05/ago/2021
Na última quarta-feira (04), um crime bárbaro foi cometido no Setor Estiva, na Terra Indígena do Guarita, em Redentora, no Rio Grande do Sul, contra uma jovem parenta de 14 anos. Daiane Griá Sales, do povo Kaingang, foi encontrada morta em uma plantação nos arredores da comunidade, suas partes íntimas estavam dilaceradas.
A violência contra os povos indígenas tem se intensificado a cada dia. Assassinam nossos jovens, nossas mulheres, nossas lideranças; roubam nossas terras e querem tirar nossos direitos. A violência contra as mulheres indígenas é intensa desde a invasão portuguesa. Mulheres que são a vida do nosso povo, mulheres que curam mulheres guerreiras.
A Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpinsul) e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), em conjunto com todas as organizações regionais de base, repudiam toda e qualquer violência contra mulheres indígenas e exige que a justiça seja feita a quem cometeu tal atrocidade.
Não podemos aceitar que nossas vidas continuem sendo ceifadas, e que nossos direitos sejam retirados, ainda mais quando falamos do nosso direito maior, o direito à vida!
Somos Daiane Griá Kaingang
Exigimos justiça!
#vidasindígenasimportam
#emergênciaindígena
05/ago/2021
A Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (ANMIGA), viemos por meio deste manifesto repudiar e denunciar o crime de barbárie cometida na tarde desta quarta-feira (04), no Setor Estiva, da Terra Indígena do Guarita, no município de Redentora, contra a jovem de apenas 14 anos, Daiane Griá Sales, indígena Kaingáng, moradora do Setor Bananeiras da Terra Indígena do Guarita. A jovem Daiane foi encontrada em uma lavoura próxima a um mato, nua e com as partes inferiores (da cintura para baixo) arrancadas e dilaceradas, com pedaços ao lado do corpo.
Temos visto dia após dia o assassinato de indígenas. Mas, parece que não é suficiente matar. O requinte de crueldade é o que dilacera nossa alma, assim como literalmente dilaceraram o jovem corpo de Daiane, de apenas 14 anos. Esquartejam corpos jovens, de mulheres, de povos. Entendemos que os conjuntos de violência cometida a nós, mulheres indígenas, desde a invasão do Brasil é uma fria tentativa de nos exterminar, com crimes hediondos que sangram nossa alma. A desumanidade exposta em corpos femininos indígenas, precisa parar!
Estamos aqui, reivindicando justiça! Não deixaremos passar impune e nem nos silenciarão. Lutamos pela dignidade humana, combatendo a violência de gênero e tantas outras violações de direitos. As violências praticadas por uma sociedade doente não podem continuar sendo banalizadas, naturalizadas, repleta de homens sem respeito e compostura humana, selvageria, repugnância e macabrismo. Quem comete uma atrocidade desta com mulheres filhas da terra, mata igualmente a si mesmo, mata também o Brasil.
Mas saibam que o ÓDIO não passará! Afinal, a violência praticada não pode passar impune, nossos corpos já não suportam mais ser dilacerados, tombado há 521 anos. Que o projeto esquartejador empunhado pela colonização, violenta todas nós, mulheres indígenas há mais de cinco séculos.
Somos 448 mil Mulheres Indígenas no Brasil que o estrupo da colonização não conseguiu matar e não permitiremos que a pandemia da violência do ódio passe por cima de nós.
Parem de nos matar! A cada mulher indígena assassinada, morre um pouco de nós.
Vidas indígenas importam. Gritaremos todos os dias, a cada momento, vidas indígenas importam. E a vida de Daiane importa. Importa para sua família, para seu povo. Importa para nós mulheres indígenas.
04/ago/2021
O Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU) obtiveram, na última segunda-feira (2), decisão liminar determinando que a União inclua, no prazo máximo de dez dias, os indígenas do Estado de Mato Grosso que vivem em áreas urbanas ou em outros locais em que não estejam cadastrados pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) na fase de vacinação prioritária contra a covid-19.
Foi determinado, ainda, que a União e o Estado de Mato Grosso assegurem, no prazo de dez dias, a destinação de doses de vacina contra covid-19 e procedam à articulação imediata junto aos municípios para efetivação da vacinação prioritária de todos os indígenas do estado que vivem em contextos urbanos ou em outros locais em que não estejam cadastrados pela Sesai. Atualmente apenas os indígenas “aldeados” estão sendo vacinados dentro do grupo prioritário.
Conforme a ação civil pública (ACP) ajuizada pelo MPF, em atuação conjunta com a DPU, e que resultou na concessão da liminar, foram requisitadas informações ao secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (SVS/MS) e à Secretaria Estadual de Saúde de Mato Grosso sobre a vacinação dos indígenas que vivem em áreas urbanas. Provas foram reunidas no sentido de que os indígenas residentes em áreas urbanas estavam excluídos do plano de vacinação contra covid-19, tanto por não serem considerados como seu público alvo pelos Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei’s) quanto por não serem atendidos pelos municípios e pelo estado no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).
As informações reunidas junto aos Dsei’s revelaram que mais de 3,6 mil indígenas em Mato Grosso estão excluídos da vacinação prioritária por não serem “aldeados”. Além disso, apurou-se que o Dsei/Cuiabá devolveu à Secretaria Estadual de Saúde 840 doses de vacina não utilizadas, enquanto que o Dsei/Xingu tem à sua disposição 800 doses prestes a serem devolvidas também. Esse total de 1.640 doses de vacina poderia ter sido utilizado para imunização de indígenas residentes em áreas urbanas, mas seu uso não foi autorizado pelo órgão central (Sesai).
O MPF e a DPU frisaram que, historicamente, os povos indígenas sempre estiveram mais vulneráveis biologicamente a viroses, em especial a infecções respiratórias. “Estas doenças sempre apresentaram altos índices de mortalidade causados pelas doenças transmissíveis que contribuíram com a redução do número de indígenas que vivem no território brasileiro. Os efeitos da pandemia somam-se, portanto, às circunstâncias históricas e peculiaridades biológicas desses grupos”, segundo consta da petição inicial. Dados apontados na ação demonstram uma letalidade maior da pandemia entre os indígenas se comparados aos demais grupos.
