Apib entra com representação no MPF contra deputada da Frente Parlamentar da Agropecuária por crimes de ameaça, incitação à violência e racismo

Apib entra com representação no MPF contra deputada da Frente Parlamentar da Agropecuária por crimes de ameaça, incitação à violência e racismo

Caroline de Toni é coordenadora jurídica da FPA e prometeu mais violência caso o PL 2903, que quer transformar marco temporal em lei e legaliza outros crimes contra os povos indígenas, não se torne lei.

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), entrou com uma representação no Ministério Público Federal (MPF) contra a deputada federal e coordenadora jurídica da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), Caroline de Toni (PL-SC), que prometeu um “banho de sangue” caso o Marco Temporal não seja transformado em lei, através do PL2903.

A fala racista da deputada promove discurso de ódio para ampliar ainda mais a violência contra os povos indígenas. A deputada fez a declaração durante coletiva de imprensa na última quarta-feira (27) no processo de votação do PL 2903, que tenta transformar em Lei o Marco Temporal e legalizar crimes contra povos indígenas.

No mesmo dia da fala da deputada, a aldeia Barra Velha, do povo Pataxó, no município de Porto Seguro, na Bahia, foi atacada com mais de 100 tiros e nos dias seguintes foram registradas outras violências. No dia 18 de setembro, Sebastiana e Rufino, casal de rezadores do povo Guarani e Kaiowá, foram queimados vivos e encontrados mortos, em meio às cinzas da casa onde moravam, em Mato Grosso do Sul. No Amapá, uma adolescente de 15 anos do povo Karipuna, foi estuprada e morta, no dia 17 de setembro.

A Apib denuncia as violências cometidas contra os povos indígenas e exige um BASTA nessa violência. É preciso acabar com o derramamento de sangue indígena e a fala da deputada apenas reforça todas as violências cometidas diariamente contra nossos povos.

Acesse a representação completa aqui

Senado Genocida
Logo após a declaração da deputada, que pede “banho de sangue”, o Senado Federal aprovou na tarde do dia 27 o Projeto de Lei 2903 intitulado pela Apib como PL do Genocídio. A atitude dos parlamentares representa um tensionamento e uma afronta ao Supremo Tribunal Federal que julgou e decidiu por maioria de 9×2 anular o Marco Temporal.

O PL 2903 agora é analisado pelo presidente Lula, que tem 15 dias úteis para sancionar ou vetar (total ou parcialmente) o projeto. A Apib exige o veto total do projeto e cobra compromisso de Lula para respeitar e garantir os direitos dos povos indígenas.

A Apib ressalta ainda que as atitudes da deputada e da FPA são resultados da ligação direta de políticos brasileiros à invasão de terras indígenas, como mostra o dossiê “Os invasores” do site jornalístico “De olho nos ruralistas”. De acordo com o estudo, representantes do Congresso Nacional e do Executivo, possuem cerca de 96 mil hectares de terras sobrepostas às terras indígenas. Além disso, muitos deles foram financiados por fazendeiros invasores de TIs, que doaram R$ 3,6 milhões para campanha eleitoral de ruralistas. Esse grupo de invasores bancou 29 campanhas políticas em 2022, totalizando R$ 5.313.843,44. Desse total, R$ 1.163.385,00 foi destinado ao candidato derrotado, Jair Bolsonaro (PL).

O Marco Temporal é uma tese política, patrocinada pelo Agronegócio. Os ruralistas querem mudar os processos de demarcação e determinar que só têm direito aos territórios tradicionais os povos que comprovarem que viviam nesses locais no período da aprovação da constituição, 1988. Uma medida que ignora o extermínio e expulsão de milhões de indígenas de suas terras ao longo da história.

Além do Marco Temporal, o PL 2903 pretende legalizar crimes cometidos contra os povos indígenas e por isso é considerado o PL do Genocídio. A Apib evidência sete pontos que podem ampliar as violências e que precisam ser vetados por Lula:

1) o PL 2903 quer definir critérios racistas de quem é ou não indígena;
2) quer autorizar a construção de rodovias, hidrelétricas e outras obras em Terras Indígenas, sem consulta prévia, livre e informada;
3) o PL quer permitir a plantação de soja, criação de gado, promoção de garimpo e mineração em Terras Indígenas;
4) propõe que qualquer pessoa questione os processos de demarcação dos territórios, inclusive os já demarcados;
5) busca reconhecer a legitimidade da posse de terra de invasores de Terras Indígenas;
6) quer flexibilizar a política de não-contato com povos indígenas em isolamento voluntário; 7) quer mudar conceitos constitucionais da política indigenista como: a tradicionalidade da ocupação, o direito originário e o usufruto exclusivo dos povos indígenas aos seus territórios.

Senado aprova PL do Marco Temporal, Apib cobra veto de Lula e STF encerra Julgamento

Senado aprova PL do Marco Temporal, Apib cobra veto de Lula e STF encerra Julgamento

Foto: Tukumã Pataxó/Apib

Em dia marcado pela afronta do Senado aos direitos indígenas e a constituição, Apib cobra veto de Lula ao PL 2903, aprovado nesta quarta-feira (27). STF encerra julgamento e anula Marco Temporal, mas define critérios prejudiciais aos povos indígenas. 

Por 43 votos a 21, o Senado Federal aprovou na tarde desta quarta-feira (27) o Projeto de Lei 2903 intitulado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) como PL do Genocídio. A proposta transforma o Marco Temporal em lei e legaliza crimes contra os povos indígenas. A movimentação, organizada pela bancada ruralista, foi feita a toque de caixa e aprovou em poucas horas a proposta na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e no plenário do Senado. A Apib agora cobra veto de Lula ao projeto, que possui 15 dias úteis para se manifestar. 

“O Senado quer perpetuar o genocídio indígena. Esse projeto de lei legaliza crimes que ameaçam as vidas indígenas e afetam a crise climática. O PL é inconstitucional e o Supremo já anulou o Marco Temporal, mas o projeto possui muitos outros retrocessos aos direitos indígenas para além do Marco. Seguimos na luta e cobramos para que o Lula vete esse projeto e concretize seu compromisso com os povos indígenas”, enfatiza Kleber Karipuna coordenador executivo da Apib

A votação do Senado aconteceu no mesmo dia que o Supremo Tribunal Federal (STF) encerrou o julgamento da tese do Marco Temporal. Os ministros e ministras do Supremo decidiram anular a tese ruralista, no dia 21/09, quando o Tribunal formou maioria de 9×2 contra o Marco Temporal. Na tarde desta quarta-feira (27), o STF retomou a sessão para finalizar o julgamento e analisar as propostas sobre indenização e exploração de Terras Indígenas. 

O STF definiu critérios considerados pela Apib como prejudiciais aos povos indígenas no contexto da indenização para demarcações. A decisão do Supremo fixou critérios para casos de indenização pela terra nua e indenizações prévias, o que pode premiar invasores de Terras Indígenas e inviabilizar economicamente os processos de demarcação. O Ministro Dias Toffoli que havia apresentado critérios referentes à mineração retirou do seu voto este tema. 

