Posicionamento a respeito da prorrogação da Câmara de Conciliação do STF

Nesta‬‭ segunda-feira,‬‭ 12‬‭ de‬‭ maio‬‭ de‬‭ 2025,‬‭ retomam-se‬‭ os‬‭ trabalhos‬‭ da‬‭ Câmara‬‭ de‬ Conciliação‬‭ sobre‬‭ a‬‭ Lei‬‭ nº ‬‭ 14.701/2023,‬‭ conhecida‬‭ como‬‭ “Lei‬‭ do‬‭ Marco‬‭ Temporal.‬‭ Em‬‭ abril,‬ a‬‭ Câmara‬‭ dos‬‭ Deputados‬‭ e‬‭ o‬‭ Senado‬‭ Federal‬‭ solicitaram‬‭ a‬‭ prorrogação‬‭ do‬‭ prazo‬‭ para‬‭ a‬ conclusão‬‭ da‬‭ análise‬‭ do‬‭ anteprojeto‬‭ de‬‭ lei‬‭ complementar,‬‭ pedido‬‭ seguido‬‭ pela‬‭ Advocacia-Geral‬‭ da‬‭ União‬‭ (AGU).‬‭ A‬‭ sessão‬‭ de‬‭ hoje‬‭ dá‬‭ continuidade‬‭ à‬‭ leitura‬‭ a‬‭ partir‬‭ do‬ artigo‬‭ 19‬‭ do‬‭ texto‬‭ apresentado‬‭ pelo‬‭ gabinete‬‭ de‬‭ Gilmar‬‭ Mendes‬‭ e,‬‭ ao‬‭ mesmo‬‭ tempo,‬‭ lê‬ artigos‬‭ correspondentes‬‭ (se‬‭ existirem)‬‭ na‬‭ proposta‬‭ apresentada‬‭ pela‬‭ AGU.‬‭ As‬‭ audiências‬ estão previstas para se encerrar em 25 de junho de 2025.‬

A‬‭ Articulação‬‭ dos‬‭ Povos‬‭ Indígenas‬‭ do‬‭ Brasil‬‭ se‬‭ retirou‬‭ desse‬‭ processo‬‭ por‬ considerá-lo‬‭ ilegítimo‬‭ e‬‭ inconstitucional.‬‭ O‬‭ espaço‬‭ de‬‭ negociação‬‭ foi‬‭ instituído‬‭ sem‬‭ a‬‭ devida‬ consulta‬‭ aos‬‭ povos‬‭ indígenas,‬‭ em‬‭ clara‬‭ violação‬‭ ao‬‭ artigo‬‭ 6º da‬‭ Convenção‬‭ 169‬‭ da‬‭ OIT,‬ ignorando‬‭ recursos‬‭ e‬‭ denúncias‬‭ apresentados‬‭ ao‬‭ longo‬‭ do‬‭ tempo‬‭ pela‬‭ organização,‬ reconhecida por sua legítima representação indígena.‬

‭Mais‬‭ uma‬‭ vez,‬‭ reiteramos‬‭ a‬‭ preocupação‬‭ com‬‭ o‬‭ andamento‬‭ das‬‭ audiências‬ conduzidas‬‭ pelo‬‭ ministro‬‭ Gilmar‬‭ Mendes.‬‭ Sob‬‭ a‬‭ justificativa‬‭ de‬‭ reunir‬‭ sugestões‬‭ e‬‭ buscar‬ alternativas‬‭ de‬ “meio-termo” entre‬‭ os‬‭ interesses‬‭ dos‬‭ povos‬‭ indígenas‬‭ e‬‭ do‬‭ agronegócio,‬‭ seu‬ gabinete‬‭ extrapolou‬‭ os‬‭ limites‬‭ do‬‭ papel‬‭ de‬‭ relator,‬‭ ultrapassando‬‭ o‬‭ escopo‬‭ da‬‭ Lei‬‭ nº 14.701/2023‬‭ e‬‭ dos‬‭ debates‬‭ travados‬‭ na‬‭ Comissão‬‭ Especial.‬‭ A‬‭ iniciativa‬‭ de‬‭ apresentar‬‭ um‬ anteprojeto‬‭ de‬‭ lei‬‭ oriunda‬‭ de‬‭ um‬‭ ministro‬‭ do‬‭ Supremo‬‭ Tribunal‬‭ Federal‬‭ é,‬‭ por‬‭ si‬‭ só,‬ inadequada;‬‭ além‬‭ disso,‬‭ o‬‭ conteúdo‬‭ da‬‭ proposta‬‭ representa‬‭ graves‬‭ retrocessos,‬‭ o‬‭ chamado‬ relevante‬‭ interesse‬‭ público‬‭ da‬‭ União‬‭ nesses‬‭ territórios‬‭ (Art.‬‭ 231,‬‭ §6º),‬‭ além‬‭ de‬‭ modificar‬ substancialmente‬‭ o‬‭ procedimento‬‭ administrativo‬‭ de‬‭ demarcação‬‭ previsto‬‭ no‬‭ Decreto‬‭ nº 1.775/1996,‬‭ prevê‬‭ a‬‭ criminalização‬‭ de‬‭ retomadas‬‭ indígenas,‬‭ remoção‬‭ forçada‬‭ de‬‭ indígenas‬ sob‬‭ justificativa‬‭ de‬‭ “Paz‬‭ Social”, revisão‬‭ e‬‭ reanálise‬‭ de‬‭ procedimentos‬‭ administrativos‬ demarcatórios‬‭ em‬‭ andamento,‬‭ fragilizar‬‭ o‬‭ direito‬‭ à‬‭ consulta‬‭ livre,‬‭ prévia‬‭ e‬‭ informada,‬ assegurado pela Convenção 169 da OIT.‬

‭Diante‬‭ do‬‭ exposto,‬‭ a‬‭ APIB‬‭ reafirma‬‭ sua‬‭ posição‬‭ contrária‬‭ ao‬‭ prosseguimento‬‭ dos‬ trabalhos‬‭ desta‬‭ Câmara‬‭ de‬‭ Conciliação,‬‭ considerando‬‭ que‬‭ os‬‭ direitos‬‭ fundamentais‬‭ dos‬ povos indígenas são inegociáveis.‬‭

