GARIMPO MATA!

GARIMPO MATA!

Começou hoje a sessão virtual do julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) que questiona a Lei Estadual 1.453/2021, que dispõe sobre o Licenciamento para a Atividade de Lavra Garimpeira em Roraima. A lei proposta amplia ainda mais a área de exploração garimpeira no estado e permite o uso de mercúrio, altamente contaminante para a floresta, rios e igarapés, e para a saúde e o bem estar das populações.

O ministro do STF, Alexandre de Moraes, suspendeu a lei em fevereiro de 2021. A decisão cautelar foi tomada na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6672, ajuizada pela Rede Sustentabilidade, que alerta sobre graves riscos à proteção e à preservação da fauna e da flora. O ministro critica a lei e vota pela ilegalidade. Agora, a medida precisa ser analisada pelos outros 10 ministros da Suprema Corte durante o julgamento virtual que perdura por mais sete dias.

Mais uma vez, um julgamento do STF contará com a participação da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia (COIAB) e da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), e suas assessorias jurídicas para o esclarecimento dos fatos através de seus pareceres, dados e informações sobre as questões que afetam os povos e os territórios indígenas da Amazônia.

Quando a lei foi criada, nossas organizações, junto ao Conselho Indígena de Roraima (CIR), e diversas outras instituições, já se manifestaram contra essa proposta eleitoreira de alguns políticos interessados em flexibilizar a legislação e a fiscalização ambiental para a ação de garimpeiros que invadem as terras indígenas.
Em Roraima, a atividade garimpeira afeta principalmente a Terra Indígena Yanomami. Neste ano, se intensificaram as invasões e os conflitos armados entre garimpeiros e indígenas. Diante das inúmeras denúncias das organizações indígenas, o STF ordenou em junho deste ano a retirada dos garimpeiros desta TI, e de outros territórios indígenas afetados duramente pelo garimpo.

PRIMAVERA INDÍGENA: Mulheres indígenas ocupam Brasília para reflorestar mentes

PRIMAVERA INDÍGENA: Mulheres indígenas ocupam Brasília para reflorestar mentes

foto: Cicero Bezerra – @cicerone.bezerra

Evento reunirá cerca de 4 mil mulheres de 150 povos, de todas as regiões do país e dará continuidade às mobilizações do movimento indígena na luta por direitos na capital federal

A Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga) realiza entre os dias 7 e 11 de setembro a 2ª Marcha Nacional das Mulheres Indígenas, em Brasília. Com o tema “Mulheres originárias: Reflorestandomentes para a cura da Terra’, está prevista a participação de cerca de 4 mil mulheres, com mais de 150 povos, vindas de todos os biomas do Brasil, durante os 3 dias de atividades, que acontecem no espaço da Fundação Nacional de Artes (FUNARTE).

“Estamos em busca da garantia de nossos territórios, das que nos antecederam, para as presentes e futuras gerações, defendendo o meio ambiente, este bem comum que garante nossos modos de vida enquanto humanidade. Para além de mero recurso físico é igualmente morada dos espíritos das florestas, dos animais e das águas da vida com um todo, fonte de nossos conhecimentos ancestrais”, reforça o comunicado da Anmiga sobre a marcha.

A mobilização foi realizada pela primeira vez em 2019, e aconteceu de forma virtual em 2020 devido à pandemia da Covid-19. Os protocolos sanitários da segunda Marcha reforçam todas as normas já existentes e recomendadas para o combate ao coronavírus.

De acordo com a organização da Marcha, as delegações de mulheres foram orientadas para priorizar a participação de pessoas que tiveram seu ciclo de imunização contra a Covid-19 completo, com pelo menos duas doses da vacina, ou dose única. O uso de máscara durante as atividades é obrigatório e será realizada testagem na chegada das pessoas que estarão no evento.

A equipe de saúde da Marcha conta com profissionais indígenas de saúde em parceria com a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), com a Fundação Oswaldo Cruz de Brasília e do Rio de Janeiro (Fiocruz DF e RJ), com o Ambulatório de Saúde Indígena da Universidade de Brasília (Asi/UNB), Secretaria de Saúde do Distrito Federal e com o Hospital Universitário de Brasília (HUB).

Mobilização Permanente
“Afirmamos que as mulheres indígenas estarão na linha de frente para enterrar de vez a tese do Marco Temporal, durante a 2ª marcha das mulheres indígenas”, enfatiza a coordenação da Anmiga.

Desde o dia 22 de agosto mais de seis mil indígenas, de 176 povos, de todas as regiões do país, estiveram presentes em Brasília, reunidos no acampamento “Luta pela Vida”, que é atualmente a maior mobilização da história do movimento indígena. Encabeçada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), em conjunto com todas as suas organizações regionais de base, os indígenas acompanham o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF), que vai definir o futuro das demarcações de Terras Indígenas e também protestar contra a agenda anti-indígena do governo Bolsonaro e do Congresso Nacional.

Após o início do julgamento, no dia 26 de agosto, e a previsão de que fosse retomado nesta quarta-feira (1/09), os indígenas decidiram manter a mobilização em Brasília e nos territórios. Assim, cerca de 1.200 lideranças indígenas, representando seus povos, permaneceram em Brasília, e o acampamento “Luta pela Vida” foi transferido para um novo local, a Funarte.

O grupo seguirá acompanhando o julgamento e une forças com a 2ª Marcha das Mulheres Indígenas em uma proposta de mobilização permanente.

Programação
O dia 7 de setembro será dedicado à acolhida das delegações em Brasília, com atividades orientações e testagem para Covid-19. O Fórum Nacional das Mulheres Indígenas inicia na quarta-feira, dia 8, e toda a mobilização vai acompanhar a volta do julgamento no STF a partir das 14h.

Na quinta-feira (9), está prevista a realização da Marcha das Mulheres Indígenas, até Praça dos Três Poderes e no dia 10 o encerramento das atividades da mobilização será realizado com o lançamento da mobilização “Reflorestarmentes”. Todas as atividades podem ser acompanhadas no site: anmiga.org

PGR posiciona-se a favor do povo Xokleng no processo sobre terras indígenas no STF

PGR posiciona-se a favor do povo Xokleng no processo sobre terras indígenas no STF

foto: Matheus Veloso

Julgamento que pode definir o futuro dos povos indígenas volta para pauta do Supremo na próxima quarta-feira, dia 8 de setembro

Brasília, 2 de setembro de 2021 | O Procurador-Geral da República (PGR), Augusto Aras, realizou, nesta quinta-feira (2), uma manifestação contrária ao Marco Temporal no julgamento que vai definir o futuro das demarcações de Terras Indígenas, no Supremo Tribunal Federal (STF). O julgamento segue no dia 8 de setembro com o voto das ministras e ministros do Supremo.