“Mais um dia marcado pelas violações dos direitos dos povos indígenas brasileiros. O marco temporal foi anulado no STF, mas a tese fixada possui diversos critérios perigosos para nós, como as indenizações que podem travar ainda mais as demarcações no país. E enquanto o Congresso tenta travar um cabo de guerra com o STF, seguimos na emergência contra as invasões de terras indígenas e o genocídio dos povos”, afirma Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib.

Senado Genocida 

No dia 23 de agosto, a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) do Senado aprovou o texto e na tarde desta quarta-feira a CCJ votou e encaminhou o projeto para o plenário. Além do marco temporal, o PL 2903 (antigo PL 490) possui outros retrocessos para os direitos dos povos indígenas, que foram ignorados pelas comissões.  

O projeto, além do Marco Temporal, propõe a construção de rodovias e hidrelétricas em territórios indígenas sem consulta livre, prévia e informada das comunidades afetadas e quer permitir que fazendeiros assinem contratos de produção com indígenas, o que viola o direito dos povos originários ao usufruto exclusivo dos territórios demarcados.

A proposta aprovada pelo Senado também autoriza qualquer pessoa a questionar o processo demarcatório, inclusive de terras indígenas já demarcadas e favorece a grilagem de terras, pois reconhece títulos de terras que estão sob áreas de ocupação tradicional. Ele também ressuscita o regime de tutela e assimilacionismo, padrões superados pela Constituição de 1988, que negam a identidade dos indígenas e flexibiliza a política indigenista de não contato com povos em isolamento voluntário, além de reformular conceitos constitucionais como a tradicionalidade da ocupação, direito originário e usufruto exclusivo.

Além disso, após a derrubada do marco temporal no STF, o senador Dr.Hiran (PP-RR) protocolou, no dia 22 de setembro, uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que pede a instituição do marco temporal. Nomeada como PEC 048/2023, a emenda quer alterar a Constituição Federal de 1988 que prevê o direito originário dos povos indígenas sobre terras tradicionalmente ocupadas. 

“O Supremo enterrou o Marco Temporal e o Senado tenta ressuscitar a tese com essa PEC 48. É uma movimentação que afronta a Constituição Federal e a democracia do Brasil. Os ruralistas tentam fazer dos direitos uma disputa em um cabo de guerra com o Supremo para tentar mostrar quem tem mais força. Seguiremos reforçando que direitos não se negociam e que as vidas indígenas não podem seguir sendo massacradas pelos interesses econômicos e políticos de quem quer que seja”, ressaltou Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib. 

A Apib ressalta que as atitudes do Senado são resultados da ligação direta de políticos brasileiros à invasão de terras indígenas, como mostra o dossiê “Os invasores” do site jornalístico “De olho nos ruralistas”.  De acordo com o estudo, representantes do Congresso Nacional e do Executivo, possuem cerca de 96 mil hectares de terras sobrepostas às terras indígenas. Além disso, muitos deles foram financiados por fazendeiros invasores de TIs, que doaram R$ 3,6 milhões para campanha eleitoral de ruralistas. Esse grupo de invasores bancou 29 campanhas políticas em 2022, totalizando R$ 5.313.843,44. Desse total, R$ 1.163.385,00 foi destinado ao candidato derrotado, Jair Bolsonaro (PL). 

Pontos do Julgamento

Com o fim do julgamento do Marco Temporal, o STF fixou 13 pontos na decisão final que além de confirmar a inconstitucionalidade do Marco Temporal coloca pontos referentes à indenização que vai estabelecer novos critérios no processo de demarcação de Terras Indígenas. 

Confira os 13 pontos:  

1- A demarcação consiste em procedimento declaratório do direito originário territorial da posse das terras ocupadas tradicionalmente comunidade indígena.

2 – A posse tradicional indígena é distinta da posse civil, consistindo na ocupação das terras habitadas em caráter permanente pelos indígenas, das utilizadas para suas atividades produtivas, das imprescindíveis para a preservação dos recursos ambientais necessários ao seu bem-estar e das necessárias às sua reprodução física e cultural, segundo os seus usos, costumes e tradições, nos termos do Parágrafo primeiro do Artigo 231 do texto constitucional.

3 – A proteção constitucional aos direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam independe da existência de um marco temporal em 5 de outubro de 1988 ou da configuração do renitente esbulho, como conflito físico ou controvérsia judicial persistente, à data da promulgação da Constituição

4 – Existindo ocupação tradicional indígena ou renitente esbulho contemporâneo à promulgação da Constituição Federal, aplica-se o regime indenizatório relativo às benfeitorias úteis e necessárias previsto no Artigo 231, Parágrafo 6º da Constituição federal de 1988.

5 – Ausente a ocupação tradicional indígena, ao tempo da promulgação da Constituição Federal, ou renitente esbulho na data da promulgação da Constituição Federal, são válidos e eficazes, produzindo todos os seus efeitos, os atos e negócios jurídicos perfeitos e a coisa julgada, relativos a justo título ou posse de boa-fé das terras de ocupação tradicional indígena, assistindo ao particular o direito à indenização prévia das benfeitorias necessárias e úteis pela União, e quando inviável o reassentamento dos particulares caberá a eles indenização pela União com direito de regresso em face do ente federativo que titulou a área correspondente ao valor da terra nua paga em dinheiro ou em título da dívida agrária, se for do interesse do beneficiário, e processada em autos apartados do procedimento de demarcação, com pagamento imediato da parte incontroversa e direito de retenção se não houver o depósito do valor incontroverso.

6 – Descabe indenização em casos já pacificados, decorrentes de Terras Indígenas já reconhecidas e declaradas em procedimento demarcatório, ressalvados os casos judicializados em andamento.

7 – É dever da União efetivar o procedimento demarcatório das Terras Indígenas, sendo admitida a formação de áreas reservadas somente diante da absoluta impossibilidade de concretização da ordem constitucional de demarcação, devendo ser ouvida em todo caso a comunidade indígena, buscando-se se necessário a autocomposição entre os respectivos entes federativos para a formação das áreas reservadas, tendo sempre em vista a busca do interesse público e a paz social, bem como a proporcional compensação às comunidades indígenas.

8 – O procedimento de redimensionamento de Terra Indígena não é vedado, em caso de descumprimento dos elementos contidos no Artigo 231 da Constituição da República, por meio de instauração de procedimento demarcatório, até o prazo de cinco anos da demarcação anterior, sendo necessário comprovar grave e insanável erro na condução do procedimento administrativo ou na definição dos limites da Terra Indígena, ressalvadas as ações judiciais em curso e os pedidos de revisão já instaurados até a data de conclusão deste julgamento.

9 – O laudo antropológico, realizado por meio do Decreto 1.775/1996, é um dos elementos fundamentais para a demonstração da tradicionalidade da ocupação de comunidade indígena determinada, de acordo com os seus usos, costumes e tradições e na forma do decreto.

10 – As terras de ocupação tradicional indígena são de posse permanente da comunidade, cabendo aos indígenas o usufruto exclusivo das riquezas do solo, do e lagos nela existentes.