De modo sucinto, elencamos os principais problemas que seguem em debate na Câmara de Conciliação:

● Proposta de Lei Complementar em detrimento da natureza ordinária da Lei no 14.701/2023 (Art. 1o): A Lei no 14.701/2023 se propôs a regulamentar exclusivamente o Art. 231 da Constituição Federal. Por essa razão, sua inconstitucionalidade formal deveria ter sido declarada, em vez de ser convertida em lei complementar e expandida para temas não originalmente tratados. A transformação da norma e a ampliação de seu escopo avançaram sobre propostas não debatidas previamente e que não deveriam partir de um Ministro do Supremo Tribunal Federal, ferindo a separação dos poderes e o devido processo legislativo. O Art. 1o da proposta de PLC estabelece, que sua finalidade é regulamentar o Art. 231 da Constituição, abrangendo o reconhecimento, a demarcação, o uso e a gestão das terras indígenas – em especial, regulamentando a mineração (Art. 231, §3o) e o relevante interesse público da União em Terras Indígenas (Art. 231, §6o), além dos dispositivos constitucionais que tratam da autorização do Congresso Nacional e da concessão da União para pesquisa e lavra mineral (Arts. 49, XVI, e 176, §1o), bem como da competência da Justiça Federal para julgar disputas sobre direitos indígenas (Art. 109, XI);

● Regulamentação do “Relevante Interesse Público da União” em Terras Indígenas (Art. 21): O anteprojeto de Lei Complementar define que obras de infraestrutura, exploração mineral e atividades de defesa nacional podem restringir o usufruto exclusivo indígena. A proposta de Lei Complementar advém do reconhecimento, pelo Gabinete do Ministro Gilmar, de que haveria uma omissão inconstitucional do Congresso em não editar a referida lei. No entanto, trata-se de discricionariedade do Congresso regulamentar a matéria e APIB e União alertam que a medida atende antes a interesses privados do que ao chamado “relevante interesse público”, facilitando a exploração econômica das terras indígenas;

● Fragilização da Consulta Prévia, Livre e Informada (Arts. 27 a 31): A proposta esvazia o direito à consulta prévia, livre e informada dos povos indígenas, constante na Convenção 169 da OIT, ao transformar o processo em uma mera formalidade, sem garantir sua efetiva influência nas decisões. Apesar de listar diretrizes como respeito à diversidade cultural e transparência, o texto impõe limitações ao estabelecer que, mesmo diante da manifestação contrária das comunidades, atividades e empreendimentos poderão prosseguir com base em critérios vagos de “interesse público” e “proporcionalidade”. Além disso, ao concentrar no Presidente da República o poder de autorizar a continuidade das atividades contra a vontade dos povos indígenas, a proposta enfraquece a autodeterminação dessas comunidades e facilita a imposição de projetos potencialmente prejudiciais a seus territórios e modos de vida;

● Criminalização das Retomadas Indígenas (Arts. 82 a 88): Proíbe retomadas antes da desocupação voluntária por não-indígenas ou da conclusão da demarcação, o que pode levar à criminalização de comunidades indígenas e justificar ações policiais estaduais contra elas. A proposta do Ministro Gilmar Mendes prevê que, para as áreas ocupadas até 23 de abril de 2024 – data em que o mesmo suspendeu as ações judiciais contra a Lei no 14.701/2023 -, Polícia Federal, Força Nacional e Polícia Militar deverão empreender protocolos de negociação para a desocupação em 30 dias. Já para retomadas indígenas posteriores a esta data, será determinada a remoção imediata, sem possibilidade de mediação pelas Comissões de Soluções Fundiárias, criadas pela Resolução CNJ no 510/2023, por determinação do STF na ADPF no 828. Vale lembrar que, no Caso Raposa Serra do Sol, o STF reconheceu a legitimidade das retomadas indígenas diante da inércia do Estado, que deveria ter concluído a demarcação desses territórios em cinco anos após a promulgação da Constituição;

● Remoção Forçada de Indígenas sob justificativa de “Paz Social” (Art. 6o, §13, III): Estabelece que, em casos em que seja “demonstrada a absoluta impossibilidade da demarcação” e “buscando a paz social”, o Ministério da Justiça e Segurança Pública poderá realizar uma “compensação” às comunidades indígenas, concedendo “terras equivalentes às tradicionalmente ocupadas”, o que remonta às remoções forçadas de indígenas pelo Serviço de Proteção ao Índio (SPI) e é rechaçado pela Constituição Federal de 1988. Não são objeto de definição objetiva, por fim, o que caracterizaria a impossibilidade de demarcação e a quem atenderia a compensação aos indígenas visando a “paz social”.

● Substituição da Demarcação de Terras Indígenas por Desapropriação de Interesse Social (Art. 89, §4o): A partir de um ano após a aprovação da referida Lei Complementar, novos pedidos de demarcação serão considerados apenas para áreas onde houver comprovação da presença de povos indígenas isolados. A minuta estabelece que a FUNAI deverá publicar, em uma “lista pública”, no prazo de até 60 dias após a entrada em vigor da lei, os pedidos de demarcação apresentados pelos indígenas, devendo essa lista ser atualizada mensalmente em caso de novas solicitações. Contudo, o texto prevê que as reivindicações feitas após um ano da divulgação dessa lista serão processadas exclusivamente por meio de desapropriação por interesse social, exceto nos casos em que houver identificação posterior de indígenas isolados, situação em que se aplicará o procedimento regular de demarcação;
● Indenização por Terra Nua a Ocupantes Não Indígenas (Arts. 10 a 12): A proposta prevê que, após a homologação e antes do registro da terra indígena, ocupantes não indígenas com posse direta, contínua e anterior a 5 de outubro de 1988 sejam reassentados ou indenizados pela terra nua e benfeitorias; caso contrário, apenas benfeitorias úteis e necessárias serão compensadas. A terra nua será avaliada conforme a tabela do ITR, que é um valor próximo ao valor de mercado, com pagamento em dinheiro ou permuta de imóvel equivalente. Além de não estar prevista na Constituição, a indenização por terra nua pode inviabilizar demarcações e comprometer políticas indigenistas, como no caso Nhanderu Marangatu, cuja indenização total alcançou metade do orçamento anual da FUNAI em 2024;