Cerca de 1200 indígenas, de 70 povos, marcharam hoje (2) rumo ao STF para acompanhar a sessão na praça dos Três Poderes. Pela quarta vez, em menos de duas semanas, povos indígenas de todo país se mobilizam, em Brasília, para acompanhar o julgamento e manifestar apoio ao Supremo.

O terceiro dia do julgamento foi encerrado após a fala do PGR, que defendeu o provimento do recurso do povo Xokleng, cujo território está no centro da disputa deste processo. “A demarcação é de índole declaratória, não constitutiva. Demarcar uma terra indígena consiste em atestar a ocupação dos índios como circunstância anterior à demarcação”, destacou Aras.

O caso em discussão começou com uma ação de reintegração de posse movida pelo Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA) em face do povo Xokleng. A área, ocupada pelos indígenas, é sobreposta a um parque estadual e já foi identificada como parte da Terra Indígena (TI) Ibirama Laklãnõ.

O PGR posicionou-se pela manutenção da posse dos indígenas na área, mesmo antes da conclusão da regularização da terra indígena, e a favor da validade da demarcação, sem a aplicação de nenhum marco temporal.

O pronunciamento do procurador foi feito após 36 manifestações dos chamados amici curiae – “amigos da Corte”, organizações e instituições que auxiliam as partes que têm interesse no caso. O STF iniciou o julgamento do Recurso Extraordinário nº 1.017.365, na última quinta-feira (26), após a leitura do relatório inicial do ministro Edson Fachin.

Além das manifestações dos amici, foram feitas as sustentações orais da Advocacia-Geral da União (AGU), dos advogados da comunidade Xokleng, da TI Ibirama-LaKlãnõ (SC), do Instituto do Meio Ambiente do estado de Santa Catarina (IMA), que propôs a ação, e da PGR, que se manifesta obrigatoriamente em processos envolvendo a temática indígena. A Fundação Nacional do Índio (Funai), que era parte no processo e defendia os direitos da comunidade indígena, agora alinhada com o atual governo e setores ruralistas, se ausentou.

“O momento é oportuno para esta Suprema Corte reafirmar o direito dos povos originários do Estado brasileiro, notadamente num contexto político tão adverso, onde cumprir as disposições constitucionais é medida que se impõe. É preciso reafirmar que a proteção constitucional dispensada às terras indígenas é um compromisso de Estado e não pode estar submetido à discricionariedade política. Sendo assim, demarcar terra indígena é imperativo constitucional”, destaca Luiz Eloy Terena, coordenador jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), durante sustentação oral na tarde de ontem.

Nesse contexto, também se destaca a posição do ministro relator Edson Fachin, que afirmou que “está em julgamento a tutela do direito à posse de terras pelas comunidades indígenas, substrato inafastável do reconhecimento ao próprio direito de existir dos povos indígenas”.

A respeito do “marco temporal” e sobre os indígenas que vivem em isolamento voluntário, o ministro questionou: “estando completamente alijadas do modo de vida ocidental, de que modo farão prova essas comunidades de estarem nas áreas que ocupam em 05 de outubro de 1988?”

“A sessão vai ser retomada na próxima quarta-feira, dia 8, a partir das 14h, com a leitura do voto do ministro relator Edson Fachin, e após será aberto para os demais ministros da corte. Continuaremos mobilizados acompanhando, dizendo não ao Marco Temporal”, enfatizou a coordenadora jurídica da Apib, Samara Pataxó.

Advocacia Indígena

Organizações indígenas e indigenistas consideram como histórica a participação dos quatro advogados indígenas que apresentaram sustentação oral como amici curiae. Ontem, Samara Pataxó, Eloy Terena, Ivo Macuxi e Cristiane Soares Baré se pronunciaram contrários à tese do Marco Temporal.

“É notório que o marco temporal figura-se como um dos principais trunfos para sobrepor interesses individuais, políticos e econômicos sobre direitos fundamentais, coletivos e constitucionais dos povos indígenas e da própria União. Ou seja, o marco temporal não goza de natureza jurídico-constitucional, pois vai de encontro a pilares que são caros ao Estado Democrático de Direito”, destacou Samara, que, além de coordenadora jurídica da Apib, representou o Movimento Unido dos Povos e Organizações Indígenas da Bahia (Mupoiba) no processo.

Para Samara, a participação dos advogados indígenas é importante, pois revela a diversidade de povos e regiões, mostrando que a tese do marco temporal afeta todos os territórios e povos do país. “O nosso papel enquanto advogados é levar a voz dos povos indígenas na condição de profissional, mas também trazendo o que a gente já faz em nossas bases, que é a defesa dos direitos dos povos nos nossos estados e também mostrando que hoje estamos em um patamar que há investimentos na qualificação dos indígenas em diversas áreas, como uma possibilidade de trazer retornos às nossas lutas, nossos povos e nossos direitos.”

Teses em disputa

A Corte analisa a reintegração de posse movida pelo IMA, de Santa Catarina, contra o povo Xokleng, referente à TI Ibirama-Laklãnõ, onde também vivem os povos Guarani e Kaingang. O caso recebeu, em 2019, status de “repercussão geral”, o que significa que a decisão servirá de diretriz para a gestão federal e todas as instâncias da Justiça no que diz respeito aos procedimentos demarcatórios.

No centro da disputa há duas teses: a tese do chamado “marco temporal”, defendida pelos ruralistas, que restringe os direitos indígenas. Segundo esta interpretação, considerada inconstitucional, os povos indígenas só teriam direito à demarcação das terras que estivessem em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. Essa tese é defendida por empresas e setores econômicos que têm interesse em explorar e se apropriar das terras indígenas.

Oposta ao marco temporal está a “teoria do indigenato”, consagrada pela Constituição Federal de 1988. De acordo com ela, o direito indígena à terra é “originário”, ou seja, é anterior à formação do próprio Estado brasileiro, independe de uma data específica de comprovação da posse da terra (“marco temporal”) e mesmo do próprio procedimento administrativo de demarcação territorial. Essa tese é defendida pelos povos e organizações indígenas, indigenistas, ambientalistas e de direitos humanos.

“A nossa história não começou em 1988, e as nossas lutas são seculares, isto é, persistem desde que os portugueses e sucessivos invasores europeus aportaram nestas terras para se apossar dos nossos territórios e suas riquezas”, reafirma o movimento indígena em nota divulgada no sábado (28). Os indígenas também asseguram seguir “resistindo, reivindicando respeito pelo nosso modo de ver, ser, pensar, sentir e agir no mundo”.

Entenda mais sobre o julgamento aqui

Mobilização indígena

Na semana passada, seis mil indígenas, de 176 povos de todas as regiões do país, estiveram presentes em Brasília, reunidos no acampamento “Luta pela Vida” para acompanhar o julgamento no STF e lutar em defesa de seus direitos, protestando também contra a agenda anti-indígena do governo Bolsonaro e do Congresso Nacional, na maior mobilização indígena dos últimos 30 anos.