Também se apontou na ação que o Ministério da Saúde não vinha cumprindo a legislação que elencou os indígenas, sem distinção, entre os integrantes dos grupos prioritários de vacinação, assim como a decisão do Supremo Tribunal Federal na ADPF n. 709.
A Justiça Federal, na decisão liminar, citou a Lei n. 14.021/2020, que versa sobre medidas de proteção social para prevenção do contágio e da disseminação da covid-19 nos territórios indígenas. A lei coloca os indígenas isolados e de recente contato, os indígenas aldeados e os que vivem fora das terras indígenas, em áreas urbanas ou rurais no mesmo patamar de proteção prioritária, sem distinção de domicílio, e “é assim que a política pública de imunização deve tratá-los, essa deve ser a premissa a partir da qual tudo deve suceder”, segundo o magistrado.
“Se a lei não os distinguiu, é vedado que uma norma infralegal o faça. Se a lei não condicionou a proteção à região em que vivem, as políticas públicas não podem limitar essa proteção com base nesse critério, realizando distinções discriminatórias e não amparadas em elementos técnicos para priorizar a imunização de indígenas aldeados em descompasso com aqueles que vivem em zona urbana ou rural, não aldeados”, destaca também a decisão.
Dessa forma, além da inclusão dos indígenas não aldeados no plano de imunização, a União e o Estado de Mato Grosso devem assegurar, no prazo de dez dias, a destinação de doses de vacina contra a Covid-19 e proceder à articulação imediata junto aos municípios do estado para fins de efetivação da vacinação prioritária de todos os indígenas de Mato Grosso que vivem em contextos urbanos ou em outros locais em que não estejam cadastrados pela Sesai.
Via: Ministério Público Federal do Mato Grosso
04/ago/2021
No início da noite desta terça-feira (03 de agosto), deputados ligados ao agronegócio e à base do governo Bolsonaro, aprovaram o Projeto de Lei 2633, conhecido como PL da Grilagem. A proposta votada aumenta a violência contra povos indígenas, quilombolas e agricultores familiares e não foi apresentada anteriormente à sociedade civil, postura típica de regimes antidemocráticos. Agora, o projeto segue para votação no Senado e o movimento indígena continua na luta por direitos.
A justificativa apresentada para a aprovação deste Projeto de Lei seria a necessidade de regulamentar terras para pequenos agricultores. Entretanto, o Brasil já dispõe de políticas para reforma agrária e destinação de terras que precisam apenas ser implementadas de forma efetiva. O fato é que o texto aprovado, legaliza o ilegal: regulariza terras apropriadas de maneira criminosa, em processos que muitas vezes incluem atos violentos contra povos indígenas e comunidades tradicionais.
Grilagem, para quem não conhece a expressão, é o nome dado à invasão, ocupação e comércio ilegal de áreas públicas. É esse tipo de ato que o Projeto de Lei aprovado ontem legaliza no Brasil. A prática está ligada ao desmatamento e à destruição da biodiversidade e ameaça diretamente povos originários que ocupam tradicionalmente as terras usurpadas pelos grileiros.
Segundo o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), cerca de 30% dos desmatamentos e queimadas na Amazônia ocorreram em terras públicas não destinadas, que foram possivelmente alvo de grilagem. Ainda, estudos do Imazon estimam que caso o PL 2633 entre em vigor como lei, poderá ocasionar um desmatamento adicional de até 16 mil quilômetros quadrados, área quase 3 vezes o tamanho do Distrito Federal.
O roubo de terra pública não é novidade no Brasil. O que é inédito é que o Poder Público, que deveria zelar pelo bem comum, resolva descaradamente premiar ladrões e usurpadores com a regularização da terra fruto de roubo. Esta aberração ética e jurídica coloca nossas florestas, nossa biodiversidade e os povos que delas dependem – especialmente os povos indígenas, comunidades tradicionais e agricultores familiares – de joelhos frente à violência que são típica dos processos de invasão e apropriação ilegal de terras.
No momento em que o mundo todo discute formas de manter as florestas em pé como uma solução para as mudanças climáticas, o governo brasileiro segue “passando a boiada”, abrindo caminho para o aumento das taxas de desmatamento, o que vai contra seus próprios compromissos para zerar o desmatamento ilegal.
Os povos indígenas manifestam seu repúdio frente a este absurdo e irresponsável sinal emanado daquela que se auto-nomeia “Casa do Povo”. Com a aprovação deste projeto, a Câmara demonstra que está se convertendo na casa dos ruralistas, dos desmatadores, dos grileiros – de todos estes, menos do povo.
03/ago/2021
O Ministério Público Federal (MPF) vem obtendo liminares na Justiça Federal que suspendem a Instrução Normativa 9, da Fundação Nacional do Índio (Funai), que alterou os critérios para a emissão de Declaração de Reconhecimento de Limites (DRL) por meio do Sistema de Gestão Fundiária (Sigef), gerido pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Com a instrução, proprietários ou possuidores de terras poderiam emitir a declaração para áreas dentro do limite de terras indígenas ainda não homologadas pelo governo federal brasileiro.
O MPF considera que a instrução viola direitos constitucionais dos povos indígenas, favorece a grilagem de terras públicas e agrava conflitos agrários. Ao todo, procuradores da República ajuizaram 28 ações judiciais na 1ª instância da Justiça Federal, pedindo a suspensão da IN 09, com 19 decisões judiciais favoráveis. Atualmente, a norma da Funai está suspensa por ordens judiciais em oito estados da Federação: Pará, Mato Grosso, Amazonas, Acre, Roraima, Rondônia, Bahia e Rio Grande do Sul, o que garante a proteção de mais da metade das terras indígenas brasileiras.
Em recursos à 2ª instância, o governo federal até agora conseguiu reverter três liminares no Mato Grosso do Sul e suspender duas, em Santa Catarina e no Ceará. Duas liminares foram negadas, nas subseções judiciárias de Dourados (MS) e Foz do Iguaçu (PR), e o MPF aguarda decisão sobre recursos nesses dois casos. Das 28 ações civis públicas ajuizadas sobre o tema em todo o país, seis ainda estão pendentes de apreciação, em Belém (PA), São Luís (MA), Carazinho (RS), Vilhena e Ji-Paraná (RO) e São Paulo (SP). Quatro das liminares deferidas já foram confirmadas por sentenças, em Santarém (PA) e Castanhal (PA), Rio Branco (AC) e Boa Vista (RR). Em uma das ações judiciais iniciadas pelo MPF, em Belo Horizonte (MG), houve declínio de competência.
