Retomada Maxakali ocupa terra para construir a Aldeia Escola Floresta

Retomada Maxakali ocupa terra para construir a Aldeia Escola Floresta

Povo Maxakali faz retomada em Teófilo Otoni (MG) para construir sua Aldeia Escola Floresta – Yãy Hã Mĩy. A terra pública do Estado de Minas estava cedida para construção de um campus do Instituto Federal do Norte de Minas, mas seguia abandonada. A retomada está ligada a uma luta por acesso à água e às condições de sobrevivência da forma de vida do povo.


Quem são os Tikmũ’ũn

Os povos Tikmũ’ũn, conhecidos como Maxakali são tradicionais ocupantes da Mata Altântica. Falam a língua Maxakali, uma língua muito rica e complexa que sobreviveu à grande pressão cultural e linguística que sofreram os povos destas regiões do Brasil. Através dos seus cantos, guardam toda a sabedoria de grandes conhecedores da biodiversidade da Mata. Formam hoje uma população de quase 3 mil pessoas, vivendo em aldeias em Santa Helena de Minas, Bertópolis, Ladainha e Teófilo Otoni. Os Tikmũ’ũn sobreviveram a vários massacres, expulsões e desafios, e seguem resistindo às dificuldades de se concentrarem em territórios reduzidos e degradados, sem acesso a água limpa. Hoje, a cultura Maxakali vem recebendo reconhecimento em todo o mundo, através do cinema, das fotografias e das artes plásticas, sendo exibidos em festivais e galerias internacionais.

Indígenas Maxakali caminhando para a nova terra.

A retomada

Na madrugada do dia 28 de setembro de 2021 uma comunidade de quase 400 pessoas chegou numa região conhecida como Itamunheque, fizeram uma retomada em uma terra onde projeta construir a sonhada ALDEIA ESCOLA FLORESTA. Trata-se de um projeto de reflorestamento, agroecologia, paz e prosperidade, onde querem, com os ensinamentos e a força de sua espiritualidade – os Yãmĩyxop – reencontrar o equilíbrio de suas vidas com as águas, os animais e a floresta. Desde o início da pandemia, esta comunidade deixou a Aldeia Verde em Ladainha em busca de um território onde suas crianças pudessem ter acesso a um rio, onde pudessem renovar seus rituais, plantar e construir suas escolas. Passaram por uma terra que se encontrava a cerca de 4 km da Usina Engenheiro Wenefredo Portela que apresentava problemas estruturais ocasionando riscos de rompimento. Em seguida, ludibriados por estelionatários, se instalaram em uma fazenda próxima do Distrito de Concórdia, que denominaram Aldeia Hãm Kaĩm. Desde então, as lideranças da aldeia vêm falando sobre suas lutas em todos os espaços: na Bienal de Arte em SP, nos festivais, nas mesas-redondas, nas universidades. A luta desta comunidade é a luta de todo o povo Tikmũ’ũn que deveria receber do estado brasileiro e de todos os cidadãos um grande reconhecimento e é a luta de todos aqueles que acreditam na necessidade de vivermos em um planeta biodiverso, com o frescor das matas e a riqueza das águas limpas. É a luta pela autonomia dos povos. É a luta daqueles que acreditam que é possível produzir sem derrubar matas e destruir mais vidas.

Lideranças Maxakali e militantes do MST juntos em uma reunião antes da retomada em Teófilo Otoni.

Aliança indígena e campesina

Nos últimos dias, sob a liderança de Isael e Sueli Maxakali, a comunidade Tikmũ’ũn visitou um Assentamento Mãe Esperança do MST, que são vizinhos da nova terra, para dialogar sobre a necessidade da luta pela terra e aliança para que exista prosperidade e paz entre a gente que é vítima dos latifúndios. As lideranças do MST local apoiaram a retomada e vemos aqui a semente de aliança indígena e campesina que nossos ancestrais lançaram ao chão.

Desafios e solidariedade

O principal desafio da comunidade agora é assegurar a água para a comunidade. O rio está poluído e há poucos acessos à água potável. Será preciso também de alimentos pois começarão agora o plantio para terem autonomia desde a terra. Assim convocamos a solidariedade de quem apoia a luta por terra e território, quem defendo os direitos dos povos originários, para que ajude através de doação de comida e água se estiverem na região de Teófilo Otoni ou de recursos para quem estiver longe.

Viva a Aldeia Escola Floresta, vivam os Tikmũ’ũn!


Apoie a luta Maxakali

Isael Maxakali
Banco do Brasil
Ag: 2232-2
Cc: 9277-0

PIX: (33)999537302
CPF:060.387.546-79

Organizações denunciam “ataque físico e institucional” contra povos indígenas, na ONU

Organizações denunciam “ataque físico e institucional” contra povos indígenas, na ONU

Representante indígena alertou países sobre projetos de legalização de grilagem em terras públicas, exploração predatória e fim da demarcação de territórios
Nesta quarta-feira (29), organizações da sociedade civil denunciaram na ONU uma política de desmonte ambiental, em curso no Brasil. Quatro entidades brasileiras alertaram a comunidade internacional sobre uma série de projetos de lei que atualmente tramitam no Congresso Nacional e visam a enfraquecer ainda mais os mecanismos de proteção ao meio ambiente e aos povos indígenas.

Sob ataques e grave violação de direitos humanos e socioambientais, a denúncia retrata um Brasil diferente daquele descrito no discurso do presidente Jair Bolsonaro, na abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas.

