promovida por membros do atual governo contra o nosso movimento e os nossos dirigentes. A negligência e descaso dessa política de ódio e racista praticada contra os nossos povos ficou ainda mais evidente neste contexto de pandemia. 

O Governo Federal é o principal agente transmissor da Covid-19 entre os povos indígenas. Sem políticas efetivas para o enfrentamento da pandemia, afirmamos que o governo Bolsonaro negligenciou sua obrigação de proteger os trabalhadores e usuários do Subsistema de Saúde Indígena e, dessa forma, favoreceu a entrada do vírus em diversos territórios. Ressaltamos que é obrigação do órgão gestor, a Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), prover os insumos, o treinamento e os protocolos adequados para a segurança de seus trabalhadores e usuários.

Com discursos carregados de racismo e ódio, Bolsonaro estimula a violência contra nossas comunidades e paralisa as ações do Estado que deveriam promover assistência, proteção e garantias de direitos. Tenta aproveitar a “oportunidade” dessa crise para avançar com uma série de decretos, portarias, instruções normativas, medidas provisórias e projetos de lei que tentam legalizar crimes e diminuir os direitos constitucionais dos povos indígenas.

A política genocida de Bolsonaro durante a pandemia da Covid-19 é reforçada com seguidas ações de negação da vacina, que é a principal arma de combate ao vírus, e a negligência na gestão da campanha de imunização. A  determinação do governo de vacinar apenas indígenas que moram em aldeias de terras homologadas é outra ação de violência, já que exclui parentes que vivem em áreas urbanas, retomadas e terras indígenas em processo de demarcação. 

Com essa decisão, o obscurantismo, a ignorância e o autoritarismo, que marcam a hedionda ditadura do governo de Jair Bolsonaro, se traduzem num plano de morte contra os povos indígenas do Brasil, uma vez que o plano de imunização exclui 42,3% de uma população estimada em 896,9 mil pelo censo demográfico realizado pelo IBGE em 2010. Como se não bastasse, setores aliados, membros do governo e o próprio Bolsonaro propagam junto às comunidades indígenas incontáveis desinformações e  mentiras que induzem muitos parentes a rejeitarem a vacina contra Covid-19. 

Decidimos não morrer!

Diante de todo esse cenário violento  que nos cerca e das muitas vidas perdidas ao longo da pandemia, nós da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), juntamente com todas as nossas organizações de base, reforçamos nosso compromisso de lutar pela vida dos nossos povos. 

Ao longo da pandemia, reinventamos nossas mobilizações online e renovamos as estratégias de luta. Criamos o plano Emergência Indígena para apoiar as barreiras sanitárias em centenas de territórios. Garantimos a segurança alimentar de mais de 10 mil famílias. Distribuimos mais de 300 mil equipamentos de segurança em saúde, apoiando equipes da saúde indígena em todo o país.   Conquistamos de forma inédita o reconhecimento do Supremo Tribunal Federal, que admitiu a Apib como entidade que pode entrar com ações diretas na principal corte de justiça do país e conquistamos uma vitória com a ADPF 709, que obriga o Governo Federal a adotar medidas de proteção aos povos indígenas.

A pandemia não acabou e as violências seguem intensas. Precisamos estar unidos e mobilizados, nesse sentido nós da Apib, com nossas organizações de base, convocamos o 17º Acampamento Terra Livre 2021, para fortalecermos as jornadas de lutas do Abril Indígena. 

Após o pior março das nossas vidas, traremos o abril de maior mobilização das nossas lutas! Vimos mais de 1000 dos nossos caírem para a pandemia da covid-19, e sentimos a dor da perda de nossos velhos. Mas nós, povos indígenas, também temos ao nosso lado a força dos ancestrais. 

Parentes, esse é um chamado pela nossa união. Precisamos estar organizados e mobilizados pela vacinação de todos os indígenas, pela garantia dos nossos direitos fundamentais, em especial do nosso direito territorial brutalmente massacrado por este governo neofacista, e pelo bem viver da nossa Mãe Terra. 