O MPF sustenta nas ações judiciais que a IN 09/2020 contraria o caráter originário do direito dos indígenas às suas terras e a natureza declaratória do ato de demarcação; cria indevida precedência da propriedade privada sobre as terras indígenas, em flagrante ofensa à Constituição; representa indevido retrocesso na proteção socioambiental; incentiva a grilagem de terras e os conflitos fundiários; entre outros problemas. As decisões judiciais obtidas determinam a manutenção das áreas indígenas ainda não homologadas no Sistema de Gestão Fundiária (Sigef) e no Sistema do Cadastro Ambiental Rural (Sicar).
Teor das decisões – Os juízes federais que concederam liminares ao MPF têm apontado o desrespeito da IN 09 ao texto constitucional e a subversão da missão institucional da Funai. Em uma das sentenças, exarada no Pará, a Justiça assinala que “a Funai, de forma pouco usual, adota uma retórica em prol dos não índios, o que causa certa estranheza em razão de seu dever de garantir o cumprimento da política indigenista (artigo 1º, lei nº. 5.371/1967)”
Para a Justiça Federal, ao permitir que particulares recebessem declarações de propriedade sobre áreas já caracterizadas como terras indígenas, a Funai utilizou-se de sua própria “ineficiência” em concluir os processos de demarcação “para onerar os povos tradicionais, retirando deles a segurança jurídica de alcançar o direito originário às terras ocupadas por eles, por meio da homologação, o que lhes é garantido pela Constituição Federal”.
“A instrução normativa da Funai não resolve o problema original enfrentado pelos indígenas no Brasil nem o dos possuidores de lotes rurais, lentidão no processo de demarcação de terra indígena, pelo contrário, com a justificativa de proteger o direito de propriedade de particulares, fere o direito originário de posse dos índios. Ainda transfere o ônus da ineficiência para os povos indígenas”, diz uma das decisões.
Atuação coordenada – Desde a publicação da IN 09/2020, o MPF defende que a regulamentação ameaça os direitos territoriais dos indígenas. Em abril de 2020, 49 procuradoras e procuradores da República de 23 estados assinaram recomendação que foi encaminhada ao presidente da Funai para que o ato administrativo fosse anulado. Com a negativa da Funai em cumprir a recomendação, o MPF precisou recorrer ao poder Judiciário.
Para o MPF a norma é inconstitucional, ilegal e contraria a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a Declaração das Nações Unidas Sobre os Direitos dos Povos Indígenas e a posição do Supremo Tribunal Federal (STF). Além disso, a instrução normativa afetaria, além das populações indígenas, os particulares de boa-fé que adquiram terrenos nas áreas em processo de demarcação, gerando falsa expectativa sobre a propriedade e insegurança jurídica.
Levantamento feito Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do MPF (6CCR/MPF) em junho do ano passado constatou que há quase 10 mil propriedades sobrepostas a terras indígenas que estão em diferentes fases de regularização ou em áreas com restrição de uso. O estudo foi encaminhado a procuradores da República em todo o país e subsidia a atuação no combate à grilagem e aos crimes ambientais em terras indígenas, bem como às violações dos direitos humanos desses povos.
A pesquisa foi feita pela Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise da Procuradoria-Geral da República, a pedido da 6CCR, e considerou dados extraídos do Sistema do Cadastro Ambiental Rural, vinculado ao Serviço Florestal Brasileiro, no período de 21 a 31 de maio de 2020. Ao todo, foram identificados 9.901 registros de propriedades no CAR cujos limites coincidem com territórios indígenas ou com restrição de uso, ou seja, áreas interditadas pela Funai para proteção de povos indígenas isolados, com o estabelecimento de restrição de ingresso e trânsito de terceiros.
Segundo a investigação, o estado com o maior número de imóveis rurais localizados em terras destinadas a povos indígenas é o Pará, com 2.325 registros. Desse total, 1.290 propriedades estão situadas dentro de terras indígenas em processo de regularização e 1.035 em áreas com restrição de uso. Em seguida, aparece o estado de Rondônia, onde foram identificados 1.385 registros de imóveis rurais sobrepostos a áreas indígenas, sendo 1.345 referentes a terras indígenas e 40 a áreas com restrição de uso. No Amazonas, são 1.163 propriedades irregulares registradas no CAR, uma vez que 524 estão dentro de terras indígenas e outras 639 em áreas interditadas para proteção de povos isolados.
Via: Ministério Público Federal
02/ago/2021
Nós, Kunhangue de Santa Catarina, de 20 tekoa, reunidas nos dias 27 a 31 de julho de 2021 na Tekoa Pira Rupa – Palhoça/SC, compartilhamos histórias de vida, saberes, choros, abraços, risos e cuidados. Escolhemos a carta como ‘um jeitinho bom’ de contar o que aconteceu para aquelas que não puderam estar presentes em nosso encontro, sendo está apenas um dos resultados, pois a maioria deles ficaram gravados em nossos corações, e para os outros, convidamos a todos vocês para nos ajudar a cultivar. Nestes dias, falamos e ouvimos sobre a importância das Kunhangue no dia-a-dia no território, tivemos os momentos sensíveis para relatos das ainda atuais violências que sentimos, e finalizamos com a força milenar da cura e saúde das mulheres, o kunhangue reko.
Iniciamos discutimos sobre a força e as dificuldades das mulheres que são chefes de família, ouvindo as histórias de vida de muitas guerreiras de nosso povo que no cotidiano vem sendo responsáveis por um dos momentos mais sagradas de nossa vida, o momento de nossa alimentação – tanto de nossos corpos quanto nossos espíritos. Afirmamos a problemática das entradas de alimentos industrializados em nossas tekoas, e relatamos como elas tem afligindo nossa saúde e na nossa vida como ser humano a nossa forma de relação comunitária com os alimentos.