“Novamente os povos indígenas do Brasil chamam a atenção para a grave situação dos direitos humanos e socioambientais que enfrentamos. Conforme apontado pela Alta Comissária Michelle Bachelet, os povos indígenas estão sob ataque físico e institucional no Brasil”, destacam.

Entre os projetos apontados pelas organizações estão o PL da Grilagem, o PL 490, que dificulta a demarcação de terras indígenas,e o projeto de flexibilização do licenciamento ambiental.

A denúncia foi feita durante o Diálogo interativo com o Relator Especial sobre os direitos dos povos indígenas, no Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra (Suíça). Assinam o documento as organizações APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), Conectas Direitos Humanos, ISA (Instituto Socioambiental) e Observatório do Clima. A representante indígena e advogada da APIB, Samara Pataxó, foi a porta-voz do grupo nas Nações Unidas.

“Todos esses projetos de lei agravam a violência no campo, principalmente na Amazônia, e incentivam o desmatamento, em meio a uma crise climática”, alertam as organizações, relembrando o discurso do secretário geral António Guterres. “Além disso, eles tramitam sem consulta e consentimento livre, prévio e informado, sem amplo debate com a sociedade e sem a participação da comunidade científica, e servindo de interesse de grupos ruralistas”, explicam.

Projetos no Congresso
A denúncia se refere a cinco projetos em tramitação no Congresso Nacional. No Senado Federal, estão o PL da Lei Geral de Licenciamento Ambiental (2159/2021) e o PL da Grilagem, também chamado pelas organizações de “PL de roubo das terras públicas” (PL 2633/2020). Na Câmara, estão o PL 490/2007, que institui o fim da demarcação de terras indígenas e permite atividades predatórias nestes territórios, e o projeto que permite a mineração em Terra Indígena (PL 191/2020), de autoria do Executivo. Há também o PDL (Projeto de Decreto Legislativo) nº 177/2021, que pretende autorizar o Presidente a retirar o Brasil da Convenção 169 da OIT. Caso seja aprovado, o PDL desobriga o Brasil ao cumprimento de um dos principais marcos internacionais de proteção dos direitos dos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais.

As entidades pedem que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e o presidente da Câmara, Arthur Lira, impeçam o avanço das propostas e “atuem para proteger o clima, o meio ambiente e a garantia de direitos dos povos indígenas e comunidades tradicionais no Brasil”.

Confira a íntegra da denúncia no Conselho de Direitos Humanos da ONU:

APOINME entra com representação no MPF por crimes cometidos contra o povo Maxakali em Minas Gerais

APOINME entra com representação no MPF por crimes cometidos contra o povo Maxakali em Minas Gerais

Nessa segunda-feira (27), a Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo ( APOINME) entrou com representação no Ministério Público Federal (MPF) devido às agressões e possivelmente estelionatos praticados contra o povo Maxakali, no município de Santa Helena em Minas Gerais.  

Os indígenas Maxakali estão sendo extorquidos por falsos comerciantes, que tomam os cartões do programa social ‘Bolsa Família’ e os obrigam a comprar em seu comércio. Os Indígenas que tentam denunciar essas práticas são ameaçados ou sofrem violência física, como aconteceu no último dia 22/09/2021 quando dois indígenas foram brutalmente espancados em praça pública em Santa Helena de Minas. As agressões são feitas à luz do dia e no centro da cidade justamente para passar um recado para os demais indígenas. As agressões são tão rotineiras que os moradores locais estão realizando as denúncias. Veja-se o seguinte depoimento de um morador:

 “Eles colocam mercadinhos de fachada que só abrem para tomar os cartões dos índios e deixá-los com fome. Vocês precisam ver a quantidade de índios com os cartões presos nas mãos deles. Como tomam os cartões, os índios só compram lá, [em locais] que só abrem em determinado período do mês, quando os índios vêm das aldeias “receber‟ e comprar comida. Não recebem praticamente nada e quando cobram são espancados para servir de exemplo”.

Ainda segundo o denunciante os indígenas ficam receosos de denunciar os agressores porque eles são contumazes nessa prática há anos e nunca ficaram presos, pelo que a denúncia via imprensa é uma tentativa de sanar o problema. “Isso não pode acontecer. Faz dó o que esses pobres coitados estão passando nas mãos desses vândalos. Alguém precisa tomar uma providência“, relatou o denunciante no jornal da região. 

Os problemas não são recentes, o povo Maxakali vem sofrendo essas agressões tanto físicas quanto psicológicas há vários anos, de modo que a situação ficou tão corriqueira que os acusados praticam esses arbitrariedades abertamente à luz do dia, no que acarreta em depressão entre os indígenas e conflitos internos. 

A Apoinme pede com urgência para os fatos serem investigados pelo Ministério Público Federal e que tais agressores e supostos estelionatários sejam punidos exemplarmente de forma que tais práticas de extorsão e agressão contra o povo Maxakali sejam extintas. 

 

Marcelo Xavier, presidente da Funai, vira réu por descumprir decisões da Justiça Federal

Marcelo Xavier, presidente da Funai, vira réu por descumprir decisões da Justiça Federal

Ação por improbidade administrativa foi ajuizada pelo MPF por atraso em demarcação

A Justiça Federal em Santarém (PA) tornou réu o presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Marcelo Xavier, em processo em que o Ministério Público Federal o acusa de improbidade administrativa por desobedecer a várias decisões em um acordo judicial em que a autarquia se comprometeu a avançar na demarcação do território indígena Munduruku do planalto santareno.