11 – As terras de ocupação tradicional indígena, na qualidade de terras públicas, são inalienáveis, indisponíveis e os direitos sobre elas imprescritíveis.

12 – A ocupação tradicional das terras indígenas é compatível com a tutela do meio ambiente, sendo assegurado o exercício das atividades tradicionais povos indígenas.

13 – Os povos indígenas possuem capacidade civil e postulatória, sendo partes legítimas nos processos em que discutisse os interesses sem prejuízo nos termos da lei, da legitimidade com da Funai e da intervenção do Ministério Público como fiscal da lei.

STF acaba de decidir que vai julgar sobre as teses que definem temas referentes a indenizações para demarcação e exploração de Terras Indígenas  

 

 

Como o voto do ministro Dias Toffoli pode flexibilizar a mineração em Terras Indígenas

Como o voto do ministro Dias Toffoli pode flexibilizar a mineração em Terras Indígenas

Em seu voto, o ministro apresentou a possibilidade de aproveitar recursos hídricos, orgânicos e minerais de Terras Indígenas, o preocupa o movimento indígena

No dia 20 de setembro, o julgamento do marco temporal foi pautado no Supremo Tribunal Federal (STF) e o ministro Dias Toffoli votou contra a tese anti-indígena, formando maioria para que o marco temporal fosse anulado no judiciário brasileiro. No entanto, em seu voto o ministro apresentou a possibilidade de aproveitar recursos hídricos, orgânicos e minerais de Terras Indígenas, no qual o Congresso Nacional teria 12 meses para legislar sobre o tema. A proposta preocupa o movimento indígena. 

Toffoli justifica a proposta sob argumento de que o tema sofre com uma suposta omissão legal e prejudica o desenvolvimento econômico do país. O mesmo argumento foi utilizado para aprovar o regime de urgência na tramitação do PL 191/2020, no início de 2022, pelo governo bolsonarista.

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) alerta que a proposta representa mais uma violação aos direitos indígenas, pois flexibiliza o usufruto exclusivo dos povos e coloca as vidas indígenas nas mãos da bancada ruralista do legislativo. A organização ressalta também que a proposta foge do tema discutido no julgamento do STF e não prevê a participação dos povos indígenas no processo.

“[…] o ministro parece ignorar a realidade enfrentada pelos Povos Indígenas. Se o Tribunal tem autonomia para não se pautar pela situação política do país, os Povos Originários não podem ignorar que o Ministro propõe que seja o atual Congresso Nacional a decidir sobre o futuro de suas Terras, no exíguo prazo de 12 meses. Este Congresso Nacional, composto por ruralistas e ex-ministros do Governo Bolsonaro diretamente envolvidos na implementação da supramencionada política anti-indígena, essa sim, responsável pelo crescimento da invasão e da exploração ilegal de Terras Indígenas. A mesma Câmara dos Deputados que aprovou o PL 490/07 por 283 votos e o mesmo Senado Federal que aprovou o PL 2903/2023 na Comissão de Reforma Agrária e Agricultura, e agora se recusa a realizar Audiência Pública na Comissão de Constituição, Cidadania e Justiça”, diz trecho da manifestação da Apib, por meio do seu departamento jurídico. Leia o parecer completo aqui

Denúncias na TI Yanomami

A destruição da mineração e os perigos da proposta já podem ser vistos na Terra Indígena Yanomami. Dados do Mapbiomas indicam que a partir de 2016 a curva de destruição do garimpo na TI assumiu uma trajetória ascendente e, desde então, tem acumulado taxas cada vez maiores. Nos cálculos da plataforma, entre os anos de 2016 a 2020 o garimpo no território Yanomami cresceu 3350%.

Além disso, o documento “Yamaki ni ohotai xoa! = Nós ainda estamos sofrendo”, da Hutukara Associação Yanomami, Associação Wanasseduume Ye’kwana e Urihi Associação Yanomami, que avalia os seis meses após o início das operações emergenciais do governo federal na TI, também expõe o aumento de doenças e mortes na TI com a mineração desenfreada.

O relatório denuncia os conflitos entre as comunidades, a cooptação de jovens para o crime organizado, o enfraquecimento da agricultura familiar, além da dizimação gradativa do povo Yanomami, uma vez que o mercúrio tem limitado a capacidade reprodutiva das mulheres indígenas.

Outra denúncia feita pelas organizações indígenas no relatório é a morosidade, ineficiência e inação de militares no âmbito das operações de ajuda humanitária no território Yanomami. Segundo elas, os órgãos federais estariam descumprindo as determinações do STF e mesmo com a realização de algumas operações o garimpo na Terra Indígena Yanomami teria crescido 4% de janeiro a junho deste ano.

“O garimpo trouxe fome, malária e morte para os Yanomami. Com esse impacto no meio ambiente vai demorar bastante para se recuperar. Tem buraco igual na Serra Pelada. Vi um no Homoxi e sofri bastante, estamos sangrando, uma cicatriz recente e que vai demorar aproximadamente 30 a 50 anos para floresta crescer, isso se o Estado nos acompanhar, continuar a fiscalização e a Funai acordar e nos proteger e defender como manda a Constituição Federal”, diz Junior Hekurari no documento.

No dia 25 de setembro, o ministro do STF Luís Roberto Barroso atendeu uma solicitação da Apib e determinou que a União informe sobre o andamento das medidas de proteção ao povo Yanomami. O pedido da Apib foi feito ao Tribunal dentro da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 709 com base no relatório das organizações Yanomami. 

Acesse a petição da Apib e decisão do ministro abaixo

Petição: https://apiboficial.org/files/2023/09/Pet.-APIB.-Militares-TIY.docx.pdf 

Decisão: https://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADPF7092578decisao_monocratica.pdf

ONU comemora decisão do STF sobre marco temporal, mas alerta para projetos de lei no Congresso

ONU comemora decisão do STF sobre marco temporal, mas alerta para projetos de lei no Congresso

Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil

A entidade expressou preocupação com projetos de lei que possam violar os direitos das populações indígenas

No dia 26 de setembro, o Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos elogiou o Supremo Tribunal Federal (STF) que, no dia 21 de setembro, formou maioria para anular a tese do marco temporal. No entanto, a ONU expressou preocupação de que a proteção oferecida pelo sistema judiciário não seja suficiente. Eles manifestaram apreensão quanto à possibilidade de que projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional – como o PL 2903 – possam violar os direitos das populações indígenas.

A mensagem da ONU para os legisladores é a mesma transmitida ao STF: “Não deve haver limitações na demarcação de terras”. A organização descreveu a decisão do STF como “altamente encorajadora” e destacou como uma decisão contrária teria perpetuado injustiças históricas.

Em agosto, a ONU publicou um comunicado reforçando o seu posicionamento contra o marco temporal e manifestando preocupação com “quaisquer ações que possam enfraquecer ou relativizar a proteção dos direitos dos Povos Indígenas no Brasil e na região”. A medida é resultado de incidências da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) em conjunto com outras organizações e lideranças do movimento indígena. 