Após o início do julgamento e a previsão de que fosse retomado nesta quarta-feira (1º), os indígenas decidiram manter a mobilização em Brasília e nos territórios. Assim, cerca de 1.200 lideranças indígenas, representando seus povos, permaneceram em Brasília, e o acampamento “Luta pela Vida” foi transferido para um novo local, a Funarte.
Seguindo os protocolos sanitários de combate à Covid-19, o grupo seguirá acompanhando o julgamento e une forças com a Segunda Marcha das Mulheres Indígenas, que acontece entre os dias 7 e 11 de setembro. Os indígenas seguem mobilizados também nos territórios, de forma permanente.

Comitê da ONU notifica Brasil por atrocidades contra indígenas e negros

Comitê da ONU notifica Brasil por atrocidades contra indígenas e negros

Numa medida que aprofunda de forma importante a pressão internacional sobre o Brasil, o Comitê da ONU contra a Discriminação Racial notificou o governo por conta da situação da pandemia da covid-19 sobre a população indígena e a violência sobre negros.

 

O estado foi alvo de um mecanismo de alerta de atrocidades, usado pela entidade internacional para chamar a atenção em relação a uma crise iminente e riscos para uma população. A notificação ocorre no momento em que o Marco Temporal é ainda alvo de um debate no país, tanto no Supremo Tribunal Federal como no Congresso.
O ato do Comitê ainda ocorre no momento em que o presidente Jair Bolsonaro é alvo de denúncias por parte de entidades nacionais e estrangeiras no Tribunal Penal Internacional, em Haia, por genocídio.

O procedimento de alerta de atrocidades não é apenas uma carta de relatores da ONU denunciando ou pedindo explicações por parte do governo. Trata-se de um processo vinculante, ligado à Convenção da ONU contra todas as formas de Discriminação Racial e ratificada pelo Brasil em 8 de dezembro de 1969. Em termos legais, o cumprimento da recomendação por parte do Brasil é obrigatório, ainda que não exista forma de punir de forma imediata o governo que a desrespeite.
Desde 1994, tal procedimento já foi usado para lançar alertas em situações de iminência de conflitos, em contextos que incluam discurso de ódio, padrões persistentes de racismo estrutural, incitação ao ódio racial e intolerância, dentre outros indicadores.

Caso o Comitê não receba notícias satisfatórias, pode acionar instâncias mais graves, como o Escritório da ONU de Prevenção de Genocídio, em Nova Iorque, ensejando, por exemplo, as consequências do regime da Responsabilidade de Proteger ou responsabilização criminal ante a Corte Penal Internacional em Haia. Em junho de 2021, a Assessora do Secretário Geral da ONU sobre Prevenção de Genocídio, Wairimu Nderitu, já havia dado o alerta sobre a situação dos povos indígenas no Brasil.

O processo atual começou quando as entidades CIMI, a Franciscans International, a Faculdade de Direito da Unisinos e a Clínica de Direito da Cardozo Law School enviaram uma petição para o órgão da ONU. O Comitê, assim, decidiu abrir um procedimento para responsibilizar internacionalmente o Estado e as autoridades brasileiras responsáveis pelas atrocidades em curso contra os povos indígenas. Em nota, o grupo de entidades informou que o Comitê “demostrou sua grave preocupação sobre o fato de o governo estar difundindo informações contra as medidas de saúde publica para conter a pandemia (“fake news”), resultando no enfraquecimento da adesão da população às recomendações baseadas em evidência científica”.

“O Comitê ainda pede explicações pelo fato de que somente os indígenas vivendo em territórios demarcados têm se beneficiado das políticas de saúde indígena, deixando outros residindo em áreas urbanas ou terras em processo de demarcação sem a devida proteção”, apontam. “A notificação também se estende aos casos de ineficiência das políticas de saúde e negligência de hospitais onde habitam significantes populações indígenas, expondo a situação de falta de suprimento de oxigênio, o que exacerbou a taxa de mortalidade entre povos indígenas”, dizem.

O Comitê ainda tomou conhecimento de que o governo não elaborou recomendações a nível nacional específicas aos sepultamentos e rituais indígenas, levando ao desrespeito das culturais tradicionais indígenas, e até mesmo sepultamento sem a autorização das famílias. “Também foi negada a identidade indígena dos falecidos nos registros de óbitos, o que contribuiu para uma subnotificação das mortes indígenas”, completa o documento.

Violência contra população afro-brasileira A situação indígena não é a única que chama a atenção da ONU. Na mesma notificação, a entidade citou as operações policiais no Rio de Janeiro. “A primeira situação relatada refere-se a uma operação realizada pela Polícia Civil do Rio de Janeiro em 6 de maio de 2021 em Jacarezinho, que resultou na morte de 28 afro-brasileiros e deixou muitos feridos. A segunda situação diz respeito a uma jovem afro-brasileira grávida, que teria sido morta a tiros em 8 de junho de 2021, durante uma ação da Polícia Militar no Complexo de Lins Vasconcelos”, apontou a carta da ONU.

As informações recebidas questionam a independência das investigações destes incidentes violentos, uma vez que supostamente está sob a responsabilidade da Polícia Civil do Rio de Janeiro. “De acordo com as informações recebidas, os incidentes acima mencionados representam apenas dois exemplos recentes de violência sistêmica e discriminação racial contra afro-brasileiros por agentes do Estado, especialmente por membros de instituições policiais. Também é alegado que a falha do Governo do Brasil em responsabilizar as forças policiais por atos violentos e racistas contra afro-brasileiros, resultou na repetição de atos similares e perpetua o racismo estrutural prevalecente na aplicação da lei brasileira”, alerta.

O Comitê da ONU agora quer informações do estado brasileiro sobre as investigações sobre a violência policial e o que tem sido feito para garantir que sejam conduzidas de forma independente, completa e imparcial. A carta ainda pede esclarecimentos sobre “as medidas adotadas para prevenir a violência policial contra afro-brasileiros, bem como para indagar sobre a dimensão estrutural da violência policial e da discriminação racial contra afro-brasileiros”.

Leia a notificação completa da ONU, de 25 de agosto de 2021, ao estado brasileiro:

Escrever para informar que, no decorrer de sua 104ª sessão, o Comitê considerou informações adicionais recebidas sob seu procedimento de alerta precoce e ação urgente, relacionadas à situação dos povos indígenas e afro-brasileiros, no contexto da COVID-19 no Brasil. A este respeito, o Comitê se refere a sua carta anterior de 7 de agosto de 2020 relacionada com o mesmo assunto.