Queremos viver bem, com muito mborayu e saúde! Os fundamentos de nosso encontro foram os aconselhamentos com nossas xejaryi, no aprender ouvindo e também fazendo as boas práticas de alimentação, cuidado e resguardo, sobre nossos remédios e curas. Como essas práticas são essenciais para as gestantes e para as crianças, são base para todos nós e nossos territórios.
Saudamos as parteiras, das mitãjaryi, e agradecemos a vida e o trabalho que essas médicas tradicionais realizam. Esse foi um dos temas que trouxeram relatos dolorosos, de como nossas jovens e mães têm sido desrespeitadas em seus momentos de parir. Um dos pontos principais levantados foi o pedido de que as nossas placentas sejam tratadas com os nossos rituais de entregarmos ela para a Terra para que permaneçam nas tekoa, pois assim nossos filhos se tornam jovens e adultos conectados com nosso território, pois permanecem conectados através da placenta e cordão umbilical e com isso capazes de defender nosso povo, o nhandereko. É muito importante que o sistema de saúde que nos atende entenda e respeite as nosso modo de ser.
Nós mulheres Guarani carregamos os conhecimentos milenares sobre a Mata Atlântica e as sementes. Na Tekoa Pira Rupa lembramos que temos remédio, força e sabedoria de sobra. Fizemos uma busca das medicinas da região e pudemos coletar remédio para todos os tipos de doença e males e juntas cozinhamos nosso alimento sagrado que são medicinas para cura do nosso corpo e do nosso espírito. Com o riso solto, fizemos os chás para benzimentos e banhos com as ervas medicinais. Era um cheiro de aromas espalhados no encontro, e a cura estava sendo feita não só dos nossos corpos, mas também na nossa memória. Coletamos nossas medicinas na mata, contando e ouvindo sobre o poder de cada erva medicinal, preparamos o avaxi ku’i, mbojape, kaguijy, entre outros alimentos e lembramos dos nossos avôs, nossas avós, lembramos das histórias que vão sendo contadas, do que faziam antigamente, e assim vamos nos curando, vamos ficando melhores.
Não podemos perder o conhecimento que as xejaryi estão trazendo, para que sirva de alimento, para o que sirva de remédio. Lembrando também que não são todas as mulheres que sabem por exemplo benzer, mas entre nós, sabemos que isso existem mulheres que tem essa licença para fazer a cura. Esse conhecimento é o mínimo que precisamos ter para cuidar e manter. Precisamos disso para que o nhandereko não se perca no futuro. Estamos em uma guerra para que nosso conhecimento, o conhecimento da mulher guarani não seja apagado, desprezado, assediado.
Sabemos que dar essa importância significa também trazer os homens conosco nessa busca. Precisamos lutar juntos para que nosso direito à saúde exista respeitando o nhandereko, o kunhangue reko, sem nunca esquecer das necessidades das mulheres e crianças. Então, decidimos que no final do encontro, escreveremos juntas um documento para a SESAI e outras autoridades, fazendo essa cobrança. Precisamos que o sistema de saúde juruá, nos escute e nos respeite, para isso, precisamos também do apoio dos homens de nossas tekoa, para que levem essas urgências trazidas pelas mulheres para todas as discussões das quais eles participam para discutir política de saúde, seja com SESAI Funai e outras instituições juruá, seja mesmo entre eles da Comissão nhemongueta e outros grupos de caciques.
Temos falado sobre os muitos tipos de violência que nos fazem sofrer, e sempre confirmamos a importância do diálogo entre as mulheres com os homens e seus filhos e filhas. Discutimos sobre como podemos criar esses espaços de fala e entendimento, sem julgamento. Não queremos também que os homens sofram, queremos nos cuidar juntos, fazer juntos nossa luta, andando lado a lado. Não queremos andar atrás. Queremos que as mulheres da comunidade tenham mais participação nas organizações e conselhos, para que que olhem mais para nós todas.
A luta contra a cultura da violência às mulheres, e a importância de reverter este triste quadro que se estende as gerações foi também um dos grandes desafios que tiramos neste encontro. Foi reafirmado por todas que o modo de vida original nhanderu criou a mulher para ser companheira dos homens, não sendo cultural e espiritual a violência contra as mulheres, tema que muitas vezes é ultilizada até no meio jurista erroneamente para defender o abuso e violência contra as mulheres, trazida pelo homem branco, e defender abusadores. Alegando ser cultural, um dos exemplos: os estupros. Não aceitamos mais nada que nós façamos sofrer e sentir dor seja ela física ou psicológica.
As mulheres desde 1500 foram linha de frente na resistência do modo de vida Guarani desde da proteção dos territórios, crianças e vulneráveis à ataques feitos pelos Juruá desde a invasão dos territórios. Foi relatado sobre a cultura juruá machista dentro das aldeias, quando se naturaliza a violência e abuso das mulheres. Foi refletido que um determinado momento o respeito tradicional entre homens e mulheres, ensinado desde criança, foi transgredido, sendo inserido uma ideologia de abusos contra as meninas e mulheres mais novas. A importância da atividade foi direcionar as mulheres que a violência contra a mulher não é algo normal, não é do Nhandereko, principalmente para as mulheres lutar, acompanhar e reverter esses casos dentro das comunidades.
Saímos das atividades fortalecidas para poder se firmar juntas e com as outras parentes das aldeias a denúncia e a luta contra a violência às mulheres. Não precisamos que nos deem voz: nós já temos, precisamos que nos deem ouvidos! Nossos encaminhamentos são: (” porque atrás de um grande homem, existe uma grande mulher”)
Vamos desconstruir as linguagens da inferiorização das mulheres. Vamos desvendar as lendas. Nossa visão de futuro é que ao lado de um grande homem estejam as grandes mulheres. A avós, as mães, as companheiras, as filhas e netas.
1• Realizar um documento direcionado a SESAI feito pela comissão guarani yvyrupa, exigindo para que os hospitais preservem placentas e outras partes do corpo para ser retornado à os territóriospara realização dos trabalhos sagrados da cultura.
