Carta para um Brasil que nunca se quis indígena

Por Dinamam Tuxá e Felipe Tuxá

Quase que em momentos equidistantes, chegamos ao final do ano com mais uma morte violenta de um jovem indígena. No décimo oitavo dia de 2023, em janeiro, estivemos consternados com a perda de dois jovens Pataxó assassinados por pistoleiros, numa área de reocupação territorial na Terra Indígena Barra Velha, no extremo sul da Bahia. Eram eles Nawir Brito de Jesus de 17 anos e Samuel Cristiano do Amor Divino de 25 anos. Agora, faltando nove dias para o final do ano, recebemos a notícia de mais uma perda. Trata-se do Cacique Lucas Kariri-Sapuyá, do povo Pataxó Hahahãe de 31 anos, alvo de emboscada por pistoleiros na entrada da Aldeia do Rio Pardo, próximo a aldeia Caramuru no Sul da Bahia. Assim começamos e encerramos o ciclo 2023.

Embora separadas por meses, engana-se quem pensa se tratarem de casos isolados. Quase como uma violência lenta, em conta-gotas, assassinatos como esses encontram-se dispersos ao longo dos anos. Aparecem na mídia como notícias desconexas, convidando o leitor ou expectador a pensar brevemente sobre o contexto cotidiano de vida de povos indígenas. A morte de nossos jovens suscita a urgência de se pensar sobre o que se convencionou chamar de “questão indígena”. Distante dos espetáculos culturais que a sociedade civil aceitou consumir acerca dos povos indígenas, “danças”, “mitos”, “lendas”, “folclore”, “cantos”, “pajelanças” e o crescente “turismo étnico espiritual” existe um Brasil indígena repleto de conflitos, onde mães, pais, avós, esposas, esposos e filhos pranteiam a iminência da morte de familiares, ameaçados e criminalizados ao buscarem seus direitos. Por mais incômodo que seja, é necessário falar desse Brasil indígena.

A narrativa de um país diverso, multicultural e democrático fabula realidades indígenas obscuras cujas cenas, acerca da violência, constrange a sociedade civil diante de um contexto de vida dramático. São cenas de crianças yanomami desnutridas ou sugadas por maquinários de garimpo ilegal, vidas jovens ceifadas cedo demais, o drama Guarani em Mato Grosso do Sul, a ameaça do Marco Temporal e um continuum de turbulências. Foi essa teia de violência que quisemos denunciar na tese de Doutorado em Antropologia Social onde tratamos da Letalidade Branca defendida na Universidade de Brasília em 2022. Com a letalidade branca refletimos sobre as experiências indígenas em um país que nunca se quis indígena! Onde o senso comum nos compele para existências marginais ao mesmo tempo em que promove ideias absurdas como a de que indígenas possuem “direitos demais”.

Como a alcunha convencional coloca quando tratamos das demandas indígenas através do rótulo de “questão indígena”, situamos esses povos a partir de uma interrogação, um problema a ser resolvido. Qual é, portanto, o problema dos povos indígenas? Olhar seriamente para as nossas demandas é ainda, falar de demarcação territorial e proteção daqueles que já estão demarcados. Afinal, vivemos em um país que situa a presença indígena como um empecilho, obstáculos para acesso a territórios. Embora os direitos territoriais e o dever do Estado de cumprir com as demarcações e desintrusões estejam previstos em nossa Carta Magna, o sem número de projetos de leis que atacam esses mesmos direitos mostram o tamanho das adversidades que enfrentamos para efetiva-los. Ultimamente, temos lutado para preservar os direitos de retrocessos, enquanto deveríamos estar vendo os mesmos sendo efetivados. São centenas de processos demarcatórios parados, presos numa morosidade violenta, vários povos vivendo em acampamentos improvisados em beiras de estradas, velhos e velhas que morrem clamando por justiça diante de vulnerabilidades históricas.

Olhar pro Brasil indígena precisa, urgentemente, ser mais que uma celebração de diversidade. Precisa ser enfrentar a História desse país. A história de sua ocupação e o legado que cinco séculos desde a invasão deixaram para as comunidades indígenas no presente. A violência que acomete os povos indígenas, não é contingencial. Precisa ser enfrentada como elemento fundante de uma nação erguida em cima de saque e pilhagem de territórios indígenas. É essa memória que é o mastro para a condução de um futuro para um Brasil que seja, também, indígena. Um Brasil onde culpados sejam encontrados e responsabilizados, onde o Ministério dos Povos Indígenas e a Fundação Nacional dos Povos Indígenas estejam fortalecidos, e onde os direitos indígenas sejam efetivados e não atacados.

Lembraremos de Nawir, Lucas, e Samuel, assim como lembramos de Galdino, Paulino e tantos outros e outras. Eles vivem em nós. Justiça e demarcação já.

Dinaman Tuxá é indígena do povo Tuxá e Coordenador Executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, APIB e Assessor jurídico da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, APOINME. Felipe Cruz é indígena do povo Tuxá, professor de Antropologia da Universidade Federal da Bahia, membro da Articulação Brasileira de Antropologues Indígenas, vice-presidente da Associação Nacional Indigenista (ANAÍ). Correio eletrônico: [email protected]

 

Referências:
Cruz, Felipe S. M. 2022. “Letalidade branca: Negacionismo, violência anti-indígena e as políticas de genocídio”. Tese de Doutorado, Universidade de Brasília, Brasília.

Apib entra com representação no MPF contra deputada da Frente Parlamentar da Agropecuária por crimes de ameaça, incitação à violência e racismo

Apib entra com representação no MPF contra deputada da Frente Parlamentar da Agropecuária por crimes de ameaça, incitação à violência e racismo

Caroline de Toni é coordenadora jurídica da FPA e prometeu mais violência caso o PL 2903, que quer transformar marco temporal em lei e legaliza outros crimes contra os povos indígenas, não se torne lei.

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), entrou com uma representação no Ministério Público Federal (MPF) contra a deputada federal e coordenadora jurídica da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), Caroline de Toni (PL-SC), que prometeu um “banho de sangue” caso o Marco Temporal não seja transformado em lei, através do PL2903.

A fala racista da deputada promove discurso de ódio para ampliar ainda mais a violência contra os povos indígenas. A deputada fez a declaração durante coletiva de imprensa na última quarta-feira (27) no processo de votação do PL 2903, que tenta transformar em Lei o Marco Temporal e legalizar crimes contra povos indígenas.

No mesmo dia da fala da deputada, a aldeia Barra Velha, do povo Pataxó, no município de Porto Seguro, na Bahia, foi atacada com mais de 100 tiros e nos dias seguintes foram registradas outras violências. No dia 18 de setembro, Sebastiana e Rufino, casal de rezadores do povo Guarani e Kaiowá, foram queimados vivos e encontrados mortos, em meio às cinzas da casa onde moravam, em Mato Grosso do Sul. No Amapá, uma adolescente de 15 anos do povo Karipuna, foi estuprada e morta, no dia 17 de setembro.

A Apib denuncia as violências cometidas contra os povos indígenas e exige um BASTA nessa violência. É preciso acabar com o derramamento de sangue indígena e a fala da deputada apenas reforça todas as violências cometidas diariamente contra nossos povos.

Acesse a representação completa aqui

Senado Genocida
Logo após a declaração da deputada, que pede “banho de sangue”, o Senado Federal aprovou na tarde do dia 27 o Projeto de Lei 2903 intitulado pela Apib como PL do Genocídio. A atitude dos parlamentares representa um tensionamento e uma afronta ao Supremo Tribunal Federal que julgou e decidiu por maioria de 9×2 anular o Marco Temporal.

O PL 2903 agora é analisado pelo presidente Lula, que tem 15 dias úteis para sancionar ou vetar (total ou parcialmente) o projeto. A Apib exige o veto total do projeto e cobra compromisso de Lula para respeitar e garantir os direitos dos povos indígenas.

A Apib ressalta ainda que as atitudes da deputada e da FPA são resultados da ligação direta de políticos brasileiros à invasão de terras indígenas, como mostra o dossiê “Os invasores” do site jornalístico “De olho nos ruralistas”. De acordo com o estudo, representantes do Congresso Nacional e do Executivo, possuem cerca de 96 mil hectares de terras sobrepostas às terras indígenas. Além disso, muitos deles foram financiados por fazendeiros invasores de TIs, que doaram R$ 3,6 milhões para campanha eleitoral de ruralistas. Esse grupo de invasores bancou 29 campanhas políticas em 2022, totalizando R$ 5.313.843,44. Desse total, R$ 1.163.385,00 foi destinado ao candidato derrotado, Jair Bolsonaro (PL).

O Marco Temporal é uma tese política, patrocinada pelo Agronegócio. Os ruralistas querem mudar os processos de demarcação e determinar que só têm direito aos territórios tradicionais os povos que comprovarem que viviam nesses locais no período da aprovação da constituição, 1988. Uma medida que ignora o extermínio e expulsão de milhões de indígenas de suas terras ao longo da história.

Além do Marco Temporal, o PL 2903 pretende legalizar crimes cometidos contra os povos indígenas e por isso é considerado o PL do Genocídio. A Apib evidência sete pontos que podem ampliar as violências e que precisam ser vetados por Lula:

1) o PL 2903 quer definir critérios racistas de quem é ou não indígena;
2) quer autorizar a construção de rodovias, hidrelétricas e outras obras em Terras Indígenas, sem consulta prévia, livre e informada;
3) o PL quer permitir a plantação de soja, criação de gado, promoção de garimpo e mineração em Terras Indígenas;
4) propõe que qualquer pessoa questione os processos de demarcação dos territórios, inclusive os já demarcados;
5) busca reconhecer a legitimidade da posse de terra de invasores de Terras Indígenas;
6) quer flexibilizar a política de não-contato com povos indígenas em isolamento voluntário; 7) quer mudar conceitos constitucionais da política indigenista como: a tradicionalidade da ocupação, o direito originário e o usufruto exclusivo dos povos indígenas aos seus territórios.