NUNCA MAIS UM BRASIL SEM NÓS! Essa é uma afirmação que fortalecemos ano após ano. Estamos nas redes, aldeias, universidades, cidades, prefeituras, câmaras legislativas federais, estaduais e municipais e seguiremos lutando contra o racismo e a violência que oprime e mata. 

Em um mundo doente e enfrentando um projeto de morte, nossa luta ainda é pela vida, contra todos os vírus que nos matam! 

Pela vida e continuidade histórica dos nossos povos, “Diga ao povo que Avance”.

A nossa luta ainda é pela vida, não apenas um vírus!

Brasil, 05 de Abril de 2021

Apib – Articulação dos Indígenas do Brasil 

Organizações regionais de base da Apib: 

APOINME – Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo

ARPIN SUDESTE – Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste

ARPINSUL – Articulação dos Povos Indígenas do Sul

ATY GUASU – Grande Assembléia do povo Guarani

Comissão Guarani Yvyrupa 

Conselho do Povo Terena 

COIAB – Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira

MNI – Mobilização Nacional Indígena

 

Maior mobilização indígena do Brasil inicia atividades em abril

Maior mobilização indígena do Brasil inicia atividades em abril

Com 25 dias de atividades, Acampamento Terra Livre é a maior mobilização virtual dos povos indígenas do Brasil.

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) inicia hoje (5) as atividades do 17º Acampamento Terra Livre (ATL). A maior mobilização indígena do Brasil, realiza pelo segundo ano consecutivo suas atividades em formato online, unindo lideranças de todas as regiões do país em uma jornada de quatro semanas de ações, que integram o ‘Abril Indígena’. A programação completa pode ser acessada no site apiboficial.org e será transmitida no facebook da Apib (apiboficial), Midia Índia (midiaindiaoficial) e Midia Ninja (midianinjaoficial). 

Com o tema ‘A nossa luta ainda é pela vida, não é apenas um vírus’, a Apib faz um chamado para união dos povos em um contexto de agravamento das violências e da pandemia da Covid-19. De acordo com dados do Comitê Nacional pela Vida e Memória Indígena da Apib, mais da metade dos 305 povos indígenas que vivem no Brasil foram diretamente afetados pela pandemia da Covid-19. Contaminando mais de 50 mil pessoas e matando 1031 indígenas, até o dia 4 de abril de 2021. 

“É preciso falarmos dos vírus que nos matam. A política genocida do governo Bolsonaro agravou a pandemia no nosso país e a violência contra os povos indígenas. Em pouco mais de um ano de pandemia, as invasões aos territórios indígenas aumentaram, o desmatamento bateu recordes alarmantes e muitos desses crimes aconteceram com o incentivo do governo que tenta a todo custo aprovar projetos de lei, como a PL da mineração, e decretos que facilitam os crimes de grilagem”, alerta Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib. 

De acordo com relatório da Apib sobre o impacto da pandemia entre os povos indígenas, lançado em dezembro de 2020,  o Governo Federal é o principal agente transmissor da Covid-19 entre os povos indígenas. “Sem políticas efetivas para o enfrentamento da pandemia, afirmamos que o governo Bolsonaro negligenciou sua obrigação de proteger os trabalhadores e usuários do Subsistema de Saúde Indígena e, dessa forma, favoreceu a entrada do vírus em diversos territórios. Ressaltamos que é obrigação do órgão gestor, a Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), prover os insumos, o treinamento e os protocolos adequados para a segurança de trabalhadores e usuários.”, denuncia o relatório. 

Segundo a coordenadora executiva da Apib, Sonia Guajajara, o ATL 2021 tem uma mensagem central de união dos povos indígenas, mobilização e de fortalecimento das estratégias de denúncia e responsabilização das violências cometidas contra os povos indígenas. 

“O ATL vai ocupar todo o mês durante o Abril Indígena com uma programação muito intensa e necessária. Todas as nossas organizações indígenas de base que compõem a Apib montaram uma agenda de atividades, que envolve lideranças indígenas de todo o Brasil e de outros países. Vai ser a maior mobilização dos povos indígenas construída de forma ampla e participativa. Não podemos arredar o pé da luta pelos nossos direitos”, afirma Guajajara. 