Segundo as informações recebidas, a situação da COVID-19 no Brasil teve um impacto dramático sobre os povos indígenas, particularmente no Estado do Amazonas. As informações afirmam que as autoridades governamentais difundiram mensagens contra as medidas de saúde pública para conter a pandemia, resultando no enfraquecimento da adesão popular às recomendações de saúde baseadas em evidências científicas. A informação alega ainda que a política de saúde indígena beneficia apenas os povos indígenas que vivem em terras indígenas oficiais (“Terra Indígena”), deixando desprotegidos aqueles que residem em áreas urbanas e rurais. As informações também alegam que a gestão ineficiente da saúde baseadas em evidências científicas.

A informação alega ainda que a política de saúde indígena beneficia apenas os povos indígenas que vivem em terras indígenas oficiais (“Terra Indígena”), deixando desprotegidos aqueles que residem em áreas urbanas e rurais. As informações também alegam que a gestão ineficiente da saúde pública e a negligência dos hospitais nas regiões habitadas pelos povos indígenas, inclusive no que diz respeito à falta de estoque de oxigênio e de fluxo de emergência adequado de suprimento de oxigênio, exacerbou as mortes de COVID-19 entre os povos indígenas.

De acordo com as informações recebidas, o Governo do Brasil não emitiu uma recomendação em nível nacional que trate especificamente do respeito aos ritos funerários e enterros dos povos indígenas, levando ao desrespeito às tradições culturais dos povos indígenas e aos enterros sem autorização das famílias indígenas. Segundo consta, alguns cartórios de registro civil recusaram-se a reconhecer a identidade indígena do falecido, o que supostamente aprofundou a subnotificação das mortes indígenas.

O Comitê também recebeu informações alegando que a polícia realizou duas operações violentas nas favelas do Rio de Janeiro, em violação a uma decisão do Supremo Tribunal Federal de junho de 2020, que proíbe temporariamente as operações policiais nas comunidades do Rio de Janeiro enquanto durar a pandemia da COVID-19. Alegadamente, a polícia ignorou a proibição, pois o número de operações policiais aumentou em outubro de 2020 e no primeiro semestre de 2021. A primeira situação relatada refere-se a uma operação realizada pela Polícia Civil do Rio de Janeiro em 6 de maio de 2021 em Jacarezinho, que resultou na morte de 28 afro-brasileiros e deixou muitos feridos. A segunda situação diz respeito a uma jovem afro-brasileira grávida, que teria sido morta a tiros em 8 de junho de 2021, durante uma ação da Polícia Militar no Complexo de Lins Vasconcelos.

As informações recebidas questionam a independência das investigações destes incidentes violentos, uma vez que supostamente está sob a responsabilidade da Polícia Civil do Rio de Janeiro. Além disso, de acordo com as informações recebidas, em maio de 2021 a Secretaria da Polícia Civil do Rio de Janeiro impôs uma medida de sigilo de cinco anos sobre todos os documentos relacionados às operações policiais desde junho de 2020, que cobrem as operações ocorridas em Jacarezinho e no Complexo de Lins Vasconcelos.

De acordo com as informações recebidas, os incidentes acima mencionados representam apenas dois exemplos recentes de violência sistêmica e discriminação racial contra afro-brasileiros por agentes do Estado, especialmente por membros de instituições policiais. Também é alegado que a falha do Governo do Brasil em responsabilizar as forças policiais por atos violentos e racistas contra afro-brasileiros, resultou na repetição de atos similares e perpetua o racismo estrutural prevalecente na aplicação da lei brasileira. De acordo com o artigo 9 (1) da Convenção e o artigo 65 de seu Regulamento Interno, o Comitê gostaria de solicitar ao Estado parte que, até 15 de outubro de 2021, forneça informações sobre:

(a) As medidas adotadas para assegurar que os povos indígenas tenham acesso sem discriminação a serviços de saúde, tratamento e vacinas de qualidade e culturalmente adequados contra a COVID-19, inclusive para aqueles indivíduos indígenas que vivem fora das terras indígenas oficiais (“Terra Indígena”); (b) As ações tomadas para incluir e consultar os povos indígenas no processo de tomada de decisão sobre as medidas para prevenir e combater a pandemia da COVID-19 e seus efeitos em suas comunidades;

(c) As medidas adotadas para registrar com precisão os falecimentos da COVID-19, incluindo os dos povos indígenas, e para assegurar que os enterros dos povos indígenas possam ocorrer de acordo com sua cultura e tradições, e em consulta com eles; (d) As investigações iniciadas sobre os incidentes de violência policial contra afro-brasileiros acima mencionados, as medidas adotadas para garantir que sejam conduzidas de forma independente, completa e imparcial, e os resultados dessas investigações;

(d) As investigações iniciadas sobre os incidentes de violência policial contra afro-brasileiros acima mencionados, as medidas adotadas para garantir que sejam conduzidas de forma independente, completa e imparcial, e os resultados dessas investigações;

(e) As medidas adotadas para prevenir a violência policial contra afro-brasileiros, bem como para indagar sobre a dimensão estrutural da violência policial e da discriminação racial contra afro-brasileiros, e informar o Comitê sobre os resultados; (f) As medidas tomadas para garantir o pleno cumprimento da decisão do Supremo Tribunal Federal de proibir operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro durante a pandemia da COVID-19. Yanduan Li Presidente do Comitê.

 

Texto originalmente publicado em: https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2021/09/02/comite-da-onu-notifica-brasil-por-atrocidades-em-relacao-a-indigenas.htm?cmpid=copiaecola

STF retoma julgamento histórico  sobre o “marco temporal” nesta quarta, 1º de setembro

STF retoma julgamento histórico sobre o “marco temporal” nesta quarta, 1º de setembro

foto: @cicerone.bezerra

Sessão está prevista para iniciar às 14h, com a sustentações orais das partes envolvidas no processo; indígenas se mobilizam em Brasília e nos territórios para acompanhar o julgamento

Com sessão prevista para iniciar às 14h desta quarta-feira, 01 de setembro, o Supremo Tribunal Federal (STF) retoma o julgamento sobre a questão do “marco temporal” das demarcações de Terras Indígenas (TIs), suspenso na última quinta-feira (26) após a leitura do relatório inicial do ministro Edson Fachin. Ainda na quinta, o presidente da Corte, Luiz Fux, confirmou que o caso seria retomado como primeiro item da pauta por se tratar de um assunto “muito importante” com decisão nesta semana ou nos “dias subsequentes”.

Como já foi realizado a leitura do relatório, a sessão será retomada com as sustentações orais das partes envolvidas no processo: da Advocacia-Geral da União (AGU), representando a União; dos advogados da comunidade Xokleng, da TI Ibirama-LaKlãnõ (SC), alvo da ação original; do Instituto do Meio Ambiente do estado de Santa Catarina (IMA), que propôs a ação; além da Procuradoria-Geral da República (PGR), que se manifesta obrigatoriamente em processos envolvendo a temática indígena. AGU, PGR e as partes do processo terão, cada uma, 15 minutos de fala.

