23/nov/2024
Movimento indígena reivindica encerramento da comissão e a suspensão da Lei 14.701/2023
Na última quinta-feira (21/11), o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu prorrogar até o dia 28 de fevereiro os trabalhos da câmara de negociação que discute a Lei 14.701/2023. Conhecida como Lei do Genocídio Indígena, ela transformou em lei a tese do marco temporal.
Em agosto deste ano, o movimento indígena, por meio da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e suas sete organizações regionais de base, se retirou da câmara. A Apib afirma que os povos indígenas não irão negociar o marco temporal e outras violações contra os direitos indígenas, já garantidos na Constituição Federal de 1988 e na Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho.
A Articulação reivindicou que fosse dado melhores condições de participação dos povos indígenas na câmara, como a suspensão dos efeitos da Lei do Genocídio, ajustes no formato da atividade e o acompanhamento de tradutores indígenas. Porém, nenhuma das solicitações foram atendidas pelos juízes instrutores e pelo ministro Gilmar Mendes.
“Neste cenário, a Apib não encontra ambiente para prosseguir na mesa de conciliação. Não há garantias de proteção suficiente, pressupostos sólidos de não retrocessos e, tampouco, garantia de um acordo que resguarde a autonomia da vontade dos povos indígenas. Nos colocamos à disposição para sentar à mesa em um ambiente em que os acordos possam ser cumpridos com respeito à livre determinação dos povos indígenas”, ressalta a Apib em sua carta de saída. Leia o documento aqui: https://apiboficial.org/files/2024/08/Manifesto-Sa%C3%ADda-da-C%C3%A2mara-no-STF.pdf.
Após a Apib se retirar da câmara de negociação, Mendes decidiu manter os debates mesmo sem a presença legítima do movimento indígena. As reuniões da câmara estavam previstas para terminar em 18 de dezembro.
06/set/2024
No dia 31/08 uma mancha de fogo com mais de 500km de extensão encobriu a Amazônia. Em menos de um mês, as queimadas consumiram 2,5 milhões de hectares da floresta. No Pantanal, atingiram quase 1,9 milhão de hectares, cerca 12,5% do território. No Cerrado 18.620 focos foram registrados, totalizando 44,6% do total de hectares queimados em todo Brasil. Na Mata Atlântica, estado de São Paulo, ocorreu o maior registro histórico de focos ativos de calor, 2,6 mil, desde o início das medições de satélite, em 1998*.
Os incêndios que se espalharam durante todo mês de agosto não são meras consequências do período de estiagem. É claro que a falta de chuvas contribui para a propagação do fogo. Porém, há indícios de outras causas para o salto dos focos de calor no Brasil: são 68 mil, um número 105% maior que em 2023.
No caso de São Paulo, o dia 23 de agosto marcou os registros de satélite com incêndios coordenados e de alta intensidade, indicando uma possível ação criminosa. De acordo com o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), as imagens de um satélite que capta focos de calor na parte da manhã e no final da tarde, mostraram que, entre suas duas passagens, o número de focos foi de 25 para 1.886 no estado. “Uma anomalia muito grande, quando todos os olhos deveriam estar pra Amazônia”, avaliou Ane Alencar, diretora de Ciência do Ipam.
A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, declarou que os incêndios na Amazônia, no Pantanal e Sudeste do país apresentam um movimento atípico que podem indicar uma ação criminosa de quem está ateando fogo propositadamente. “Do mesmo jeito que nós tivemos o ‘dia do fogo’ [em 2019], há uma forte suspeita que isso esteja acontecendo de novo. No caso do Pantanal, a gente estava tendo ali a abertura de dez frentes de incêndios por semana. No caso da Amazônia, nós identificamos o mesmo fenômeno. E em São Paulo, não é natural, em hipótese alguma, que em poucos dias você tenha tantas frentes de incêndio envolvendo concomitantemente vários municípios”, afirmou.
Quem ganha com o fogo?
Pode parecer loucura, um setor que depende da natureza criar desastres ambientais. Porém, o presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Rodrigo Agostinho, explica que o agravamento da crise climática, o desmatamento de anos anteriores, a falta de conscientização e, principalmente, a mudança na estratégia de desmatamento influencia nas queimadas atuais.
“É muito essa lógica: eu vou acabar com a floresta. Não preciso desmatar. Porque o desmatamento é caro. O fogo é muito mais barato, só comprar gasolina e sair espalhando”, o que justifica incêndios tão intensos apesar da diminuição do desmatamento da Amazônia. O fogo é o meio mais eficiente para os ruralistas escaparem à fiscalização do Ibama.
Além disso, os desmatadores têm vantagens na Bovespa, que canaliza R$560 bilhões do agronegócio e que não conta com mecanismos de punição para crimes ambientais. E mais, na lógica da queima do café em 1930, se há um excesso de mercadoria disponível os preços caem, mas qualquer sinal da indisponibilidade do produto no mercado pode gerar aumentos substanciais nos preços.