Programação 

Vacinação de todos os indígenas que vivem no Brasil, protagonismo das mulheres indígenas, participação dos povos nas eleições e espaços de poder, mineração, saúde indígena e a proteção dos povos isolados são alguns dos temas que marcam a programação do ATL 2021. 

Serão 25 dias de mobilização seguidos com mais de 60 atividades online. As quatro semanas de ações possuem temas para cada um dos períodos que pautam a programação, que foi construída pelas organizações indígenas de base da Apib e parceiros. 

Com o tema ‘Nosso direito de existir’ a primeira semana de atividades é mobilizada pela Articulação dos Povos Indígenas do Sul (Arpinsul), Comissão Guarani Yvyrupa (CGY) e pela Grande Assembléia do povo Guarani (Aty Guasu), juntamente com os parceiros da Midia Ninja, que promovem o Emergências Amazônia, a Frente Parlamentar Indígena e o mandato da deputada federal Joenia Wapichana. 

Os discursos carregados de racismo e ódio de Bolsonaro estimulam a violência contra os povos indígenas, segundo a Apib, que denuncia a paralisação das ações da atual gestão presidencial em ações que deveriam promover assistência, proteção e garantias de direitos. Esse processo de violações incentivou a construção da programação da segunda semana do ATL, que possui o tema de Vidas Indígenas Importam e foi construida pela Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apinme), Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste (Arpin Sudeste) e pela Fundaçao Oswaldo Cruz (Fiocruz) e Associaçao Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). 

Para enfrentar a pandemia da Covid-19, a Apib e as organizações indígenas que integram sua articulação criaram o plano ‘Emergência Indígena’, que é o tema da terceira semana do ATL 2021. A Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), que completa este ano mais de três décadas de existência e o Conselho do Povo Terena, que tem feito uma atuação intensa no enfrentamento da pandemia, em Mato Grosso do Sul, são as organizações que mobilizam a programação do ATL entre os dias 19 e 25 de abril.  

Encerrando o mês do Abril Indígena, a programação do ATL vai promover uma série de atividades com as mulheres indígenas, a juventude dos povos e pautar as estratégias de incidência internacional para a garantia dos direitos indígenas. 

De acordo com a coordenaçao da Apib, a programação está sujeita a mudanças ao longo das semanas e todas as atualizações podem ser conferidas no site da Apib (apiboficial.org/atl2021/) e nas redes sociais da organização. Pelo site é possível conferir as atividades e adicionar a programação no seu calendário do Google não perder as transmissões.  

Frente Parlamentar Indígena manifesta apoio a Apib e a Sônia Guajajara

Frente Parlamentar Indígena manifesta apoio a Apib e a Sônia Guajajara

A Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas (FPMDDPI) manifesta seu repúdio à carta do grupo intitulado “agricultores e produtores indígenas”, publicada no dia 29 de março no site da Fundação Nacional do Índio (Funai). O documento traz ataques e inverdades contra a coordenadora executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Sônia Guajajara.

A carta, destinada a instituições europeias, assinada por três porta-vozes do Grupo de Agricultores e Produtores Indígenas, desfere ataques à mais importante organização indígena do país, que no contexto pandêmico vem fazendo o enfrentamento necessário na defesa da vida dos povos indígenas.

A APIB é uma instância de referência nacional do movimento indígena no Brasil, criada de baixo pra cima. A organização aglutina organizações regionais indígenas e nasceu com o propósito de fortalecer a união dos povos, a articulação entre as diferentes regiões e organizações indígenas do país, além de mobilizar os povos e organizações indígenas contra as ameaças e agressões aos direitos indígenas.

A Frente Parlamentar reforça, ainda, a representatividade da Apib na luta dos povos indígenas. Fazem parte da APIB as seguintes organizações indígenas regionais: Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (APOINME), Conselho do Povo Terena, Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste (ARPINSUDESTE), Articulação dos Povos Indígenas do Sul (ARPINSUL), Grande Assembléia do povo Guarani (ATY GUASU), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) e Comissão  Guarani Yvyrupa.