Em seguida, devem ocorrer as 34 falas dos chamados amici curiae – “amigos da Corte”, pessoas ou organizações que auxiliam as partes mais diretamente interessadas no caso e oferecem subsídios aos ministros e ministras que deverão proferir seus votos na sequência do julgamento.

Estão cadastrados para falar 21 amici curiae favoráveis aos direitos dos povos indígenas, entre organizações e instituições indígenas e indigenistas, socioambientais e de direitos humanos, e 13 contrários, ligados a representações e entidades do agronegócio. Cada fala terá até cinco minutos.

“Ter iniciado com a leitura do relatório já é um elemento extremamente importante. Foi um relatório minucioso do ministro Edson Fachin, que traz as grandes questões envolvidas na disputa processual neste recurso extraordinário, ou seja, as relações de posse com relação às áreas de ocupação tradicional indígena à luz do artigo 231 da nossa Constituição Federal”, destaca Rafael Modesto, assessor jurídico do Conselho Indigenistas Missionário (Cimi) e advogado do povo Xokleng no caso.

A expectativa é que as sustentações orais das partes, da AGU, da PGR e dos amici curiae ocorram por quase toda a tarde de quarta-feira (1º). A seguir, o primeiro ministro a proferir seu voto deve ser o relator, Edson Fachin.

Os povos originários, organizações indígenas e indigenistas esperam que o ministro relator, Edson Fachin, que já apresentou seu voto quando o processo estava em Plenário Virtual, “traga um voto idêntico ou similar ao que já havia sido apresentado, contra a tese do ‘marco temporal’, que é repelida pelos povos indígenas, pelas organizações de apoio e da sociedade civil, artistas, intelectuais, pela sociedade como um todo, e em defesa do direito originário, da ‘tese do indigenato’, que é a vontade do constituinte originário de 1988, portanto, em defesa da nossa Constituição Federal”, reforça o advogado do povo Xokleng.

Depois de Fachin, os outros nove ministros devem apresentar seus votos. Eles ainda podem solicitar uma nova suspensão do processo para analisá-lo melhor, o chamado pedido de “vistas”.

Teses em disputa
A Corte irá analisar a reintegração de posse movida pelo governo de Santa Catarina contra o povo Xokleng, referente à TI Ibirama-Laklãnõ, onde também vivem os povos Guarani e Kaingang. O caso recebeu, em 2019, status de “repercussão geral”, o que significa que a decisão servirá de diretriz para a gestão federal e todas as instâncias da Justiça no que diz respeito aos procedimentos demarcatórios.

No centro da disputa há duas teses:
A tese do chamado “marco temporal”, uma tese ruralista que restringe os direitos indígenas. Segundo esta interpretação, considerada inconstitucional, os povos indígenas só teriam direito à demarcação das terras que estivessem em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. Essa tese é defendida por empresas e setores econômicos que têm interesse em explorar e se apropriar das terras indígenas.

Oposta ao marco temporal está a “teoria do indigenato”, consagrada pela Constituição Federal de 1988. De acordo com ela, o direito indígena à terra é “originário”, ou seja, é anterior à formação do próprio Estado brasileiro, independe de uma data específica de comprovação da posse da terra (“marco temporal”) e mesmo do próprio procedimento administrativo de demarcação territorial. Esta tese é defendida pelos povos e organizações indígenas, indigenistas, ambientalistas e de direitos humanos.
“A nossa história não começou em 1988, e as nossas lutas são seculares, isto é, persistem desde que os portugueses e sucessivos invasores europeus aportaram nestas terras para se apossar dos nossos territórios e suas riquezas”, reafirma o movimento indígena em nota divulgada no sábado (28). Os indígenas também asseguram seguir “resistindo, reivindicando respeito pelo nosso modo de ver, ser, pensar, sentir e agir no mundo”.

Mobilização indígena
Na semana passada, seis mil indígenas de 176 povos de todas as regiões do país estiveram presentes em Brasília, reunidos no acampamento “Luta pela Vida” para acompanhar o julgamento no STF e lutar em defesa de seus direitos, protestando também contra a agenda anti-indígena do governo Bolsonaro e do Congresso Nacional, na maior mobilização indígena dos últimos 30 anos.

Após o início do julgamento e a previsão de que fosse retomado nesta quarta-feira (1º), os indígenas decidiram manter a mobilização em Brasília e nos territórios. Assim, cerca de mil lideranças indígenas, representando seus povos, permaneceram em Brasília, e o acampamento “Luta pela Vida” foi transferido para um novo local, a Funarte.

No início da tarde desta quarta-feira (1º), os povos indígenas que permanecem em Brasília devem sair do acampamento em marcha até a Praça dos Três Poderes, onde irão acompanhar o julgamento no STF.

Seguindo os protocolos sanitários de combate à Covid-19, o grupo permanecerá até o dia 2 de setembro e posteriormente unem forças com a Segunda Marcha das Mulheres Indígenas, que acontece entre os dias 7 e 11 de setembro.

PRIMAVERA INDÍGENA: mobilização permanente pela vida e democracia

PRIMAVERA INDÍGENA: mobilização permanente pela vida e democracia

Foto: @cicerone.bezerra

Em memória dos nossos ancestrais, que entregaram as suas vidas para existirmos. Dos encantados que nos trouxeram até aqui para dar continuidade às suas lutas em defesa dos nossos corpos, terras e territórios, a nossa identidade e culturas diferenciadas, dizemos à sociedade brasileira e internacional que estamos em mobilização permanente em defesa da VIDA e da DEMOCRACIA.

A nossa luta não é apenas para preservar a vida dos nossos povos mas da humanidade inteira, hoje gravemente ameaçada pela política de extermínio e devastação da Mãe Natureza promovida pelas elites econômicas – que herdaram a ganância do poder colonial, mercantilista e feudal expansionista – e de governantes como o genocida Jair Bolsonaro.

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) deu início ao acampamento Luta pela Vida, em Brasília, no dia 22 de agosto e reforça nesta carta que seguiremos mobilizados até o dia 2 de setembro de 2021 para lutarmos por nossos direitos. Hoje, essa é a maior mobilização na história dos povos originários, na Capital Federal, e reforça nosso grito: Nossa história não começa, em 1988!

Mesmo colocando nossas vidas em risco, no contexto ainda gravemente perigoso da Covid-19, estamos aqui para dizer aos invasores dos nossos territórios que não passarão, mesmo diante dos intensos ataques aos nossos direitos fundamentais assegurados pela Constituição Federal de 1988.

Ocupamos as redes, as ruas, as aldeias e Brasília para lutarmos pela democracia, contra a agenda racista e anti-indígena que está em curso no Governo Federal e no Congresso Nacional e para acompanhar o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF), que vai definir o futuro dos nossos povos.

Durante o mês de junho de 2021, realizamos o Levante pela Terra, dando início às nossas primeiras atividades presenciais, em Brasília, para enfrentarmos o agravamento das violências contra as vidas indígenas. A partir de então, começamos um novo ciclo de jornada de lutas, que desde março de 2020, aconteceram de forma virtual e dentro dos nossos territórios, devido à pandemia.