Senado aprova PL do Marco Temporal, Apib cobra veto de Lula e STF encerra Julgamento

Senado aprova PL do Marco Temporal, Apib cobra veto de Lula e STF encerra Julgamento

Foto: Tukumã Pataxó/Apib

Em dia marcado pela afronta do Senado aos direitos indígenas e a constituição, Apib cobra veto de Lula ao PL 2903, aprovado nesta quarta-feira (27). STF encerra julgamento e anula Marco Temporal, mas define critérios prejudiciais aos povos indígenas. 

Por 43 votos a 21, o Senado Federal aprovou na tarde desta quarta-feira (27) o Projeto de Lei 2903 intitulado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) como PL do Genocídio. A proposta transforma o Marco Temporal em lei e legaliza crimes contra os povos indígenas. A movimentação, organizada pela bancada ruralista, foi feita a toque de caixa e aprovou em poucas horas a proposta na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e no plenário do Senado. A Apib agora cobra veto de Lula ao projeto, que possui 15 dias úteis para se manifestar. 

“O Senado quer perpetuar o genocídio indígena. Esse projeto de lei legaliza crimes que ameaçam as vidas indígenas e afetam a crise climática. O PL é inconstitucional e o Supremo já anulou o Marco Temporal, mas o projeto possui muitos outros retrocessos aos direitos indígenas para além do Marco. Seguimos na luta e cobramos para que o Lula vete esse projeto e concretize seu compromisso com os povos indígenas”, enfatiza Kleber Karipuna coordenador executivo da Apib

A votação do Senado aconteceu no mesmo dia que o Supremo Tribunal Federal (STF) encerrou o julgamento da tese do Marco Temporal. Os ministros e ministras do Supremo decidiram anular a tese ruralista, no dia 21/09, quando o Tribunal formou maioria de 9×2 contra o Marco Temporal. Na tarde desta quarta-feira (27), o STF retomou a sessão para finalizar o julgamento e analisar as propostas sobre indenização e exploração de Terras Indígenas. 

O STF definiu critérios considerados pela Apib como prejudiciais aos povos indígenas no contexto da indenização para demarcações. A decisão do Supremo fixou critérios para casos de indenização pela terra nua e indenizações prévias, o que pode premiar invasores de Terras Indígenas e inviabilizar economicamente os processos de demarcação. O Ministro Dias Toffoli que havia apresentado critérios referentes à mineração retirou do seu voto este tema. 

“Mais um dia marcado pelas violações dos direitos dos povos indígenas brasileiros. O marco temporal foi anulado no STF, mas a tese fixada possui diversos critérios perigosos para nós, como as indenizações que podem travar ainda mais as demarcações no país. E enquanto o Congresso tenta travar um cabo de guerra com o STF, seguimos na emergência contra as invasões de terras indígenas e o genocídio dos povos”, afirma Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib.

Senado Genocida 

No dia 23 de agosto, a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) do Senado aprovou o texto e na tarde desta quarta-feira a CCJ votou e encaminhou o projeto para o plenário. Além do marco temporal, o PL 2903 (antigo PL 490) possui outros retrocessos para os direitos dos povos indígenas, que foram ignorados pelas comissões.  

O projeto, além do Marco Temporal, propõe a construção de rodovias e hidrelétricas em territórios indígenas sem consulta livre, prévia e informada das comunidades afetadas e quer permitir que fazendeiros assinem contratos de produção com indígenas, o que viola o direito dos povos originários ao usufruto exclusivo dos territórios demarcados.

A proposta aprovada pelo Senado também autoriza qualquer pessoa a questionar o processo demarcatório, inclusive de terras indígenas já demarcadas e favorece a grilagem de terras, pois reconhece títulos de terras que estão sob áreas de ocupação tradicional. Ele também ressuscita o regime de tutela e assimilacionismo, padrões superados pela Constituição de 1988, que negam a identidade dos indígenas e flexibiliza a política indigenista de não contato com povos em isolamento voluntário, além de reformular conceitos constitucionais como a tradicionalidade da ocupação, direito originário e usufruto exclusivo.

Além disso, após a derrubada do marco temporal no STF, o senador Dr.Hiran (PP-RR) protocolou, no dia 22 de setembro, uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que pede a instituição do marco temporal. Nomeada como PEC 048/2023, a emenda quer alterar a Constituição Federal de 1988 que prevê o direito originário dos povos indígenas sobre terras tradicionalmente ocupadas. 

“O Supremo enterrou o Marco Temporal e o Senado tenta ressuscitar a tese com essa PEC 48. É uma movimentação que afronta a Constituição Federal e a democracia do Brasil. Os ruralistas tentam fazer dos direitos uma disputa em um cabo de guerra com o Supremo para tentar mostrar quem tem mais força. Seguiremos reforçando que direitos não se negociam e que as vidas indígenas não podem seguir sendo massacradas pelos interesses econômicos e políticos de quem quer que seja”, ressaltou Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib. 

A Apib ressalta que as atitudes do Senado são resultados da ligação direta de políticos brasileiros à invasão de terras indígenas, como mostra o dossiê “Os invasores” do site jornalístico “De olho nos ruralistas”.  De acordo com o estudo, representantes do Congresso Nacional e do Executivo, possuem cerca de 96 mil hectares de terras sobrepostas às terras indígenas. Além disso, muitos deles foram financiados por fazendeiros invasores de TIs, que doaram R$ 3,6 milhões para campanha eleitoral de ruralistas. Esse grupo de invasores bancou 29 campanhas políticas em 2022, totalizando R$ 5.313.843,44. Desse total, R$ 1.163.385,00 foi destinado ao candidato derrotado, Jair Bolsonaro (PL). 

Pontos do Julgamento

Com o fim do julgamento do Marco Temporal, o STF fixou 13 pontos na decisão final que além de confirmar a inconstitucionalidade do Marco Temporal coloca pontos referentes à indenização que vai estabelecer novos critérios no processo de demarcação de Terras Indígenas. 

Confira os 13 pontos:  

1- A demarcação consiste em procedimento declaratório do direito originário territorial da posse das terras ocupadas tradicionalmente comunidade indígena.

2 – A posse tradicional indígena é distinta da posse civil, consistindo na ocupação das terras habitadas em caráter permanente pelos indígenas, das utilizadas para suas atividades produtivas, das imprescindíveis para a preservação dos recursos ambientais necessários ao seu bem-estar e das necessárias às sua reprodução física e cultural, segundo os seus usos, costumes e tradições, nos termos do Parágrafo primeiro do Artigo 231 do texto constitucional.

3 – A proteção constitucional aos direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam independe da existência de um marco temporal em 5 de outubro de 1988 ou da configuração do renitente esbulho, como conflito físico ou controvérsia judicial persistente, à data da promulgação da Constituição

4 – Existindo ocupação tradicional indígena ou renitente esbulho contemporâneo à promulgação da Constituição Federal, aplica-se o regime indenizatório relativo às benfeitorias úteis e necessárias previsto no Artigo 231, Parágrafo 6º da Constituição federal de 1988.

5 – Ausente a ocupação tradicional indígena, ao tempo da promulgação da Constituição Federal, ou renitente esbulho na data da promulgação da Constituição Federal, são válidos e eficazes, produzindo todos os seus efeitos, os atos e negócios jurídicos perfeitos e a coisa julgada, relativos a justo título ou posse de boa-fé das terras de ocupação tradicional indígena, assistindo ao particular o direito à indenização prévia das benfeitorias necessárias e úteis pela União, e quando inviável o reassentamento dos particulares caberá a eles indenização pela União com direito de regresso em face do ente federativo que titulou a área correspondente ao valor da terra nua paga em dinheiro ou em título da dívida agrária, se for do interesse do beneficiário, e processada em autos apartados do procedimento de demarcação, com pagamento imediato da parte incontroversa e direito de retenção se não houver o depósito do valor incontroverso.

6 – Descabe indenização em casos já pacificados, decorrentes de Terras Indígenas já reconhecidas e declaradas em procedimento demarcatório, ressalvados os casos judicializados em andamento.

7 – É dever da União efetivar o procedimento demarcatório das Terras Indígenas, sendo admitida a formação de áreas reservadas somente diante da absoluta impossibilidade de concretização da ordem constitucional de demarcação, devendo ser ouvida em todo caso a comunidade indígena, buscando-se se necessário a autocomposição entre os respectivos entes federativos para a formação das áreas reservadas, tendo sempre em vista a busca do interesse público e a paz social, bem como a proporcional compensação às comunidades indígenas.

8 – O procedimento de redimensionamento de Terra Indígena não é vedado, em caso de descumprimento dos elementos contidos no Artigo 231 da Constituição da República, por meio de instauração de procedimento demarcatório, até o prazo de cinco anos da demarcação anterior, sendo necessário comprovar grave e insanável erro na condução do procedimento administrativo ou na definição dos limites da Terra Indígena, ressalvadas as ações judiciais em curso e os pedidos de revisão já instaurados até a data de conclusão deste julgamento.

9 – O laudo antropológico, realizado por meio do Decreto 1.775/1996, é um dos elementos fundamentais para a demonstração da tradicionalidade da ocupação de comunidade indígena determinada, de acordo com os seus usos, costumes e tradições e na forma do decreto.

10 – As terras de ocupação tradicional indígena são de posse permanente da comunidade, cabendo aos indígenas o usufruto exclusivo das riquezas do solo, do e lagos nela existentes.

11 – As terras de ocupação tradicional indígena, na qualidade de terras públicas, são inalienáveis, indisponíveis e os direitos sobre elas imprescritíveis.

12 – A ocupação tradicional das terras indígenas é compatível com a tutela do meio ambiente, sendo assegurado o exercício das atividades tradicionais povos indígenas.

13 – Os povos indígenas possuem capacidade civil e postulatória, sendo partes legítimas nos processos em que discutisse os interesses sem prejuízo nos termos da lei, da legitimidade com da Funai e da intervenção do Ministério Público como fiscal da lei.