Marco temporal no STF 

Em sessão histórica no dia 21 de setembro, os ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Rosa Weber do STF votaram contra o marco temporal e formaram maioria de votos para a derrubada da tese no Judiciário. A tese foi anulada com 9 votos contra e 2 a favor. 

“Nós saímos vitoriosos sim da tese do Marco Temporal mas ainda há muita luta a ser feita para afastar todas as ameaças que também estão tramitando no Senado Federal que é através do PL 2903. Seguimos mobilizados, seguimos lutando, pois a luta irá continuar para garantia e proteção dos direitos dos Povos Indígenas”, afirma Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib, depois da finalização da sessão de votação no STF do dia 21 de setembro em Brasília. 

O julgamento deve ser retomado no dia 27 para debater sobre as propostas levantadas por Moraes e Toffoli no que refere à indenização prévia para invasores de TIs e o aproveitamento de recursos em TIs, o que preocupa o movimento indígena. A votação no Senado, defendida pela bancada ruralista para começar no dia 20 de setembro, foi adiada também para 27 de setembro.

*Com informações da coluna do Jamil Chade, UOL

Senado vota PL 2903 no mesmo dia que o STF retoma julgamento do marco temporal para tratar sobre indenização e exploração de Terras Indígenas

Senado vota PL 2903 no mesmo dia que o STF retoma julgamento do marco temporal para tratar sobre indenização e exploração de Terras Indígenas

Foto: Tukumã Pataxó

A votação na CCJ irá ocorrer a partir das 10h, pouco antes do retorno do julgamento do marco temporal, no Supremo, previsto para iniciar às 14h.

Mais uma vez o Senado tenta atropelar os direitos dos povos indígenas ao pautar o Projeto de Lei 2903, que tenta transformar o marco temporal em lei e busca legalizar crimes contra indígenas. A  Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado vota, nesta quarta-feira (27), a partir das 10h (horário de Brasília), o PL, que foi nomeado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), como PL do Genocídio.

O projeto vai ser apreciado no mesmo dia que o Supremo Tribunal Federal (STF) retoma o julgamento do Marco Temporal, previsto para iniciar às 14h. Os ministros e ministras irão debater as propostas sobre indenização, mineração e permuta de Terras Indígenas que surgiram nas sessões ao longo do julgamento. 

Em sessão histórica na última quinta-feira (21/09), o STF formou maioria de votos para a derrubada da tese patrocinada pelo agronegócio, no Judiciário. Com votação de 9×2 contrários ao Marco Temporal, o Tribunal formou maioria e selou uma importante vitória na luta por direitos dos povos indígenas, mas as propostas apresentadas pelos ministros Alexandre de Moraes e Dias Toffoli serão discutidas somente nesta quarta-feira, dia 27. Saiba como foi a votação no STF aqui

No Senado a votação estava prevista para o dia 20 de setembro, mas a sessão foi marcada pela falta de diálogo. Lideranças foram impedidas de entrar no local e a CCJ rejeitou o pedido de audiência pública. Após pedido de vistas coletivo dos senadores, a votação foi adiada também para o dia 27 de setembro. 

Para a Apib, a decisão do Senado é uma afronta ao Supremo, ao movimento indígena e à democracia. “O marco temporal foi derrubado no Supremo, mas a luta continua. A bancada ruralista do Senado está colocando seus interesses econômicos à frente das vidas indígenas e tentando aprovar o PL 2903 antes da finalização do julgamento do marco temporal no Supremo”, afirma Kleber Karipuna, coordenador executivo da Apib.

Além disso, após a derrubada do marco temporal no STF, o senador Dr.Hiran (PP-RR) protocolou, no dia 22 de setembro, uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que pede a instituição do marco temporal. Nomeada como PEC 048/2023, a emenda quer alterar a Constituição Federal de 1988 que prevê o direito originário dos povos indígenas sobre terras tradicionalmente ocupadas. 

“O Supremo enterrou o Marco Temporal e o Senado tenta ressuscitar a tese com essa PEC 48. É uma movimentação que afronta a Constituição Federal e a democracia do Brasil. Os ruralistas tentam fazer dos direitos uma disputa em um cabo de guerra com o Supremo para tentar mostrar quem tem mais força. Seguiremos reforçando que direitos não se negociam e que as vidas indígenas não podem seguir sendo massacradas pelos interesses econômicos e políticos de quem quer que seja”, ressaltou Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib. 

A Apib ressalta que as atitudes do Senado são resultados da ligação direta de políticos brasileiros à invasão de terras indígenas, como mostra o dossiê “Os invasores” do site jornalístico “De olho nos ruralistas”.  De acordo com o estudo, representantes do Congresso Nacional e do Executivo, possuem cerca de 96 mil hectares de terras sobrepostas às terras indígenas. Além disso, muitos deles foram financiados por fazendeiros invasores de TIs, que doaram R$ 3,6 milhões para campanha eleitoral de ruralistas. Esse grupo de invasores bancou 29 campanhas políticas em 2022, totalizando R$ 5.313.843,44. Desse total, R$ 1.163.385,00 foi destinado ao candidato derrotado, Jair Bolsonaro (PL). 

Entenda o PL 2903

No dia 23 de agosto, a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) do Senado aprovou o texto, que agora é analisado pela CCJ. Além do marco temporal, o PL 2903 (antigo PL 490) possui outros retrocessos para os direitos dos povos indígenas, aponta o departamento jurídico da Apib. 

Segundo o jurídico, o PL propõe a construção de rodovias e hidrelétricas em territórios indígenas sem consulta livre, prévia e informada das comunidades afetadas e quer permitir que fazendeiros assinem contratos de produção com indígenas, o que viola o direito dos povos originários ao usufruto exclusivo dos territórios demarcados.

O Projeto de Lei também autoriza qualquer pessoa a questionar o processo demarcatório, inclusive de terras indígenas já demarcadas e favorece a grilagem de terras, pois reconhece títulos de terras que estão sob áreas de ocupação tradicional. Ele também ressuscita o regime do tutela e assimilacionismo, padrões superados pela Constituição de 1988, que negam a identidade dos indígenas e flexibiliza a política indigenista de não contato com povos em isolamento voluntário, além de reformular conceitos constitucionais como a tradicionalidade da ocupação, direito originário e usufruto exclusivo.

Saiba mais sobre a tese que pode definir o futuro dos povos indígenas na cartilha e no site: https://apiboficial.org/marco-temporal/ 

“A volta dos mortos vivos”: STF enterra tese do Marco Temporal e Senado tenta ressuscitar o Marco da Morte com a PEC 48/2023

“A volta dos mortos vivos”: STF enterra tese do Marco Temporal e Senado tenta ressuscitar o Marco da Morte com a PEC 48/2023

Ilustração: Apib

Na última quinta-feira (21) o Supremo Tribunal Federal (STF)  julgou sobre a tese do Marco Temporal. Com 9 votos contra e 2 votos a favor, a maioria dos Ministros decidiu por anular a tese ruralista. Mas o julgamento ainda continua no âmbito da RE do povo Xokleng que trata do processo de reconhecimento do território Laklãno Xockleng localizado em Ibirama, em Santa Catarina.