Mais da metade dos focos em São Paulo aconteceu em fazendas privadas, registradas no Sistema de Gestão Fundiária (Sigef). Apenas 11 deles estavam localizados em terras públicas, como assentamentos e terras indígenas. 81,29% deles estavam em áreas de uso agropecuário como as ocupadas pela cana-de-açúcar e pela pastagem. Entre as áreas queimadas estão grandes empresas, como São Martinho SA e Raízen SA. E as cotações internacionais do açúcar subiram no final de agosto, logo após as queimadas.
Garimpo e fogo
Já o mapeamento na Amazônia mostrou que as Terras Indígenas Kayapó (PA), Munduruku (PA) e Sararé (MT) tiveram mais incêndios que outras, com 1.111 focos. O Ibama e a Funai veem indícios de ação de garimpeiros, já que são áreas fortemente afetadas pelo garimpo ilegal.
Os números do Inpe mostraram que a Terra Indígena Kayapó, no sul do Pará, teve 746 focos de calor. O território onde vivem cerca de 5 mil kayapós mebengôkres foi o que registrou maior número de queimadas na Amazônia em agosto.
A terra indígena munduruku, no sudoeste do Pará, teve 217 focos de calor. Lá vivem 9.257 indígenas dos povos munduruku e apiaká. Esta área é a segunda com maior exploração garimpeira ilegal no país. Em 2023 houve apenas 163 focos.
E a terceira terra indígena com mais queimadas é uma área pequena, que abriga 250 pessoas do povo nambikwara. O território Sararé, no sudoeste de Mato Grosso, próximo à fronteira com a Bolívia registrou 148 focos de calor. No ano passado, a terra Sararé não registrou queimadas, no entanto, houve uma super invasão pelo garimpo em um ano.
A Funai estima que 2 mil invasores estiveram no território. O coordenador do posto de vigilância da Funai, André Augusto Rodrigues, afirmou em entrevista que boa parte do fogo resulta de retaliação de garimpeiros, que chegaram, a fazer um cerco ao posto.
“O fogo prejudica operações e atrasa ações aéreas, em razão da densa fumaça”, explica o coordenador. No dia 18 de agosto, começou uma operação para desintrusão do território, que desativou acampamentos e escavadeiras hidráulicas.
Nestas Terras Indígenas não há brigadas do Prevfogo (Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais). E os processos de desintrusão dos territórios exigem do governo federal mais que ações esporádicas, visto que ações pontuais resultam em retaliação, no retorno dos garimpeiros e mais ameaças às vidas e aos territórios.
Sobre as queimadas, o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, afirmou que existem atualmente 29 inquéritos instaurados na Amazônia e Pantanal, e foram abertos mais dois em São Paulo, para apurar as evidências de queimadas criminosas.
Brasileiros(as) sofrerão a emergência
Para completar o cenário, as previsões apontam que a seca amazônica deste ano repetirá a seca extrema em 2023. Toda essa devastação afeta os rios e o regime de chuvas. As queimadas poluem os rios e suas nascentes, e as cinzas transportadas para o leito dos rios nas primeiras chuvas degradam a qualidade da água.
Em consequência, as grandes cidades sentirão mais uma vez a escassez de água potável, com racionamento e aumento das contas para os trabalhadores no final do mês. Bem como o secamento dos rios prejudica a produção de energia hidrelétrica, outra conta que o trabalhador deverá sentir no bolso.
As populações mais intensamente afetadas, entretanto, são aquelas que dependem diretamente da agricultura, da caça e da pesca. As comunidades indígenas e ribeirinhas são as primeiras a sentirem na pele as dificuldades para manter seu modo de vida, o que gera uma situação de extrema vulnerabilidade. Na Amazônia, comunidades inteiras ficam isoladas porque seu principal meio de transporte é fluvial. O governo do estado já decretou emergência pela estiagem em 62 municípios, e mais de 75 mil famílias estão sofrendo pela falta de água e alimentos.
As famílias agricultoras ficam cada vez mais dependentes da irrigação, de pacotes tecnológicos do agronegócio (que são vendidos como solução do problema) e dos empréstimos bancários. As perdas na produção geram endividamento, a perda das terras, o êxodo para cidades e o aumento da concentração fundiária.
A crise climática, portanto, afeta toda a população brasileira. Ela não diz respeito apenas as minorias, se trata de uma emergência que o país (e o mundo) enfrenta. O Estado brasileiro e a sociedade precisam agir para reverter o problema, antes que essa realidade nos torne uma sociedade pobre em natureza e rica de enfermidades crônicas.
Marco temporal é agro
Enquanto o fogo consome o Brasil, a influência do agro dentro das instituições caminha a passos largos para desfigurar os direitos indígenas constitucionais, uma investida dos ruralistas no Congresso Nacional com a conivência de partes do executivo e do judiciário.
A lei do Marco Temporal está em vigor. E com isso, os ruralistas estão desencadeando novos ataques sobre as Terras Indígenas, utilizando armas como as queimadas.
No legislativo, tramita a PEC 48, que altera a constituição para retirar o direito indígena originário e inserir a tese inconstitucional. Uma prova de que todos os deputados e senadores que aprovaram a lei, tinham pleno conhecimento da sua ilegalidade.
No Supremo Tribunal Federal, ao contrário do que era esperado, o debate e a defesa da cláusula pétrea da constituição se tornou uma câmara de conciliação forçada, na qual, qualquer discordância da nossa parte, seria levada para votação. Com a representação indígena em menor número, qualquer proposta poderia ser aprovada. A Apib se retirou desta armadilha.