No total, o presidente da Funai descumpriu seis decisões da Justiça Federal, o que configura ato de improbidade administrativa por retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, atentando contra os princípios da administração pública. A ação do MPF foi iniciada em março, mas só nesta semana o processo foi recebido pelo juízo, o que transforma Marcelo Xavier em réu.

Agora, o processo por improbidade segue o trâmite normal com a produção de provas pelas partes. Para a Justiça, há indícios contundentes da possível prática de improbidade administrativa porque o acusado não só descumpriu as decisões judiciais como também deixou de se manifestar quando instado pelo juiz que fiscalizava o acordo entre a Funai e o MPF.

“Além de ter havido o descumprimento direto do acordo, as decisões judiciais que instaram a manifestação do requerido também foram descumpridas sem justificativa razoável”, diz a decisão que recebeu a ação de improbidade.

Multas já aplicadas – O presidente da Funai já foi multado, dentro do acordo judicial, em valores que, atualmente, ultrapassam R$ 270 mil. A multa é contada por dia de atraso no cumprimento das decisões e deve aumentar. Mas, com o processo de improbidade, ele ficará também sujeito às penas previstas na lei de improbidade administrativa: perda dos direitos políticos, proibição de contratar com o poder público e multa.

As decisões que Marcelo Xavier deixou de obedecer, enquanto presidente da Funai, ordenavam medidas burocráticas para a realização da segunda etapa do trabalho de campo do grupo técnico que confeccionava o Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação da terra indígena Munduruku do planalto santareno. As ordens foram dirigidas tanto à fundação quanto ao seu presidente, pessoalmente.

Informações técnicas reunidas pelo MPF mostram que havia disponibilidade orçamentária e todas as condições materiais para que fosse realizado o trabalho de campo. “Frise-se, a propósito, que o cumprimento das ordens judiciais não demanda dispêndio significativo de recursos (apenas para o pagamento de diárias, passagens e suprimentos aos quatro membros do Grupo Técnico, durante o período do trabalho de campo), tampouco envolve grande complexidade administrativa”, disse o MPF na ação de improbidade.

Processo nº 1001898-62.2021.4.01.3902 – 1ª Vara da Justiça Federal em Santarém (PA)

Lideranças indígenas protocolam carta ao ministro do STF Alexandre de Moraes

Lideranças indígenas protocolam carta ao ministro do STF Alexandre de Moraes

Na tarde desta quinta-feira (16), 150 lideranças de 13 povos protocolaram uma carta de pedido de urgência ao Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes acerca do julgamento que decidirá os rumos das demarcações das terras indígenas no país. O julgamento adiado na tarde de ontem (15), depois do voto a favor do Marco Temporal pelo ministro Nunes Marques, indicado por Bolsonaro para a corte, teve pedido de vista por Alexandre de Moraes. 

Na carta os indígenas pedem que o ministro devolva com rapidez o voto de vista para a continuidade e finalização do julgamento do Recurso Extraordinário de número 1017365. 

“Mantemos plena confiança e apoio ao STF neste contexto de grandes ataques que têm sido desferidos contra a mais alta corte de nosso país. Ao mesmo tempo, a postergação para a finalização deste emblemático julgamento faz aumentar sobremaneira a expectativa nossa e de todos os povos indígenas do Brasil quanto a uma decisão favorável do Supremo aos nossos direitos constitucionais e fundamentais”, diz a carta.  

Sabendo que a data de retorno do julgamento é incerta, após devolvido por Alexandre de Moraes, o processo precisa ser recolocado na pauta pelo presidente da Corte, Luiz Fux. O regimento interno do STF estabelece um prazo de 30 dias para a devolução do processo sob vista, prorrogável por mais 30. A Corte, contudo, não prevê sanções em caso de descumprimento do prazo e é comum que ele seja estendido para além desse período.

Quando for reiniciado, o julgamento deve retornar com o voto de Moraes, que será seguido pelos outros oito ministros e ministras, do mais novo na Corte ao decano, Gilmar Mendes. O último a votar é o presidente do STF, Luiz Fux.

LEIA A CARTA COMPLETA: 

Ao Excelentíssimo Senhor Ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes

 Assunto: RE 1017365

Pedido de vista

 Senhor Ministro, nós dos Povo Xokleng, Kaingang, Guarani, Tuxá, Xavante, Xucurú, Tupi Guarani, Pataxó, Guajajara, Terena, Krikati estamos em Brasília desde o dia 20 de agosto para acompanhar o julgamento do Recurso Extraordinário nº 1017365, que conta com repercussão geral nesta Suprema Corte. Hoje somos cerca de 150 lideranças ainda em Brasília, mas nestes dias mais de 10 mil representantes de  outros 170 povos, aproximadamente, também estiveram em Brasília pelo mesmo motivo.  Também estivemos acampados entre os dias 08 a 30 de junho aqui em Brasília em função desse fundamental julgamento, bem como para pedir que o PL 490/2007 não fosse aprovado na Câmara do Deputados.

O PL 490/2007 tem como objeto a institucionalização da tese do marco temporal e a reforma do Decreto 1775/1996, profundamente debatido e aprovado no governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Pedimos aos parlamentares que esse projeto não seja aprovado, dado que, ao nosso ver, é inconstitucional e afronta o direito de demarcação de nossas terras de ocupação tradicional.