STF acaba de decidir que vai julgar sobre as teses que definem temas referentes a indenizações para demarcação e exploração de Terras Indígenas  

 

 

Senado vota PL 2903 no mesmo dia que o STF retoma julgamento do marco temporal para tratar sobre indenização e exploração de Terras Indígenas

Senado vota PL 2903 no mesmo dia que o STF retoma julgamento do marco temporal para tratar sobre indenização e exploração de Terras Indígenas

Foto: Tukumã Pataxó

A votação na CCJ irá ocorrer a partir das 10h, pouco antes do retorno do julgamento do marco temporal, no Supremo, previsto para iniciar às 14h.

Mais uma vez o Senado tenta atropelar os direitos dos povos indígenas ao pautar o Projeto de Lei 2903, que tenta transformar o marco temporal em lei e busca legalizar crimes contra indígenas. A  Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado vota, nesta quarta-feira (27), a partir das 10h (horário de Brasília), o PL, que foi nomeado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), como PL do Genocídio.

O projeto vai ser apreciado no mesmo dia que o Supremo Tribunal Federal (STF) retoma o julgamento do Marco Temporal, previsto para iniciar às 14h. Os ministros e ministras irão debater as propostas sobre indenização, mineração e permuta de Terras Indígenas que surgiram nas sessões ao longo do julgamento. 

Em sessão histórica na última quinta-feira (21/09), o STF formou maioria de votos para a derrubada da tese patrocinada pelo agronegócio, no Judiciário. Com votação de 9×2 contrários ao Marco Temporal, o Tribunal formou maioria e selou uma importante vitória na luta por direitos dos povos indígenas, mas as propostas apresentadas pelos ministros Alexandre de Moraes e Dias Toffoli serão discutidas somente nesta quarta-feira, dia 27. Saiba como foi a votação no STF aqui

No Senado a votação estava prevista para o dia 20 de setembro, mas a sessão foi marcada pela falta de diálogo. Lideranças foram impedidas de entrar no local e a CCJ rejeitou o pedido de audiência pública. Após pedido de vistas coletivo dos senadores, a votação foi adiada também para o dia 27 de setembro. 

Para a Apib, a decisão do Senado é uma afronta ao Supremo, ao movimento indígena e à democracia. “O marco temporal foi derrubado no Supremo, mas a luta continua. A bancada ruralista do Senado está colocando seus interesses econômicos à frente das vidas indígenas e tentando aprovar o PL 2903 antes da finalização do julgamento do marco temporal no Supremo”, afirma Kleber Karipuna, coordenador executivo da Apib.

Além disso, após a derrubada do marco temporal no STF, o senador Dr.Hiran (PP-RR) protocolou, no dia 22 de setembro, uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que pede a instituição do marco temporal. Nomeada como PEC 048/2023, a emenda quer alterar a Constituição Federal de 1988 que prevê o direito originário dos povos indígenas sobre terras tradicionalmente ocupadas. 

“O Supremo enterrou o Marco Temporal e o Senado tenta ressuscitar a tese com essa PEC 48. É uma movimentação que afronta a Constituição Federal e a democracia do Brasil. Os ruralistas tentam fazer dos direitos uma disputa em um cabo de guerra com o Supremo para tentar mostrar quem tem mais força. Seguiremos reforçando que direitos não se negociam e que as vidas indígenas não podem seguir sendo massacradas pelos interesses econômicos e políticos de quem quer que seja”, ressaltou Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib. 

A Apib ressalta que as atitudes do Senado são resultados da ligação direta de políticos brasileiros à invasão de terras indígenas, como mostra o dossiê “Os invasores” do site jornalístico “De olho nos ruralistas”.  De acordo com o estudo, representantes do Congresso Nacional e do Executivo, possuem cerca de 96 mil hectares de terras sobrepostas às terras indígenas. Além disso, muitos deles foram financiados por fazendeiros invasores de TIs, que doaram R$ 3,6 milhões para campanha eleitoral de ruralistas. Esse grupo de invasores bancou 29 campanhas políticas em 2022, totalizando R$ 5.313.843,44. Desse total, R$ 1.163.385,00 foi destinado ao candidato derrotado, Jair Bolsonaro (PL). 

Entenda o PL 2903

No dia 23 de agosto, a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) do Senado aprovou o texto, que agora é analisado pela CCJ. Além do marco temporal, o PL 2903 (antigo PL 490) possui outros retrocessos para os direitos dos povos indígenas, aponta o departamento jurídico da Apib. 

Segundo o jurídico, o PL propõe a construção de rodovias e hidrelétricas em territórios indígenas sem consulta livre, prévia e informada das comunidades afetadas e quer permitir que fazendeiros assinem contratos de produção com indígenas, o que viola o direito dos povos originários ao usufruto exclusivo dos territórios demarcados.

O Projeto de Lei também autoriza qualquer pessoa a questionar o processo demarcatório, inclusive de terras indígenas já demarcadas e favorece a grilagem de terras, pois reconhece títulos de terras que estão sob áreas de ocupação tradicional. Ele também ressuscita o regime do tutela e assimilacionismo, padrões superados pela Constituição de 1988, que negam a identidade dos indígenas e flexibiliza a política indigenista de não contato com povos em isolamento voluntário, além de reformular conceitos constitucionais como a tradicionalidade da ocupação, direito originário e usufruto exclusivo.

Saiba mais sobre a tese que pode definir o futuro dos povos indígenas na cartilha e no site: https://apiboficial.org/marco-temporal/ 

Vitória: ministros formam maioria e Marco Temporal é derrubado no STF

Vitória: ministros formam maioria e Marco Temporal é derrubado no STF

Foto: @tukuma_pataxo / APIB

Com o placar de 9×2 contra a tese anti-indígena, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) comemora e alerta para teses sobre indenização e mineração apresentadas no julgamento 

Em sessão histórica nesta quinta-feira (21/09), os ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Rosa Weber do Supremo Tribunal Federal (STF) votaram contra o marco temporal e formaram maioria de votos para a derrubada da tese no Judiciário. Com placar de 9×2, a votação dos ministros foi concluída derrubando a tese do Marco Temporal. No entanto, o julgamento deve ser retomado no dia 27 para debater sobre as propostas levantadas por Moraes e Toffoli no que refere à indenização prévia para invasores de TIs e o aproveitamento de recursos em TIs, o que preocupa o movimento indígena. A votação no Senado defendida pela bancada ruralista para começar no 20 de setembro, foi adiada também para 27 de setembro.

“Nós saímos vitoriosos sim da tese do Marco Temporal mas ainda há muita luta a ser feita para afastar todas as ameaças que também estão tramitando no Senado Federal que é através do PL 2903. Seguimos mobilizados, seguimos lutando, pois a luta irá continuar para garantia e proteção dos direitos dos Povos Indígenas”, afirma Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib, depois da finalização da sessão de votação no STF do dia 21 de setembro em Brasília. 

Continuamos na luta para que nenhum direito seja negociado! 

A Apib comemora o respeito aos direitos indígenas mas alerta de que a luta continua pois, mesmo fora da legalidade, diversas terras indígenas estão sendo invadidas. “É uma vitória para os povos indígenas, pois há anos nós estamos lutando para afastar essa tese que, de certa forma, estava paralisando os processos de demarcação no Brasil. No entanto, tem alguns pontos importantes a serem observados, porque os votos de Toffoli e Moraes trouxeram elementos bastantes perigosos para os Povos Indígenas”, defende Tuxá. Mesmo perante a crescente violência provocada pela ocupação ilegal de território indígena, o ministro Moraes levantou a tese de uma possível indenização para invasores, que supostamente possuam títulos de propriedade rural de “boa fé”, e Toffoli defendeu a possibilidade de aproveitamento de recursos hídricos, orgânicos e minerais localizados dentro de Terras Indígenas. 

Votaram contra a tese do Marco Temporal: Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Rosa Weber. André Mendonça e Nunes Marques votaram a favor do marco temporal. 

O Marco Temporal é uma tese política que afirma que os povos indígenas só teriam direito aos seus territórios caso  estivessem em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal. A Apib aponta que a tese é inconstitucional e anti-indígena, pois viola o direito originário dos povos ao território ancestral – previsto na própria Constituição – e ignora as violências e perseguições, em especial durante a ditadura militar, impossibilitando que muitos povos estivessem em seus territórios na data de  1988. 

No STF, o marco temporal trata, no mérito, de uma ação possessória (Recurso Extraordinário n.º 1.017.365) envolvendo a Terra Indígena Xokleng Ibirama Laklaño, dos povos Xokleng, Kaingang e Guarani, e o estado de Santa Catarina. Com status de repercussão geral, a decisão tomada neste caso servirá de diretriz para todos os processos de demarcação de terras indígenas no país. Como afirmou o Ministro Luís Roberto Barroso, “A constituição é muito clara, não existe propriedade sobre terras tradicionalmente pertencentes a comunidades indígenas. Esta é a solução deste caso.”

Mesmo que o resultado da votação seja uma vitória para os Povos Indígenas do Brasil, outras propostas levantadas pelos ministros em seus votos ameaçam o cenário atual de luta pelo respeito dos nossos direitos. 

O Ministro Alexandre de Moraes votou contra o Marco Temporal na sessão do STF que aconteceu em 7 de junho de 2023. Mesmo com uma posição contrária à tese, ele levantou uma proposta altamente ameaçadora para os Povos Indígenas. Moraes supôs a existência de proprietários rurais de “boa fé”, que poderiam receber indenização do Estado pela terra nua, caso eles chegassem a ser desapropriados das terras que ocupam ilegalmente para realizar a demarcação de uma terra indígena.