● Direito de Retenção de Particulares até Recebimento da Indenização (Art. 11, §2o): A proposta garante o direito de retenção ao não-indígena, permitindo sua permanência na área até o pagamento do valor incontroverso da indenização da terra nua e das benfeitorias em dinheiro ou título da dívida agrária, se for do seu interesse. Ocorre que não se pode admitir que o direito de retenção seja utilizado pelo particular para impedir a realização do dever constitucional da União de demarcar as Terras Indígenas, impondo que a procrastinação na definição do valor da indenização impeça o acesso da comunidade indígena a seu território tradicional, o que é objeto de embargos de declaração da União e do Povo Xokleng no RE 1017365/SC (Tema 1031) pendentes de julgamento;

● Definição de Renitente Esbulho para fins indenizatórios restrita a Conflito Físico ou Controvérsia Judicial (Art. 4o, §1o): Outro ponto da proposta que também deve aguardar o julgamento dos embargos de declaração no RE 1017365/SC é a definição de renitente esbulho. Isso porque, nos termos do Item IV do Tema 1031, caso exista renitente esbulho contemporâneo à promulgação da Constituição, somente serão indenizadas as benfeitorias úteis e necessárias. Uma definição restritiva do renitente esbulho que requer da comunidade indígena a comprovação de conflito físico ou a judicialização de demanda possessória desconsidera a remoção forçada dos povos indígenas de suas terras pelo próprio Estado e o paradigma tutelar que os impedia de acessar a justiça diretamente. Razão pela qual se requer, em sede de embargos, definição mais ampla do renitente esbulho no que diz respeito à sua vinculação à presença indígena na área segundo seus usos, costumes e tradições;

● Ampliação da Participação de Entes Federados e Terceiros no Processo de Demarcação antes da Delimitação da Ocupação Indígena (Art. 6o, II, b e Art. 5o, §§2o e 3o): Estados e municípios poderão participar dos grupos técnicos desde o plano de trabalho, ao indicar técnicos para acompanhar estudos de demarcação, ampliando a influência de interesses econômicos locais. Também é prevista a intimação de proprietários rurais antes mesmo da definição do perímetro da área de ocupação indígena. Esse mecanismo enfraquece o direito indígena ao território ao permitir interferências no processo antes da conclusão dos estudos técnicos e
publicação do Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação. A proposta exige, ainda, a gravação de informações orais de indígenas, comprometendo a metodologia antropológica. Além disso, facilita contestações, tornando o processo mais lento;

● Revisão e Reanálise de Procedimentos Administrativos Demarcatórios (Art. 89): Determina que processos de demarcação não finalizados devem seguir novas regras, alterando critérios técnicos já consolidados. Apenas terras já declaradas e homologadas e os RCIDs já aprovados permaneceriam resguardados. Além disso, processos decisórios no Ministério da Justiça e na Presidência da República precisarão se adequar às novas normas, incluindo as regras de indenização. Trata-se de imposição de reanálise arbitrária e protelatória, dado que a retroatividade da lei aos procedimentos administrativos em curso afronta os Arts. 5o, incisos incisos XXXVI, LXXVIII e Art. 37, caput pois lei nova não pode atingir direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada, tampouco a Administração Pública poderia inobservar a eficiência e a celeridade processual de seus atos administrativos;

● Redimensionamento de Terras Indígenas (Art. 14): A proposta restringe, ao período de cinco anos contados da demarcação, o direito da comunidade indígena solicitar a revisão da extensão do seu território por descumprimento do Art. 231. Ainda que esteja de acordo com o que o STF decidiu no Tema 1031, há questionamentos sobre o prazo decadencial desse direito constitucional pendentes de julgamento nos embargos ao RE 1017365/SC (Caso Xokleng). Tendo em vista que a imposição desse prazo impediria a correção de demarcações feitas em desacordo com o artigo 231 da Constituição, mesmo quando comprovado erro grave e insanável. Além disso, o STF
já consolidou o entendimento de que atos administrativos flagrantemente inconstitucionais não podem ser protegidos pela decadência legal, garantindo que a revisão de processos demarcatórios possa ocorrer sempre que houver violação dos direitos indígenas assegurados constitucionalmente.

Diante destas considerações, o espaço da câmara de conciliação se tornou um espaço
ilegítimo e inconstitucional.

Nota pública a respeito do julgamento de recursos judiciais pelo TRF1 a respeito do projeto Potássio Brasil Autazes na Terra Indígena Soares

Nota pública a respeito do julgamento de recursos judiciais pelo TRF1 a respeito do projeto Potássio Brasil Autazes na Terra Indígena Soares

As organizações indígenas APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), COIAB (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira) e APIAM (Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Amazonas) vêm a público manifestar seu veemente repúdio à decisão proferida pela 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), no julgamento do Agravo de Instrumento nº 1037175-40.2023.4.01.0000, ocorrido no dia 07 de maio de 2025. O julgamento, que deveria analisar 19 agravos interpostos no contexto da tentativa de imposição do Projeto Potássio Autazes, que visa instaurar um projeto de mineração sobreposto à Terra Indígena Soares, resultou na análise isolada de apenas um recurso, com decisões parciais e falas inaceitáveis de dois dos três desembargadores que compuseram a sessão.

Contrariamente ao que tem sido difundido por setores da mídia, a decisão não representa vitória para o povo Mura, tampouco reforça o direito à autonomia indígena. Pelo contrário, a decisão válida uma consulta forjada, manipulada e desrespeitosa aos protocolos próprios do povo Mura, ao excluir comunidades diretamente afetadas — como a do Lago do Soares — e suas representações legítimas, como a OLIMCV (Organização de Lideranças Indígenas Mura de Careiro da Várzea). A tentativa de legitimar esse processo de consulta — viciado desde a origem — fere frontalmente os preceitos da Convenção 169 da OIT e do artigo 231 da Constituição Federal.