No mesmo dia, algumas horas após o STF ter enterrado o Marco Temporal, o Senado protocolou a Proposta de Emenda Constitucional 48 (PEC 48/2023) que prevê a alteração do inciso 1º do artigo 231 da Constituição Federal de 1988, numa tentativa de ‘desenterrar’ e constitucionalizar o Marco Temporal.

Vivemos um momento de vitória no sentido de ter conseguido enterrar a tese do Marco Temporal junto ao STF, embora tenham surgido outras teses que ameaçam nossos direitos, como a indenização prévia, indenização de terra nua entre outras. Apesar da vitória parcial, ainda é momento de continuarmos mobilizados na luta contra o Marco Temporal, agora no âmbito da PEC 48, além das demais ameaças contra nossos direitos.

Nossa luta é por nossos territórios, por nossas vidas, por todos e todas que vieram antes de nós e por todos e todas que ainda estão por vir.

Movimento indígena promove 300 mobilizações contra o marco temporal em todo o Brasil

Movimento indígena promove 300 mobilizações contra o marco temporal em todo o Brasil

Foto: @kamikiakisedje 

A maior parte das mobilizações ocorreram nos estados do Amazonas, Mato Grosso e Pará 

Cerca de 300 mobilizações contra o marco temporal foram realizadas pelo movimento indígena em 2023. As mobilizações ocorreram entre maio e setembro e foram convocadas e mapeadas pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e suas sete organizações regionais de base.

As manifestações reivindicavam a queda da tese no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Congresso Nacional, presentes respectivamente no Recurso Extraordinário n.º 1.017.365 e no PL 2903. Após dois anos de luta, os ministros do STF formaram maioria contra a tese no último dia 21 de setembro. Confira o histórico do marco temporal aqui.

Com o tema “Pela justiça climática, pelo futuro do planeta, pelas vidas indígenas, pela democracia, pelo direito originário/ancestral, pelo fim do genocídio, pelo direito à vida, por demarcação já: Não ao Marco Temporal!”, as mobilizações ocorreram em 24 estados brasileiros, além do Distrito Federal. A maior parte delas aconteceram no Amazonas (Estado com maior presença indígena, segundo o Censo 2022) e no Mato Grosso, com 24 mobilizações cada, seguido do Pará com 19 atividades. 

Entre as mobilizações, dois acampamentos foram feitos na cidade de Brasília (DF). O primeiro deles no mês de junho, onde 2 mil indígenas acamparam na Praça da Cidadania para acompanhar a primeira sessão do julgamento deste ano. Já o segundo acampamento ocorreu no Memorial dos Povos Indígenas com a presença de mais de 600 lideranças. 

“A queda do marco temporal é resultado das mobilizações e articulações que fizemos nos últimos meses e anos. Ocupamos não só Brasília, mas diversas cidades, territórios e perfis nas redes sociais com as nossas mensagens”, afirma Kleber Karipuna, coordenador executivo da Apib. 

A luta continua 

Em sessão histórica e com o placar de 9×2, o marco temporal foi derrubado no Supremo mas a discussão será retomada na próxima quarta-feira, 27 de setembro. O julgamento será retomado para debater sobre as propostas levantadas pelos ministros Alexandra de Moraes e Dias Toffoli no que refere à indenização prévia para invasores de terras indígenas e o aproveitamento de recursos em TIs.

A Apib comemora o respeito aos direitos indígenas no STF, mas alerta que a luta continua. Mesmo fora da legalidade, diversas terras indígenas estão sendo invadidas e a violência tornou-se constante. “É uma vitória para os povos indígenas, pois há anos nós estamos lutando para afastar essa tese que, de certa forma, estava paralisando os processos de demarcação no Brasil. No entanto, tem alguns pontos importantes a serem observados, porque os votos de Toffoli e Moraes trouxeram elementos bastantes perigosos para nós”, defende Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib. 

No Senado, a tese do marco temporal está presente no Projeto de Lei 2903 que, atualmente, encontra-se na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Em uma queda de braço com o Supremo, a bancada ruralista pressionou para que o PL fosse votado no dia 20, mas o dia foi marcado pela falta de diálogo: lideranças foram impedidas de entrar no Senado e a Comissão rejeitou pedido de audiência pública. A votação foi adiada para o dia 27 de setembro após pedido de vistas coletivo dos senadores.

Saiba mais sobre a tese que pode definir o futuro dos povos indígenas na cartilha e no site: https://apiboficial.org/marco-temporal/ 

Ministro Barroso atende pedido da Apib e pede informações à União sobre medidas de proteção aos Yanomami

Ministro Barroso atende pedido da Apib e pede informações à União sobre medidas de proteção aos Yanomami

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso atendeu uma solicitação da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e determinou que a União informe sobre o andamento das medidas de proteção ao povo Yanomami. O pedido da Apib foi feito ao Tribunal dentro da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 709 com base no relatório “nós ainda estamos sofrendo” feito pela Hutukara Associação Yanomami (HAY), pela Associação Wanasseduume Ye’kwana (SEDUUME) e pela Urihi Associação Yanomami.

As organizações indígenas denunciaram a morosidade, ineficiência e inação de militares no âmbito das operações de ajuda humanitária no território Yanomami. Segundo as entidades, os órgãos federais estariam descumprindo as determinações do STF e mesmo com a realização de algumas operações o garimpo na Terra Indígena Yanomami teria crescido 4% de janeiro a junho deste ano.

Entre outros pontos, afirma que os alertas de garimpo na TI Yanomami foram interrompidos e que o espaço aéreo na região ficou fechado por apenas seis dias, dificultando o combate à mineração ilegal. Também sustenta que as cestas alimentares destinadas à ajuda humanitária não estão sendo entregues ou entregues com demora, provocando perda de alimentos.

Acesse a petição da Apib aqui

Acesse relatório completo das organizações Yanomami aqui 

De acordo com o relatório, o contingente de profissionais, materiais e infraestrutura para o combate à malária é insuficiente e que falta articulação entre diferentes órgãos, entidades e ministérios. Relata, ainda, o agravamento da crise sanitária em algumas comunidades, com aumento de incidência de malária em até 11 vezes em alguns locais, se comparado com o mesmo período do ano anterior.

A decisão do ministro Barroso pede que a União se manifeste detalhadamente sobre o pedido da Apib, por cada um dos órgãos que atuam na área, a respeito das falhas de coordenação nas operações de logística, desintrusão e proteção à saúde dos povos indígenas Yanomami.

Acesse a decisão completa do ministro Barroso aqui 

Indenizar fazendeiros invasores vai custar mais de 1 bilhão e pode tornar demarcações inviáveis

Indenizar fazendeiros invasores vai custar mais de 1 bilhão e pode tornar demarcações inviáveis

A proposta de indenização sobre a terra nua pode bloquear as demarcações por falta de orçamento nos governos, além de ser um prêmio a grileiros invasores de terra indígena

A vitória da força do movimento indígena marcou esta quarta-feira, 21/09. No dia da árvore, o Supremo Tribunal Federal compreendeu as reivindicações dos povos originários do Brasil e derrubou o marco temporal, com nove votos contrários e dois favoráveis à tese. No entanto, durante o debate as teorias apresentadas pelos ministros deixaram diversas questões pendentes. Elas serão abordadas pela suprema corte nesta semana. Entre elas, a que mais preocupa a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil é a questão da indenização prévia sobre a “terra nua”, apresentada inicialmente pelo ministro Alexandre de Moraes e posteriormente pelo ministro Cristiano Zanin.
Segundo os juristas, pessoas que tenham tomado posse de terras indígenas de “boa fé” teriam o direito a indenizações sobre a terra que ocupam. A lei atual já prevê a indenização pelas benfeitorias e o reassentamento de pequenos agricultores, através do INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).