A Apib considera que, apesar da existência de uma pequena parcela de pequenos  proprietários que adquiriram de boa-fé títulos de propriedade sobre terras indígenas por ilegalidade praticada pelo Estado,  a proposta da indenização supõe uma premiação aos invasores ilegais que representam a maioria das propriedades com sobreposição em terras indígenas, portanto, um incentivo à ocupação ilegal de terras paga com dinheiro público. A partir do cruzamento de bases de dados fundiários do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), os dados dos relatórios “Os Invasores” realizados por De Olho nos ruralistas, mostram 1.692 sobreposições de fazendas em terras indígenas, o que representa 1,18 milhão de hectares e, desse total, 95,5% estão em territórios pendentes de demarcação. Com a sua proposta, Morares ignora a vasta história de grilagem de terras no Brasil e a ação criminosa de ruralistas, que tem provocado um aumento da violência contra os povos indígenas e um crescimento do desmatamento. Entre 2008 e 2021, 46,9 mil hectares foram desmatados em áreas de sobreposição de fazendas em terras indígenas, segundo apontam os dados do relatório previamente mencionado. 

Por sua vez, o Ministro Dias Toffoli votou no dia 20 de setembro, representando o  5 voto contrário à tese do marco temporal. No entanto, ao contrário dos outros ministros e com temática alheia à discutida no processo, Toffoli optou por expandir os temas analisados e incluiu a possibilidade de aproveitamento de recursos hídricos, orgânicos e minerais de Terras Indígenas, sob o argumento de que o tema sofre com uma suposta omissão legal e prejudica o desenvolvimento econômico do país. Maurício Terena, coordenador jurídico da Apib, complementa: “No último momento, o ministro trouxe uma questão que muito nos preocupa enquanto movimento indígena. O ministro preceitua teses sobre exploração econômica em terras indígenas.  A gente entende que não é momento para fazer esse debate e a forma que ele fez isso, em alguma medida, flexibiliza o usufruto exclusivo dos povos indígenas’’.

Leia o comunicado completo realizado pela Assessoria Jurídica da APIB em manifestação sobre o voto do Ministro Dias Toffoli.

A quem interessa o Marco Temporal?

Dentre as ameaças, resaltamos a ocupação ilegal em algums Terras Indígenas por alguns fazendeiros que estão ligados diretamente com o poder político ruralista. Políticos brasileiros, representantes no Congresso Nacional e no executivo, possuem 96 mil hectares de terras sobrepostas às Terras Indígenas. Além disso, muitos deles foram  financiados por fazendeiros invasores de Terras Indígenas, que doaram R$ 3,6 milhões para campanha eleitoral de ruralistas. Esse grupo de invasores bancou 29 campanhas políticas em 2022, totalizando R$ 5.313.843,44. Desse total, R$ 1.163.385,00 foi destinado ao candidato derrotado, Jair Bolsonaro (PL). 

Votação no Senado adiada 

Sob pressão da bancada ruralista, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado tinha previsto começar no dia 20 de setembro a debater o Projeto de Lei 2903, que pretende transformar o Marco Temporal em lei e legalizar crimes cometidos contra povos indígenas. No entanto, a falta de diálogo marcou a jornada: lideranças foram impedidas de entrar e a Comissão rejeitou pedido de audiência pública para. A votação foi adiada para o dia 27 de setembro após pedido de vistas coletivo dos senadores. “Os direitos dos povos indígenas estão sendo violados e não estamos sendo escutados. O parlamento não está ouvindo a opinião pública o que beneficia apenas os interesses do agronegócio”, alerta Tuxá. Para a Apib, o embate entre legislativo e judiciário é uma afronta de políticos que querem impor seus interesses econômicos nas terras indígenas sobre as próprias vidas indígenas. 

Sobre a Apib

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) é uma instância de referência nacional do movimento indígena no Brasil, criada de baixo pra cima. Ela aglutina sete organizações regionais indígenas (Apoinme, ArpinSudeste, ArpinSul, Aty Guasu, Conselho Terena, Coaib e Comissão Guarani Yvyrupa) e nasceu com o propósito de fortalecer a união de nossos povos, a articulação entre as diferentes regiões e organizações indígenas do país, além de mobilizar os povos e organizações indígenas contra as ameaças e agressões aos direitos indígenas.

Saiba mais sobre o marco temporal: https://apiboficial.org/marco-temporal/ 

Para mais informações e para agendar entrevistas pode contatar com o serviço de imprensa:

E-mail: [email protected]

Coordenação de comunicação – Samela Sateré Mawé – +55 (92) 98285 5077

Comunicação internacional –  +55 (65) 99686 6289 / +55 (21) 96665 5518 / +55 (92) 99430-3762

Apib e Apoinme realizam audiência pública sobre a violação dos direitos indígenas na Bahia

Apib e Apoinme realizam audiência pública sobre a violação dos direitos indígenas na Bahia

A Comissão de Direitos Humanos e Segurança Pública em parceria com a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme) realizam uma audiência pública à Assembleia Legislativa da Bahia (ALBA) para tratar do tema “Violações de Direitos dos Povos Indígenas no Estado da Bahia”, no dia 26 de setembro de 2023, às 9 horas.

A Bahia é o segundo estado com maior população indígena do país. Com 229,1 mil pessoas de etnias indígenas, atrás apenas do estado do Amazonas. No entanto, o último período registrou um aumento no número de casos de violência, perseguições e assassinatos que, mesmo com a intervenção realizada pelo governo do Estado, ainda não foi contida.

A criação da Frente Parlamentar tem como objetivo “aprimorar a atuação conjunta com movimentos ambientalistas, povos e comunidades tradicionais do estado para fortalecer a agenda de proteção ambiental e da promoção do bem viver de povos e comunidades tradicionais”, como explica o documento que justifica a solicitação.

Desta forma, uma das primeiras atividades da Frente será a apuração em audiência dos casos e denúncias que levaram a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) a conceder o pedido de Medidas Cautelares em favor do povo Pataxó, solicitadas pela Apib e Apoinme, em janeiro de 2023. A medida é referente aos casos ocorridos nas Terras Indígenas (TIs) Comexatibá e Barra Velha do Monte Pascoal. A CIDH indicou que os indígenas destas áreas estão em “grave e urgente risco de dano irreparável aos seus direitos”.

Causas da violência

O povo Pataxó do extremo sul baiano aguarda há anos a conclusão da demarcação de suas terras. A falta de eficiência na atuação do Estado brasileiro abre brechas para a promoção de invasões por parte do agronegócio, do setor hoteleiro e da especulação imobiliária na região.

Por esse motivo, a TI Comexatibá se tornou um local de mais disputas de terra do que qualquer outro território indígena no Brasil, refletido na alta quantidade de contestações administrativas no seu processo de demarcação.

O povo originário destes territórios tem sofrido com violência intensa, contínua e desproporcional, por meio de ameaças, cercos armados, tiroteios, difamações e campanhas de desinformação.

Frustrados por ver o agronegócio destruir seu território, membros de várias comunidades indígenas Pataxó, no sul da Bahia, realizaram uma ação de retomada em 22 de junho de 2022, quando 180 indígenas assumiram a Fazenda Santa Bárbara, área utilizada para a criação de gado e cultivo de eucaliptos pela Suzano, empresa transnacional de produção de celulose.

A fazenda, que se encontra no interior dos limites do Território Indígena Pataxó Comexatibá, foi incendiada e, numa tentativa de deter a pressão externa sobre suas terras, os indígenas exigiram que as empresas multinacionais as deixassem para sempre.

A Federação Indígena das Nações Pataxó e Tupinambá do Extremo Sul da Bahia (Finpat) afirmou em nota que, “atualmente, fazendeiros na forma de fomento, fazem a exploração da área com plantações de eucaliptos, trazendo sérios problemas ambientais para toda a região, inclusive, desmatamentos e uso excessivo de agrotóxicos”.

Tais práticas vêm afetando os recursos hídricos, ecossistemas, fauna e flora, causando destruição de fragmentos de Mata Atlântica, espécies de plantas, animais e pássaros ameaçados de extinção ainda existentes na região. Para além das empresas de produção de celulose, os Pataxó também enfrentam a expansão dos setores de turismo e outros setores do agronegócio.

Grande parte do eucalipto cultivado no Brasil está na região que compreende o extremo sul da Bahia e o estado vizinho, Espírito Santo, região que tem uma longa história de conflitos envolvendo as plantações para produção de celulose, cujo resultado tem sido o assassinato de ativistas em contextos de grilagem de terra associados à expansão desse cultivo.

Após a retomada, foram assassinados três jovens indígenas. Casos que ainda não foram totalmente elucidados. O povo Pataxó exige justiça aos responsáveis, mandantes e executores dos crimes, e imediata demarcação de seus territórios. Assinam o pedido de audiência o deputado estadual, Hilton Coelho (PSOL), e os representantes jurídicos da Apib, Maurício Terena e Andressa Pataxó.

Justiça e congresso do Brasil podem agravar a crise climática e ampliar violações aos Povos Indígenas

Justiça e congresso do Brasil podem agravar a crise climática e ampliar violações aos Povos Indígenas

Foto Tukumã Pataxó | Apib

Julgamento marcado para o dia 20 de setembro no Supremo Tribunal Federal pode definir futuro das Terras Indígenas em território brasileiro e ser decisivo para o clima global. Movimento indígena mobiliza todo o Brasil e uma comitiva indígena da Apib está em Nova York na Semana do Clima para fortalecer a campanha de mobilização internacional pela defesa do direito às Terras Indígenas

  • A ameaça às Terras Indígenas do Brasil, é uma ameaça climática para toda a humanidade

“Nós estamos na terra e a terra está em nós. Se a terra morre, nós morremos enquanto povos indígenas.”

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) convoca, nesta semana, mobilizações por todo o Brasil e participa da Semana do Clima de Nova York para alertar o mundo sobre os riscos do julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF), previsto para o dia 20 de setembro. A corte vai votar sobre a legitimidade da  tese jurídica do Marco Temporal, articulada pelo agronegócio brasileiro, que pode rever as demarcações das Terras Indígenas e afetar o enfrentamento da crise climática global.  

O Marco Temporal propõe que somente podem ter direito às terras os indígenas que puderem comprovar que viviam nelas em 1988, mesmo ano da criação da Constituição Federal. Uma ação que nega as expulsões forçadas de centenas de povos que só puderam reivindicar suas terras tradicionais após a redemocratização do Brasil, no final dos anos 1980.  