Daí que o RE 1017365 (Tema 1031) teve o julgamento iniciado no dia 26 de agosto do corrente ano, com ampla participação da sociedade. O Ministro Relator, Edson Fachin, apresentou voto no sentido de que a Constituição não limitou no tempo o direito territorial indígena, nem que se poderia onerar os povos indígenas a comprovarem disputa pela posse na data de 05 de outubro de 1988, garantindo que o esbulho é inadmissível e que os crimes cometidos para nos expulsar das nossas terras não podem ser anistiados, legalizados pela tese do marco temporal, além de garantir a obrigação da União em demarcar e fazer proteger.

O segundo voto foi apresentado, quando Sua Excelência pediu vistas. Contudo, o Ministro Nunes Marques trouxe um voto divergente, no qual confere ao texto da Constituição o marco temporal, associado ao renitente esbulho, onerando os grupos étnicos a comprovarem a posse ou disputa pela posse da terra em 05 de outubro de 1988, além de impedir reestudo para redefinição de terras indígenas já demarcadas.

Além de todo o voto trazer, ao nosso ver, uma intepretação conflitante com o art. 231 da Carta de 1988, impedindo a demarcação de terras ainda não regularizadas, determina que decaiu o direito da União em demarcar as terras indígenas, já que tinha o prazo de 05 anos a partir da promulgação da Constituição para fazê-lo, desconsiderando o caráter imprescritível do nosso direito territorial.

Por fim, o Ministro Nunes Marques entende que é necessário “anistiar oficialmente esbulhos ancestrais”. Ou seja, toda violência ocorrida até 1988, período recente da nossa história, estaria de ora em diante legalizada. E veja que as violências são de castigo físico e psicológico, assassinatos, prisões sem motivação, trabalho escravo, crimes de genocídio, dinamite e estricnina jogadas de avião nas comunidades indígenas, tudo isso sob o jugo do regime tutelar e de exceção, como se constara do Relatório Figueiredo e o Relatório da Comissão Nacional da Verdade – CNV, e até casos de crucificação de indígenas. Ao fazer isso, na prática o voto do Eminente Ministro Numes Marques premia o amplo espectro de crimes praticados contra os povos para esbulhar nossas terras e, assim, incentiva que os mesmos crimes sejam repetidos contra nós e nossas terras.  

Nesse sentido, vimos com muito respeito até Sua Excelência pedir encarecidamente que possa fazer valer a vontade do constituinte de 1988, que era justamente o de reparar os crimes até aquela data cometidos e garantir o futuro das demarcações de terras indígenas, impedindo a dispersão dos povos e a perda de muitas culturas, de línguas, crenças e tradições dos povos originários, para impedir um prejuízo irreparável.

Pedimos, que afaste a tese do marco temporal e do renitente esbulho e não permita a legalização de toda sorte de crimes cometidos até 1988 com o objeto de esbulhar nossas ricas terras de ocupação tradicional e determine que a União, por estar em mora, se obrigue a cumprir o acordo feito em 1988, no qual os povos indígenas foram contemplados com o direito à demarcação de suas terras, como meio de reparação e de justiça.

Pedimos, por fim que possa devolver com brevidade o voto vista para a continuidade e finalização deste julgamento. Mantemos plena confiança e apoio ao STF neste contexto de grandes ataques que tem sido desferidos contra a mais alta corte de nosso país. Ao mesmo tempo, a postergação para a finalização deste emblemático julgamento faz aumentar sobremaneira a expectativa nossa e de todos os povos indígenas do Brasil quanto a uma decisão favorável do Supremo aos nossos direitos constitucionais e fundamentais.

 Com o devido respeito de sempre.

 Brasília-DF, 16 de setembro de 2021.

 

Julgamento no STF suspenso: após Nunes Marques votar por anistiar invasões de terras indígenas no passado, Moraes pede vista

Julgamento no STF suspenso: após Nunes Marques votar por anistiar invasões de terras indígenas no passado, Moraes pede vista

Foto: Matheus Alves/Inedita Brasil

Indicado por Jair Bolsonaro, Nunes Marques abriu divergência com voto do relator, Edson Fachin, que reafirmou o caráter originário dos direitos constitucionais indígenas

Repetindo argumentos dos setores mais retrógrados do agronegócio, nesta quarta-feira (15), o ministro Kássio Nunes Marques apresentou seu voto a favor da tese do marco temporal para as demarcações de terras indígenas. Logo após o voto de Nunes Marques, o ministro Alexandre de Moraes pediu vista e o julgamento foi suspenso, sem data prevista para retorno.

Com seu voto, o ministro Nunes Marques abriu uma divergência em relação ao voto do relator do processo, o ministro Edson Fachin, favorável aos direitos constitucionais indígenas e contrário à tese do marco temporal. A necessidade de analisar melhor as posições apresentadas foi a justificativa dada pelo ministro Alexandre de Moraes para pedir vista, interrompendo o julgamento empatado em um a um.

O voto de Nunes Marques foi apresentado na continuação do julgamento do Recurso Extraordinário 1.017.365, processo que envolve um pedido de reintegração de posse movido pelo Instituto do Meio Ambiente (IMA) de Santa Catarina, contra a comunidade Xokleng da Terra Indígena (TI) Ibirama-Lã Klãnõ, também habitada por comunidades guarani e kaingang. O caso ganhou status de repercussão geral no Supremo e terá efeitos para as demarcações de terras indígenas de todo o país.