Mas a lei de número 14.703/2023, abriu brechas como o abono para invasores de terra indígena, que pode ser considerada de “boa-fé” e dar direito a indenização. Nesse caso, o invasor pode continuar no território até a finalização do processo de demarcação. Ela também proíbe o redimensionamento de terra indígena demarcada, mesmo quando houver erro do Estado. O direito de usufruto exclusivo foi flexibilizado. As terras já demarcadas podem ser contestadas por terceiros. Estados e municípios passam a interferir nos processos demarcatórios que até então cabiam somente à união, tornando-os ainda mais demorados. A lei ainda permite, leia-se incentiva, a cooperação entre indígenas e não indígenas para exploração dos territórios. Além, é claro, de exigir a comprovação da presença indígenas nas terras na data de 05 de outubro de 1988.
Tudo isso, somado ao apagamento que é consequente das queimadas, está criando um abismo entre o Estado e a efetiva proteção e justiça aos povos que primeiro tiveram a posse das terras brasileiras. Portanto, as queimadas, a manipulação das leis pela bancada ruralista e a articulação nacional do movimento de extrema direita conhecido como Invasão Zero, fazem parte de um mesmo projeto de país, que visa desestruturar a democracia brasileira em favor de um pequeno grupo de coronelistas criminosos. Um projeto que ficou escancarado durante o governo Bolsonaro e continua em curso no governo Lula.
A consequente crise ambiental/climática gerada por isso tudo, para esse grupo elitista é mero detalhe ou um delírio “esquerdista”, “coisa de comunista”. Mas o Inpe registrou no último mês uma concentração tão alta de gases poluentes, que foi percebida da Amazônia ao Sul do Brasil, alcançou dez estados, o Peru, a Bolívia e o Paraguai. Isto ocorre porque, os chamados “rios voadores”, correntes de ar que transportam a umidade da Amazônia para outras regiões da América do Sul, foram transformados em imensos corredores de fumaça.
Resposta indígena
Os povos indígenas resistem, estão permanentemente mobilizados e lutam para defender seus territórios, suas vidas e de toda população. As terras indígenas, como sabemos, são as mais preservadas e, ainda assim, as menos assoladas pelos incêndios.
A Terra Indígena Rio dos Índios, por exemplo, foi homologada há pouco mais de um ano. Ela está localizada no município de Vicente Dutra, no noroeste do Rio Grande do Sul, e abriga uma comunidade de cerca de 230 indígenas kaingang.
A homologação daria o direito à demarcação de 713 hectares, porém, os indígenas estão ocupando pouco mais de 100 hectares, devido a uma liminar da Justiça, movida por políticos e ruralistas locais. Mesmo com as condições adversas, a comunidade deu início a um projeto de reflorestamento que busca reabilitar as matas, plantando centenas de árvores nativas e frutíferas através da escola indígena e parcerias, projeto que envolve os jovens, as crianças e os mais antigos da comunidade.
Este é apenas um exemplo do caminho que o Brasil precisa seguir para superar a fumaça que encobre o futuro possível. Sem a demarcação das terras indígenas, vamos continuar caminhando para ampliar desastres e viver em crise. A ancestralidade nos ensina que é possível construir o caminho do bem viver, com respeito e integrado à natureza. O futuro do Brasil é indígena.
* Os dados são do levantamento do Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Lasa-UFRJ) e do Programa Queimadas, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Fontes:
“Desmatamento é caro, fogo é mais barato”, explica presidente do Ibama, sobre queimadas
Fogo e lamaçal
Fumaça de queimadas atinge cidades de dez estados
Dia da Amazônia tem região sofrendo com seca e queimadas
Sem critérios ambientais, Bolsa canaliza mais de R$ 560 bilhões ao agro brasileiro
Sete cidades de São Paulo registram focos de incêndio nesta segunda-feira (2)
Terras indígenas da Amazônia mais invadidas por garimpo de ouro têm explosão de queimadas
Com 68 mil focos de queimadas, Brasil tem pior mês de agosto desde 2010
Preço do açúcar encerra agosto em alta, informa Cepea
Queimadas mais que dobraram no Brasil em agosto, segundo Inpe
Brasil em chamas: Amazônia atinge 5 milhões de hectares queimados no ano após pior agosto já registrado
Kaingangs iniciam reflorestamento de terra indígena disputada com produtores rurais
16/ago/2024
O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CIDH) recomendou ao Supremo Tribunal Federal (STF) que suspenda os efeitos da lei 14.701/2023, que instituiu o marco temporal e outras violações dos direitos indígenas.
O documento também reconhece a incompatibilidade da mesa de negociação instaurada pelo Supremo, no dia 5 de agosto.
O CIDH reforça que “o STF, em setembro de 2023, no Tema 1031 de repercussão geral, definiu que a tese do marco temporal é inconstitucional e que não se aplica em prejuízo dos povos indígenas o renitente esbulho, bem como que não há impedimento para reestudo de terras já demarcadas, nos termos do art. 231 da Constituição”.