As teses de Moraes e Zanin, no entanto, abrangem desde a agricultura familiar, até fazendeiros. E a soma das quantias para garantir as demarcações pendentes na FUNAI (Fundação Nacional dos Povos Indígenas), com a indenização sobre a terra, pode ultrapassar R$1 bilhão de reais. Um orçamento 46% maior do que a cifra atual do órgão.

De acordo com a pesquisa realizada pela Agência Pública as dez áreas com mais hectares sob posse de fazendeiros e contestação judicial, registradas pelo Sigef (Sistema de Gestão Fundiária) do INCRA se localizam nos estados de Pará/Mato Grosso, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pernambuco e Paraná e somam 544 mil hectares. São 55% do total de terras reivindicadas por povos indígenas, que atingem a quantia de R$942 milhões de reais, caso a indenização seja paga.

O cálculo desse preço leva em conta a chamada terra nua, ou seja, a área da fazenda em hectares, de acordo com cada localização e a base de cálculo da Pauta de Valores de Terra Nua do Incra. Ainda não está claro na discussão do STF, quais proprietários teriam direito a essa indenização ou quantos deles seriam beneficiados, por isso, este cálculo leva em conta todas as sobreposições nas TIs. Este orçamento está R$200 milhões acima do previsto no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) do governo Lula para a Funai em 2024.

Teses de indenização sobre a terra nua

Há duas propostas de indenização sobre a terra no STF. A proposta feita por Alexandre de Moraes no dia 7 de junho, apareceu infiltrada em seu discurso contrário ao marco temporal. Uma forma de amenizar os ânimos do agronegócio com um “caminho do meio”. Para ele, os proprietários de imóveis em terras indígenas poderiam receber “indenização prévia” à demarcação dos territórios pelas benfeitorias e pelo valor do terreno.

O artigo 231 da Constituição Federal, em seu parágrafo 6º, torna “nulos e extintos” os “atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse” das terras tradicionais indígenas. Ou seja: qualquer título de propriedade que esteja sobre esses territórios não tem validade. E não há nada previsto em termos de direito a indenizações, diante da extinção destes atos. A constituição permite apenas a compensação pelas “benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé”. Além disso, não está clara qual será a forma de garantir a posse integral do território aos Povos Indígenas, uma vez demarcado o território e paga a indenização aos fazendeiros invasores. A proposta deixa lacunas para o alargamento de conflitos que oneram o Estado e ceifam vidas indígenas.

Já Cristiano Zanin, afastou a tese do Marco Temporal durante seu voto no dia 31 de agosto, no entanto propôs a indenização com base em danos causados a terceiros pelo Estado, prevista no artigo 37 da Constituição. O que significa responsabilizar o poder público por equívocos na gestão das terras, visto que foi o próprio Estado que permitiu titular propriedades privadas sobre territórios tradicionais indígenas. Zanin atribui as sobreposições de TIs ao fato dos fazendeiros terem acreditado na idoneidade dos títulos concedidos pelas instituições estatais.
Para ele, a indenização deve ocorrer por via judicial ou administrativa. Um processo que correria fora dos trâmites para a demarcação de terras indígenas, sendo analisado caso a caso. As verbas para o pagamento das indenizações seriam encaminhadas do governo federal e dos estados e municípios que tenham incentivado a titulação privada de terras indígenas.

A proposta de Moraes é mais aprazível aos olhos do agronegócio. Gustavo Passarelli, advogado da Federação de Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul), afirmou que “se [a indenização] pudesse fazer parte do processo administrativo [de demarcação de terras indígenas], acho que ajudaria a todos. Se for necessário esperar que o produtor ajuíze a demanda para depois receber a indenização, isso certamente atrasa o procedimento administrativo”, pontua Passareli. “Se no próprio procedimento administrativo já tiver uma previsão nesse sentido, fica mais rápido. O procedimento judicial é moroso.”

O Ministério dos Povos Indígenas apontou o voto de Zanin como uma saída mais plausível. “Mesmo com a questão das indenizações à terra nua, a proposta do ministro Zanin não impede a continuidade e abertura de novos processos demarcatórios, já que cada caso poderá ser analisado com suas particularidades”, afirmou Sonia Guajajara em nota divulgada no dia 31 de agosto.

A Apib se opõe a qualquer tipo de indenização, partindo do entendimento de que a própria constituição aponta o direito originário à terra e prevê no processo demarcatório as devidas garantias de direitos aos pequenos agricultores e aos investidores, que possam ter manejado benfeitorias dentro dos territórios, não demarcados pela morosidade do próprio Estado. Já os grandes proprietários do agronegócio têm atuado sistematicamente com suas frentes, confederações e articulações, para manipular leis, a economia e a política, além do uso da violência e do extermínio, para impedir as demarcações e se locupletar com as invasões. De maneira nenhuma se poderia considerar ações de “boa fé” destes sujeitos.

Um exemplo disso, é a Proposta de Emenda à Constituição número 48/2023, protocolada na última quinta-feira, 21/09, mesmo dia em que o Supremo apontou a inconstitucionalidade do marco temporal. A PEC feita pelo senador Hiran Gonçalves (PP-RR) ressuscita a tese e quer alterar a constituição para beneficiar os invasores.

Mesmo com a decisão do STF, apontando para a tese do indigenato, o Congresso Nacional continua discutindo o PL 2903/23, que também busca instituir o Marco Temporal e apresenta outras inúmeras ameaças aos direitos indígenas. O PL está nas mãos do senador Marcos Rogério (PL-RO), relator na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e deve voltar à pauta nesta semana.

Territórios em disputa

A Terra Indígena onde o cacique Raoni Metuktire passou sua juventude, chamada de Kapôt Nhinore, de ocupação tradicional dos povos Yudja (Juruna) e Mebengokrê (conhecidos como Kayapó), possui a maior área reivindicada por fazendeiros. Os estudos de identificação e delimitação foram aprovados pela Funai em julho deste ano. O território possui 362 mil hectares e está localizado na bacia do rio Xingu, entre os municípios de Santa Cruz do Xingu (MT), São Félix do Xingu (PA) e Vila Rica (MT).

Destes, mais de 258 mil hectares são reivindicados por fazendeiros, 79% da terra indígena. Se todos eles fossem indenizados pelo valor da terra nua, o custo seria de R$477,5 milhões.

