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Mobilização ‘Aldear a Política’, que contabilizou 446 mil votos em candidatos indígenas no 1º turno e as organizações de base da Apib reforçam apoio a Lula.

Em carta aberta aos Povos Indígenas e ao Brasil, divulgada nesta quinta-feira, 13.10, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) declarou, oficialmente, apoio ao candidato Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno das Eleições presidenciais 2022. O posicionamento foi anunciado durante coletiva de imprensa realizada na sede do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal, em Brasília.

O evento reuniu representantes de várias etnias, membros da coordenação executiva da Apib, além das candidatas eleitas pela Bancada Indígena, Célia Xakriabá (MG) e Sônia Guajajara (SP) e de mulheres integrantes da Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga). 

“As candidaturas indígenas que fizeram parte da Bancada Indígena da Apib tiveram mais de 446 mil votos nas urnas. Demonstramos a força da mobilização coletiva para ocupação das Casas Legislativas estadual e federal, encabeçando, principalmente, a questão da identidade territorial por meio da retomada da demarcação de territórios, principal luta do movimento indígena”, diz trecho do documento. 

O chamado convoca as bases para atuar, por meio de sensibilização, junto a quem não votou no primeiro turno seja por abstenção ou pela opção do voto nulo ou em branco.  Além disso, reforça a necessidade do retorno às demarcações e proteção dos territórios, a reestruturação das instituições responsáveis pelas políticas públicas voltadas aos povos originários e a retomada dos compromissos ambientais internacionais assumidos pelo Brasil em relação ao clima e ao meio ambiente. 

A carta traz ainda, em oito pontos, uma análise de conjuntura do contexto de violações contra os direitos humanos, cometidos pelo atual governo ao longo dos últimos quatro anos. Entre elas estão: a paralisação da demarcação de terras indígenas; omissão e morosidade no atendimento às comunidades, principalmente no período da pandemia de Covid-19; desmonte de instituições e políticas públicas específicas e diferenciadas garantidas na Constituição Federal de 88; violação do direito de consulta livre, prévia e informada assegurada aos povos pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT); e propositura de leis antiindígenas, em consonância com o Congresso Nacional. 

“Vamos construir um novo horizonte, de respeito total aos nossos direitos fundamentais, à nossa vida e dignidade, no marco de uma nova relação com o Estado brasileiro, multiétnico e cultural, que ainda tem muitas dívidas a pagar pelo histórico de violência e morte, física e cultural, que por séculos vitimou os nossos povos e comunidades”, destaca outro trecho da carta aberta.

“Neste momento, somos um movimento unificado. Viemos romper com o racismo da ofensa, retomar o Brasil que foi arrancado de nós; Nunca existiu Brasil sem a nossa presença. Nossa candidatura trouxe uma reflexão diferente: vimos pessoas que votavam em mulheres e em outros candidatos presidenciais. Agora, não existem duas pautas, não se trata de partido, mas de plano de vida ou plano da morte”, afirmou a deputada eleita pela Bancada Indígena, Célia Xakriabá (PSOL-MG). 

Ela lembrou ainda que, em 2021, a Apib denunciou o presidente Jair Bolsonaro junto Tribunal de Haia por crimes contra a humanidade, que incluiu o desmantelamento das estruturas públicas de proteção socioambiental e aos povos indígenas, o que desencadeou invasões nas Terras Indígenas, desmatamento e incêndios nos biomas brasileiros, além do aumento do garimpo e da mineração nos territórios. A denúncia foi atualizada em junho, incluindo a negligência nas buscas por Bruno da Cunha Araújo Pereira e Dom Phillips e a barbárie no território Yanomami.

A deputada Sônia Guajajara (PSOL-SP) lembrou que os povos indígenas sempre estiveram na luta pela cobrança de seus direitos, em todos os governos, e que este fato nunca significou ignorar lacunas deixadas em gestões anteriores. 

“O voto no presidente Lula é para podemos ter o direito de continuar brigando por nossas pautas. Sempre fomos recebidos. Enquanto nossas pautas não forem atendidas, nossos povos estiverem em segurança nos territórios, a gente não vai deixar de exigir ou cobrar essa responsabilização do estado brasileiro”, afirmou a deputada eleita por São Paulo. 

“A política e o projeto de genocídio deste governo não tem comparação a nenhum outro momento histórico do Brasil. Não podemos adiar o processo de retomada da democracia”, completou. 

 Aldear o Congresso

Na ocasião, as deputadas eleitas Sônia Guajajara e Célia Xakriabá, avaliaram como positivo o movimento ‘Aldear a Política’, que trabalhou de forma articulada e coletiva em todo o Brasil para conseguir aumentar o número de representantes da Bancada Indígena no Congresso Nacional.

O resultado foi um crescimento de 100% em relação à última eleição proporcional, em 2018, quando a deputada federal Joênia Wapichana tornou-se a primeira mulher indígena eleita como deputada federal.

“Este é um recado para além do saldo eleitoral: estamos trazendo uma voz importante de um Brasil que reconhece que nós existimos e que estamos vivendo um ecocídio contra a humanidade”, afirmou. Xakriabá afirmou que os povos indígenas representa 5% da população mundial, responsável pela proteção de mais de 80% do patrimônio natural do planeta. 

“A presença da Joênia (Wapichana) no Congresso foi fundamental para a gente entender que era necessário ampliar nossa voz. A forma de fazer campanha no Brasil ainda é muito desigual, mas conseguimos chegar e estaremos lá fazendo jus a esse voto e a essa consciência política ambiental para salvar a mãe Terra”, afirmou Sônia Gujajara. 

Ela ressaltou que priorizará a retomada da demarcação das terras indígenas, a Politica Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGAT) e o Conselho Nacional de Políticas Indigenistas (CNPI), por meio de alianças com candidatos eleitos provenientes de movimentos e segmentos sociais sub-representados no Parlamento. O objetivo é formar uma linha de enfrentamento da agenda de retrocessos na Câmara dos Deputados.

ATL 2022

Há 28 anos, em 1994, as organizações dos povos indígenas do Brasil pautavam a democracia junto ao presidente Lula. Na ocasião, a liderança Fausto Mandulão, de Roraima, fez a entrega de um manifesto, solicitando a proteção dos direitos constitucionais à terra, à saúde, à educação e à representatividade dos povos nas instâncias do governo. 

Em abril deste ano, a Apib divulgou carta compromisso endereçada ao então pré-candidato Luiz Inácio Lula da Silva, durante a 18° edição do Acampamento Terra Livre (ATL), maior mobilização nacional indígena que reuniu mais de 8 mil parentes de 200 povos diferentes. 

Na ocasião, o movimento indígena anunciou os cinco eixos de ação necessários para assegurar a defesa dos direitos fundamentais dos povos indígenas no Brasil: Direitos territoriais indígenas: demarcação e proteção aos territórios indígenas (Eixo 1); Retomada dos espaços de participação e controle social indígenas (Eixo 2); Reconstrução de políticas e instituições indígenas (Eixo 3); Interrupção da agenda anti-indígena no congresso federal (Eixo 4) e Agenda ambiental (Eixo 5).