2• Foi apontada a importância de valorizar as parteiras tradicionais, ter um espaço para poder realizar os partos nas aldeias e a formação de novas parteiras.
3• Na questão da alimentação,
O diálogo da sesai com as comunidades e hospitais para quando a mulher ter o bebê nos hospitais, que atenda essa dieta do resguardo com alimentação específica para seu resguardo.
4* Que seja contratada mulheres com conhecimentos nutricionistas para poder gerir e atuar na questão alimentar e resgatar os alimentos tradicionais muito importantes para saúde de todas as comunidades do povo Guarani.
5• Que a SESAI contrate agentes de saúde guarani com a entendimento de cura. Para todas as aldeias que ainda não tem agentes feminino.
6* pedimos para seja paritária a participação das kunhangue dentro do controle social de saúde e da gestão da saúde, seja ela dentro dos conselhos locais ou dentro da sesai.
Incentivamos e fortalecemos umas às outras para fazer outros encontros como esse em suas tekoa. Porque falar sobre as nossas vidas, da gestão dos nosso territórios e da manutenção das políticas públicas e nós kunhangue somos donas e gestoras dessas grandezas.
Somos Yvyrupa.
Aguyjevete para quem não bate, não estupra e não humilha.
Demarcação já!
COMISSÃO GUARANI YVYRUPA
Kunhangue Nhemboaty
I Encontro Estadual de Mulheres Guarani
Santa Catarinak
31/jul/2021
Foto:Bruno Kelly
Garimpeiros em três embarcações voltaram a atacar indígenas da comunidade de Palimiú, que vive uma série de ataques desde 10 de maio, na Terra Yanomami, em Roraima.
O novo ataque aconteceu no sábado (24), mas a informação foi divulgada na quinta-feira (29) pelo Conselho de Saúde Indígena Yanomami e Ye’kuanna (Condisi-YY).
Um ofício assinado no último dia 27, pelo presidente do Condisi-YY, Júnior Hekurari Yanomami, informa que servidores do Distrito de Saúde Indígena Yanomami (Dsei-Y) e da Fundação Nacional do Índio (Funai) estavam no local e precisaram fugir durante o ataque.
Na quarta-feira (28) um indígena morreu ao ser atropelado por um avião de garimpeiros em uma pista na comunidade Homoxi. O jovem indigena tinha 25 anos e se chamava Edgar Yanomami. O atropelamento foi por volta de 14h30.
A reportagem procurou a Funai para saber se os servidores foram feridos e se uma nova equipe será enviada à região e, aguarda reposta.
“Os garimpeiros ameaçaram que vão entrar na comunidade, matar todos e queimar. Até mandaram recado para os Yanomami, por outro subgrupo, que eles têm que deixar a comunidade, senão vão vir com todo mundo. Vão atacar com mais de 100, 200 homens. O assunto é muito preocupante. O governo tem que fazer a barreira urgente na comunidade Palimiú, para não acontecer algo grave”, comenta Hekurari.
A região fica às margens do rio Uraricoera, em Alto Alegre, Norte de Roraima, e é rota usada por garimpeiros que entram ilegalmente na Terra Yanomami. No primeiro ataque, em maio, invasores à bordo de um barco, abriram fogo contra a comunidade Palimiú, próxima à Walomapi, e a partir daí houve uma sucessão de conflitos.
Em 14 de junho, o Ministério da Justiça autorizou o uso da Força Nacional na região. Mas de acordo Júnior Yanomami, os quatro agentes que estavam em Palimiú, voltaram para Boa Vista.
Segundo o coordenador do D-sei Y, Rômulo Pinheiro, que recebeu o documento do Condisi-YY, há informações que no dia do ataque, os garimpeiros tentaram resgatar um bote. Ele pede que os órgãos de segurança se manifestem, pois além dos indígenas, há também risco para os profissionais de saúde.
“D-sei Yanomami faz saúde, não faz segurança. Da mesma forma que os indígenas se encontram preocupados, com esse sentimento de insegurança, a equipe de saúde também. A equipe estava lá. Estamos fazendo atendimentos. Não abandonamos. No entanto, fazendo saúde, não fazendo segurança. Assim que possível, encaminho outra equipe de saúde, desde que haja segurança. Não somente para os indígenas, mas para os profissionais de saúde”, disse Pinheiro.
O documento com a denúncia foi endereçado à Polícia Federal. O chefe da Delegacia de Repressão a Crime Ambientais, delegado Gilberto Kirsch, disse que os trabalhos da corporação na região de Palimiú, seguem em andamento. Pois as ações da PF não são de caráter ostensivo, mas de investigação.
“Um pouco antes desse ataque, inclusive, uma equipe da PF, esteve na região de Palimiú, conversou com as lideranças da localidade e explicou o papel da Polícia Federal, que em nenhum momento deixa de atuar na região. Como é uma investigação em andamento, nós não podemos abrir aquilo que está sendo feito, até por uma questão de segurança e efetividade da medida a ser tomada”, disse o delegado.
O ofício também foi encaminhado ao Ministério Público Federal (MPF). Ao G1 o órgão informou que recebeu o documento e deu início à apuração. “Assim que forem ouvidos os envolvidos, o MPF definirá as medidas cabíveis”, complementou em nota.
Maior reserva indígena do Brasil, a Terra Yanomami tem quase 10 milhões de hectares entre os estados de Roraima e Amazonas. Cerca de 27 mil indígenas vivem na região, alvo de garimpeiros que invadem a terra em busca da extração ilegal de ouro.
Em 2020, o ano da pandemia, o garimpo ilegal avançou 30% na Terra Yanomami. Só o rio Uraricoera concentra 52% de todo o dano causado pela atividade ilegal.
A invasão garimpeira causa a contaminação dos rios e degradação da floresta, o que reflete na saúde dos Yanomami, principalmente crianças, que enfrentam a desnutrição por conta do escasseamento dos alimentos.
Em 24 de maio, uma decisão do Supremo Tribunal Federal ordenou que o governo federal adotasse medidas para proteger a Terra Yanomami. Antes, uma outra medida judicial determinou o envio de efetivo armado para que ficasse de forma permanente em Palimiú.