A FPMDDPI manifesta solidariedade a Apib e a Sônia Guajajara e repudia a tentativa de criminalização e deslegitimação de organizações que lutam pelos direitos dos povos indígenas no Brasil veiculada nos sites oficias do Governo Federal.

Carta de apoio ao Movimento Indígena e a nossa Liderança Sônia Guajajara

Carta de apoio ao Movimento Indígena e a nossa Liderança Sônia Guajajara

Macapá/AP, 31 de março de 2021

Em carta publicada pela Fundação Nacional do Índio (Funai) no dia 29 de março de 2021, um pequeno grupo de agricultores, que se intitula como porta vozes dos agricultores e produtores indígenas, de representatividade questionável, proferiu palavras de intimidação, criminalização e difamação contra a coordenadora executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), a nossa legítima liderança representativa, Sônia Guajajara, estendendo seus ataques também a APIB, organização da qual fazemos parte e pela qual nos sentimos legitimamente representados. Além disso, a deputada federal Carla Zambeli (PSL) mostrou-se apoiadora dessa iniciativa, o que consideramos no mínimo lamentável. Repudiamos veementemente esses constantes ataques que o movimento indígena vem recebendo quase que diariamente, promovidos inclusive pelo Governo Federal, ao manipular pequenos grupos de indígenas. Por mais de uma vez, se apresenta como inimigo declarado dos povos indígenas.

A Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Amapá e Norte do Pará ( APOIANP) é uma das instâncias legítimas de articulação e coordenação do movimento indígena. Hoje, congrega 15 organizações indígenas de base e 13 povos indígenas que vivem no extremo norte do Brasil, mas especificamente nos estados do Amapá e norte do Pará. O processo de criação dessa articulação ocorreu com uma ampla discussão que contou com a participação de caciques e lideranças indígenas dos povos e organizações das quatro regiões de nossa base: Parque Indígena do Tumucumaque, Rio Parú D’Este, Oiapoque e Wajãpi. Somos parte de uma grande rede, legítima e articulada, do movimento indígena amazônico e nacional, que congrega a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), e que, por sua vez, integra a APIB. Ao contrário do que a carta apresenta, essa rede de articulação dos povos e movimento indígena brasileiro é reconhecida local, estadual, regional, nacional e internacionalmente pelos povos indígenas, organizações representativas, governos, parceiros e aliados em todo mundo, e sua cobertura abrange todo o território nacional através da aglutinação das seguintes organizações regionais: Conselho do Povo Terena, Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste (ARPINSUDESTE), Articulação dos Povos Indígenas do Sul (ARPINSUL), Grande Assembléia do povo Guarani (ATY GUASU), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) e Comissão Guarani Yvyrupa.

As lideranças representativas de nossas organizações e articulações, que estão na linha de frente da nossa luta em todos os níveis do movimento indígena, são lideranças legitimamente escolhidas através de uma dinâmica de organização social pertencente a cada povo, região, colegiado, organização e movimento indígena.

Seguindo esse processo legítimo de escolha das nossas representatividades, informamos que a guerreira Sônia Guajajara foi eleita, por unanimidade, na XI Assembleia Geral Ordinária da COIAB, que contou com a participação de cerca de 800 lideranças indígenas legítimas, com representatividade das 48 regiões de base da COIAB à época. Esse evento foi realizado no período de 28 à 30 de agosto de 2017, na Aldeia Sede da Terra Indígena Alto Rio Guamá, no estado do Pará.