No caso específico dos Xokleng, Nunes Marques votou pelo desprovimento do recurso, ou seja, votou pela anulação da demarcação da terra indígena e a favor da reintegração de posse movida pelo órgão ambiental do estado de Santa Catarina. O argumento de Marques é de que as comunidades não ocupavam as áreas reivindicadas em 1988. Embora anteriormente em seu voto tenha reconhecido que os Xokleng tiveram suas terras esbulhadas, demonstrando ser contraditório seu argumento.

Em seu voto, Nunes Marques apresentou tese a favor do marco temporal como forma de conciliar interesses. A tese, no entanto, é defendida pelos setores mais retrógrados do agronegócio e rechaçada por comunidades indígenas e suas organizações em todo o país.

Segundo a interpretação, os direitos territoriais dos povos indígenas estariam restritos àquelas áreas que estivessem em sua posse ou disputadas judicialmente até 5 de outubro de 1988, ignorando, e ao mesmo tempo legitimando, o histórico de expulsões e violências sofridas pelos povos indígenas antes da data.

Nunes Marques reconheceu que a tese significaria anistiar esbulhos ocorridos antes da data de promulgação da Constituição Federal. 

“A teoria do fato indígena, que embasa o posicionamento do STF no caso já referido [caso da Terra Indígena Raposa Serra do Sol], é a que melhor concilia os interesses em jogo na questão indígena. Por um lado, admite-se que os índios remanescentes em 1988 e suas gerações posteriores têm direito à posse de suas terras tradicionais, para que possam desenvolver livremente seu modo de vida. Por outro, procura-se anistiar oficialmente esbulhos ancestrais, ocorridos em épocas distantes, e já acomodados pelo tempo e pela própria dinâmica histórica”, declarou.

Seguindo o mesmo roteiro de setores ruralistas e do agronegócio, o voto de Nunes Marques repetiu as condicionantes utilizadas na votação do caso da Terra Indígenas Raposa Serra do Sol. A decisão do STF de uma década atrás estabeleceu 19 condicionantes, mas sem efeitos para as demarcações de outras Terras Indígenas. 

“Os argumentos do Nunes Marques não inovaram em nada, foi um voto que não nos surpreendeu. Ele trouxe basicamente os argumentos que os ruralistas defendem. Ele desconsidera o indigenato, traz o indigenato como um instituto defasado, que traz insegurança jurídica, e defende a tese do marco temporal”, avalia a advogada Samara Pataxó, da assessoria jurídica da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). 

Além do marco temporal, Nunes Marques votou por vedar a ampliação de terras indígenas, o que restringe os direitos territoriais das comunidades que tiveram suas terras demarcadas fora dos parâmetros estabelecidos pela Constituição de 1988. 

No sentido contrário do que apontam todos os estudos sobre a preservação das florestas nos territórios indígenas, o ministro considerou ainda a incompatibilidade das demarcações de terras sobrepostas com áreas de preservação, considerando que deve prevalecer a administração dos parques e unidades de conservação sobre as terras indígenas.

“Ouvindo o voto do ministro Nunes Marques, não vi nada de novo. Vi apenas um ministro repetindo os velhos argumentos dos ruralistas. Pareceu-me um copia e cola, das petições dos fazendeiros. Nunes Marques conhece que o direito indígena é imprescritível, mas aplica o marco temporal, anistiando os crimes perpetrados contra os povos indígenas. Voto Teratológico!”, comenta o coordenador jurídico da Apib, Eloy Terena.

Povo Xokleng

No mérito, o processo trata de um recurso extraordinário, originalmente impetrado pela Funai, contra a ação de reintegração de posse que o IMA moveu contra o povo Xokleng. A disputa envolve a reserva ambiental do Sassafrás, criada pelo estado de Santa Catarina sobre uma parte da TI Ibirama-La Klãnõ, já reconhecida e declarada como terra tradicionalmente ocupada pelo povo Xokleng.

O voto de Fachin, além de afastar a tese do marco temporal, dá provimento ao recurso em favor do povo Xokleng – ou seja, reconhece o seu direito à posse e à demarcação da sua terra de ocupação tradicional, invadida e reduzida pelo estado ao longo do século XX.

Apesar de iniciar seu voto com um longo histórico que recupera a cronologia do esbulho e da brutal violência praticada contra os Xokleng, Nunes Marques votou pela anulação da demarcação da terra indígena.

“O ministro Nunes Marques votou por anular a demarcação com base no argumento de que os Xokleng não ocupavam a área em 5 de outubro de 1988, defendendo que os indígenas devem ser retirados da área. Foi um voto completamente equivocado, que não se baseia na vontade do constituinte de 1988”, avalia Rafael Modesto dos Santos, assessor jurídico do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e advogado do povo Xokleng no processo.

Próximos passos

A data de retorno do julgamento é incerta. Depois de devolvido por Alexandre de Moraes, o processo precisa ser recolocado na pauta pelo presidente da Corte, Luiz Fux. O regimento interno do STF estabelece um prazo de 30 dias para a devolução do processo sob vista, prorrogável por mais 30. A Corte, contudo, não prevê sanções em caso de descumprimento do prazo, e é comum que ele seja estendido para além desse período.

Quando for reiniciado, o julgamento deve retornar com o voto de Moraes, que será seguido pelos outros oito ministros e ministras, do mais novo na Corte ao decano, Gilmar Mendes. O último a votar é o presidente do STF, Luiz Fux.