Por enfrentarmos muitos vírus, incluindo a política genocida de Bolsonaro, começamos a nossa ‘Primavera Indígena’ que pretende ocupar Brasília de forma constante, em 2021, além de seguirmos nas redes sociais e nos territórios mobilizados.

Afirmamos que de 7 a 11 de setembro às mulheres indígenas estarão na linha de frente para enterrar de vez a tese do Marco Temporal, durante a 2ª marcha das mulheres indígenas: as originárias reflorestando mentes para a cura da Terra.

No dia 26, o STF iniciou o julgamento que vai definir as demarcações de Terras Indígenas (TIs). Sem previsão de término, os povos indígenas seguem mobilizados para acompanhar o desfecho das votações dos ministros e ministras do Supremo.

Lutaremos até o fim para manter o nosso direito originário às terras que tradicionalmente ocupamos e protegemos. Fazendo parte deste país, mantendo a nossa condição de povos culturalmente diferenciados, mesmo que autoridades públicas e corporações privadas nos considerem empecilhos ao desenvolvimento. Desenvolvimento esse, que desde os primórdios da invasão europeia é devastador, etnocida, genocida e ecocida e que nos tempos atuais encontrou, e não por acaso, nesse desgoverno, um protótipo para perpetuar o seu projeto de dominação.

Somos filhos da Terra! E a Terra não é Nossa, somos nós que fazemos parte dela. É o útero que nos gera e o colo que nos acolhe. Por isso damos a Vida por Ela. Na nossa tradição nunca houve essa história de regulamentar quem é ou não é dono da terra, pois a nossa relação com ela nunca foi de propriedade . A nossa posse é coletiva tal qual é o usufruto. É esse o fundamento basilar da nossa existência, que a ignorância da cultura da dita civilização ocidental não entende, mesmo após 521 anos.

Essa contradição está na base das disputas que os herdeiros ou descendentes dos invasores insistem em manter conosco. Disputam incansavelmente os nossos territórios sem trégua, tanto durante as distintas fases da formação e configuração do Estado Nacional Brasileiro quanto nos dias de hoje!

As elites neocoloniais, também promotoras e beneficiárias da ditadura militar, tomaram conta da maior parte do atual Congresso Nacional e permanecem defendendo a continuidade de seu controle hegemônico, de domínio de corpos, terras e territórios e não apenas dos povos indígenas. Pretendem nos fazer crer que vão desenvolver o Brasil, quando, na verdade, estão promovendo um Projeto de Morte da Mãe Natureza – das florestas, dos rios, da biodiversidade – e de povos e culturas detentores de sabedorias milenarmente acumuladas, na contramão de pesquisas científicas. Segundo os dados mais recentes do Painel de Mudanças Climáticas da ONU, há um incontestável aumento da temperatura do planeta, de enchentes, dentre outros desastres ambientais, provocados obviamente por esse modelo de desenvolvimento.

Por conta de tudo isso é que dizemos NÃO a toda e qualquer iniciativa que venha ignorar a nossa histórica e estratégica proteção da vida, da humanidade e do planeta. Também dizemos NÃO a todos aqueles que se propõe violar os nossos direitos por meio de centenas de medidas administrativas, jurídicas, legislativas e ações judiciais.

A nossa história não começou em 1988, e as nossas lutas são seculares, isto é, persistem desde que os portugueses e sucessivos invasores europeus aportaram nestas terras para se apossar dos nossos territórios e suas riquezas. Por isso continuaremos resistindo, reivindicando respeito pelo nosso modo de ver, ser, pensar, sentir e agir no mundo.

Sob a égide do texto Constitucional, confiamos que a Suprema Corte irá sacramentar o nosso direito originário à terra, que independe de uma data específica de comprovação da ocupação, conforme defendem os invasores. Por meio da tese do “marco temporal”, os atuais colonizadores querem ignorar que já estávamos aqui quando seus ascendentes dizimaram muitos dos nossos ancestrais, erguendo sobre os seus cadáveres o atual Estado nacional.

Amparados por nossa ancestralidade e pelo poder dos nossos povos, da nossa espiritualidade e da força dos nossos encantados que prezam pelo Bem Viver, nosso e da humanidade, dizemos não ao Marco Temporal! E conclamamos a sociedade nacional e internacional, em especial às distintas organizações e movimentos sociais que estiveram sempre conosco, e sobretudo às nossas bases, povos e organizações indígenas para que continuemos vigilantes e mobilizados na defesa dos nossos direitos.

Brasília – DF, 27 de agosto de 2021.

Acampamento Luta pela Vida
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB
Mobilização Nacional Indígena – MNI

Mobilização Permanente: Indígenas seguem em luta na capital federal e nos territórios

Mobilização Permanente: Indígenas seguem em luta na capital federal e nos territórios

Foto: Matheus Alves

Em plenária, os 6 mil indígenas presentes no acampamento “Luta Pela Vida”, decidem manter a mobilização, de forma permanente, em Brasília e nos territórios em todo país, até o julgamento do Marco Temporal. Em memória a seus ancestrais e encantados, em defesa de seus corpos, terras e territórios, identidade e culturas diferentes, reafirmam a mobilização em defesa da vida.

Mobilizados na capital federal, desde o domingo 22 de agosto, um dos motivadores da decisão de estender a mobilização é o início do julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), sobre a questão do “marco temporal” das demarcações de Terras Indígenas. A sessão foi suspensa por falta de tempo, na quinta-feira, 26, após a leitura do relatório inicial do ministro Edson Fachin. O presidente da Corte, Luiz Fux, garantiu que o julgamento será retomado na quarta-feira, dia 1º de setembro.

Em carta publicada na noite desta sexta-feira, 27, o Movimento Indígena reafirma “confiamos que a Suprema Corte irá sacramentar o nosso direito originário à terra, que independe de uma data específica de comprovação da ocupação, conforme defendem os invasores”. Amparados na ancestralidade e “pelo poder dos nossos povos, da nossa espiritualidade e da força dos nossos encantados que prezam pelo Bem Viver, nosso e da humanidade, dizemos não ao Marco Temporal”, reforçam os indígenas.

Cerca de mil lideranças indígenas, representando seus povos, irão permanecer acampados em Brasília, em um novo local: na FUNARTE. Seguindo os protocolos sanitários de combate à Covid-19, o grupo permanecerá até o dia primeiro de setembro, a continuidade da mobilização Luta Pela Vida antecede a Segunda Marcha das Mulheres Indígenas, que acontece entre os dias 7 e 11 de setembro.

“A nossa história não começou em 1988, e as nossas lutas são seculares, isto é, persistem desde que os portugueses e sucessivos invasores europeus aportaram nestas terras para se apossar dos nossos territórios e suas riquezas”, assegura o Movimento Indígena. Também, asseguram seguir “resistindo, reivindicando respeito pelo nosso modo de ver, ser, pensar, sentir e agir no mundo”.