Nesta semana acontece em Nova York a 15ª edição da Semana do Clima, entre os dias 17 e 24 de setembro, e a 78ª Sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 19 a 23 de setembro, que terá na abertura o discurso do presidente Lula. Uma comissão composta por 10 lideranças indígenas está em Nova York para participar das atividades da agenda da Semana do Clima. O objetivo da mobilização internacional é reforçar para o mundo que o Marco Temporal é uma ameaça para a vida dos povos indígenas do Brasil e pode agravar a crise climática, já que as Terras Indígenas são uma reserva de vida no planeta.

A Apib e suas organizações regionais reforçam as mobilizações nos territórios, nas cidades e em Brasília contra o Marco Temporal no dia 20 de setembro. A proposta é de acompanhar o julgamento e reforçar os próximos passos da luta do movimento indígena. As organizações que compõem a Apib, mobilizaram no período de maio e junho mais de 220 manifestações em 21 estados, incluindo o Distrito Federal. 

Ainda faltam cinco ministros do STF para votar no julgamento. O placar atual é de quatro votos  contrários à tese do Marco Temporal, contra dois votos favoráveis. Os ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin e Luís Roberto Barroso manifestaram posição contrária à tese ruralista. Os únicos votos favoráveis à proposta anti-indígena foram dos ministros indicados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, André Mendonça e Nunes Marques. 

No mesmo dia da votação no Supremo, o Senado brasileiro tenta pautar a votação do Projeto para transformar o Marco Temporal em lei. A bancada ruralista do Congresso busca tensionar uma quebra de braço com o poder judiciário brasileiro, pois existe a possibilidade do STF anular a tese do Marco Temporal. 

Além do Marco Temporal, o Projeto de Lei 2903 propõe outros retrocessos para os direitos dos povos indígenas, como a construção de rodovias e hidrelétricas em territórios indígenas sem consulta livre, prévia e informada das comunidades afetadas. A proposta também quer permitir que fazendeiros assinem contratos de produção com indígenas, o que viola o direito dos povos originários ao usufruto exclusivo dos territórios demarcados.  

Enquanto alguns falsamente afirmam que “tem muita terra para pouco índio no Brasil”, a Apib contra argumenta que tem muita terra para pouco fazendeiro e que o agronegócio promove a invasão ilegal das terras indígenas. “Não existe solução para a crise climática sem a garantia dos direitos dos povos indígenas e a demarcação dos seus territórios “, afirma a entidade. 

Atualmente, quase metade das terras do Brasil estão nas mãos dos produtores rurais. Do total das terras do país, 41% corresponde a propriedades rurais, 13,7% a terras indígenas e 45,2% a outros fins, de acordo com os dados publicados no Diário Oficial da União. As Terras Indígenas são uma garantia de vida para os povos indígenas e para toda a humanidade que depende do futuro climático.

O Marco Temporal é uma estratégia moderna de colonização

“O futuro dos povos indígenas do Brasil está sob forte ameaça e isso pode afetar a toda a humanidade, pois tem se demonstrado que os povos indígenas, graças aos nossos modos de vida, somos guardiões da natureza e, portanto, do equilíbrio climático mundial”, afirma o coordenador executivo da Apib, Dinamam Tuxá. Enquanto 29 % do território ao redor das Terras Indígenas  está desmatado, o índice de desmatamento dentro das TIs é de somente  2%, de acordo com dados coletados, em setembro de 2022, pela Apib e o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM). Segundo o levantamento, a maior parte da degradação é resultado de ações ilegais financiadas por setores do agronegócio, como plantações de soja e pecuária extensiva. Da mesma forma, cientistas insistem na importância das Terras Indígenas como berços de biodiversidade muito superior ao restante do território nacional. 

O Supremo Tribunal Federal julga atualmente uma proposta que pretende mudar o processo de demarcação das Terras Indígenas mediante a tese do Marco Temporal. Ao mesmo tempo, o Congresso Nacional tenta transformar o Marco Temporal em lei e legalizar crimes que promovem o genocidio indígena e a destruição do meio ambiente. Mas, quem financia esse ameaçador cenário? Empresas nacionais e estrangeiras -como Bunge, Xp, Kinea, Bradesco, Ducoco, Groupe Lactalis, entre outras-, bancos e fundos de inversão internacionais, contribuem com o agronegócio brasileiro, principal beneficiário da tese do Marco Temporal, tal e como demonstram os recentes relatórios realizados por De Olho nos Ruralistas.

Alguns poucos fazendeiros e empresários se beneficiam do lucro do agronegócio em detrimento da vida dos povos indígenas e do equilíbrio climático mundial. As invasões ilegais de terras indígenas, assassinatos de lideranças e militantes, e os cenários de violência por disputas de terras tem crescido nos últimos anos. Permitir a ocupação de terras para o enriquecimento de uns poucos é uma forma moderna de colonização onde os colonos pretendem legalizar a ocupação de Terras Indígenas para se apropriar de cada vez mais hectares de solo do território nacional. 

A proposta do Marco Temporal só existe como consequência do poder econômico e político que o agronegócio tem. Se ela for aprovada, os delitos aumentarão e crescerá a exploração agropecuária e de extração de recursos naturais. Quem primeiro vai pagar essa conta serão os Povos Indígenas. “Os responsáveis pela continuidade do genocídio indígena e pelo agravamento da crise climática ficarão marcados na história .Muitos serão cúmplices do novo colonialismo que ameaça a sobrevivência de nós, povos indígenas que estamos no grande território chamado Brasil, e o futuro de toda a humanidade porque não tem solução para a crise climática sem a participação dos povos indígenas”, reforça Dinamam Tuxá.

Atividades relevantes da Apib durante a 15ª edição da Semana do Clima do 17 a 24 de setembro:

A Apib participou no 17 de setembro da Marcha da semana do clima nas ruas de Nova York em apoio à Greve pela luta contra os combustíveis fósseis (Fight Fossil Fuel Strike). A comitiva indígena da Apib denunciou a ameaça provocada pela proposta da tese do Marco temporal, sublinhou a situação de emergência indígena em relação às indústrias extrativistas e ao agronegócio que provocam múltiplas situações de violência em nossos territórios. Além disso, entre as atividades que compõem a agenda da Semana do Clima, vale destacar que os coordenadores executivos da Apib Kleber Karipuna, Dinamam Tuxá e outras pessoas da comitiva indígena participarão na terça dia 19 da palestra “FCLP: Direitos. Participação e Benefícios para Povos Indígenas e Comunidades Locais no Financiamento Climático Florestal” organizada pelas organizações Forest e Climate Leaders Partnership. No 22 de setembro, uma parte da comitiva estará presente no diálogo co-organizado com H.E Razan Al Mubarak, atual presidente da União Internacional para a Conservação da Natureza, para avaliar o progresso na agenda da COP28 com o intuito de identificar coletivamente maneiras de envolvimento significativo e respeitoso dos Povos Indígenas na COP.

  • Consulte as fotos e vídeos da Marcha e de outros eventos da agenda da semana do clima onde a comitiva da Apib esteve presente:

Material audiovisual Apib – 15ª edição da Semana do Clima Nova York

Sobre a Apib

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) é uma instância de referência nacional do movimento indígena no Brasil, criada de baixo pra cima. Ela aglutina sete organizações regionais indígenas (Apoinme, ArpinSudeste, ArpinSul, Aty Guasu, Conselho Terena, Coaib e Comissão Guarani Yvyrupa) e nasceu com o propósito de fortalecer a união de nossos povos, a articulação entre as diferentes regiões e organizações indígenas do país, além de mobilizar os povos e organizações indígenas contra as ameaças e agressões aos direitos indígenas

Saiba mais sobre o marco temporal: https://apiboficial.org/marco-temporal/ 

Para mais informações e para agendar entrevistas pode contatar com o serviço de imprensa:

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Coordenação de comunicação – Samela Sateré Mawé – +55 (92) 98285 5077

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Julgamento do Marco Temporal é paralisado pelo STF e será retomado amanhã 31/08

Julgamento do Marco Temporal é paralisado pelo STF e será retomado amanhã 31/08

foto Tukumã Pataxó / Apib

O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou nesta quarta-feira (30/08) o julgamento sobre o Marco Temporal, mas a sessão foi suspensa por falta de tempo e o julgamento continuará amanhã (31/08). O ministro André Mendonça passou toda a sessão promovendo a leitura do seu voto, que deve ser finalizado nesta quinta-feira.

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e suas sete organizações regionais de base reforçam que as mobilizações nos territórios, nas cidades, nas redes sociais e em Brasília (DF) contra o Marco Temporal, continuam.

“Nós estamos esperançosos que vamos sair vitoriosos desse julgamento. Amanhã nós vamos seguir mobilizados. A base tem que continuar mobilizada. Essa energia que está vindo das bases para Brasília para os ministros votarem a nosso favor é de suma importância”, reforçou Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib.

O julgamento no STF estava paralisado desde o dia 7 de junho quando o ministro André Mendonça pediu vista do processo (mais tempo para analisar o caso). O último voto foi de Alexandre de Moraes que votou contra o marco temporal, mas apresentou uma “tese meio termo’’que supõe a existência de proprietários rurais de “boa fé”, que poderiam receber indenização do Estado pela terra nua, diante da desapropriação para demarcação das terras indígenas. A tese é considerada desastrosa pela Apib porque desconsidera a história da grilagem de terras no Brasil e pode inviabilizar a demarcação dos territórios. Leia o posicionamento do departamento jurídico da Apib aqui.

ONU
Nesta quarta-feira (30/08), a Organização das Nações Unidas (ONU) publicou um comunicado reforçando o seu posicionamento contra o marco temporal e manifestando preocupação com “quaisquer ações que possam enfraquecer ou relativizar a proteção dos direitos dos Povos Indígenas no Brasil e na região”. A medida é resultado de incidências da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) em conjunto com outras organizações e lideranças do movimento indígena.