Tais ataques contam com manobras inescrupulosas, de manipulação de uma minoria de indígenas, que busca apenas atender a interesses escusos do próprio governo, além de  parte de grupos historicamente inimigos dos povos indígenas do Brasil e que hoje estão instalados nos porões do poder Executivo Federal e do Congresso Nacional, visando somente prejudicar os direitos coletivos, constitucionais, consuetudinários e históricos dos povos indígenas. Nossa carta de apoio tem caráter informativo, e gostaríamos de direcionar parte dela, como contribuição para elucidar alguns pontos apresentados pelos porta vozes dos agricultores indígenas. São eles: que existe uma estrutura organizacional que dá suporte as tomadas de decisão da coordenadora executiva da APIB e com isso esclarecemos que a Sra. Sônia Guajajara não fala por si só, que ela tem o apoio da APIB e toda rede do movimento indígena ligada a ela; que todas essas articulações aqui apresentadas tem suas coordenações executivas eleitas através de  que todas essas articulações aqui apresentadas tem suas coordenações executivas eleitas através de assembleias indígenas; que inserimos informações suficiente para mostrar que a APIB é a instância de referência nacional do movimento indígena no Brasil, que não somos povos desavisados e desconhecedores das atuações da coordenadora; que o estilo de vida que escolhemos seguir como indígenas, seja vivendo em aldeias ou em cidades, pode dificultar, mas não nos impede de estar ativos e atentos ao que vem acontecendo em nosso país e nos movimentos indígenas e suas lutas e que para um bom observador, ter uma representante indígena como candidata a vice presidência da república deveria ser encarado como um feito positivo, o suficiente para ter noção da dimensão da representatividade que essa cidadã alcançou nacionalmente.

Aproveitamos para pedir a Funai que reflita sobre a ação de disseminar e promover notas como essa. Uma coisa é tentar incentivar atividades produtivas em Terras Indígenas, com foco na sustentabilidade, outra é disseminar materiais com teor agressivo contra as representações dos movimentos indígenas nacionais, que tomam como base acusações infundadas.

Reafirmamos aqui o nosso repúdio e menosprezo a essa minoria, aos seus grupos de aliados e apadrinhados políticos, e reiteramos todo o apoio, as nossas lideranças e organizações indígenas, conclamando aos povos indígenas do Brasil que permaneçamos firmes e fortes em nossa luta e no nosso propósito, uma vez que entendemos que estamos em um caminho correto e coerente seguindo a luta de nossos ancestrais pela defesa dos nossos direitos, dos territórios e da vida indígena.

Atenciosamente,

Coordenação Executiva

Articulação dos Povos e Organizações do

Amapá e norte do Pará – APOIANP

Nota da comissão Guarani Yvyrupa pela defesa dos direitos dos Povos Indígenas e de Repúdio a “Carta da comissão de Agricultores e Produtores Indígenas” 

Nota da comissão Guarani Yvyrupa pela defesa dos direitos dos Povos Indígenas e de Repúdio a “Carta da comissão de Agricultores e Produtores Indígenas” 