Entre as dez terras que fazem parte do levantamento da Agência Pública, três estão na mesma região do Maranhão, cerca de 580 km a sudoeste de São Luís. As Terras Indígenas Porquinhos dos Canela-Apãnjekra, Bacurizinho e Kanela Memortumré têm juntas cerca de 374 mil hectares, sendo que ao menos 194 mil (52% do total) são disputados por fazendeiros. Se todos eles fossem indenizados pelo valor médio da terra nua aplicado hoje pelo Incra, seriam necessários R$108 milhões.

As Terras Indígenas Porquinhos dos Canela-Apãnjekra, Bacurizinho, reivindicam ampliação de áreas demarcadas, e já estão declaradas. Enquanto Bacurizinho é habitada pelo povo Guajajara, a terra Porquinhos é do povo Canela Apanyekrá. Já o território Kanela Memortumré é ocupado pelo povo Kanela e aguarda portaria declaratória.

O estado do Mato Grosso do Sul é campeão em casos de invasão de terras indígenas e assassinatos, de acordo com dados dos relatórios Os Invasores I e II, da página De Olho nos Ruralistas e levantamento do Instituto Socioambiental (ISA) com base em números do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).

Três tekoha (“lugar onde se é”, em Guarani) na região de Dourados, onde vivem os povos Guarani e Kaiowá, somam cerca de 118 mil hectares, sendo que metade é disputada por fazendeiros. Juntas, as indenizações nas TIs Dourados-Amambaipeguá I, Iguatemipegua I e Ypoi/Triunfo custam R$269,8 milhões.

Os conflitos na região envolvem os Guarani e Kaiowá expulsos de suas terras a partir do século 19, que desde o fim da década de 1970 buscam retomar os territórios transformados em fazendas.

Estes territórios são apenas alguns exemplos das disputas envolvendo os abusos do agronegócio e os povos indígenas. O recente levantamento do De olho nos ruralistas apontou que existem 1.692 invasões de fazendas sobre terras indígenas, resultando em 1,18 milhão de hectares, envolvendo empresas transnacionais, políticos, donos de veículos de comunicação e personalidades da elite brasileira.

Manifestação da APIB sobre o voto do Ministro Dias Toffoli no RE 1.017.365: rejeição da tese do marco temporal e tentativa de flexibilização dos direitos a posse e usufruto exclusivo das terras indígenas

Manifestação da APIB sobre o voto do Ministro Dias Toffoli no RE 1.017.365: rejeição da tese do marco temporal e tentativa de flexibilização dos direitos a posse e usufruto exclusivo das terras indígenas

O julgamento do RE 1.017.365, que busca definir, com repercussão geral, a constitucionalidade da fixação da tese do “marco temporal” para a demarcação de Terras Indígenas no Brasil, voltou à pauta do Supremo Tribunal Federal na última quarta-feira, 20 de setembro. O voto do Ministro Dias Toffoli consolidou a atual maioria de 5 votos contrários à tese do marco temporal, contra dois favoráveis – proferidos pelos Ministros Kassio Nunes Marques e André Mendonça. No entanto, ao contrário dos outros ministros e com temática alheia à discutida no processo, Toffoli optou por expandir os temas analisados e incluiu a possibilidade de aproveitamento de recursos hídricos, orgânicos e minerais de Terras Indígenas, sob o argumento de que o tema sofre com uma suposta omissão legal e prejudica o desenvolvimento econômico do país.

A APIB vem por meio deste documento manifestar sua profunda preocupação com a proposta do Ministro, considerando a possibilidade de que o Tribunal determine ao atual Congresso Nacional, amplamente ruralista e contra os Direitos Indígenas, a edição de Lei ordinária sobre este tema, sem que tenha havido a devida participação dos Povos Indígenas neste processo. Dessa forma, tal “outorga” ao Poder Legislativo, no que se refere à definição jurídico-normativa sobre a mineração em Terras Indígenas, além de se tratar de tema alheio ao discutido no julgamento do STF, representa, na prática, a alta possibilidade de instituição de diploma contrário aos interesses indígenas no país, em vista à atual configuração do Congresso Nacional brasileiro.

A mineração em Terras Indígenas, atividade por meio da qual se pretende autorizar toda sorte de exploração econômica de territórios tradicionais, possui alto grau de prejudicialidade à garantia e manutenção dos Direitos dos Povos Originários, além de ameaçar diretamente sua sobrevivência física, religiosa e cultural. A história recente nos mostra que a existência de empreendimentos para extração de recursos hídricos, orgânicos (hidrocarbonetos) e minerais, na prática, gera a destruição de territórios indígenas, a contaminação das populações por agentes biológicos e químicos, como o mercúrio, e o esgarçamento do tecido social destas comunidades, além de enfraquecer ou inviabilizar sua Soberania Alimentar e submeter mulheres e crianças à violência física e sexual.

Alheia ao julgamento, esta discussão sobre o aproveitamento econômico de Terras Indígenas foi justificada por Dias Toffoli pelo mesmo argumento que levou à aprovação do regime de urgência na tramitação do PL 191/2020, no início de 2022. Naquele momento, o governo bolsonarista e seus aliados na Câmara dos Deputados exploraram a dependência brasileira de fertilizantes russos para pressionar pela aprovação deste projeto de lei que, se não revoga os Direitos Territoriais Originários de Posse e Usufruto Exclusivo, os relativiza ao limite.

Segundo estes atores políticos, somente a exploração mineral – especialmente de potássio – em Terras Indígenas evitaria um colapso econômico do país. O que se seguiu, foi uma série de estudos comprovando que as maiores reservas de potássio e demais minerais utilizados na produção de fertilizantes agrícolas não residem em Terras Indígenas. O relatório “Crise dos fertilizantes no Brasil: da tragédia anunciada às falsas soluções”, de autoria de pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais, indicou que 90% das reservas deste mineral em solo amazônico encontram-se fora de Terras Indígenas e, nacionalmente, se dividem entre os estados do Amazonas (21%), Sergipe (4%), Minas Gerais e São Paulo (que, somados, abrigam 75% das reservas). Dados da própria Agência Nacional de Mineração e do Serviço Geológico do Brasil indicam que apenas 11% das jazidas de sais de potássio se sobrepõem a Terras Indígenas. É muito preocupante, portanto, que o Ministro Dias Toffoli faça uso de uma retórica sem fundamentação concreta para justificar a inserção de uma tese prejudicial – e sem nenhuma conexão com o caso em discussão – no julgamento mais importante do século para os Povos Indígenas e para a sociedade brasileira.

Dessa forma, a proposta de tese a ser fixada não encontra respaldo no arcabouço jurídico nacional, que restringe e, em alguns casos, até mesmo veda a exploração econômica de Terras Indígenas. Além disso, é certo que o atual diploma processualista brasileiro, por inteligência do art. 10 do Código de Processo Civil, veda a prolação das chamadas “decisões surpresa”, em vista ao cerceamento do contraditório e ampla defesa das partes. No caso em questão, o Ministro adentrou no mérito da regulamentação da mineração em terras indígenas sem ter dado às partes oportunidade de se manifestar, de forma a anular, implicitamente, a consulta aos representantes das comunidades indígenas atingidas pelo julgamento, bem como dos órgãos indigenistas que possuem norte à proteção e garantia dos direitos originários.