No dia 25 de agosto, Maurício Terena, coordenador do setor jurídico da Apib, se reuniu com a relatoria especial para povos indígenas da ONU, em Genebra, na Suíça, para articular a atualização do comunicado da ONU. Além dele, Kari Guajajara, assessora jurídica da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), e Lorena Curuaia, liderança do Xingu, também estiveram presentes na reunião.

Acesse o parecer da ONU contra o Marco Temporal aqui

Histórico
O marco temporal é uma tese política que afirma que os povos indígenas só teriam direito à demarcação das terras se estivessem em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal. A Apib aponta que a tese é inconstitucional e anti-indígena, pois viola o direito originário dos povos ao território ancestral – previsto na própria Constituição – e ignora as violências, em especial da ditadura militar, e a tutela do Estado a que os povos foram submetidos até 1988. Antes disso, inúmeros povos foram forçados a sair dos seus territórios e não tinham autonomia para lutar judicialmente por seus direitos.

No STF, o marco temporal trata, no mérito, de uma ação possessória (Recurso Extraordinário n.º 1.017.365) envolvendo a Terra Indígena Xokleng Ibirama Laklaño, dos povos Xokleng, Kaingang e Guarani, e o estado de Santa Catarina. Com status de repercussão geral, a decisão tomada neste caso servirá de diretriz para todos os processos de demarcação de terras indígenas no país.Como afirmou o Ministro Luís Roberto Barroso, “A constituição é muito clara, não existe propriedade sobre terras tradicionalmente pertencentes a comunidades indígenas. Esta é a solução deste caso.”

LUTA CONTINUA: PL 2903 é aprovado na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado

LUTA CONTINUA: PL 2903 é aprovado na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado

Foto Tukumã Pataxó
Projeto de Lei que institui o marco temporal foi aprovado com 13 votos e agora segue para Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado.

Com 13 votos a favor e 3 contra, o Projeto de Lei 2903, que transforma o marco temporal em lei, foi aprovado na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) do Senado na tarde desta quarta-feira (23/08), em Brasília (DF). Agora, o PL segue para avaliação da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.

Antes da votação, Kleber Karipuna, coordenador executivo da Apib, e outras lideranças indígenas participaram de audiência pública sobre o PL 2903. Na ocasião, o coordenador ressaltou que a audiência não era suficiente para aprofundar as discussões e criticou a celeridade da proposta no Senado.

“Essa audiência não se compara nenhum pouco com o processo de consulta prévia, livre e informada aos povos indígenas, conforme prevê a Convenção 169 OIT. É preciso ampliar o debate, pois somos nós os mais impactados!. Votar às pressas, hoje, um relatório que é um copia e cola que veio da Câmara dos Deputados é não debater o processo. Que debate vossas excelências estão fazendo?”, afirmou Karipuna. Assista a audiência pública aqui.

A Apib e suas organizações regionais de base têm acompanhado de perto a tramitação do PL 2903 no Senado e reivindica que o Governo Federal faça articulações mais intensas dentro do Congresso Nacional para garantir uma tramitação participativa do PL. A organização também tem cobrado que Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, não permita que o Projeto de Lei seja votado antes do julgamento da tese no Supremo Tribunal Federal (STF), como garantido por ele em reunião com lideranças indígenas no dia 31 de maio.

Além do marco temporal, o PL 2903 (antigo PL 490) possui outros oito pontos de retrocessos para os direitos dos povos indígenas, como aponta nota técnica publicada pelo departamento jurídico da Apib. Segundo o documento, o PL propõe a transferência da competência de demarcação de terras indígenas do poder executivo para o legislativo; construção de rodovias e hidrelétricas em territórios indígenas sem consulta livre, prévia e informada das comunidades afetadas e a mitigação da diferença entre posse tradicional indígena e posse privada, permitindo que fazendeiros assinem contratos de produção com indígenas e violam o direito dos povos originários ao usufruto exclusivo dos territórios demarcados.

O Projeto de Lei também autoriza qualquer pessoa a questionar o processo demarcatório, inclusive de terras indígenas já demarcadas e favorece a grilagem de terras, pois reconhece títulos de terras que estão sob áreas de ocupação tradicional. Ele também a reaviva o regime do tutelar e assimilacionismo, padrões superados pela Constituição de 1988, que negam a identidade dos indígenas e flexibiliza a política indigenista de não contato com povos em isolamento voluntário, além de reformular conceitos constitucionais como a tradicionalidade da ocupação, direito originário e usufruto exclusivo.

No dia 8 de agosto, a relatora da matéria na CRA, a senadora Soraya Thronicke, que foi base do governo Bolsonaro, deu parecer favorável à aprovação do PL e manteve aprovado pelos deputados. A decisão ignora os alertas feitos pela coordenação executiva da Apib e pelos parlamentares da Bancada do Cocar dados em reuniões com a senadora, além da recomendação do Conselho de Direitos Humanos (CDH) e organizações internacionais de direitos humanos.

No STF
O marco temporal é uma tese anti-indígena e inconstitucional que afirma que os povos indígenas só teriam direito à demarcação das terras se estivessem em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. No Supremo Tribunal Federal (STF), o marco temporal trata, no mérito, de uma ação possessória (Recurso Extraordinário n.º 1.017.365) envolvendo a Terra Indígena Xokleng Ibirama Laklaño, dos povos Xokleng, Kaingang e Guarani, e o estado de Santa Catarina. Com status de repercussão geral, a decisão tomada neste caso servirá de diretriz para todos os processos de demarcação de terras indígenas no país.

O julgamento estava paralisado no STF há quase dois anos e foi retomado no dia 7 de junho com voto do ministro Alexandre de Moraes, mas foi novamente suspenso com o pedido de vista (mais tempo para analisar o caso) de André Mendonça. Alexandre de Moraes votou contra o marco temporal, mas apresentou uma “proposta alternativa’’ considerada desastrosa para os povos indígenas pela Apib.

“Na análise do departamento jurídico da APIB, essa proposta do Ministro Alexandre de Moraes, mitiga o Direito Originário dos Povos Indígenas sob suas Terras de ocupação Tradicional, instituindo novos marcos temporais de acordo com a data em que o produtor rural consegue apresentar uma certidão de propriedade da Terra registrada em cartório oficial. O Ministro ao afastar o parágrafo 6º do art. 231 Constituição Federal em seu voto abre a possibilidade de grileiros aumentarem suas atividades em terras indígenas”, ressalta trecho de informe circular da Apib. Leia completo aqui.

Saiba mais sobre o marco temporal aqui 

Sobre Apib
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) é uma instância de referência nacional do movimento indígena no Brasil, criada de baixo pra cima. Ela aglutina sete organizações regionais indígenas (Apoinme, ArpinSudeste, ArpinSul, Aty Guasu, Conselho Terena, Coaib e Comissão Guarani Yvyrupa) e nasceu com o propósito de fortalecer a união de nossos povos, a articulação entre as diferentes regiões e organizações indígenas do país, além de mobilizar os povos e organizações indígenas contra as ameaças e agressões aos direitos indígenas

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Telefones:
Samela Sateré Mawé: 92 98285-5077 (coordenadora de comunicação)
Caio Mota: 65 99686-6289
Ariel Bentes: 92 99430-3762

Balanço Apib: Mobilizações, demarcações, representatividade, denúncias e resistência indígena no primeiro semestre de 2023

Balanço Apib: Mobilizações, demarcações, representatividade, denúncias e resistência indígena no primeiro semestre de 2023

Os primeiros seis meses de 2023 foram intensos para os povos indígenas. Ações de resistência e violações de direitos marcaram esse período, que vai ficar na história como um momento único sobre representatividade indígena nos diversos espaços de poder. Mobilizações nos territórios, nas redes sociais e nas cidades, pautaram a importância da continuidade das demarcações das Terras Indígenas, a necessidade dos ministros e ministras do Supremo Tribunal Federal (STF) votarem contra a tese política do Marco Temporal, de denunciar as ameaças aos direitos dos povos indígenas dentro do Congresso Nacional e do enfrentamento das violências e do racismo.

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) promoveu, junto com suas organizações de base, mais de 15 ações estratégicas nos primeiros seis meses de 2023. APOINME, ATY GUASU, ARPIN SUDESTE, ARPINSUL, Comissão Guarani Yvyrupa, Conselho do Povo Terena e COIAB, mobilizaram o movimento indígena para ampliar as incidências políticas, jurídicas e de comunicação dentro e fora do Brasil.

Neste balanço, destacamos as principais mobilizações, ações jurídicas e incidências políticas, que envolvem a Apib dentro e fora do Brasil. Colocamos também pontos chaves do “Aldear a Política”, que proporcionou um processo de representatividade política do movimento indígena nos espaços de poder dentro do Governo Lula e em diversos estados.

Mobilizações

Marco Temporal

Iniciamos essa retrospectiva falando da mobilização nacional contra a tese do marco temporal, que está sendo analisada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O julgamento, que pode definir o futuro dos povos indígenas do Brasil e é decisivo para o enfrentamento da crise climática, foi retomado no dia 7 de junho com o voto do ministro Alexandre de Moraes e suspenso mais uma vez após o pedido de vistas do ministro André Mendonça.

Ao longo dos meses de abril e junho, o poder legislativo também se mobilizou para votar a tese do Marco Temporal no Congresso Nacional, através do PL 490. A Apib também acompanhou diretamente a votação e as movimentações políticas após sua aprovação, no dia 30 de maio na Câmara dos Deputados. A Articulação agora segue acompanhando as incidências do projeto que está em análise no Senado com novo número: PL 2903.

A Apib e suas organizações de base promoveram mais de 125 mobilizações, em 21 Estados para dizer #MarcoTemporalNão entre os meses de abril e junho. Ocupamos as redes e mais de 7,5 milhões de pessoas foram alcançadas nas redes sociais, com mais de 19 milhões de impressões, em 696 publicações.