O conselho destaca também que “os direitos fundamentais dos povos indígenas se constituem em cláusulas pétreas, imunes a maiorias eventuais”, conforme a Apib vem reivindicando junto à corte desde a aprovação da lei.
Leia a carta completa:
Recomendação CNDH
31/jul/2024
Segundo relatório do Cimi, Roraima é o estado com maior número de assassinatos em 2023
Em 2023, mesmo ano em que o Congresso Nacional aprovou a Lei 14.701 que transformou em lei o marco temporal, 208 indígenas foram assassinados no Brasil, conforme o relatório Violência Contra os Povos Indígenas do Conselho Indigenista Missionário (Cimi). Este é o segundo pior resultado desde 2014, quando o Cimi começou a utilizar dados oficiais para contabilizar homicídios indígenas.
O número de assassinatos em 2023 é menor apenas que o de 2020, quando 216 indígenas foram mortos. O dado também representa um aumento de 15,5% em relação a 2022 (180 assassinatos) e contrasta com a redução de 3,4% no total de homicídios no país.
Roraima (47), Mato Grosso do Sul (43) e Amazonas (36) lideram o ranking de estados com mais assassinatos indígenas, representando quase 40% dos homicídios em 26 das 27 unidades federativas. A maioria das vítimas (171) tinha entre 20 e 59 anos e eram homens (179), enquanto 29 eram mulheres.
Os dados do anuário foram compilados a partir do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) e informações da Secretaria de Saúde Indígena (Sesai).
Outras formas de violência
Também em 2023, 670 crianças indígenas morreram por causas evitáveis, como enfermidades que poderiam ser tratadas com atenção adequada à saúde. Pelo menos 180 indígenas cometeram suicídio.
Em termos de direitos territoriais, o Cimi registrou 1.276 casos de violência, incluindo omissão e morosidade na regularização de terras, conflitos e invasões. A “violência por omissão do poder público” inclui 66 casos de desassistência geral, 61 na educação escolar e 100 na saúde.
O relatório critica a falta de ação do governo federal na defesa dos territórios indígenas, destacando a indefinição em torno da Lei nº 14.701, nomeada pelo movimento indígena como Lei do Genocídio Indígena, e o marco temporal. A lei restringe os direitos territoriais aos povos indígenas que ocupavam ou reivindicavam terras até 5 de outubro de 1988.
Lei o relatório completo aqui: https://cimi.org.br/2024/07/relatorioviolencia2023/
No STF
Sem responder aos pedidos da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), o ministro Gilmar Mendes, do STF, agendou para o dia 5 de agosto a primeira reunião da câmara de conciliação que avaliará a Lei do Genocídio Indígena (Lei 14.701). A Apib repudia a decisão e afirma que o direito ao território tradicionalmente ocupado é um direito originário que está previsto na Constituição Federal de 1988 e não pode ser negociado.
Na Corte, a Apib protocolou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) e solicitou que a Lei do Genocídio Indígena seja declarada inconstitucional e suspensa até a finalização do julgamento no STF (ADI 7.582). Em outra ação, a Articulação solicita que todos processos que tratam do marco temporal tenham como relator o ministro Edson Fachin, visto que ele foi responsável pelo Recurso Extraordinário (RE) 1017365 que tratou da Terra Indígena (TI) Ibirama La-Klãnõ, território do povo Xokleng, e declarou o marco temporal como inconstitucional em 2023.
As reuniões de conciliação estão previstas para ocorrer entre 5 de agosto a 18 de dezembro com a participação de membros do Senado, Câmara dos Deputados, Governo Federal, dois governadores e um representante da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) e Frente Nacional dos Prefeitos (FNP). Seis representantes da Apib e suas sete organizações regionais de base podem participar das reuniões, o que ainda será debatido entre as lideranças nas próximas semanas.
*Com informações da Agência Brasil
22/jul/2024
“A constante tentativa de adoção da tese do Marco Temporal, teoria que contraria os compromissos internacionais de direitos humanos assumidos pelo Estado brasileiro (análise técnica) e cuja inconstitucionalidade foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal, gera insegurança jurídica e acirra ainda mais os conflitos fundiários no país, causando dano direto e irreparável aos Povos Indígenas. Garantir que as terras e territórios dos Povos Indígenas estejam reconhecidos, demarcados e protegidos é dever fundamental do Estado – composto por Executivo, Legislativo e Judiciário – para que eles possam desfrutar de todos os demais direitos”.
Esta foi a posição oficial de Jan Jarab, chefe da ONU Direitos Humanos para a América do Sul (CIDH), diante do retorno do debate da tese do Marco Temporal no Congresso brasileiro. A PEC 48 ou PEC da Morte busca descaracterizar o artigo 231 da Constituição Federal, mais especificamente o inciso 1º, que trata do direito originário dos povos indígenas às suas terras. A PEC altera uma cláusula pétrea da constituição.
No último dia 10/07, parlamentares da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal pediram vista coletiva à Proposta. “Reiteramos nossa preocupação sobre qualquer ação que possa enfraquecer ou relativizar a proteção dos direitos dos Povos Indígenas”, afirmou Jarab, em nota publicada no site da ONU.