“Quem deu a terra para nós foi deus, não o homem. Estamos há 500 anos lutando e vamos seguir lutando. Nossa luta não é só para o povo Xokleng, é para todos os povos indígenas, para a sociedade brasileira e para o mundo”, afirma Brasílio Priprá, liderança do povo Xokleng.

Na tarde desta quarta-feira (15), cerca de 150 lideranças indígenas acompanharam a sessão em frente ao STF, na Praça dos Três Poderes, em Brasília. Após a interrupção do julgamento, prometeram dar continuidade à mobilização, que já dura quatro semanas e reuniu mais de 6 mil indígenas na capital federal, além das diversas manifestações realizadas nos territórios e em todas as regiões do país.

“É um processo doloroso, cansativo, mas assim como a gente acredita em Topé, Nhanderu, temos que continuar acreditando que dali do Supremo saiam os votos necessários para garantir nossos direitos”, afirma Kretã Kaingang, que integra a coordenação da Apib.

 

STF dá sequência ao julgamento sobre o marco temporal nesta quarta, 15

STF dá sequência ao julgamento sobre o marco temporal nesta quarta, 15

Foto: Rafael Vilela

Por Assessoria de Comunicação da MNI 

O julgamento que definirá o futuro das demarcações das terras indígenas em todo país será retomado, nesta quarta-feira, 15, pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A sessão está prevista para iniciar às 14h, horário de Brasília. Esta será a sexta sessão seguida em que a Corte debate o tema, desde que a análise do caso começou, em 26/8. Os povos indígenas seguem mobilizados e acompanham o julgamento a partir de Brasília e dos territórios. 

Na última sessão, no dia 9 de setembro, o ministro relator do processo, Edson Fachin, rechaçou a tese do marco temporal e reafirmou o caráter fundamental dos direitos constitucionais indígenas, que ele caracterizou como cláusulas pétreas.  O ministro também foi enfático ao afirmar que a Constituição Federal reconhece que o direito dos povos indígenas sobre suas terras de ocupação tradicional é um direito originário, ou seja, anterior à própria formação do Estado. O voto de Fachin foi considerado uma vitória para os povos indígenas. 

Defendida por ruralistas e outros setores interessados na exploração das terras indígenas, a tese do marco temporal restringe o direito dos povos indígenas à demarcação de suas terras. Segundo esta interpretação, considerada inconstitucional, os povos indígenas só teriam direito à demarcação das terras que estivessem em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. 

Ainda no dia 9, o ministro Nunes Marques deu início à leitura de seu voto, mas antes de entrar no mérito da questão pediu para o presidente Luiz Fux que seu voto fosse concluído na próxima sessão. 

Na sessão prevista para esta quarta, “o ministro Nunes Marques vai entrar no mérito do seu voto, no qual ele pode concordar com o voto do relator, o que seria muito positivo para os direitos territoriais dos povos indígenas, mas pode também divergir, no todo ou em parte, do voto do ministro relator”, explica Samara Pataxó, coordenadora jurídica da Articulação dos povos indígenas do Brasil (Apib).

Depois de Nunes Marques, os outros oito ministros devem apresentar seus votos. Eles ainda podem solicitar uma nova suspensão do processo para analisá-lo melhor, o chamado pedido de “vistas”. A previsão é que os votos sejam proferidos do ministro mais novo ao decano da Corte. O último a votar deve ser o presidente do STF, ministro Luiz Fux.

Na prática, a Corte analisa a reintegração de posse movida pelo Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA) contra o povo Xokleng, referente à Terra Indígena Ibirama-Laklãnõ, onde também vivem os povos Guarani e Kaingang. Em 2019, o caso ganhou  status de “repercussão geral”, o que significa que a decisão servirá de diretriz para a gestão federal e todas as instâncias da Justiça no que diz respeito aos procedimentos demarcatórios.

Saiba mais sobre o julgamento aqui.

Mobilização permanente 

Em defesa de seus direitos originários e contra o marco temporal, os povos indígenas têm se mantido em mobilização permanente para acompanhar o julgamento da Corte.

Nesta quarta, 15, a partir das 14h, cerca de 150 lideranças indígenas dos povos Kaingang, Xokleng, Xavante, Terena, Guarani, Tupi Guarani, Tuxá e Guarani Nhandeva irão acompanhar o julgamento em vigília na praça dos Três Poderes em Brasília, dando sequência às mobilizações organizadas em todos os territórios. 

De  22 a 28 de agosto, semana em que a Suprema Corte deu início ao julgamento,  mais de 6 mil indígenas de 176 povos de todas as regiões do país estiveram reunidos no acampamento “Luta pela Vida”, em Brasília. Considerada a maior mobilização indígena dos últimos 30 anos, além de acompanhar o julgamento no STF, o objetivo também  foi de denunciar a agenda anti-indígena do governo Bolsonaro e do Congresso Nacional.

Como o julgamento foi prolongado, um grupo de 1.200 lideranças, de 150 povos, permaneceu mobilizado em Brasília e o acampamento foi montado no espaço da Fundação Nacional de Artes (Funarte). O grupo se juntou à II Marcha Nacional das Mulheres Indígenas, que reuniu mais de 5 mil guerreiras da ancestralidade, de 185 povos de todos os biomas, entre 7 e 11 de setembro, em Brasília. 