O voto do ministro Alexandre de Moraes abre novas perspectivas de debate e de enfrentamento contra o Marco Temporal. O ministro, mesmo questionando a validade do argumento temporal para a garantia dos direitos dos Povos Indígenas, constrói uma “tese alternativa” que complexifica o acesso aos direitos constitucionais já que iguala o direito patrimonial ao direito originário. Dessa maneira, a estratégia da Apib continua sendo a de contínua e qualificada mobilização de suas bases e articulação com as organizações indígenas, bem como da sensibilização da opinião pública sobre o tema.

A Apib por meio de seu departamento jurídico, fez diversas incidências nos mais diversos âmbitos, damos destaques nessa oportunidade de um ciclo de debates realizados em parceria com a FGV/SP e comissão ARNS, o intuito era mobilizar intelectuais, juristas, lideranças indígenas e cientistas para refletir o impacto do marco temporal na vida dos povos indígenas, mas também na vida de toda humanidade, como fruto desses encontros saiu uma publicação científica que traz a tona os impactos do marco temporal caso aprovado, a publicação pode ser encontrada nas redes da Apib.

Acesse nossa página dedicada ao marco temporal, baixe nossa cartilha e fortaleça essa luta aqui

Acampamento Terra Livre

O Acampamento Terra Livre deste ano reuniu entre os dias 24 e 28 de abril mais de 6 mil indígenas de todos os cantos do Brasil, em Brasília. A 19a edição do nosso acampamento, foi a primeira grande mobilização, na capital federal, após os atos golpistas do dia 8 de janeiro e mais uma vez a Apib e todas as organizações do movimento indígena deram uma lição de luta democrática.

Com o tema “O FUTURO INDÍGENA É HOJE. SEM DEMARCAÇÃO NÃO HÁ DEMOCRACIA”, o movimento indígena decretou EMERGÊNCIA CLIMÁTICA e promoveu alertas e incidências contra os projetos de morte que estão no Congresso Nacional. O novo ciclo de mobilizações contra a tese do marco temporal foi iniciado durante o ATL 2023 e foi no último dia de mobilização que o Governo Federal atendeu uma reivindicação histórica do movimento.

Demarcação Já

Ao fim do ATL 2023, a Apib e suas sete regionais destacaram a demarcação de terras como ação prioritária do movimento indígena e o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, assinou os decretos de homologação de seis Terras Indígenas (TI), sendo elas:

TI Arara do Rio Amônia (AC)
TI Tremembé da Barra do Mundaú (CE)
TI Rio dos Índios (RS)
TI Avá-Canoeiro (GO)
TI Kariri-Xocó (AL)
TI Uneiuxi (AM)

O ato quebrou um jejum de quase cinco anos sem a garantia deste direito fundamental dos povos indígenas. A Apib reconhece as vitórias da mobilização, com o retorno de demarcações de territórios indígenas. Um das TI, Uneiuxi, localizada no estado Amazonas, tem a presença de povos em isolamento voluntário. O processo para sua efetivação já caminhava a passos lentos, há 40 anos. A recriação do Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI) e a criação do Comitê Gestor da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI) somam às conquistas desta edição do Acampamento.

Mulheres Indígenas
Mais de 150 mulheres e lideranças indígenas dos seis biomas do Brasil realizaram a Pré-Marcha das Mulheres Indígenas, em Brasília. O evento é organizado pela Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (ANMIGA), que aconteceu entre os dias 29 de janeiro a 01 de fevereiro.

O encontro foi pensado para o fortalecimento da luta e o protagonismo das mulheres indígenas na defesa dos seus direitos. A representatividade nos espaços institucionais e o debate sobre as incidências no Ministério dos Povos Indígenas, no Congresso Nacional, na Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI) e na Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), fazem parte da programação para buscar a visibilidade das pautas específicas das mulheres.

A terceira Marcha das Mulheres Indígenas será realizada entre os dias 11 e 13 de setembro. Acesse a página da Anmiga e fortaleça a luta das mulheres indígenas aqui

Fórum de Lideranças
Mais de 50 lideranças de todas as regiões do país, que representam as sete organizações regionais de base da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil e compõem o Fórum de Lideranças, estiveram reunidas de 23 a 26 de fevereiro, na Terra Indígena Renascer Ywyty Guaçu, em São Paulo.

Foram quatro dias de atividades de planejamento estratégico para organizar as ações de 2023, olhando o presente e aprendendo com a resistência ancestral dos antepassados. Os desafios do movimento indígena pela garantia de direitos seguem vivos, por isso é necessário estar organizados.

O momento reforçou a proposta de governança indígena da Apib, que quer fortalecer as organizações de base da Apib, ampliar e qualificar a participação e controle social do movimento indígena na construção de políticas públicas.

Retomada do CIMC
Durante a programação do ATL, foi reativado o Comitê Indígena de Mudanças Climáticas (CIMC). O Comitê foi criado em 2015 mas estava paralisado desde o governo Temer, devido à redução ou eliminação dos espaços de participação social no governo federal. O CIMC pretende posicionar o movimento indígena na discussão desse tema a nível nacional e internacional, além de aumentar a interlocução com os governos.

Sinéia do Vale, do povo Wapichana, é referência na temática e está à frente da retomada e da coordenação do CIMC nacional. “A proposta da retomada está sendo construída e debatida com as organizações indígenas, mas a intenção é instituir CIMCs regionais que irão dialogar com o nacional. Agora, a discussão não se restringe mais à Amazônia. Precisamos proteger todos os biomas e territórios”, explica ela.

Internacional
No primeiro semestre de 2023 a Apib mobilizou agendas de denúncia internacional, em conjunto com suas organizações de base, em agendas centrais para os povos indígenas.

Em meio ao cenário a cada ano mais desafiador para reverter o descaminho que afasta a todos da meta mundial de limitar o aquecimento do planeta em 1.5ºC, os povos indígenas foram mais uma vez reconhecidos como lideranças globais para a sonhada transformação que levaria ao alcance das metas do Acordo de Paris, nos discursos de abertura da 9ª reunião do Grupo de Trabalho Facilitador da Plataforma de Comunidades Locais e Povos Indígenas (LCIPP, na sigla em inglês), que tradicionalmente abre as atividades da Conferência do Órgão Subsidiário de Assessoramento Científico e Técnico (SBSTA) da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC), em Bonn, na Alemanha. A atividade aconteceu entre os dias 31 de maio e 3 de junho.

O coordenador executivo da Apib, Dinamam Tuxá, esteve, em Genebra, no final do mês de junho, para denunciar as ameaças do Marco Temporal, durante a 138ª Sessão do Comitê de Direitos Humanos, da Organização das Nações Unidas (ONU). Na sequência, Dinamam realizou agendas de incidência junto ao Parlamento Europeu, em Bruxelas, para mobilizar aliados internacionais contra a proposta do marco temporal e para dialogar sobre a lei Anti Desmatamento do Parlamento Europeu, que viola o direito dos povos indígenas e não reconhece os diversos biomas do Brasil, ameaçados com o desmatamento.

A Apib tem realizado um trabalho de litigância estratégica perante Tribunais Internacionais, nesse sentido a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil tem eleito a Corte Interamericana de Direitos Humanos como um espaço fertil para denunciar as violações de Direitos Humanos que ocorrem no país em desfavor aos povos indígenas, o JUR/APIB atua nas medidas cautelares do povo Pataxó, Guarani Kaowá, Yanomimi, Munduruku e Guajajara. Além disso, o Departamento Jurídico mantém uma comunicação no Tribunal Penal Internacional, que visa condenar Bolsonaro pelo crime de genocio.

Governança, participação e controle social
Em janeiro de 2023, retomamos os trabalhos do GT de Governança Indígena reafirmando seu caráter autônomo. Para além do período de transição governamental e dos 100 primeiros dias do novo Governo Federal, o GT propõe-se a monitorar permanentemente a implementação das políticas públicas para povos indígenas.

Avaliamos que a participação do movimento indígena nas políticas públicas tem se dado de forma reativa, em consequência do cenário de constantes ameaças aos nossos direitos, de intensificação da violência, e de degradação ambiental dos nossos territórios. Assim, esperamos que haja o efetivo comprometimento político para implementação de nossos direitos e que possamos colaborar de forma mais propositiva.

Reconhecemos, portanto, o início de um novo cenário para a política indigenista com a instituição do Ministério dos Povos Indígenas, assim como a nomeação de indígenas para o cargo de presidente da Funai e para a Sesai. Nossa expectativa sobre a presença dos povos indígenas nas instituições de governo, é que possam transformar estes espaços e garantir o fortalecimento de mais uma frente aliada para o avanço na implementação de políticas públicas.

A Apib e suas organizações regionais de base participam dos seguintes espaços de conselhos/comitês como forma de participação e controle social nas políticas voltadas aos povos indígenas:

Gabinete de Crise / Povo Pataxó
Fórum de Presidentes de CONDISI
Conselho Nacional de Meio Ambiente
Comitê Gestor da PNGATI
Conselho Deliberativo do Fundo Nacional de Meio Ambiente
Comitê de Assessoramento do Grupo Gestor do Programa de Aquisição de Alimentos
Conselho Nacional de Política Indigenista
Comitê Gestor do Fundo Clima
Fundo Biomas Indígenas
Composição do Comitê Interministerial de Coordenaçao, Planejamento e Acompanhamento das Ações de Desintrusão de Terras Indígenas
Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA)
Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (Condraf)
Conselho Consultivo Sobre Gestão Pública, Saúde e Mudanças Climáticas – Fiocruz

Violências

O primeiro semestre de 2023 foi marcado pela violência contra os povos indígenas. Uma realidade que impõe o empenho e aprofundamento de ações e políticas de defesa dos nossos povos.

Luta Guarani Kaiowá

Com a violência sistemática contra os povos indígenas Guarani e Kaiowá, em Mato Grosso do Sul (MS), a Apib apresentou no dia 17 de abril uma nova Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) no Supremo Tribunal Federal (STF). A medida é histórica e tem como objetivo combater a violência e as violações de direitos dos povos indígenas no Estado. O protocolo ocorreu após a prisão de dez indígenas dos povos Guarani, Kaiowá e Terena durante a retomada de parte do território ancestral tekoha Yvu Vera, no município de Dourados (MS), que aguarda a demarcação pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).