Para a deputada indígena, Célia Xakriabá, o esforço e a celeridade para debater e aprovar a emenda é a comprovação de os deputados da bancada ruralistas tem plena consciência de que a lei 14.701, aprovada no ano passado, corrobora com uma tese que fere a constituição e por esse motivo, agora eles tentam alterar a constituição.
Ao mesmo tempo, as ações de contestação à lei, protocoladas no Supremo Tribunal Federal (STF), foram encaminhadas ao ministro Gilmar Mendes. O ministro conhecido publicamente por suas posições anti-indígenas, não seguiu o protocolo institucional sobre as ações diretas de inconstitucionalidade (ADI), ignorou as manifestações jurídicas da Apib e por fim, propôs uma câmara de conciliação sobre o caso.
Atropelo em benefício de fazendeiros
Em setembro de 2023, o STF formou maioria sobre a tese, atestando sua inconstitucionalidade. No mês seguinte o Congresso aprovou a lei do marco temporal, que recebeu o número 14.701/2023, ignorando os vetos do presidente Lula. Logo em seguida, o Senador Hiran Gonçalves, criou a PEC 48. A sequência dos fatos aponta para um orquestramento de ações arbitrárias, que manipulam a atuação do Estado para beneficiar interesses do agronegócio e de espoliadores dos bens naturais preservados nos territórios, como a madeira, minérios, água e a própria terra que dão continuidade ao projeto genocida bolsonarista.
A maioria dos senadores que deram seguimento aos trâmites da emenda são vinculados ao PL, à Frente Parlamentar de Agropecuária (FPA) e a partidos da base do ex-presidente.
São eles:
Senador Dr. Hiran (PP/RR)
Senadora Margareth Buzetti (PSD/MT)
Senador Sérgio Petecão (PSD/AC)
Senador Wilder Morais (PL/GO)
Senador Styvenson Valentim (PODEMOS/RN)
Senador Esperidião Amin (PP/SC)
Senador Luis Carlos Heinze (PP/RS)
Senador Hamilton Mourão (REPUBLICANOS/RS)
Senador Izalci Lucas (PSDB/DF)
Senador Mecias de Jesus (REPUBLICANOS/RR)
Senador Marcos do Val (PSDB/ES)
Senador Sergio Moro (UNIÃO/PR)
Senador Plínio Valério (PSDB/AM)
Senador Carlos Viana (PODEMOS/MG)
Senadora Tereza Cristina (PP/MS)
Senador Astronauta Marcos Pontes (PL/SP)
Senador Eduardo Girão (NOVO/CE)
Senador Marcio Bittar (UNIÃO/AC)
Senador Magno Malta (PL/ES)
Senador Jorge Seif (PL/SC)
Senador Chico Rodrigues (PSB/RR)
Senadora Damares Alves (REPUBLICANOS/DF)
Senadora Ivete da Silveira (MDB/SC)
Senador Flávio Bolsonaro (PL/RJ)
Senador Irajá (PSD/TO)
Senador Carlos Portinho (PL/RJ)
Senador Marcos Rogério (PL/RO)
Posição da Apib
Para a Apib, a câmara de conciliação criada por Gilmar Mendes é uma arbitrariedade. Reafirmamos que nossos direitos, conquistados constitucionalmente, não estão em negociação. Ao contrário do que atestam os ruralistas, é a proposta de lei que tramita atualmente, a grande responsável pela insegurança jurídica e pelo aumento substancial de ataques aos povos indígenas.
Somente nas últimas duas semanas, houve ataques em seis territórios e lideranças indígenas foram feridas, com a propagação das ações do grupo miliciano Invasão Zero. Ocorreram ataques armados na comunidade Pekuruty, no Rio Grande do Sul, do povo Guarani Mbya, na comunidade Guasu Guavirá, no Oeste do Paraná, do povo Avá-Guarani e na comunidade Tekora Kunumi Vera, pertencente a Terra Indígena Dourados-Amambaipeguá I, no Mato Grosso do Sul. Também registramos ataques na retomada Kaingang, Fág Nor, em Pontão, no Rio Grande do Sul, na T.I. Guasu Guavira, Tekoha Arapoty e Arakoé e na T.I. Panambi, em Douradina, no Mato Grosso do Sul.
09/jul/2024
O ministro do STF agendou a primeira reunião para agosto, mas a criação da câmara de conciliação ainda não passou pelo plenário da Corte e lideranças indígenas afirmam que não estão sendo ouvidas
03/jul/2024
De autoria da deputada Célia Xakriabá, o projeto é uma resposta à tese ruralista do marco temporal
Na última terça-feira (02/07), a Comissão da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 4566/23, que proíbe a imposição administrativa, legislativa ou judicial de qualquer marco temporal para fins de demarcação de terras indígenas.
De autoria da deputada Célia Xakriabá (Psol-MG), que contou com contribuições da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), o PL também fixa o ano de 1500 como Marco Temporal do Genocídio Indígena e é uma resposta à Lei 14.701/2023, que legaliza a tese ruralista do marco temporal. A partir de agora, o PL segue para análise da Comissão de Constituição e Justiça.