As provas constantes nos autos demonstram que o projeto da Potássio do Brasil incide sobre a Terra Indígena Soares, reivindicada desde 1997 e com estudos de demarcação em curso pela FUNAI. Análises cartográficas da própria Fundação Nacional dos Povos Indígenas confirmam a sobreposição do empreendimento sobre o território tradicional. Ignorar essas evidências, como fizeram os votos dos desembargadores no julgamento, é abrir precedente gravíssimo para a violação sistemática dos direitos territoriais indígenas em nome do discurso desenvolvimentista.

Reafirmamos que não se trata de debate sobre regularidade procedimental, mas sim da proteção de direitos fundamentais. A tentativa de dividir o povo Mura, criar falsos consensos e deslegitimar lideranças históricas representa manipulação institucional inaceitável. As decisões tomadas no processo em julgamento estão lastreadas em atas adulteradas, denúncias de cooptação e exclusão de comunidades contrárias ao projeto — fatos amplamente documentados no processo.

Ademais, a tentativa dos desembargadores de afirmar que não há terra indígena na área, ao mesmo tempo em que se reconhece uma “consulta indígena” à população local, é contraditória e revela o uso estratégico de retóricas jurídicas para enfraquecer os direitos indígenas. Ao afirmarem que houve consulta às comunidades indígenas, os desembargadores reconhecem a existência das comunidades indígenas e de suas terras. Consequentemente, é necessário que tenha autorização do Congresso Nacional conforme estabelece a Constituição Federal de 1988, matéria que os desembargadores não levaram em consideração.

Por fim, o alerta que trazemos é o de que a forma como este caso venha a ser decidido servirá de paradigma para outros empreendimentos que aguardam a fragilização dos direitos indígenas como porta de entrada para seus projetos. Uma decisão que viole o direito à consulta prévia, livre e informada, que desconsidere aos direitos territoriais do povo Mura e que tolere manipulações internas entre comunidades, é uma autorização velada para o avanço do extrativismo sobre os territórios indígenas de todo o país. Por isso, confiamos que o TRF1 reafirmará o compromisso com a Constituição e com os povos originários, sem legitimar um processo marcado por violações.

Brasília, 09 de maio de 2025.

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB

Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB

Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Amazonas – APIAM

NOTA DE REPÚDIO: CONAFER É FRAUDE!

NOTA DE REPÚDIO: CONAFER É FRAUDE!

A Apib repudia a Conafer e sua atuação corrupta dentro dos territórios indígenas. A Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares do Brasil, organização vinculada ao agro, lucrou bilhões desviando ilegalmente os benefícios de aposentados e pensionistas, em grande parte de povos indígenas, conforme foi veiculado em distintos meios de comunicação, após a “Operação Sem Desconto” deflagrada pela Polícia Federal e pela Controladoria-Geral da União, em abril. 

Através de convênios que deveriam fornecer serviços como assistência jurídica e odontológica, a confederação descontava valores diretamente do INSS, muitas vezes sem autorização. O esquema gerou R$6,3 bilhões em descontos sobre 6 milhões de pessoas.

Manifestamos apoio às investigações da Polícia Federal e esperamos que a Conafer responda por seus atos, sendo investigada, julgada e punida no rigor da lei. Não compactuamos com esse tipo de atitude, que viola os direitos dos cidadãos, especialmente dos povos indígenas. E não incentivamos nenhum parente a apoiar nenhuma entidade que se usa de fraude para arrancar o dinheiro dos mais necessitados.

A Apib orienta aos povos indígenas que não gravem vídeos, não manifestem apoio à entidade e evitem vincular sua imagem a qualquer símbolo ligado à Conafer. Nós não compactuamos com a postura criminosa e oportunista de mais esta entidade do Agro e temos suspeitas de existem outros crimes mais graves escondidos sob a fachada de organização sem “ideologias políticas”. 

O presidente da Conafer, Carlos Roberto Ferreira Lopes, é um empresário mineiro da área de melhoramento genético de gado, possui uma holding nos EUA (Concepto Vet e da holding Farmlands) e gosta de aparecer usando cocar, dizendo ser descendente de indígenas. Seu filho tem uma empresa de mineração no norte de Minas Gerais (Lagoa Alta).

A Conafer foi fundada em 2011 afirmando representar agricultores familiares sem vínculos “político-ideológicos”, o que sabemos ser um discurso amplamente utilizado pela direita quando quer iludir cidadãos brasileiros.

Para entrar nos territórios eles oferecem caminhonete locada e salário às lideranças, patrocinam assembleias, torneios de futebol, entregam cestas básicas, e promovem mutirões previdenciários, através dos quais fazem os desvios financeiros. 

A organização se aproveitou da crise causada pela reforma trabalhista, promovida durante o governo golpista de Michel Temer, em 2016. E aprofundou sua atuação durante o governo fascista de Bolsonaro, após uma normativa de 2022. A atuação dentro das comunidades indígenas se intensificou a partir de 2018.

Conhecendo as reais intenções da entidade, temos a certeza de que os povos indígenas do Brasil não permitirão mais a entrada da Conafer em seus territórios.

Brasília – DF, 28 de abril de 2025.

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB

Apib repudia atos de violência do Congresso anti-indígena

Apib repudia atos de violência do Congresso anti-indígena

Foto: Richard Wera/Apib

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) repudia de forma veemente os atos de violência do Congresso anti-indígena, cometidos pelo Departamento de Polícia Legislativa (DPOL) e pela Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) na tarde desta quinta-feira, 10, durante a marcha “A Resposta Somos Nós”, que faz parte da programação do Acampamento Terra Livre (ATL).

O Congresso, além de aprovar leis inconstitucionais, ataca os povos indígenas e seus próprios deputados. A deputada indígena Célia Xakriabá (PSOL) e várias pessoas ficaram feridas ao serem recebidas com bombas de gás de pimenta e efeito moral, no local que deveria ser a casa da democracia. Lamentamos o uso desnecessário de substâncias químicas contra os manifestantes, mulheres, idosos, crianças e lideranças tradicionais.