Ainda, o Ministro motiva a necessidade de regulamentação § 1º do art. 176 e o § 3º do art. 231 da Constituição Federal por decorrência do avanço recente do garimpo ilegal e de outras explorações íliticas nas áreas protegidas, as quais, segundo o magistrado, encontram-se entregues à ilegalidade, gerando alto custo ao país, em vista do impacto no Meio Ambiente e do cenário de emergência humanitária observado, por exemplo, na Terra Indígena Yanomami, altamente atingida pela invasão de garimpeiros, grileiros e demais empresários com interesses na exploração dos territórios indígenas do país.

A escala e intensidade do garimpo ilegal em tal Terra Indígena cresceu exacerbadamente nos últimos cinco anos. Dados do Mapbiomas indicam que a partir de 2016 a curva de destruição do garimpo assumiu uma trajetória ascendente e, desde então, tem acumulado taxas cada vez maiores. Nos cálculos da plataforma, entre os anos de 2016 a 2020 o garimpo na TIY cresceu nada menos que 3350%.

Este cenário, porém, não é fruto de mera omissão legislativa. Os últimos anos foram marcados por uma política anti-indígena que desmontou e desfinanciou os órgãos responsáveis pela implementação da Política Indigenista Nacional e pelo controle ambiental. Um dos eixos desta política se estruturou justamente sobre facilitação da abertura de Terras Indígena à exploração econômica, combinando o estrangulamento de instituições de proteção socioambiental com discursos e sinalizações públicas em favor de agentes econômicos interessados nesta exploração ilegal, que se viram incentivados a cometerem ilícitos ambientais com a garantira de que não seriam punidos.

Sabe-se que nos últimos quatro anos houve o desmantelamento da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI), principal órgão de proteção indígena, a partir da nomeação, por Jair Bolsonaro, do delegado Marcelo Xavier para presidir o órgão, o qual, dolosamente, buscou gerenciar a autarquia a partir de interesses opostos às Garantias Constitucionais dos Povos Indígenas. Cenário semelhante ocorreu com a Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), a qual, encarregada da proteção à saúde originária e presidida anteriormente pelo militar Robson Santos da Silva, também nomeado pelo antigo gestor do executivo federal, contribuiu com o genocídio étnico dos povos tradicionais, principalmente na negligência observada no combate à COVID-19. Nesse sentido, é certo que o cenário de aumento do garimpo ilegal e o alto impacto às comunidades indígenas e ao Meio Ambiente do país é resultado do enfraquecimento de Políticas Públicas voltadas à proteção e preservação dos povos e cultura originários e não à omissão legislativa, em nada se assemelhando à conjuntura apresentada por Dias Toffoli.

Ainda, a Constituição Federal prevê regimes legais diferenciados para a mineração e para o garimpo. A mineração corresponde a uma atividade econômica e industrial que consiste na pesquisa, exploração, lavra (extração) e beneficiamento de minérios presentes no subsolo. O processo de minerar passa pela extração de minerais e envolve várias etapas a serem seguidas até se chegar ao seu produto final, são elas: pesquisa e exploração, lavra e beneficiamento. O garimpo, por sua vez, é uma atividade extrativista que tem como objetivo a obtenção de minérios, em teoria, de cunho artesanal e empregando pouca ou nenhuma tecnologia avançada. Também possui especial proteção pela Constituição Federal, tendo em vista a expressa proibição da prática em Terras Indígenas (art. 231, § 7º).

No que se refere aos marcos legais sobre a mineração em Terras Indígenas, o parágrafo 6º do art. 231 da Constituição Federal determina que são nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação e a posse das Terras a que se refere o artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nela existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção, direito a indenização ou à ações contra a União, salvo na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé.

A extração de minérios em Terras Indígenas e as respectivas discussões jurídicas sobre o tema impactam diretamente na vida em comunidade de tais povos, de modo que deve haver, conforme art. 6 da Convenção 169 da OIT, consulta aos povos interessados, mediante procedimentos apropriados e, particularmente, através de instituições representativas como a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI).

Dessa forma, observa-se que a Constituição Federal condiciona o aproveitamento mineral de Terras Indígenas a duas exigências: prévia autorização do Congresso Nacional e a oitiva das comunidades afetadas, após a efetiva tramitação da Lei Complementar que visa regulamentar os artigos da Constituição Federal que tratam sobre a questão.

Frente a tais condicionantes, o Ministro Dias Toffoli propõe que o STF estabeleça o prazo de 12 meses ao Congresso Nacional para que se legisle sobre o tema. Esta proposta é extremamente preocupante. O julgamento do RE 1.017.365 tem repercussão geral e definirá o estatuto jurídico-constitucional das relações de posse das áreas de tradicional ocupação indígena à luz das regras dispostas no artigo 231 do texto constitucional. Nem o caso concreto nem a tese de repercussão geral versam sobre o aproveitamento econômico das terras indígenas, mas exclusivamente das relações de posse delas derivadas.

A inserção de um posicionamento definitivo do STF sobre a exploração econômica desses territórios, nestes termos, viola o devido processo legal, garantido pelo art. 5, LIV, da Constituição Federal, ao não permitir que os reais interessados e impactados pela decisão se manifestem de maneira informada e em tempo hábil sobre o tema.

Além disso, o Ministro parece ignorar a realidade enfrentada pelos Povos Indígenas. Se o Tribunal tem autonomia para não se pautar pela situação política do país, os Povos Originários não podem ignorar que o Ministro propõe que seja o atual Congresso Nacional a decidir sobre o futuro de suas Terras, no exíguo prazo de 12 meses. Este Congresso Nacional, composto por ruralistas e ex-ministros do Governo Bolsonaro diretamente envolvidos na implementação da supramencionada política anti-indígena, essa sim, responsável pelo crescimento da invasão e da exploração ilegal de Terras Indígenas. A mesma Câmara dos Deputados que aprovou o PL 490/07 por 283 votos e o mesmo Senado Federal que aprovou o PL 2903/2023 na Comissão de Reforma Agrária e Agricultura, e agora se recusa a realizar Audiência Pública na Comissão de Constituição, Cidadania e Justiça.

Os Povos Indígenas brasileiros estão enfrentando uma grave ofensiva contra seus Direitos Originários de Posse e Usufruto Exclusivo sobre seus territórios. O Supremo Tribunal Federal tem em mãos o maior julgamento social e climático do século, do qual dependem o futuro dos Povos Indígenas e o projeto de nação que deriva da Constituição Federal de 1988. Não podemos permitir que essa decisão seja tomada sem a devida participação dos Povos Indígenas e que seja este o Congresso Nacional responsável por decidir sobre a existência dos territórios originários que garantem a vida e o equilíbrio climático do Planeta.

Mauricio Terena
Coordenador Jurídico da APIB
OAB/MS 24.060

Giovanna Dutra Silva Valentim
Assessora Jurídica da APIB
OAB/SP 485.585

Iorrannis Luiz Moreira da Silva
Secretário Jurídico da APIB
Advogado OAB/MS 27.100