Marco temporal
O Marco Temporal é uma tese política que afirma que os povos indígenas só teriam direito aos seus territórios caso estivessem em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal. A Apib aponta que a tese é inconstitucional e anti-indígena, pois viola o direito originário dos povos ao território ancestral – previsto na própria Constituição – e ignora as violências e perseguições, em especial durante a ditadura militar, que impossibilitaram que muitos povos estivessem em seus territórios na data de 1988.
Em sessão histórica no dia 21 de setembro de 2023, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) formaram maioria de votos para a derrubada da tese no Judiciário. Com placar de 9×2, a votação dos ministros concluiu pela derrubada da tese do Marco Temporal. Porém, o Projeto de Lei 2903 foi aprovado pelo Senado Federal e transformado na Lei 14.701/2023 em dezembro do mesmo ano.
Abaixo veja quais crimes foram legalizados com a Lei 14.701/2023:
– Tese do marco temporal em 05 de outubro de 1988. Povos indígenas precisam comprovar conflitos e/ou que foram expulsos do seu território por ação judicial até a data fixada.
– Demarcação de terras indígenas com participação dos Estados e municípios.
– Cooperação entre indígenas e não indígenas para exploração de atividades econômicas.
– Demarcações dos territórios ancestrais podem ser contestadas a qualquer momento.
– Direito de usufruto exclusivo não pode se sobrepor ao interesse da política de defesa e soberania nacional, permitindo intervenções militares sem consulta prévia.
– Invasão de terra indígena pode ser considerada de boa-fé com direito a indenização. O invasor pode continuar no território até a finalização do processo de demarcação.
– Proibido o redimensionamento de terra indígena demarcada, mesmo quando houver erro do Estado.
– Insegurança jurídica nos processos de demarcação em curso, para que se adequem à Lei do Genocídio Indígena.
08/fev/2024
A Polícia Federal de Rondônia e a Força Nacional de Segurança desmobilizou uma invasão de 50 pessoas no território demarcado do povo Uru-Eu-Wau-Wau, no município de Governador Jorge Teixeira, dentro da floresta amazônica, no fim de semana de 27 e 28 de janeiro. A nova invasão é reflexo da lei do genocídio indígena, 14.701/2023, que instituiu o marco temporal e outras violações dos direitos povos originários.
De acordo com a Funai, a intrusão “é incentivada politicamente para extração ilegal de madeira e especulação imobiliária”. O Povo Uru-Eu-Wau-Wau encontrou o grupo há apenas 30km da aldeia, na região Alto Jamari. Eles montaram barracões para dividir os lotes de terras, uma prática da grilagem.
Uma pessoa identificada como líder da invasão foi presa e responderá a acusação de crime de contrabando de produtos veterinários. Ele e os demais adultos presentes poderão ser condenados até 10 anos de prisão, pelos crimes de associação criminosa, invasão de terras da União e desmatamento.
Os nomes dos acusados não foram divulgados para não prejudicar as investigações. “Sabemos que há, além das pessoas que encontramos ali acampadas e invadindo Terra Indígena, um organismo coordenado e patrocinado financeira e politicamente para incentivar essas pessoas nas tentativas de ocupação ilegal de terras públicas”, afirmou o chefe da Divisão Técnica da Coordenação Regional de Ji-Paraná da Funai, Ramires Andrade.
Ele garante que o território está sendo monitorado. “Agimos pronta e imediatamente para desmobilizar esse acampamento, continuaremos a agir para conter quaisquer outras iniciativas de invasores que tenham por objetivo ingressar, permanecer ou explorar ilegalmente o Território Indígena Uru-Eu-Wau-Wau”.
As lideranças indígenas optaram por não se identificar, por medo de retaliações. “São coisas que a gente está muito preocupado, por conta de algumas atividades que vêm acontecendo, por conta do que vem acontecendo em outros territórios”, afirma uma das lideranças indígenas, fazendo referência ao assassinato da Pajé Nega Pataxó Hã hã hãe, pela milícia autointitulada de Invasão Zero, na Bahia.
Lei do Genocídio
A Lei 14.701 (antigo PL 2903, da tese do marco temporal) foi aprovada em setembro e em dezembro o Congresso Nacional derrubou os vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) aos pontos mais críticos, sendo institucionalizada com diversas violações constitucionais.
A lei passou a ser um incentivo à invasores e organizações criminosas que atacam as vidas indígenas e avançam sobre os territórios para explorar as riquezas naturais preservadas pelos povos.
O jurídico da Apib entrou com um pedido de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no supremo e aguarda uma nova posição do Supremo Tribunal Federal (STF), que já havia decidido pela inconstitucionalidade da tese no mesmo período em que a lei foi aprovado pelo Senadores em 2023.
Com informações da Página Amazônia Real*
14/dez/2023
Apib vai entrar com uma ação de inconstitucionalidade, no STF
O Congresso Nacional derrubou os vetos do presidente Lula ao Projeto de Lei 2903, agora lei 14.701/2023, nesta quinta-feira (14/12). Com isso, transformaram a tese ruralista do Marco Temporal em lei e aprovaram outros crimes contra os povos indígenas.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) reforça que ‘Direitos não se Negociam’ e como resposta ao resultado da votação vai protocolar uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF) para pedir a anulação desta lei, considerada pela articulação como a lei do genocídio indígena. O protocolo só pode ser feito após a promulgação da lei, que ocorrerá em 48 horas e a ação será proposta em conjunto com os partidos políticos PT, REDE, PSOL e PSB.