Temos evidências de que os atos fazem parte de um contexto de violência institucional disseminada contra os povos indígenas. Ontem, durante reunião convocada pela Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF), para tratar da organização da marcha do dia de hoje, um participante não-identificado proferiu manifestação de cunho racista e de incitação à violência: “deixa descer logo… deixa descer e mete o cacete se fizer bagunça”. Conforme registrado em gravação obtida por solicitação da APIB após a reunião, a fala foi proferida por um provável agente das forças de segurança.

Hoje, o acesso ao gramado do Congresso Nacional por parte dos manifestantes ocorreu de forma espontânea, sem qualquer ato de violência, depredação ou rompimento de barreira. A  APIB reforça  o caráter pacífico e democrático da manifestação, que reuniu mais de 7 mil  lideranças indígenas de diferentes povos de todo o país.

A mobilização teve como objetivo a defesa de direitos constitucionais e o fortalecimento do diálogo com os Poderes da República. O Acampamento Terra Livre é realizado há mais de 20 anos na capital federal, sempre com forte organização, compromisso e respeito às instituições democráticas. Ao longo dessas mais de duas décadas, o movimento indígena sempre colaborou e continuará colaborando para garantir que o evento ocorra de forma tranquila e segura.

Acampamento Terra Livre 2025

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB

Brasília, 10 de abril de 2025

Nota conjunta de indignação e repúdio aos ataques criminosos contra os Avá-Guarani no oeste do Paraná

A comunidade Yvy Okaju sofreu quatro ataques em sete dias, deixando seis feridos, barracos e vegetação destruídos; os indígenas temem novos ataques

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), a Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), a Articulação dos Povos Indígenas do Sul do Brasil (Arpin Sul), a Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste (Arpin Sudeste) e o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) vêm a público, nestes primeiros dias do ano de 2025, denunciar e repudiar as violências que os Avá-Guarani estão sofrendo na região de Guaíra, no oeste do Paraná, desde o dia 29 de dezembro de 2024, deixando ao menos seis indígenas feridos por disparos de armas de fogo e casas Avá-Guarani e vegetação queimadas.

Neste período, todas as noites, homens armados invadiram a comunidade Yvy Okaju (antigo Y’Hovy), na Terra Indígena (TI) Tekoha Guasu Guavirá, queimaram barracos, dispararam com pistolas, espingardas e rifles e lançaram bombas contra os indígenas, que estão aguardando pela conclusão da demarcação de suas terras. Várias pessoas ficaram feridas, inclusive crianças, vítimas do tiroteio. Muitas delas buscaram socorro em hospitais, onde acabaram sendo mal atendidas. Aqueles que foram feridos por armas de fogo continuam com as balas nos corpos.

O ataque mais recente ocorreu na noite do dia 3 de janeiro e deixou quatro Avá-Guarani feridos por tiros. Na ocasião, uma criança de 4 anos foi atingida na perna, um jovem foi alvejado nas costas, outro indígena também foi ferido na perna e um quarto Avá-Guarani foi atingido no maxilar por um disparo efetuado com munição de grosso calibre. As imagens dos indígenas feridos são chocantes e estarrecedoras: indicam a ausência de pudor dos agressores e sinalizam para um desfecho trágico, se os órgãos competentes não tomarem medidas urgentes.

O governo do estado do Paraná, por meio de falas preconceituosas e ofensivas de seu governador, tem incitado e alimentando o ódio e a violência contra os Avá-Guarani. Os ataques são perpetrados por pistoleiros mascarados e armados, que formam verdadeiras milícias paramilitares a serviço dos interesses do agronegócio da região e que atuam com absoluta impunidade, ameaçando e anunciando morte aos Avá-Guarani em áudios que circulam em redes sociais. A comunidade indígena e a Polícia Federal já encontraram no local cápsulas de projéteis e balas não deflagradas, o que evidencia a intenção de matar.

A Força Nacional, que foi enviada à região por meio da Portaria Nº 812, do Ministério da Justiça, para atuar e conter a violência, age, ao que parece, como se nada estivesse ocorrendo. Ao ser permanentemente acionada pela comunidade ou inclusive por instâncias do governo federal, relativiza as denúncias e chega sempre atrasada, depois que os indígenas já foram agredidos. Essa postura não aparenta ser um acaso e já aconteceu durante os graves ataques que esta mesma comunidade sofreu entre os meses de julho e setembro de 2024.

Não há nenhuma operação de identificação dos responsáveis ou de desarme dos grupos violentos. Os ataques dos últimos dias foram anunciados e as forças de segurança pública sabiam disso. A comunidade ficou durante horas cercada por pistoleiros sem que nenhuma ação de proteção fosse realizada. Diante destas circunstâncias, estaria a Força Nacional acobertando essa situação de violência contra os Avá-Guarani, sonegando informações aos órgãos superiores?

 A Apib, a CGY, a Arpin Sul, a Articulação  Arpin Sudeste e o Cimi vêm denunciando recorrentemente estes graves acontecimentos criminosos, mas a atuação do governo federal é absolutamente ineficiente, quando não inerte;de fato, o governo parece acovardado. Essa covardia traz dor, sofrimento e muita angústia aos originários habitantes daquela região, os Avá-Guarani.

A Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), com poucos servidores na região, parece estar sem capacidade de intervenção no contexto local e, quando aciona a Força Nacional, não consegue mobilizar o apoio para a comunidade. O mesmo ocorre com alguns agentes do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), que também não conseguem obter da Força Nacional a resposta necessária face a tanta brutalidade. Diante de tantos dias de ataque aos Avá-Guarani, é incompreensível e inaceitável o silêncio do MPI e da Funai. A tática das milícias paramilitares de atacar os Avá-Guarani no final de ano é recorrente e o recesso próprio desse período não justifica a ausência de manifestação dos órgãos públicos federais à sociedade brasileira sobre a situação.

A superação estruturante dessa situação de violência e violações contra os Avá-Guarani será alcançada com a continuidade e finalização do procedimento administrativo de demarcação da Terra Indígena Tekoha Guasu Guavirá. Para tanto, os poderes Executivo e Judiciário do Estado brasileiro precisam fazer sua parte. Neste sentido, a manutenção da vigência e eficácia da inconstitucional Lei 14.701/2023, por parte do Supremo Tribunal Federal (STF), é usada como justificativa, municia e potencializa as violências contra os Avá-Guarani. Nesse contexto, é fundamental e urgente a declaração da inconstitucionalidade desta lei por parte da Suprema Corte.