Nós, Povo Guarani no Brasil, distribuídos em 8 estados, sendo eles São Paulo, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Paraná, Mato Grosso do Sul e Pará, aguardamos desde a promulgação da Constituição Federal de 1988 a demarcação das terras de onde historicamente fomos expulsos e alijados do usufruto de nosso território.
Vimos nosso território ser invadido pelos não indígenas que transformaram nossas florestas em pasto para gado e nossos rios em mares de monocultura, como soja, cana e milho transgênico. Vimos nossas terras se transformarem em cidades, nossos cemitérios serem revirados pelos tratores do agronegócio. Vimos nossas sementes serem contaminadas pelas sementes transgênicas e nossas crianças sendo envenenadas nas chuvas de agrotóxico espalhados pelos aviões ruralistas que banham com a morte o nosso povo de norte a sul no país.
Somos resistência. E nossa resistência é fruto de nossa luta travada por séculos para continuarmos existindo e reaver os nossos territórios usurpados. Nas poucas terras que conseguimos recuperar a nossa posse, nos deparamos com o solo bastante machucado pela exploração secular do agronegócio e diante da ausência de políticas públicas que respeitem nossos direitos, repudiamos qualquer ação ou omissão que busque implementar falsas soluções para problemas estruturais.
Nosso povo tem mostrado com experiências que já renderam diversas reportagens e pesquisas que nossa agricultura tradicional não é tecnicamente fraca, pouco produtiva e/ou presa ao passado. Ao contrário, nossa agricultura aponta que é possível manter características tradicionais do plantio e ao mesmo tempo incorporar inovações técnicas, caminhar para uma fartura na produção e ainda assim proporcionar não só a preservação do ambiente, mas o aumento de sua biodiversidade e qualidade do solo, diferente do agronegócio que quer arrendar terras indígenas para produzir desmatamento, envenenar ecossistemas e degradar nossos territórios. O arrendamento de terras indígenas aprofunda relações de dependência e acelera a escassez de nossos recursos naturais. Ainda assim, sabemos que podemos revitalizar nossas matas, nossos rios e animais. Mas, diante do gradiente de destruição ambiental que nos encontramos, precisamos da ação do estado brasileiro, na regularização de nossos territórios e em políticas públicas que venham ao encontro de nossa cultura.
Precisamos que os compromissos assumidos pela sociedade não indígena com os povos originários sejam integralmente cumpridos, e que as Terras Indígenas sejam demarcadas, além da implementação de políticas públicas como a PNGATI, criada em conjunto com nossos parentes e que aponta soluções construídas e dialogadas para os problemas historicamente enfrentados por todos nós.
Atualmente, os poderes públicos brasileiros e grande parte de seus gestores têm realizado ações e discursos abertamente anti-indígenas, questionando os nossos direitos, sucateando os órgãos de proteção e garantia de nossos direitos, eliminando as políticas públicas diferenciadas pelas quais lutamos por décadas para que existissem, e assim, avançando contra nossos direitos territoriais e humanos protegidos pela Carta Magna deste país e por diversos Tratados Internacionais, dos quais o Brasil é signatário. Nesse momento, nos encontramos diante de uma realidade preocupante, que é a dificuldade para acessar informações fundamentais para nossa proteção e garantia da nossa sobrevivência e resistência, na qual muitas de nossas lideranças estão sendo cooptadas, em nome de uma autonomia fictícia advinda de promessas enganosas que as tem levado a arrendar parte de nossas terras, se encontrando sem alternativas diante da pressão dos ruralistas pela tomada dos nossos territórios em todo o Brasil.
Esses arrendamentos aumentam ainda mais a situação de conflitos internos entre lideranças e a destruição de nossas terras e vidas; aumentam a nossa dependência diante do Estado e da iniciativa privada e nos coloca, junto com nossas terras, mais uma vez, submetidos aos interesses da exploração do solo, da água e dos diversos recursos naturais que o agronegócio teima em depreciar em detrimento dos nossos princípios tradicionais de proteção da fauna e da flora que nos cerca. O arrendamento das terras indígenas é ilegal de acordo com nossa Constituição Federal, como previsto no artigo 231, especialmente no parágrafo 4º, quando diz que “As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis”. Entretanto, a ganância ruralista vem através da tragédia humana tentar legalizar mais um crime contra nós, povos indígenas brasileiros.
Para nós, autonomia é demarcação de terras e liberdade de existência. O que inclui, liberdade de reivindicar os nossos direitos e nos organizarmos conforme nossas tradições na luta por estes. E por isso, nós, Povo Guarani que vivemos nas regiões Sul e Sudeste deste país nos organizamos através da Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), organização indígena autônoma que congrega os Guarani dos estados de Santa Catarina, Rio de Janeiro, Paraná, São Paulo, Rio Grande do Sul e Espírito Santo, criada em assembleia desde 2006 e orientada por nossos Xamõi kuery e Xejaryi kuery, os mais velhos de nosso povo que regem nossa conduta. A CGY reconhece a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB, e junto com ela, suas lideranças e orientações. Reconhecemos Sônia Guajajara como uma liderança representativa, e respeitamos a sua conduta e palavra de indígena mulher. As mulheres indígenas são mães da terra. Elas sabem o que fazer para a defesa de nossas vidas.
Somos uma organização de base da APIB. E só a somos, porque reconhecemos que a unidade de nossa luta é o que pode vencer a política adotada pelo estado brasileiro há séculos forjada nas expulsões e no extermínio perpetrados contra os povos indígenas e seus territórios. Atualmente, a falta de divulgação de dados, a demora na compra de vacinas, a falta de testagem em massa, entre outras ausências e omissões, ceifaram mais de 300 mil vidas vitimadas pela pandemia do novo coronavírus no Brasil; Política essa de traição aos compromissos assumidos com base na Constituição Federal e nas Leis com todo o povo brasileiro.
Manifestamos repúdio à carta publicada em 29/03/2021 no site da Fundação Nacional do Índio – FUNAI e ressaltamos que não reconhecemos o grupo autor autointitulado de “Grupo de Agricultores e Produtores Indígenas do Brasil” e reforçamos a cobrança ao Estado brasileiro para que respeitem nossos modos de vida, parem de cooptar nossas lideranças e entendam que sem nossos cuidados, a existência nessa terra não será mais possível.
Nós não somos todos iguais. Estamos no mundo, vivemos num mundo compartilhado e isto não anula a riqueza da nossa diversidade indígena que é o que possibilita ainda que o Brasil seja um dos países com a maior biodiversidade do mundo. Graças a nós, povos indígenas guardiões das florestas e das sementes. Seguimos atentos e fortes na luta por nossos direitos, por uma vida mais justa e livre de violências para todos e todas brasileiros e brasileiras.
Demarcação Já!
Aguyjevete para quem luta!
COMISSÃO GUARANI YVYRUPA
Brasil, 31 de março de 2021
Ditadura nunca mais: para que nunca se esqueça