“Esta lei é inconstitucional e deve ser analisada pelo STF. Porém, enquanto a ADI não for julgada pelos ministros do Supremo, os parentes estão enfrentando invasões nos territórios, assassinatos e a devastação do meio ambiente. É por isso que solicitamos que seja concedida a tutela de urgência antecipada! Não podemos ficar esperando enquanto as comunidades estão morrendo”, afirma Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib.
A Apib protocolou no STF, na tarde desta quinta-feira, uma solicitação de audiência no tribunal para tratar sobre as ameaças aos direitos indígenas e a Constituição Federal, que existem nesta nova lei (14.701/2023). A Apib e suas sete organizações regionais de base (Apoinme, ArpinSudeste, ArpinSul, Aty Guasu, Conselho Terena, Coaib e Comissão Guarani Yvyrupa) reforçam que a luta continua e que o movimento indígena segue mobilizado nacionalmente e internacionalmente.
“O Futuro da humanidade depende dos povos e da demarcação das Terras Indígenas. A principal Conferência, que trata sobre mudanças climáticas, a COP 28, foi encerrada nesta semana e o Congresso Nacional mais uma vez reforça seu compromisso com a morte. O Marco Temporal é uma proposta criada pelo agronegócio e já foi anulada pelo STF”, reforça Kleber Karipuna, coordenador executivo da Apib.
Os únicos pontos dos vetos que foram mantidos e portanto foram RETIRADOS da Lei do Genocídio foram:
- as ameaças aos povos indígenas isolados
- a proposta que pretendia autorizar o uso de transgênicos nas Terras Indígenas
- a proposta racista sobre a alteração de traços culturais
Em sessão conjunta, entre deputados e senadores, desta quinta-feira, que derrubou os vetos de Lula terminou com um placar de 321 deputados contrários aos vetos e 137 favoráveis. No Senado a votação foi de 53 a 19 pela retirada dos vetos.
Inconstitucionalidades
Além do Marco Temporal, outras inconstitucionalidades da lei já estão vigentes e violam artigos da Constituição Federal, bem como aos Tratados Internacionais de Direitos Humanos assinados pelo Estado Brasileiro.
A participação efetiva de Estados e municípios em todas as fases do processo de demarcação e a regulamentação da cooperação entre indígenas e não indígenas para exploração de atividades econômicas, são pontos destacados pela Apib como inconstitucionais. De acordo com a articulação, esses pontos da lei podem inviabilizar as demarcações e ampliar assédios de não indígenas sobre as TIs.
A nova lei também afirma que o direito de usufruto exclusivo não pode se sobrepor ao interesse da política de defesa e soberania nacional. Lideranças indígenas da Apib ressaltam que o trecho pode abrir margem para violar o usufruto exclusivo dos povos indígenas sob o pretexto do “interesse de política de defesa”.
Na ADI, o departamento jurídico da Apib pede que a ação tenha como relator o Ministro Edson Fachin. O Ministro foi relator do Recurso Extraordinário (RE) nº 1.017.365, no qual o STF rejeitou o marco temporal, ou seja, a possibilidade de adotar a data da promulgação da Constituição Federal como marco para definir a ocupação tradicional da terra pelas comunidades indígenas.
“A proteção constitucional aos direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam independe da existência de um marco temporal em 05 de outubro de 1988 ou da configuração do renitente esbulho, como conflito físico ou controvérsia judicial persistente à data da promulgação da Constituição”, diz trecho da decisão do Supremo. O julgamento do marco temporal no STF foi finalizado no dia 27 de setembro com 9 votos contra e 2 a favor da tese.
O desmatamento e a destruição da biodiversidade nas terras indígenas representam uma ameaça internacional para o equilíbrio climático global. Nos últimos 30 anos, o Brasil perdeu 69 milhões de hectares de vegetação nativa. Porém, apenas 1,6% desse desmatamento foi registrado em terras indígenas. Além disso, os territórios indígenas concentram 80% da biodiversidade do planeta, mas estão ameaçados pelo avanço do agronegócio e das indústrias extrativistas, de desenvolvimento e turismo, tal como alerta o relatório da ONU Estado dos Povos Indígenas no Mundo, publicado em 2021.
Maurício Terena, coordenador do departamento jurídico da Apib, afirma que a Lei nº 14.701/2023, possui vícios de inconstitucionalidade e revanchismo parlamentar, onde o Senado pautou o PL no mesmo dia do julgamento do marco temporal no STF. O coordenador também reforça que um dos papéis do Supremo é garantir os direitos fundamentais de grupos sociais minoritários e que tem expectativas de que isso seja cumprido por meio da ADI.
“Vivemos em um sistema de freios e contrapesos e o limite imposto pelo Poder Legislativo é o de não aprovar leis que atentem contra cláusulas pétreas estabelecidas na Constituição Federal. Os direitos dos povos indígenas são originários e foram reconhecidos em 1988 e isso precisa ser respeitado”, diz Terena.