Basta de covardia! Manifestamos nossa solidariedade aos Avá-Guarani e instamos o governo federal para que se posicione publicamente, garantindo os direitos e a proteção aos indígenas. Do contrário, assumirá a responsabilidade por toda a violência e suas consequências à vida e ao futuro dos Avá-Guarani, pessoas que vivem em barracos de lona que estão sendo atacados e incendiados pelas milícias assassinas do agronegócio, com a conivência do Estado brasileiro.

 4 de janeiro de 2025

 Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib)

Comissão Guarani Yvyrupa (CGY)

Articulação dos Povos Indígenas do Sul (Arpin Sul)

Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste (Arpin Sudeste)

Conselho Indigenista Missionário (Cimi)

Nota de repúdio aos ataques no Mato Grosso do Sul

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e suas regionais de base, vem por meio desta nota pública expressar o seu veemente repúdio contra a ação criminosa da tropa de choque do Governo de Mato Grosso do Sul que, nesta quinta-feira, 27/11, atacou os povos Guarani Kaiowá e Terena nas imediações da Reserva de Dourados e da rodovia que Liga Dourados a Itaporã (MS 157), que realizavam manifestações pacíficas em busca de um direito fundamental à vida, contra a escassez de água potável.

Os indígenas faziam uma manifestação pacífica na busca de uma solução para a escassez de água que sofrem há décadas, mas que os poderes públicos federal e estadual têm sido omissos no atendimento desse direito fundamental.

Ao invés de propor uma solução emergencial e estruturante, além da água fornecida por caminhões pipa, o governo optou por piorar o sofrimento das comunidades, enviando a tropa de choque, não apenas para dispersar os protestos, mas para coagir e agredir os manifestantes.

Os policiais invadiram a reserva indígena, área de jurisdição federal, e atacaram os moradores, homens, lideranças espirituais, mulheres e crianças, com bombas de gás, balas de borracha e projéteis letais, deixando ao menos 20 feridos, que ainda foram impedidos de ter atendimento médico, pois a polícia não permitiu o acesso das ambulâncias ao local. Essas ações configuram crimes contra os direitos humanos garantidos pela constituição.

A Apib denuncia ainda a ação truculenta da polícia de MS que pretendia prender o coordenador executivo da Apib, pela Aty Guasu, Norivaldo Mendes. Os policiais foram até a casa do líder sem motivos e sem ordem judicial.

A Apib responsabiliza por esta prática rotineira e criminosa da Polícia do Estado de Mato Grosso do Sul, o Comando da Polícia, Coronel Renato Garnes, o secretário de Segurança Pública, Antonio Carlos Videira, e sobretudo, o Governador do Estado, Eduardo Riedel (PSDB).

Estes políticos compõem, em nome dos governadores de todos os estados, a Câmara de conciliação instituída no Supremo Tribunal Federal visando a legitimação da lei do marco temporal, para consagrar a supressão dos direitos fundamentais, principalmente territoriais dos povos indígenas.

Aos órgãos do governo federal (MPI, Funai, Sesai) instituídos para zelar pelos direitos dos povos indígenas, reivindicamos mais celeridade no atendimento, no âmbito das suas competências, das demandas emergenciais dos povos indígenas, como a solução definitiva da escassez de água para as comunidades da reserva de Dourados.

Brasília – DF 28 de novembro de 2024

A RESPOSTA SOMOS NÓS

A RESPOSTA SOMOS NÓS

Nós, povos indígenas brasileiros, diante da gravidade das crises de biodiversidade e do clima, sabemos que não há tempo a perder.

Aqui, na COP-16 em Cali na Colômbia, viemos declarar que não aceitaremos mais nenhum projeto predatório, que ameace nossas vidas, nossos territórios e a humanidade. Não aceitaremos mais nenhum projeto de petróleo e gás e qualquer outra forma de exploração predatória na Amazônia brasileira, em nossos territórios e nossos ecossistemas. Não haverá preservação da biodiversidade e nem territórios indígenas seguros em um planeta em chamas.

Nós sabemos quem está botando fogo no mundo e o impacto violento que isso tem produzido nos nossos territórios: seca severa, isolamento forçado, doenças, falta de alimento, invasões, conflitos e mortes.

Diante do colapso iminente da sustentação da vida no planeta, ações fortes e efetivas precisam ser tomadas. Enquanto os governos continuam querendo mediar metas insuficientes e financiamentos vazios, queremos anunciar que, a partir de agora, só haverá paz com a Natureza se declararmos abertamente a guerra contra os combustíveis fósseis e qualquer outro projeto predatório que ameaça a vida no planeta.

O governo colombiano já deu o primeiro passo, suspendendo a concessão de novas explorações de petróleo e gás no país e já nos reconheceu como autoridades ambientais. Esperamos que outros países sigam esse mesmo compromisso. A outra face da crise climática e da biodiversidade é a crise de liderança e de valores. Nós nunca abdicamos desse lugar e não vamos nos perder em discussões vazias e compromissos estéreis.

Demandamos a retomada imediata das demarcações de todas as terras indígenas no Brasil como uma política climática efetiva e o financiamento direto para a proteção integral dos nossos territórios e nossos modos de vida em harmonia com a Natureza.

A COP-30 será no nosso território. Não aceitaremos que as discussões aconteçam sem a devida consulta e participação das nossas vozes e autoridades. Reivindicamos a co-presidência da COP de Clima no Brasil para que o acúmulo de nossos conhecimentos e experiências ancestrais possam oferecer ao mundo a oportunidade de um outro futuro.

Convocamos todos os povos indígenas, parceiros, aliados e todos que se importam com a vida na Terra a se juntarem ao nosso chamado para, coletivamente, segurar o céu. Se depender de nós, o céu não irá desabar.

SEMPRE ESTIVEMOS AQUI.

O levante do céu começa agora.