Ditadura nunca mais: para que nunca se esqueça

Hoje, 31 de abril, lembramos um período da história que queremos que jamais se repita. Nesta mesma data, em 1964, a ditadura civil-militar foi instaurada no Brasil por um golpe contra o governo de João Goulart. De acordo com relatório da Comissão Nacional da Verdade, mais de 8.300 indígenas foram assassinados durante a ditadura. Um genocídio que marcou a história recente do Brasil e que jamais deve ser esquecido. 

Para denunciar as violências e exaltar a resistência milenar dos povos indígenas diante de tantos massacres, compartilhamos texto da liderança Célia Xakriabá e reforçamos: Ditadura Nunca Mais!

Na invasão deste país,

Fomos vítimas nesta trama

Não sei se chamo de Brasil

Ou se chamo pindorama.

São lutas e muitas dores

Que ficaram marcadas na memória

Seja negro ou indígena

Protagonista nesta história.

 

A primeira intervenção militar foi em 1500

E não em 1964 na época da ditadura,

Nós indígenas resistimos a tudo isso,

Porque a final somente quem tem cicatrizes sabe o remédio que cura.

 

O Brasil não é apenas verde e amarelo

É também cor de terra, é vermelho,

Quando na ditadura derramaram sangue de nossos povos, que do Brasil são os primeiros.

 

Muita história foi recoberta

Da violência cometida aos nossos povos guerreiros,

Somente veio a tona o massacre dos povos indígenas

Da denúncia pelo relatório Figueiredo.

 

Resistimos 519 anos

Porque somos um povo que na espiritualidade acredita,

Recontamos a história recoberta

De que a miscigenação não foi pacífica.

 

O plano da ditadura da supremacia branca

Estratégia de extermínio da diversidade

Aquele que não fosse civilizado

Não tinha lugar nesta sociedade.

 

Assim traquinava o extermínio linguístico

Era um plano de emboscada

Não era considerada língua

Aquela que não fosse civilizada.

Suicidaram muitas línguas

Impostas por forasteiros

Neste plano de civilização

Tem privilégio o estrangeiro.

 

Plano religioso

Seguido pela catequização

Dizia que não tinha alma

Aquele que não fosse cristão.

 

Demonizavam os rituais

Não respeitavam nossa crença

Junto como projeto de modernidade

Também dizimaram nosso povo com doenças.

 

Seguindo este projeto de sociedade

Foi projetado o plano da economia

Gerenciada pelo capitalismo

Foi o extermínio da harmonia.

 

Nós fazemos a diferença

Na luta nós somos fermento,

Nós sofremos o primeiro golpe no ano de 1500

 

O Plano mais perigoso

Culmina-se no plano político

Da ditadura de um governo

Do país ter um domínio.

 

Da herança desta história

Do projeto de colonização

Atualmente sofremos outro extermínio

Chamado golpe a democratização!