PL 2903 e veto parcial de Lula
Ao longo do ano de 2023, o PL 2903 representou uma das maiores ameaças aos direitos dos povos indígenas do Brasil. O Projeto de Lei defende os interesses latifundiários em detrimento dos direitos indígenas e foi aprovado em caráter de urgência no Senado Federal no dia 27 de setembro, mesma data em que o STF encerrou o julgamento do marco temporal.
Em contramão à demanda do movimento indígena pelo veto completo ao PL, o presidente Lula anunciou seu veto parcial no dia 20 de outubro. Lula retirou o marco temporal da proposta, assim como o cultivo de espécies transgênicas em Terras Indígenas e a construção de grandes obras de infraestrutura, como hidrelétricas e rodovias, sem consulta prévia, livre e informada. O veto do presidente também retirou a flexibilização das políticas de proteção aos povos indígenas em isolamento voluntário do PL.
“A aprovação de projetos que interessam ao Executivo, tal como a Reforma Tributária no último dia 8 de novembro, fazem parte desse toma lá dá cá e reafirmamos que DIREITOS NÃO SE NEGOCIAM! Essas ações apenas perpetuam o império dos interesses do capital representado principalmente pela bancada ruralista e evangélica, entre outras, que alavancam a sobrevida da extrema direita que nos últimos anos infernizou a vida do povo brasileiro. A negociata dos nossos direitos para aprovar a Reforma Tributária implicou em o Governo Federal acenar para os parlamentares sinal verde para a derrubada dos vetos do presidente Lula ao Projeto de Lei 2903, que pretende transformar o Marco Temporal e outros crimes contra povos indígenas em lei”, diz nota da Apib.
À época, a votação dos vetos ao PL 2903 estava prevista para 9 de novembro, mas foi adiada algumas vezes, até a votação no dia 14 de dezembro. Leia aqui a nota completa publicada pela Apib no dia 10 de novembro.
A Apib ressalta que as atitudes do Congresso Nacional são resultados da ligação direta de políticos brasileiros à invasão de terras indígenas, como mostra o dossiê “Os invasores” do site jornalístico “De olho nos ruralistas”. De acordo com o estudo, representantes do Congresso e do Executivo possuem cerca de 96 mil hectares de terras sobrepostas às terras indígenas.
Além disso, muitos deles foram financiados por fazendeiros invasores de TIs, que doaram R$ 3,6 milhões para a campanha eleitoral de ruralistas. Esse grupo de invasores bancou 29 campanhas políticas em 2022, totalizando R$ 5.313.843,44. Desse total, R$ 1.163.385,00 foi destinado ao candidato derrotado, Jair Bolsonaro (PL).
Nesta última semana, uma comitiva das organizações e lideranças indígenas, que compõem a Apib, estiveram em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, para a Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, a COP28. A participação indígena foi a maior de todas as conferências e a Apib promoveu uma série de denúncias de violações de direitos e incidências políticas internacionais.
Na COP28, a comitiva reforçou as Emergências Indígenas e exigiu a garantia dos direitos e demarcação das Terras Indígenas. Para a Apib e suas organizações regionais de base, não é possível combater a crise climática sem a demarcação e é necessário frear as violências financiadas pelo agronegócio contra as vidas indígenas.
05/dez/2023
A Secretaria-Geral da Presidência da República disse que continuará cumprindo a decisão do ministro do STF Luís Roberto Barroso sobre o caso, na qual decidiu pela continuidade da desintrusão
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Kassio Nunes Marques, determinou a paralisação da desintrusão das terras indígenas Apyterewa e Trincheira Bacajá, localizadas no Pará, no dia 28 de novembro, utilizando a tese do Marco Temporal, como mostra o site Metrópoles. A decisão utilizando a tese anti-indígena, que foi derrubada pelo STF em setembro de 2023, tenta passar por cima da decisão do colegiado do STF.
O marco temporal estabelece que somente são reconhecidos os direitos territoriais indígenas para as áreas ocupadas por essas comunidades na data da promulgação da Constituição Federal, em 1988.
Na decisão, Nunes Marques disse: “ausente ocupação tradicional indígena ao tempo da promulgação da Constituição Federal ou renitente esbulho na data da promulgação da Constituição, são válidos e eficazes”.
Barroso determina que União continue com plano de retirada de invasores
A Secretaria-Geral da Presidência da República disse que continuará cumprindo a decisão do ministro do STF Luís Roberto Barroso sobre o caso, na qual decidiu pela continuidade da desintrusão.
No dia 30 do mesmo mês, Barroso determinou que a União continue com o plano de retirada de invasores das terras indígenas. A decisão foi tomada na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 709, protocolada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), que tem por objeto ações e omissões por parte do Poder Público que colocam em risco a saúde e a subsistência da população indígena no país.
No texto o ministro Barroso, que é presidente do STF e relator da ADPF 709, explica que a Advocacia-Geral da União (AGU) o comunicou sobre a decisão do ministro Nunes Marques, apontando suposta contradição com o plano de desintrusão. Porém, a decisão de Marques ocorreu no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1467105 e Barroso afirma que ela não interfere na decisão tomada por ele na ADPF, pois refere-se apenas ao processo do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1).