Confira o documento, que reforça a ‘Primavera Indígena’ de mobilizaçoes permanentes, em Brasília aqui

Em ato simbólico, povos indígenas denunciam agenda anti-indígena do governo federal e do Congresso

Em ato simbólico, povos indígenas denunciam agenda anti-indígena do governo federal e do Congresso

Fotos: @mvelos2 / @midianinja

No sexto dia do acampamento “Luta pela Vida”, mais de 6 mil indígenas de 176 povos de todas as regiões do país marcharam pela Esplanada dos Ministérios, em Brasília, para denunciar a agenda anti-indígena do Congresso Nacional e do governo federal. O ato ocorreu na manhã desta sexta-feira (26).

Com cantos e rituais, carregando um grande caixão que simbolizava os “projetos de morte” contra seus direitos, os povos manifestaram-se em frente ao Congresso Nacional, ao Ministério da Justiça e ao Palácio do Planalto, onde o caixão foi queimado.

“Ecocídio”, “marco temporal não”, “não é só um vírus”, “fora garimpo”, “fora grilagem” e “condenação ao genocida” foram algumas das mensagens gravadas no caixão simbólico, que também trazia uma lista dos principais Projetos de Lei (PLs) que atacam os direitos dos povos indígenas.

Com um discurso abertamente anti-indígena, o governo de Jair Bolsonaro paralisou as demarcações de terras e esvaziou os órgãos de fiscalização contra crimes ambientais, favorecendo invasores, grileiros e garimpeiros que atuam ilegalmente nos territórios tradicionais. “Fora Bolsonaro, genocida!”, cobraram os indígenas, em coro, em frente à sede do governo federal.

Durante a manifestação, os povos indígenas também ocuparam o espelho d’água do Ministério da Justiça (MJ), responsável por uma das principais etapas do processo de demarcação de terras indígenas.

Sob o governo Bolsonaro, mais do que estagnar, as demarcações retrocederam: ainda em 2020, o Ministério Público Federal (MPF) identificou pelo menos 27 procedimentos administrativos de demarcação de terras indígenas que aguardavam a emissão da Portaria Declaratória, sob responsabilidade do MJ, e foram devolvidas à Funai para serem revisadas com base na tese do marco temporal.

Congresso anti-indígena
No Congresso Nacional, os povos manifestaram-se contra as diversas propostas legislativas que buscam restringir seus direitos. Entre elas, destaca-se o PL 490/2007, recentemente aprovado na CCJC da Câmara, que flexibiliza o usufruto exclusivo das terras indígenas pelos povos originários, garantido pela Constituição, e na prática inviabiliza demarcações de terras indígenas.

Entre as restrições às demarcações de terras indígenas que o PL 490 busca impor está a tese do marco temporal, que está sendo analisada no processo de repercussão geral que está em análise no Supremo Tribunal Federal (STF). Os povos indígenas acompanham o julgamento, que iniciou ontem (26) e deve ser retomado no dia 1/09.

Além do PL 490/2007, outras propostas legislativas que buscam restringir ou retirar os direitos dos povos indígenas foram listadas como “PLs da morte” no caixão e simbolicamente queimadas junto com ele.

Um dos projetos denunciados foi o PL 191/2020, de autoria do governo Bolsonaro, que libera a mineração, a geração hidrelétrica, a exploração de petróleo e gás e a agricultura em larga escala nas terras indígenas.

Os PLs 2633/2020 e 510/2021, conhecidos como PLs da Grilagem de Terras, ampliam as áreas passíveis de regularização como propriedade privada – e, portanto, abrem caminho para a legalização de áreas griladas. O PL 510, além disso, pretende alterar a data limite para que invasões de terras públicas sejam legalizadas, passando o prazo de 2011 para 2014.

O PL 3729/2004, que agora tramita no Senado com o número 2159/2021, desmonta o licenciamento ambiental, ao isentar 13 tipos de atividades e permitir o “autolicenciamento” para uma série de projetos.

Também integrava a lista de “PLs da Morte” o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 177/2021, que pretende retirar o Brasil da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), principal instrumento de direito internacional para a proteção dos direitos indígenas. Entre outras coisas, a Convenção 169 garante aos povos indígenas o direito à Consulta Livre, Prévia e Informada sobre projetos que afetem suas vidas, direitos e territórios.

“Esse ato representou o genocídio que está sendo causado aos povos indígenas do Brasil, com todas essas armadilhas e questões que estão tramitando dentro do Congresso que tiram os direitos dos povos indígenas à terra, à vida”, explica Paulo Tupiniquim, coordenador da Articulação dos Povos e Organizações indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme).

“O povo indígena sem terra, sem meio ambiente, sem floresta, não tem vida. Então significa o genocídio causado pelos poderes Legislativo e Executivo do país, que estão matando as populações indígenas”, afirma a liderança.

Indígenas realizam marcha contra os projetos anti-indígenas em trâmite no Congresso Nacional e no governo federal, nesta sexta (27)

Indígenas realizam marcha contra os projetos anti-indígenas em trâmite no Congresso Nacional e no governo federal, nesta sexta (27)

Foto: Marina Oliveira – CIMI

Os mais de 6 mil indígenas de 176 povos de todas as regiões do país que estão no acampamento “Luta Pela Vida”, em Brasília, realizam uma marcha contra a agenda anti-indígenas do Congresso Nacional e do governo federal. 

Além de paralisar as demarcações de terras indígenas e esvaziar os órgãos de fiscalização, favorecendo invasores, o governo federal vem adotando uma série de medidas que atacam os direitos dos povos indígenas. No Congresso Nacional, diversas proposições buscam restringir os direitos territoriais indígenas.

Entre elas, destaca-se o PL 490/2007, recentemente aprovado na CCJC da Câmara, que flexibiliza o usufruto exclusivo das terras indígenas pelos povos originários, garantido pela Constituição, e na prática inviabiliza demarcações de terras indígenas.

Entre as restrições às demarcações de terras indígenas que o PL 490 busca impor está a tese do marco temporal, que está sendo analisada no processo de repercussão geral que está em análise no STF. Os povos indígenas acompanham o julgamento, que iniciou ontem (26) e deve ser retomado no dia 1/09.

A marcha está prevista para iniciar às 9h30, saindo da Praça da Cidadania/Brasília. Os povos indígenas irão realizar manifestações culturais e políticas no Ministério da Justiça, Palácio do Planalto e Congresso Nacional. 