Nota Oficial de Esclarecimento

Nota Oficial de Esclarecimento

A FEPIPA, em nome do povo Tembé-Tenetehar da Terra Indígena Alto Rio Guamá (TIARG), vem através desta nota esclarecer os fatos ocorridos na noite do dia 13/09/21, dentro da Terra Indígena, envolvendo não-indígenas.
Por volta das 19h, um grupo de 30 guerreiros Tembé, que fazem o papel de proteção do território, receberam informações de invasão de madeireiros e adentraram a floresta fechada, no interior da TIARG, a 12 km da Vila do Cristal, no município de Vizeu, às margens do rio Piriá, em busca de vestígios.
Os guerreiros encontraram várias toras de madeira dentro da reserva, além de um trator e um caminhão, que foram queimados.
Neste momento, os indígenas distinguiram pelo som do motor que um barco se aproximava. Enquanto abordavam o barco, perceberam que o condutor portava uma espingarda. Os indígenas pediram que ele baixasse a arma. Houve uma pequena confusão e, no calor e na escuridão da situação, uma mulher, que acompanhava o condutor, foi atingida chegando à óbito no local.
O povo Tembé esclarece que a TIARG, devidamente homologada e demarcada, vem sofrendo invasões há décadas. Por todos esses anos, a luta do povo Tembé foi, fundamentalmente, uma briga para manter seu território longe de invasões sustentadas pelo próprio Governo do Brasil.
Desde junho, a FUNAI estabeleceu um grupo de trabalho com o objetivo de implementar o Plano Operacional de Extrusão da Terra Indígena Alto Rio Guamá. Mas, até quando precisaremos estar nestas frentes de guerrilha? Até quando nós vamos sofrer invasões e ameaças? Quando as autoridades vão cumprir o seu papel e seu dever constitucional?
O povo Tembé-Tenetehara vem buscando por conta própria alternativas de proteção de seu território e de suas vidas.
Para os não indígenas, a definição de território é bastante diferente da concepção dos povos indígenas. Para os Tembé-Tenetehara, como para qualquer indígena, a terra está constantemente em produção por conta própria, é a terra que dá vida a eles e não o contrário. O papel das populações indígenas dentro das Terras é protegê-las e sustentar o seu papel vital.
Sabemos a importância da vida, por isso sentimos muito pelo ocorrido! E esperamos que os poderes públicos, das esferas federal, estadual e municipal, cumpram o seu papel e estejam de perto acompanhando e tocando esta situação de forma justa.

14/09/2021

Reflorestarmentes de sonhos, afetos, soma, solidariedade, ancestralidade, coletividade e história.

Reflorestarmentes de sonhos, afetos, soma, solidariedade, ancestralidade, coletividade e história.

As mulheres indígenas do Brasil, reunidas e mobilizadas por meio da Articulação Nacional de Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade – ANMIGA, apresentam ao mundo o Reflorestarmentes. Trata-se de um grande chamamento que fazemos à humanidade, na tentativa de proporcionar a todos os povos do mundo uma nova forma possível de nos relacionarmos com a Mãe Terra, e também entre nós, seres que nela vivemos.

É necessário e urgente nos reconectarmos com a Mãe Terra, pois essa é a única forma de mantermos nossos corpos vivos – e é essencialmente sobre a vida e o bem-viver que falamos quando colocamos o movimento Reflorestarmentes ao conhecimento e ao acesso de todas e todos.

Fazemos isso diante da sobreposição sem precedentes de emergências que vivemos nos tempos de hoje. Em todos os países do planeta, os impactos da crise climática e ambiental associados aos efeitos da maior pandemia da história geram montantes assombrosos de mortos e novas hordas de excluídos e flagelados. A fome, o desemprego, o racismo, a LGBTFOBIA, o machismo colocam milhões de pessoas em uma situação de vulnerabilidade extrema e esgotam seus recursos para se protegerem. Estes são resultados de um projeto exploratório insustentável, que empurra todo o mundo a um ponto de não-retorno, comprometendo a própria continuidade de nossa existência no planeta Terra. Este caminho de morte e destruição: este caminho não queremos e nem podemos trilhar.

Precisamos construir juntos um trajeto de vida e reconstrução, que se baseie no encontro entre os povos, no cuidado com nossa Terra, na interação positiva de saberes. É isso que propomos com o Reflorestarmentes. É possível vivermos e convivermos de outra forma, com outras epistemes, a partir de cosmologias ancestrais. Cuidar da Mãe Terra é, no fundo, cuidar de nossos próprios corpos e espíritos. Corpo é terra, floresta é mente. Queremos reflorestar as mentes para que elas se somem para prover os cuidados tão necessários com nosso corpo-terra.

A Plataforma Reflorestarmentes organiza os conhecimentos e tecnologias ancestrais desenvolvidos e preservados por nós, mulheres indígenas, e os coloca à disposição de todas e todos que compartilham conosco a preocupação com nossas vidas, com nossa terra, com nosso futuro.

Vamos juntas construir o bem-viver e viver bem para todos!
Vamos juntas reflorestar mentes para curar nossa terra!

ANMIGA – ARTICULAÇÃO DAS MULHERES INDÍGENAS GUERREIRAS DA ANCESTRALIDADE

A mãe do Brasil é indígena: 5 mil guerreiras da ancestralidade ocupam Brasília em marcha histórica

A mãe do Brasil é indígena: 5 mil guerreiras da ancestralidade ocupam Brasília em marcha histórica

foto: Alass Derivas | @derivajornalismo

Em defesa de seus corpos-territórios, mulheres indígenas de todo país manifestaram-se hoje (10/9) pelas ruas da capital federal

Brasília acordou hoje (10/9) ao som dos cantos e maracás de mais de 5 mil mulheres indígenas, pertencentes a 185 povos, que se preparavam para marchar pelas ruas da capital. Em defesa de seus corpos-territórios e pelo fim do genocídio dos povos indígenas, a II Marcha Nacional das Mulheres Indígenas trouxe a força das mulheres guerreiras da ancestralidade na luta pela vida.