Via: G1 Roraima – Rede Amazônica
30/jul/2021
A Funai (Fundação Nacional do Índio) está levando adiante um plano de localização de indígenas em contexto de isolamento na terra Ituna-Itatá, no Pará, o que preocupa indigenistas e contraria recomendações do MPF (Ministério Público Federal) e do CNDH (Conselho Nacional de Direitos Humanos).
A portaria que interditou a área tem prazo de validade até janeiro próximo, quando precisa ser reeditada pelo governo federal por mais três anos. Se a Funai declarar que supostamente não localizou os indígenas, isso poderá ser usado pelos adversários políticos da terra indígena para questionar a interdição da área. Por outro lado, um contato pode levar doenças e colocar em risco a vida do grupo isolado, ainda mais no contexto da pandemia do coronavírus.
O país tem hoje 114 registros de indígenas em contexto de isolamento em diversos estados, mas não há notícia de outras expedições com a envergadura da que está sendo organizada para Ituna-Itatá.
A Funai elaborou um processo administrativo com mais de 70 páginas cujo assunto é “Plano de localização de índios isolados (registro no 110- Igarapé Ipiaçava), Terra Indígena Ituna-Itatá”.
Em 13 de abril último, o presidente da Funai, o delegado da Polícia Federal Marcelo Xavier, assinou um despacho pelo qual aprovou o plano de trabalho e um cronograma para a ação que ganhou o nome de “Expedição Locus”. Ele escreveu sobre “a necessidade de concluir sobre a existência ou não de indígenas isolados na referida área”.
Uma tabela produzida pela Funai mostra que a operação primeiramente seria desencadeada em quatro etapas entre o final de 2020 e o início de 2021 ao custo preliminar de R$ 200 mil. O plano foi adiado no ano passado mas, segundo apurou a coluna, já foi retomado.
A Terra Indígena Ituna-Itatá, com cerca de 142 mil hectares, é localizada nos municípios de Altamira e Senador José Porfírio, ambas no Pará. Ela foi interditada pela primeira vez em 2011, já que a proteção a indígenas isolados na região era um dos condicionantes para a licença de construção da usina hidrelétrica de Belo Monte. A cada três anos, a portaria de interdição precisa ser renovada.
As invasões na terra indígena recrudesceram nos últimos anos e o desmatamento atingiu “níveis alarmantes” a partir de 2016, segundo um relatório da Funai, levando o local ao “ranking das terras indígenas mais desmatadas do Brasil em 2019”. Naquele ano, primeiro do governo de Jair Bolsonaro, a terra indígena “passa a ser a terra indígena mais desmatada do país”, com aumento de 700% na taxa de desmatamento em um ano. Em 2020, foi desmatada uma área equivalente a mil campos de futebol.
A interdição da área, contudo, é alvo de pressões de políticos do Pará. Em setembro de 2019, o senador e pastor evangélico Zequinha Marinho (PSC-PA) encaminhou uma carta ao então ministro-chefe da Segov (Secretaria de Governo) da Presidência da República, o general da reserva Luiz Eduardo Ramos. Ele chamou de “grave equívoco” a portaria que, em janeiro de 2019, reeditou a interdição da terra Ituna- Itatá por mais três anos e pediu a anulação da decisão.
Senador pediu expedição para localizar os isolados
Na carta, senador pediu que fosse realizado “um levantamento in loco na região para constatar a existência, ou não, desses índios, que até hoje ninguém daquelas localidades conheceram”. A Funai deu à sua operação o nome de “Locus” (lugar específico), que lembra a expressão in loco usada pelo senador.
Meses depois da carta, o senador gravou um vídeo de apoio a garimpeiros ilegais do Pará que protestavam contra uma operação doIbama que reprimia crimes ambientais no Estado.
Em nota à coluna do UOL em novembro de 2020, o senador afirmou que “caso seja comprovada a existência de índios isolados, aquela área será corretamente decretada como Terra Indígena, caso não se comprove a existência de indígenas, a terra deverá ser finalmente desbloqueada, amenizando os conflitos rurais na região”.
Em novembro passado, depois que o UOL revelou que a Funai trabalhava com a possibilidade de reduzir a Ituna-Itatá quase à metade, o MPF de Altamira (PA) recomendou que o órgão se abstivesse de realizar qualquer operação de localização de indígenas isolados na região. A paralisação, segundo o MPF, deveria durar até que o governo federal providenciasse a retirada de invasores, madeireiros e grileiros e a regularização fundiária da área.
Na mesma época, a organização não governamental OPI (Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato) divulgou um relatório de 81 páginas que revelou a “movimentações de atores públicos para a redução da Terra Indígena Ituna-Itatá”. A OPI procurou o MPF.
No relatório, a OPI manifestou preocupação sobre operação de localização de isolados, ainda mais no contexto da pandemia do coronavírus. “As informações levantadas pela equipe da Frente de Proteção Etnoambiental do Médio Xingu formam um conjunto coerente sobre a presença dos isolados, tanto do ponto de vista geográfico (mobilidade através de um corredor situado nas cabeceiras dos igarapés) como do ponto de vista histórico (relação das informações recentes com os registros historiográficos sobre a ocupação indígena)”, aponta o relatório.
Em maio último, o CNDH (Conselho Nacional dos Direitos Humanos) aprovou um relatório pelo qual recomendou à Funai “abster-se de dar prosseguimento nas atividades de localização dos indígenas isolados da TI Ituna/Itatá até que todos os invasores da Área de Restrição de Uso sejam retirados, promovendo a integridade física e territorial dos isolados e garantindo a segurança mínima necessária para a atuação da equipe de campo da Funai”.
Em resposta de dezembro de 2020 à recomendação do MPF, o diretor do DPT (Departamento de Proteção Territorial) da Funai, Cesar Augusto Martinez, respondeu que “não caberia, em nosso entendimento, falar em processo de desintrusão da TI Ituna-Itatá, por ser esse um procedimento posterior à homologação do território devidamente identificado como de ocupação tradicional de povo ou grupo indígena isolado”.