A RESPOSTA SOMOS NÓS

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB)

Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB)

Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (APOINME)

Conselho do Povo Terena 

Grande Assembléia do povo Guarani (ATY GUASU)

Comissão Guarani Yvyrupa (CGY)

Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste (ARPINSUDESTE)

Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (ARPINSULl)



Nota sobre as indicações do MPI para Câmara de Conciliação criada pelo ministro Gilmar Mendes

Nota sobre as indicações do MPI para Câmara de Conciliação criada pelo ministro Gilmar Mendes

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) diante das indicações feitas pelo Ministério dos Povos Indígenas (MPI) no dia de hoje, 14/10, para compor a Câmara de Conciliação instituída pelo Ministro Gilmar Mendes no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF), vem por meio da presente nota fazer junto a suas bases e à rede de aliados nacionais e internacionais os seguintes esclarecimentos:

1) A Apib, ciente de sua responsabilidade e compromisso político com os povos, comunidades e organizações indígenas que representa, mantém a decisão de não fazer parte desta Comissão de Conciliação, e portanto de não indicar outras lideranças após ter se retirado dessa instância, sob o entendimento de que não foram garantidas condições mínimas e justas para sua participação. A continuidade da vigência da Lei do Genocídio Indígena, que coloca os povos indígenas sob constante ameaça e violência, bem como a falta de respeito à autonomia de vontade e aos direitos constitucionais afastaram os povos indígenas desse espaço, não obstante inúmeros apelos. Sem a definição de objeto sob conciliação, corre-se o risco desse espaço, que reúne os Três Poderes do Estado, desemboque num cenário de “desconstitucionalização” de direitos fundamentais alçados a cláusulas pétreas pela Carta Magna de 1988, principalmente no que se refere aos direitos originários dos nossos povos sobre as terras que tradicionalmente ocupam; terras essas declaradas pela Constituição inalienáveis e indisponíveis, sobre as quais os nossos direitos são imprescritíveis (Art. 231).

2) Observe-se que as indicações encaminhadas pelo Ministério dos Povos Indígenas para compor a Comissão de Conciliação fazem parte do quadro de servidores de órgãos governamentais, portanto, deve ficar claro que não estarão lá em nome do movimento indígena.

3) A Apib lamenta profundamente que as instâncias autônomas dos povos indígenas ou entes públicos em que há participação indígenas sejam pressionados a ocuparem colegiados contra a sua vontade, sobretudo em espaços nos quais não está garantido o respeito à lei e às decisões já tomadas peloplenário da Suprema Corte, que declarou inconstitucional a tese do marco temporal, em setembro de

2023.

4) A Apib chama a suas organizações, povos e comunidades que a compõem a não desistirem do

exercício pleno de sua autonomia, do seu direito à autodeterminação, sabendo que a Constituição nos

garante sermos “partes legítimas para ingressar em juízo” em defesa dos nossos “direitos e interesses”

(Art. 232). Dessa prerrogativa a Apib não abre mão.

5) O Estado tutelar, paternalista e autoritário foi enterrado pela Constituição Federal há 36

anos, ao mesmo tempo que reconheceu o nosso direito de sermos povos étnica eculturalmente diferenciados, e de sermos protagonistas do nosso próprio destino e, por

isso, reivindicamos dos poderes do Estado que respeitem as nossas decisões autônomas.

Brasília, 14 de outubro de 2024

Nota de apoio aos povos indígenas afetados pela Ferrogrão (EF 170)

Nesta segunda-feira, 29 de julho de 2024, organizações indígenas representantes dos povos afetados pelo projeto da Ferrogrão decidiram romper publicamente com o Grupo de Trabalho (GT) do Ministério dos Transportes, criado no âmbito da ADI 6553, que discute a inconstitucionalidade da lei de desafetação de parte do Parque do Jamanxim para viabilizar a ferrovia. 

O GT foi instituído como um espaço de diálogo transversal e interministerial, para que houvesse participação social nos debates sobre a construção do empreendimento, que tem o potencial de destruir modos de vida tradicionais no coração da Amazônia. É preciso lembrar, sempre, que a construção de uma ferrovia na região pretendida vai potencializar os passivos ambientais e fundiários que já assolam as comunidades locais, causando impactos que os estudos apresentados pelas empresas interessadas não puderam sequer mensurar.

Contudo, o que se viu foi o extremo desprestígio, por parte do governo federal, das organizações da sociedade civil participantes. Como informam na Carta que anuncia o rompimento com o GT, a presença indígena nas reuniões do grupo ficou a cargo das próprias organizações de base, o que implica em custos que dificultam a participação qualificada nesse espaço.

Além disso, o Ministério dos Transportes, a despeito do que foi informado à sociedade civil, deu andamento paralelo, em parceria com a empresa INFRA S.A., aos estudos sobre a Ferrogrão e a ANTT já divulgou cronograma de leilões para o ano de 2025 em que consta o empreendimento ferroviário. 

Esse comportamento desrespeitoso em relação às organizações indígenas se soma ao fato de que não houve, em nenhum momento, a realização de consultas livres, prévias, informadas e de boa-fé aos povos indígenas e comunidades tradicionais possivelmente impactados pelo projeto. Ou seja, mais um capítulo de uma longa história de menosprezo por parte das autoridades nacionais e do setor privado. 

A APIB, no momento da criação do GT, tomou a decisão política de não compô-lo, como forma de não dar legitimidade a um espaço que poderia servir para, mais uma vez, silenciar e desrespeitar nossos parentes. Apoiamos aqueles que decidiram estar no GT e, nesse momento, apoiamos fortemente, a decisão de com ele romper. 

Às vésperas do início do processo de negociação de direitos fundamentais indígenas no Supremo Tribunal Federal, ecoamos o posicionamento do Instituto Kabu, da Rede Xingu+ e da Aliança #FerrogrãoNão, reafirmando que não seremos enganados por falsas promessas de diálogo, que têm, como objetivo final, nos retirar direitos que foram conquistados pelo sangue de nossos ancestrais. 