Após leitura de relatório, julgamento do ‘marco temporal’ no STF é suspenso; caso será retomado na quarta (1/9)

Após leitura de relatório, julgamento do ‘marco temporal’ no STF é suspenso; caso será retomado na quarta (1/9)

Análise do caso que pode definir o futuro das demarcações de Terras Indígenas seguirá com apresentação de voto do ministro Fachin

O julgamento sobre a questão do “marco temporal” das demarcações de Terras Indígenas (TIs) foi suspenso, após a leitura do relatório inicial do ministro Edson Fachin, no final da tarde de hoje (26).

Mais de seis mil indígenas que acompanhavam o julgamento, em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF), tiveram de voltar ao Acampamento Luta pela Vida, instalado ao lado da Esplanada dos Ministérios, em Brasília, sem saber qual a decisão final do caso.

A mobilização começou na segunda e vai até o próximo sábado (28), reunindo 176 povos diferentes de todas as regiões do país. Mobilizado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), o acampamento é a maior mobilização indígena em 30 anos e, além de acompanhar o processo no STF, protesta contra a agenda anti-indígena do governo Bolsonaro e do Congresso.

O julgamento estava marcado para ontem, mas teve de esperar a análise da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6.696, sobre a lei que prevê a autonomia do Banco Central. A discussão terminou só hoje, por volta das 16:30. Após um intervalo de descanso, só foi possível a Fachin ler seu relatório, documento que resume o histórico do processo. A sessão foi encerrada às 18h.

Antes disso, o presidente do tribunal, Luiz Fux, confirmou que o caso será retomado na próxima quarta (1/9), como primeiro item da pauta. No início da sessão de ontem, Fux já havia afirmado que ambos os assuntos eram “muito importantes” e seriam decididos nesta semana ou nos “dias subsequentes”.

O voto de Fachin foi protocolado em junho. Nele, o ministro rejeitou de forma categórica o chamado “marco temporal”, afirmando que sua existência seria o mesmo que fechar a porta aos indígenas “para o exercício completo e digno de todos os direitos inerentes à cidadania”. O ministro defendeu a chamada teoria do “indigenato” e reafirmou que o direito indígena à terra é “originário” e “fundamental”.

A teoria do indigenato é umas das teses que estão sendo discutidas no caso. De acordo com ela, o direito indígena à terra é “originário”, ou seja, é anterior à constituição do próprio Estado brasileiro, independe de uma data específica de comprovação da posse da terra (“marco temporal”) e mesmo do próprio procedimento administrativo de demarcação territorial.

Próximos passos

Na semana que vem, com o relatório do processo já lido, começam as sustentações orais: da Advocacia-Geral da União (AGU), representando o governo federal; dos advogados da comunidade Xokleng, da TI Ibirama-LaKlãnõ (SC), alvo da ação original; do governo de Santa Catarina, que a propôs; e da Procuradoria-Geral da República.

Na sequência, conforme informado por Fux, ocorrerão as 34 falas previstas para os chamados amici curiae (“amigos da causa”), pessoas ou organizações que auxiliam as partes mais diretamente interessadas no caso.

É neste momento queA Apib, Coiab, Conselho Terena, Cir, Aty Guasú e demais organizações indígenas e indigenistas realizam suas sustentações orais. Só depois Fachin deverá ler seu voto propriamente dito, com sua posição sobre as questões de mérito. O relator então será seguido pelos demais ministros, que proferirão seus votos. Eles ainda podem solicitar uma nova suspensão do processo para analisá-lo melhor, o chamado pedido “vistas”.

“O julgamento começou com uma atmosfera interessante, no sentido de que o ministro Edson Fachin exaltou o caráter ‘originário’ dos direitos indígenas e a importância da teoria do indigenato. De certa maneira, isso é um recado aos povos indígenas no sentido de reconhecimento dos seus direitos”, afirma Maurício Terena, assessor jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).

“Queremos que o STF conclua o julgamento e enterre a tese do ‘marco temporal’, para que possamos viver o nosso bem-viver, a nossa cultura e nossa ancestralidade com paz”, continua Maurício Terena. “Seguimos firmes na nossa mobilização e os ministros estão atentos a isso. Isso pode sensiblizá-los”, conclui.

“Estamos muito felizes com o primeiro voto, a favor da vida dos povos indígenas e contra o marco temporal”, diz Enok Taurepang, da coordenação do Conselho Indígena de Roraima (CIR). “O voto do ministro foi favorável, bem pautado, respeitando a realidade e a Constituição cidadã. Vamos continuar firmes e fortes na luta, aqui em Brasília e nos estados”, ressaltou.

Repercussão geral

Na prática, o STF analisa a reintegração de posse movida pelo governo de Santa Catarina contra o povo Xokleng, referente à TI Ibirama-Laklãnõ, onde também vivem os povos Guarani e Kaingang. Em 2019, o tribunal deu status de “repercussão geral” ao processo, o que significa que a decisão servirá de diretriz para a gestão federal e todas as instâncias da Justiça no que diz respeito aos procedimentos demarcatórios.

No centro da disputa está a discussão em torno do chamado “marco temporal”, uma tese ruralista que restringe os direitos indígenas. Segundo a interpretação, considerada inconstitucional, os povos indígenas só teriam direito à demarcação das terras que estivessem em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição.

Alternativamente, se não estivessem na terra, precisariam estar em disputa judicial ou em conflito material comprovado pela área na mesma data. A tese é injusta porque desconsidera as expulsões, remoções forçadas e todas as violências sofridas pelos indígenas até a promulgação da Constituição. Além disso, ignora o fato de que, até 1988, eles eram tutelados pelo Estado e não podiam entrar na Justiça de forma independente para lutar por seus direitos.

“Sabendo que a conclusão do julgamento ficou para quarta-feira, dia 1.º, seguiremos acompanhando”, garante Brasílio Priprá, liderança do povo Xokleng. “Ainda temos esperança que o STF julgue e reconheça os direitos do povo Xokleng e de todos os povos indígenas do Brasil. Sem os povos indígenas, não terá água boa, não terá meio ambiente tranquilo, e isso é para todos os brasileiros”.

“Estamos aqui na expectativa, confiando que essa questão possa ser resolvida de uma vez por todas, não só para o povo Laklãnõ-Xokleng, mas para todos os povos de todo o Brasil. O marco temporal é uma lei genocida. Pedimos que o STF veja o lado dos povos indígenas”, afirma o cacique-geral do povo Xokleng, Nilton Ndili.

Quinto adiamento em dois meses

Em dois meses, a análise do caso foi adiada cinco vezes. No dia 11 de junho, o julgamento chegou a iniciar em plenário virtual, mas foi suspenso por um pedido de “destaque” do ministro Alexandre de Moraes, um minuto após começar. O julgamento foi remarcado para o dia 30 de junho, mas os ministros e ministras não chegaram a iniciar por falta de tempo e adiaram para o dia 31. Ainda naquela semana, a análise do caso foi remarcada pelo presidente da Corte, o ministro Luiz Fux, que incluiu o julgamento sobre demarcações de terras indígenas na pauta do dia 25 de agosto.