No ofício, Martinez disse ainda ao MPF que entendia “ser essencial que a Funai mantenha a realização da Expedição de Localização, uma vez que se trata de trabalho cuja continuidade e aprofundamento se configura como único mecanismo possível para a efetiva verificação da possível existência de indígenas isolados na TI Ituna-Itatá, partindo, claramente, do pressuposto de garantia de condições de segurança não só pela Funai, mas pelo Estado brasileiro e suas forças de segurança”.
Funai diz que expedições “têm caráter reservado”
Em nota enviada à coluna nesta quinta-feira (29), a Funai disse que, “por meio de sua Coordenação-Geral de Índios Isolados e de Recente Contato (CGIIRC), vem realizando, periodicamente e de forma sistematizada, expedições para esclarecer e consolidar com provas (positivas ou negativas) os registros de índios isolados, bem como realizar o monitoramento e proteção das áreas onde existem tais registros”.
Indagada se recebeu pedidos da Presidência da República ou do senador Zequinha Marinho para realizar a expedição, a Funai respondeu: “Como as expedições têm caráter reservado, visando à proteção de tais comunidades indígenas, a Funai não informa as datas nem o local de sua realização. A fundação esclarece ainda que as expedições são planejadas e realizadas pela CGRIIC com base em critérios técnicos, e jamais por solicitação ou a pedido de terceiros”.
“Com relação às medidas de prevenção ao coronavírus, a Funai esclarece que, na execução dos trabalhos, cumpre todos os protocolos de saúde necessários e estabelecidos pelos órgãos sanitários. Cabe ressaltar também que a Funai, dentro dos limites legais, atende a todas as recomendações do Ministério Público Federal”, afirmou a nota.
Via Coluna – Rubens Valente do Portal de Noticiais UOL
30/jul/2021
Um indígena morreu ao ser atropelado por um avião de garimpeiros em uma pista na comunidade Homoxi, Terra Indígena Yanomami, em Roraima. A afirmação é do presidente do Conselho de Saúde Indígena Yanomami e Ye’kuanna (Condisi-YY), Júnior Hekurari Yanomami, que, nesta sexta-feira (30), comunicou as autoridades sobre o caso.
A vítima tinha 25 anos e se chamava Edgar Yanomami. O atropelamento foi por volta de 14h30 de quarta-feira (28), informou Hekurari. O jovem indígena morreu na hora. Depois do acidente, pousou no local uma segunda aeronave que foi apreendida pelos indígenas.
Segundo o presidente da Condisi-YY, Homoxi é uma comunidade que foi cercada pelo garimpo ilegal na região, de forma que indígenas vivem no meio dos invasores.
Segundo relatos feitos ao Condisi-YY, após o acidente, os próprios garimpeiros levaram o corpo de Edgar para a comunidade Yamasipiu, região de Haxiu, distante cerca de 15 Km de onde ocorreu o atropelamento.
A pista onde ocorreu o atropelamento foi aberta no meio da floresta por volta de 1980 por garimpeiros. Hoje em dia, ela também é usada pela Sesai para levar servidores que atuam no posto da comunidade.
Um ofício relatando a morte do jovem e cobrando providências, feito pelo Condisi-YY, foi enviado à Polícia Federal, Frente de Proteção Etnoambiental Yanomami e Ye’kuana da Fundação Nacional do Índio (Funai), Polícia Civil, Ministério Público Federal, Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami e Secretaria Especial de Saúde Indígena – subordinados ao Ministério da Saúde.
Procurada, a Polícia Civil informou ao G1 Roraima que não foi registrado boletim de ocorrência e o Instituto Médico Legal (IML) também não foi acionado para remover o corpo.
Indígenas que vivem em Homoxi disseram que os garimpeiros ainda tentaram suborná-los com ouro para que eles não divulgassem nada sobre o atropelamento.
“Ele foi atropelado 14h30 e disseram que umas 15h20 eles levaram o corpo de helicóptero. Os garimpeiros falaram para os yanomami não denunciar e deram ouro para a família dele. Eu vi o ouro, mas não tinha como tirar foto. Tinham muitos garimpeiros armados no local”, disse Hekurari, acrescentando que os invasores circulam normalmente entre os indígenas que vivem em Homoxi.
Ainda conforme Hekurari, os indígenas e os próprios garimpeiros contaram que o corpo, junto com a esposa e os três filhos da vítima, foi retirado da comunidade em um helicóptero dos garimpeiros. Depois do acidente, um outro avião de pequeno porte pousou na pista e foi retido pelos indígenas. O piloto fugiu.
“O pessoal segurou esse avião pensando que era ele de novo [o piloto] pousando e está lá, retido. Furaram os pneus”, disse. Hekurari identificou que havia manchas de sangue na pista onde ocorreu ao atropelamento.
Durante o tempo em que esteve em Homoxi, Hekurari disse ter notado que o movimento de garimpeiros é intenso na localidade. “Homoxi é uma comunidade que fica dentro do garimpo. Quer dizer, destruíram a comunidade [com a invasão garimpeira]”, disse.
“Enquanto estive lá, vi uns 10 ou 11 helicóptero pousando. […] Os garimpeiros controlam a pista. Antes de descer, demos muitas voltas até liberarem a pista “, afirmou o presidente do Condisi-YY.
Em Homoxi vivem cerca de 254 yanomami. A comunidade é uma das três citadas na denúncia feita pelo Condisi-YY de que servidores da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), ligada ao Ministério da Saúde, vacinaram garimpeiros em troca de ouro. O Ministério da Saúde e o Ministério Público Federal (MPF) investigam.
Maior reserva indígena do Brasil, a Terra Yanomami tem quase 10 milhões de hectares entre os estados de Roraima e Amazonas, e parte da Venezuela. Cerca de 27 mil indígenas vivem na região em mais de 360 comunidades.
A área é alvo do garimpo ilegal de ouro desde a década de 1980. Mas, nos últimos anos, essa busca pelo minério se intensificou, causando além de conflitos armados, a degradação da floresta e ameaça a saúde dos indígenas.
A invasão garimpeira causa a contaminação dos rios e degradação da floresta, o que reflete na saúde dos Yanomami, principalmente crianças, que enfrentam a desnutrição por conta do escasseamento dos alimentos.