NOTA DE REPÚDIO CONTRA A PEC 48/23 QUE SE PROPÕE RETIRAR DIREITOS FUNDAMENTAIS DOS POVOS INDÍGENAS

Nós, organizações indígenas, indigenistas, socioambientais e de direitos humanos, movimentos sociais e outras entidades abaixo assinadas, em razão da tramitação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal da PEC 48/23,  que altera o Artigo 231 da Constituição Federal, no § 1º, ao incorporar no texto a tese do Marco Temporal, manifestamos por meio desta Nota Pública o nosso veemente repúdio a esta manobra inconstitucional da bancada ruralista e de outras por afrontarem “os direitos originários” dos povos indígenas “sobre as terras que tradicionalmente ocupam”, direitos estes, fundamentais, portanto, cláusulas pétreas instituídas pela Carta Magna de 1988 e reiterados pelo Supremo Tribunal Federal, que declarou inconstitucional o marco temporal em setembro de 2023. Os parlamentares ignoraram a decisão e aprovaram no fim de ano a Lei 14.701/2023, que institui esse entendimento, e que hoje é responsável, em parte, pela paralisação da demarcação das terras e territórios indígenas e pelo o acirramento de conflitos e da violência contra os povos indígenas. 

A PEC 48 desconsidera ainda o histórico de violências e expulsões que muitos povos indígenas sofreram antes e após 1988. Se aprovada, tornar-se-ia uma sentença de morte, a legalização do etnocídio e genocídio secular praticado pelo Estado e setores da sociedade contra os povos indígenas, cuja existência, física e cultural, depende fundamentalmente de suas terras.

A PEC também representa uma grave ameaça ao meio ambiente. As terras indígenas são as áreas ambientalmente mais protegidas no país. Desempenham um papel crucial na proteção dos biomas, na manutenção de ecossistemas vitais, na preservação das florestas, dos recursos hídricos e da biodiversidade e na regulação do regime de chuvas. Desempenham uma contribuição estratégica contra a atual crise climática e o aquecimento global. Impedir a demarcação dessas terras equivale a projetar a intensificação das invasões, da grilagem, do desmatamento, das queimadas, enfim, da degradação ambiental e do agravamento das mudanças climáticas, problemas aos quais se somam outras práticas criminosas que ameaçam, matam e expulsam os povos indígenas nos seus territórios. 

Lamentavelmente setores do governo federal e os do poder judiciário, por ação ou omissão, tem favorecido esta brutal investida contra os povos e territórios indígenas.

Alterar a Constituição, restringindo os direitos fundamentais dos povos indígenas por meio de uma espúria emenda constitucional patrocinada pelos setores mais retrógrados do Congresso Nacional, e apoiada por outros interessados na exploração das riquezas que abrigam as terras indígenas, é totalmente inaceitável, vergonhoso, imoral e inconstitucional, por atentar contra cláusula pétrea da Carta Magna.

Pelas consequências irreversíveis para os povos indígenas e o meio ambiente, é fundamental que a sociedade brasileira e internacional se posicione firmemente contra a PEC 48/2023, pelo direito desses povos a viverem em liberdade nos seus territórios, de acordo com a sua identidade e modos de vida, e pelo respeito aos direitos humanos e a defesa do Estado democrático de direito, por um meio ambiente equilibrado, pelo bem viver da humanidade e do planeta.

Direitos originários não se negociam!

Brasília – DF, 09 de julho de 2024.

Assinam esta carta:

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB

Rede de Cooperação Amazônica – RCA

Greenpeace Brasil 

CTI – Centro de Trabalho Indigenista

Associação Wyty Cate das Comunidades Timbira do Maranhão e Tocantins

Iepé – Instituto de Pesquisa e Formação Indígena

IEB – Instituto Internacional de Educação do Brasil 

Rede Cerrado

OPAN – Operação Amazônia Nativa

Amazon Watch

Uma Gota No Oceano
Coordenação das Organizações e Articulações dos Povos Indígenas do Maranhão – COAPIMA

Opi – Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato

Comitê Chico Mendes

Comissão Pró-Indígenas do Acre – CPI-Acre

SOS Amazônia

Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre – AMAAIAC

Instituto de Estudos Amazônicos – IEA.

Instituto Yorenka Tasorentsi – IYT

Instituto Makarapy

Organização dos Professores Indígenas do Acre – OPIAC

Centro de Promoção da Cidadania e Defesa dos Direitos Humanos Pe. Josimo.

Fórum de Mulheres de Imperatriz

Núcleo de extensão e pesquisa com populações e comunidades Rurais, Negras, quilombolas e Indígenas (NuRuNI)/Universidade Federal do Maranhão

Associação Nacional de Ação Indigenista (ANAÍ)/Maranhão

Centro de Pesquisa em Arqueologia e História Timbira – CPAHT/UEMASUL – Universidade Estadual da Região Tocantina do Maranhão 

Amigos da Terra – Amazônia Brasileira

Instituto Amazonialerta

Conselho Indigenista Missionário – Cimi

Proteção Animal Mundial – WAP

Centro de Defesa dos Direitos Humanos e de Povos e Comunidades Tradicionais – CDDHPCT 

 Indigenistas Associados – INA

Sindicato dos Servidores Públicos Federais do DF – Sindsep-DF

Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal – Condsef

Instituto de Desenvolvimento e Valorização Humana

Central Única dos Trabalhadores do Distrito Federal – CUT-DF

Conselho Nacional das Populações Extrativistas – CNS

Memorial Chico Mendes – MCM

Associação Nacional dos Servidores da Funai – ANSEF

Instituto Sociedade, População e Natureza – ISPN

WCS Brasil – Wildlife Conservation Society

Instituto Fronteiras 

Coletivo Varadouro 

Casa do Rio

Associação Ashaninka do Rio Amônia – APIWTXA

Organização dos Povos Indígenas do Rio Juruá – OPIRJ

Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas – CONAQ

Rainforest Foundation US 

Manxinerune Ptohi Phunputuru Poktshi Hajene – MAPPHA

Federação do Povo Huni Kuĩ do Estado do Acre – FEPHAC

Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra- MST

Movimento pela Soberania Popular na Mineração – MAM

Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB

Associação Sociocultural Yawanawa – ASCY

Associação Sócio Cultural e Ambiental Kuntamana – ASCAK

Associação Kaxinawa do Rio Breu – AKARIB

Instituto ClimaInfo

Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras – CPP 

Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio Pindaré

Movimento Interestadual de Quebradeiras de Coco Babaçu – MIQCB