A taxa de homicídios praticados contra a população indígena no estado de Mato Grosso do Sul é alarmante. De acordo com dados do Atlas da Violência de 2021, em 2019 a taxa contra indígenas era de 44,8 para 100 mil habitantes, representando uma média superior à média geral do Estado de 17,7 e mais que o dobro da média nacional de 21,7.

Em 2022, a Apib denunciou ao menos dois casos de homicídios contra os Guarani e Kaiowá no Mato Grosso do Sul. O primeiro deles foi no dia 24 de junho quando o indígena Vítor Fernandes foi morto na retomada do território ancestral Guapoy, atualmente registrada como uma fazenda. Vítor foi vítima de uma ação violenta da Polícia Militar, que deixou cerca de dez feridos e ficou conhecido como Massacre de Guapoy.
Semanas depois, Márcio Moreira foi assassinado em uma emboscada no dia 14 de julho. Lideranças Guarani Kaiowá apontam que o crime foi uma retaliação contra a ação de retomada e a repercussão do massacre.

Crise Humanitária Yanomami
O ano de 2023 iniciou com uma série de ações, promovidas pelo Governo Federal, para atender às inúmeras solicitações feitas pelas organizações indígenas sobre as violências sofridas pelo povo Yanomami, no estado de Roraima. A morte de mais de 500 crianças, assassinatos, estupros, trafíco de pessoas, aumento do crime organizado dentro da Terra Indígena Yanomami e da destruição de grandes áreas do território causadas pelo garimpo ilegal, faz parte da gestao anti-indígena do governo Bolsonaro.

No dia 26 de janeiro a Apib e Coiab entraram com representaçao criminal na Procuradoria Geral da República (PGR) contra o ex-presidente do Brasil, Bolsonaro, e seus aliados: Marcelo Xavier, ex-presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Damares Alves, ex-ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, e Robson Santos, ex-secretário de saúde indígena da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), para que eles sejam responsabilizados criminalmente pelo genocídio dos Yanomamis, em Roraima.

A representação criminal da Apib também relembra que 21 ofícios com pedidos de ajuda dos Yanomamis foram ignorados por Bolsonaro feitas pela Coiab e pelo Conselho Indígena de Roraima (CIR). No relatório “Yanomami sob ataque”, publicado em 2021, a Hutukara Associação Yanomami e a Associação Wanasseduume Ye’kuana relataram o aumento das doenças decorrentes do garimpo.
Os conflitos seguem na região e a Apib, Coiab, Cir, Hutukara Associação Yanomami, a Associação Wanasseduume Ye’kuana e a Associação URIHI seguem agindo e cobrando ações efetivas do Estado brasileiro contra as violências contra o povo Yanomami.

Luta Pataxó
As violências contra o povo Pataxó, na região sul da Bahia, seguiram intensas nos primeiros meses de 2023. Um processo agravado das violencias nos últimos quatro anos e que levaram ao assassinato de diversos indígenas seguiu no inicio do primeiro semestre. A Apib, Apoinme e diversas organizações indigenistas promoveram denúncias nacionais e internacionais para reverter essa situação e realizaram articulações em instâncias do Governo Federal e Estadual.

Samuel Divino, 25 anos, e Inauí Brito, 16 anos, ambos do povo Pataxó, foram perseguidos e assassinados no dia 17 de janeiro. Este é mais um crime da milícia que tem espalhado o terror entre os indígenas da região. Há meses as comunidades dos Territórios Indígenas de Barra Velha e Comexatibá vem denunciando a atuação dos criminosos, que ameaçam o povo Pataxó diariamente, disparam tiros contra suas casas, impedem a livre circulação no território e matam jovens.

Em setembro de 2022, Gustavo Silva, uma criança de 14 anos, foi executado com um tiro na cabeça pelos mesmos milicianos, no município vizinho, Prado. No dia 27 de dezembro de 2022, a aldeia “Quero Ver”, do povo Pataxó, foi invadida por homens armados e encapuzados que metralharam casas na comunidade.

A TI Barra Velha do Monte Pascoal abrange áreas em quatro municípios do sul da Bahia: Itabela, Itamaraju, Porto Seguro e Prado. A região desperta o interesse não apenas de empresários do setor agropecuário, mas também de empresas do setor de turismo, o que vem desencadeando muita especulação imobiliária. Entenda o histórico da sobreposição de terras AQUI.
Diante desse cenário de violência, a Apib peticionou perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e conseguiu na semana do acampamento terra livre a concessão de Medidas Cautelares para proteção do Povo Pataxó, essa incidência foi articulada por meio do departamento jurídico da Apib com organizações parceiras.

Dossiê
No dia 9 de junho, o Observatório de Justiça Criminal e Povos Indígenas, iniciativa da Apib, lançou o dossiê “Povos Indígenas e Sistema de Justiça Criminal da América Latina”. “O documento joga luz na invisibilidade contra os povos indígenas dentro do sistema de injustiça. Existem diversos mecanismos legais que dão tratamento especial para os parentes e isso é negado, pois o sistema judicial ainda é muito racista. É comum a gente encontrar em decisões judiciais fundamentações como: ‘não é mais indígena porque fala português’ e ‘não é mais indígena porque usa celular’, por exemplo”, diz Maurício Terena, coordenador do departamento jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e integrante do observatório. Confira o dossiê completo aqui

Mina de Sangue

A Apib, por meio do departamento jurídico, denunciou uma série de violações aos direitos dos povos indígenas no projeto de mineração da empresa Belo Sun em Volta Grande do Xingu, no estado do Pará. A análise foi publicada no relatório “Mina de sangue – Relatório sobre o projeto da mineradora Belo Sun”, produzido pela Apib e publicado, no dia 29 de junho.
No relatório, a Apib pontua as omissões, ilegalidades e intimidações por parte da mineradora contra os povos originários Volta Grande do Xingu, no Pará

Educação Indígena e Políticas ameaçadas

A medida provisória (MP) 1154 do governo Lula que reorganiza os ministérios, publicada no Diário Oficial da União no dia 19 de junho, não cita a educação indígena como uma das competências do Ministério da Educação (MEC) e utiliza o termo “educação geral”. Para a Apib, o termo ignora a existência da educação escolar específica, diferenciada, intercultural, bilíngue/multilíngue e comunitária para os povos indígenas, garantida na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e na Constituição Federal de 1988.

Além da educação indígena, a medida retira do MEC atribuições históricas como a educação do campo, de direitos humanos e quilombolas, representando um esvaziamento da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetizada de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão (Secadi) que possui uma diretoria de “Políticas de Educação do Campo, Indígena e para Relações Étnico-raciais”. A pasta foi extinta por Jair Bolsonaro e recriada por Lula.

“A educação indígena é um direito conquistado pelo movimento social. É um absurdo que isso tenha sido ignorado pelo governo, que apresentou o texto ao Congresso Nacional dessa forma”, disse o coordenador executivo da Articulação, Dinamam Tuxá.

No dia 1 de junho, o Senado Federal aprovou a MP 1154 com 51 votos a favor. A MP estava tramitando em regime de urgência no Congresso Nacional e já tinha sido aprovada pela Câmara dos Deputados. Senadores e deputados federais aprovaram o texto-base elaborado pelo deputado Isnaldo Bulhões Jr. (MDB-AL), relator na comissão mista que analisou a MP.

Com a aprovação, o Ministério dos Povos Indígenas deixou de ser responsável pela homologação de terras indígenas, que passa ser competência do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP).

Conquistas

Advocacia Indígena

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou, no dia 20 de junho, a criação de cotas para indígenas nos concursos públicos do Poder Judiciário. A medida estabelece percentual de ao menos 3% das vagas oferecidas nas concorrências e faz parte de uma luta histórica da advocacia indígena.

“Nós do Departamento Jurídico da Apib, fizemos diversas incidências junto aos conselheiros. Encaminhamos memoriais, pedimos audiência, etc… para que o percentual fosse de 5%. A luta continua para que esse percentual aumente. Nunca mais um judiciário sem nós!”, destacou o coordenador jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Maurício Terena.

Outra conquista da advocacia indígena no primeiro semestre, que possui incidência da Apib, foi a instauração, no dia 21 de junho, do Grupo de Trabalho criado para analisar o ‘Estatuto dos Povos Indígenas’ (‘Estatuto do Índio’). O ineditismo dessa ação é a representatividade, pois todo o processo será liderado por juristas indígenas. A reformulação e proposições de mudanças nessa legislação, fundamental para os povos, será analisada por advogadas e advogados indígenas. O GT é coordenado pelo MPI.
Para além, dessas articulações a advocacia indígena tem realizado um trabalho importante sobre

Gestão Territorial

A Apib promoveu, entre os dias 3 e 6 de abril, em Brasília, um seminário que pautou o retorno da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI). A atividade discutiu ferramentas de implementação e controle da PNGATI e mecanismos de financiamento, além de participar de plenárias e grupos de trabalho onde foi organizado um documento com propostas para o próximo ano da política.

“Este momento é muito importante para os povos indígenas, pois marca o retorno do debate sobre gestão territorial e ambiental de Terras Indígenas longe do desgoverno Bolsonaro. Estamos unindo forças para combater tudo o que foi negligenciado pelo Estado Brasileiro nos últimos quatro anos e construir o futuro indígena a partir da demarcação dos territórios e da garantia dos direitos ancestrais”, afirmou Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib.

A PNGATI é uma política pública vinculada à Funai e criada por decreto presidencial em 2012. Ela é a primeira política indigenista construída de modo participativo e representa um avanço na gestão autônoma e sustentável dos territórios indígenas no Brasil. Paralisada desde 2018, na gestão Bolsonaro. No dia 3 de julho, a Ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, anunciou a volta do Comitê Gestor da PNGATI, que foi instituída via decreto, assinado em 28 de abril deste ano, durante o encerramento do ATL 2023, pelo presidente Lula.