O número de casos de Covid entre indígenas que habitam a região, aumentou em razão da presença de garimpeiros. No ano passado, em apenas três meses, as infecções avançaram 250%.
Via: G1 Roraima – Rede Amazônica
29/jul/2021
Documento encaminhado ao Itamaraty em 28 de maio, e só tornado público esta semana, cobra o governo de Jair Bolsonaro a dar explicações sobre o aumento da violência contra os povos Yanomami e Munduruku. A carta é assinada por oito relatores especiais da ONU e alerta para a existência de uma preocupação internacional sobre o que “aparenta ser violações de normas e padrões internacionais”. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e associações indígenas de base têm buscado denunciar e mobilizar instâncias do internacionais para a proteção dos povos indígenas em situação mais vulnerável.
Entre as preocupações listadas na carta estão os ataques contra a Associação de Mulheres Wakoborun, em Jacareacanga (PA), os ataques contra a Terra Indígena Yanomami (RR), a contaminação pelo mercúrio de terras indígenas e o projeto de lei 191/2020, que regulariza a mineração nas reservas. O envio de uma carta conjunta entre um número elevado de relatores da ONU revela a dimensão da preocupação que hoje o Brasil gera na comunidade internacional. No sistema eletrônico da organização, não consta qualquer resposta por parte da diplomacia brasileira. “As alegações aparentam ser, prima facie, violações de normas e padrões internacionais de direitos humanos”, dizem os oito relatores que assinam a denúncia. Entre as leis violadas estaria ao do direito à vida, argumento similar ao apresentado na ADPF 709 (Arguição por Descumprimento de Preceito Fundamental).
Na carta, os relatores pedem que o governo explique o que tem feito para evitar essa violência e os ataques contra indígenas. Além disso, pedem para que as autoridades expliquem como têm lutado contra o garimpo. Brasília também é cobrada sobre a ação do governo para lidar com o desmatamento, a covid-19 em terras indígenas e saúde da população local. Ataques Um dos casos destacados é do garimpo na bacia do Tapajós, no Pará. De acordo com a carta, o Ministério Público Federal foi alertado sobre invasões por conta da exploração de ouro e o potencial confronto entre indígenas e a mineração ilegal. “Mas nenhuma proteção efetiva foi garantida até hoje”, escreveram.
As preocupações presentes na carta dos relatores da ONU estão também na ADPF 709, ajuizada em julho de 2020 pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e por seis partidos, visando à adoção de providências no combate à epidemia da Covid-19 entre a população indígena. Em maio de 2021, foi apresentado pedido de tutela provisória antecipada com base nos relatos de ataques a tiros a indígenas, mortes, desnutrição, anemia, contágio por mercúrio, desmatamento e garimpo ilegal, bem como a prática de ilícitos de toda ordem decorrentes da presença de invasores nas terras indígenas durante a pandemia. Na peça, sustentaram também que a presença de invasores é responsável pelo contágio das comunidades por Covid-19, e pediram o deferimento da medida para assegurar a vida, a saúde e a segurança desses povos no contexto da crise sanitária.
A carta dos relatores da ONU indica como os grupos indígenas têm se organizado de maneira própria para se defender da invasão de garimpeiros, inclusive criando patrulhas, destruindo pontes construídas por invasores e removendo do local máquinas usadas pelo garimpo. Segundo eles, porém, esse grupo enfrenta “ameaças e intimidação”. Diversos incidentes são relatados no documento, entre eles a ação de homens armados que impediram que indígenas desembarcassem de seus barcos em seus próprios territórios. Das 3,7 mil minas de ouro abertas na região do Tapajós desde 2014, um quarto ocorre em áreas protegidas onde a mineração é proibida pela Constituição. Só nas terras do povo Munduruku, são 422 minas ilegais. Mas, entre 2017 e 2019, houve um aumento de 239% no garimpo ilegal em sua região. Em maio de 2021 uma ação da Polícia Federal aumentou a tensão na região.
O documento também aponta como, em junho de 2020, procuradores recomendaram a ação da Polícia Federal. Mas o monitoramento, dois meses depois, teria sido interrompido pelo Ministério da Defesa. Outro ataque destacado na carta ocorreu contra a Associação das Mulheres Munduruku Wakoborũn, em março de 2021. Garimpeiros invadiram o local e colocaram fogo em documentos e escritórios da entidade. A Associação, segundo os relatores, tem sido ativa no monitoramento das invasões de terras indígenas. O documento ainda denuncia como as atividades ilegais dos garimpeiros ainda contaminam com mercúrio os rios locais e afeta a sobrevivência de comunidades. No território Sawré Muybu, testes realizados em três aldeias apontaram que 58% da população apresentava níveis inaceitáveis de mercúrio no sangue.
Os ataques contra grupos Yanomamis, intensificados desde o mês de maio também estão presentes no documento, com destaque para o ataque de 11 de maio, quando policiais que investigavam invasões foram alvo de disparos direcionados contra a comunidade indígena. No dia 16 de maio, mais um ataque de garimpeiros, dessa vez com o uso de 15 barcos e bombas de gás conta a comunidade Palimiu.
“Pesquisas indicam que as atividades de garimpeiros se intensificaram desde 2020, diante do aumento de 30% de aumento da degredado ambiental na região”, afirma o documento. A atuação de milhares de garimpeiros ilegais ocasiona sérios impactos sócio-econômicos, contaminação e proliferação da covid-19.
Outra preocupação da ONU se refere ao projeto de Lei 191 que libera a mineração em terras indígenas. O que chama a atenção dos relatores é de que, ainda que a proposta preveja a “consulta” de grupos indígenas, eles não teriam o poder de vetar. Mais de 863 mil quilômetros quadrados de florestas poderiam ser afetadas. Há ainda a preocupação de que isso pode se transformar em estopim para conflitos de terra, expondo grupos indígenas à violência, mais contaminação e doenças. “Além disso, impacto ambiental substancial devem ser esperados, tal como desmatamento, perda de biodiversidade e contaminação de solos e rios”, completam os relatores.
Com informações da coluna de Jamil Chade no UOL, publicada em 28/07/2021: https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2021/07/28/onu-denuncia-escalada-de-violencia-contra-indigenas-nos-anos-bolsonaro.htm