A marcha saiu do acampamento localizado na Funarte, seguindo pelo Eixo Monumental e pela via W3 Sul em direção à Praça do Compromisso, local onde, em 1997, o indígena Galdino Pataxó Hã-Hã-Hãe teve o seu corpo incendiado por 5 jovens que residiam no Plano Piloto.

Durante a marcha, diversas faixas e cartazes trouxeram palavras de ordem contra a violência de gênero, contra o marco temporal, contra a invasão do garimpo, agronegócio e grandes empreendimentos que provocam a destruição socioambiental dos biomas e pela demarcação de seus territórios.

Na praça do Compromisso, um grande boneco com a imagem de Jair Bolsonaro foi queimado. “Juntos queimam o racismo, a violência contra as mulheres e para que nunca mais um indígena seja queimado vivo nesse país”, disse Sônia Guajajara, liderança indígena da Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga) e coordenadora da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB).

Para Alessandra Munduruku, liderança indígena do rio Tapajós, “estar nessa marcha é muito importante para as mulheres estarem juntas. Nossas comunidade/aldeias estão sendo atacadas, nossos povos estão sendo atacados e tudo isso está sendo aprovado aqui no Congresso e a gente precisa sair das nossas aldeias para denunciar aqui. Já chega de genocídio, já chega de morte, já chega de violência, de invasões, esses projetos de morte estão afetando nossas vidas, está afetando as mulheres, as crianças, os idosos, nossos territórios”.

O ato aconteceu de maneira pacífica, após uma semana de tensões provocadas por atos e ameaças racistas vindos de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro. A marcha, que estava prevista para 9 de setembro, precisou ser adiada por questões de segurança.

“A decisão tem como objetivo de resguardar a vida das mulheres, anciãs, jovens e crianças presentes, na mobilização que acontece desde o dia 7 de setembro, na capital federal, com a participação de mais de 5 mil pessoas de 185 povos, de todas as regiões do país”, reforça nota lançada ontem(9/9) pela Anmiga.

Segundo Shirley Krenak, liderança indígena da Anmiga e coordenadora de segurança da marcha, “nossa função enquanto segurança foi proteger as mulheres indígenas, levando todo esse processo da nossa marcha de uma forma muito positiva, pacífica, não tivemos nenhum problema, não tivemos ninguém passando por problemas no que diz respeito à violência, foi uma marcha totalmente cheia de paz.”

A marcha contou com uma equipe de mais de 50 pessoas, homens e mulheres indígenas,coordenados por Shirley desde o primeiro dia de acampamento, que precisou ser reforçada para garantir a segurança de mulheres e crianças durante todos os dias de atividade.

Juventude indígena presente!

A marcha também ficou marcada pelo encontro de anciãs e jovens mulheres, algumas participando pela primeira vez de uma mobilização deste tipo. Esse encontro demarca o futuro da luta indígena, onde a juventude se faz presente nos processos de luta em defesa dos territórios e formando-se enquanto jovens lideranças.

Para Lídia Guajajara, indígena do povo Guajajara e comunicadora da Anmiga, “as mulheres protagonizaram esse momento que, pra nós, foi histórico, porque a juventude está fazendo essa participação pela primeira vez. Também viemos somar forças, mobilizar, porque aqui também se encontram várias referências, de lideranças mulheres, lideranças que vem forte nessa mobilização e trazem consigo essa força da juventude, que vem também protagonizando espaço trazendo a sua fala.”

Acampamento

Desde o dia 7 de setembro, 5 mil mulheres indígenas de 185 povos ocupam o gramado da Funarte, em Brasília, na II Marcha Nacional das Mulheres Indígenas, que tem como tema “Mulheres originárias: Reflorestando mentes para a cura da Terra”.

Lideranças indígenas femininas da Amazônia, Cerrado, Pantanal, Mata Atlântica, Caatinga e dos Pampas foram credenciadas e testadas para a Covid-19, dentro da parceria com Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz DF e RJ), Ambulatório de Saúde Indígena da Universidade de Brasília, Secretaria de Saúde do DF e Hospital Universitário de Brasília.

A II Marcha Nacional das Mulheres Indígenas contou com uma série de atividades que refletem não só as violências sofridas pelas mulheres indígenas no Brasil, como também trouxe a força da ancestralidade, rituais, acolhimento e diversidade, em um momento de celebração e reencontro.

“Estamos em busca da garantia de nossos territórios, das que nos antecederam, para as presentes e futuras gerações, defendendo o meio ambiente, este bem comum que garante nossos modos de vida enquanto humanidade. Para além de mero recurso físico, é igualmente morada dos espíritos das florestas, dos animais e das águas da vida como um todo, fonte de nossos conhecimentos ancestrais”, reforça o comunicado da Anmiga sobre a marcha.

Durante a Marcha, as mulheres também acompanharam o julgamento do marco temporal, quando todo o acampamento se concentrou na tenda principal para assistir a transmissão da sessão do Supremo Tribunal Federal (STF) que irá decidir o futuro das demarcações de terras indígenas em todo o país.