Apib defende no Parlamento Europeu a proteção de todos os biomas do Brasil na nova lei anti desmatamento da União Europeia

Apib defende no Parlamento Europeu a proteção de todos os biomas do Brasil na nova lei anti desmatamento da União Europeia

Foto: Andre Guajajara 

A Comissão Ambiental do Parlamento Europeu está atualmente debatendo sobre o texto da proposta da lei FERC (Lei sobre importação de produtos com risco florestal), também chamada de lei anti desmatamento, que vai ser votada em setembro. A legislação contém algumas brechas de extrema relevância para a garantia dos direitos dos Povos Indígenas e a proteção dos seus territórios. 

Os países europeus, importadores de commodities brasileiras como carne, soja e couro, precisam se responsabilizar pelos impactos que essas cadeias produtivas de larga escala têm nas Terras Indígenas no Brasil. A Europa é o segundo mercado de venda da soja produzida no Brasil, além de grande  importador de carne bovina brasileira e outros produtos de risco florestal. O agronegócio, a mineração e outras explorações em grande escala exercem uma forte pressão sobre a proteção dos biomas brasileiros, a garantia dos direitos indígenas e as mudanças climáticas. A demanda europeia de commodities amplifica esses conflitos. Por isso, é preciso impor limites e criar mecanismos de rastreabilidade comprometidos com os direitos humanos e o meio ambiente. O Brasil vive atualmente um delicado momento de desmonte das políticas e instituições, além de um aumento da violência no campo tal e como o assasinato do indigenista Bruno Araújo e do jornalista Dom Phillips tem demonstrado. Segundo o relatório da Global Witness de 2021, o Brasil é o quarto país mais violento para defensores do meio ambiente e dos direitos humanos. 

Para incidir nesse debate, a APIB fez um tour pela Europa com uma comitiva de lideranças indígenas entre os dias 8 e 17 de junho. Nos primeiros dias a comitiva esteve em Paris, França, acompanhando as investigações do caso Casino, varejista de supermercados no nível internacional acusado de vender produtos vinculados ao desmatamento e grilagem de terras no Brasil e na Colômbia (pode ler mais sobre o início e os objetivos do Tour da APIB na Europa aqui). Na segunda parte da viagem, entre os dias 13 e 17 de junho, a comitiva de lideranças indígenas da APIB esteve em Bruxelas, Bélgica, e fez várias reuniões com membros e comissões do Parlamento Europeu para se posicionar sobre a Lei de Importação de produtos com risco florestal (FERC) e para exigir que o Parlamento inclua as demandas dos Povos Indígenas na dita legislação. 

Os ministros representantes dos Estados membros da União Europeia vão colocar suas posições em relação à lei no próximo Conselho europeu de Meio Ambiente, que vai acontecer no dia 28 de junho. Posteriormente, o Comitê de Meio Ambiente, Saúde Pública e Segurança Alimentária -que é o responsável pela elaboração da lei FERC- vai votar na metade de julho sobre as propostas de modificações do rascunho apresentado, com o objetivo de ter o texto definitivo para votação da lei em plenária do Parlamento em setembro de 2022

O que propõe atualmente a Lei de Importação de produtos com risco florestal (FERC)?

A proposta do Parlamento Europeu com a Lei de Importação de produtos com risco florestal (FERC ou European Commission’s Proposal for a regulation on deforestation-free products) é inibir a importação de produtos que promovem o desmatamento ilegal dentro das suas cadeias produtivas. A proposta de lei, apresentada no 17 de novembro de 2021, busca criar sanções a produtos que promovem um risco ao meio ambiente, mas só seria implementada em terras consideradas florestas segundo a definição da FAO (Food and Agriculture Organization of the United Nations). Essa definição desconsidera uma grande parte dos biomas brasileiros e, em consequência, exclui também a realidade de uma boa parte dos Povos Indígenas do Brasil. 

Se levada em conta a atual definição de florestas da FAO ficariam em risco por conta das cadeias de produção de commodities em larga escala: 75% do Cerrado, 89% da Caatinga, 76% do Pantanal e 74% de Pampa, segundo dados de MapBiomas.

A proposta de lei seria aplicada em apenas 15% da região do Pantanal, um dos biomas mais atingidos com as queimadas nos últimos anos, e desconsidera por completo o bioma Pampas no sul do país, onde se desenrolam históricos processos de invasão e ocupação de terras indígenas, ocasionados principalmente pelo avanço da soja e pecuária. O bioma Cerrado, tem apenas ¼ de sua área reconhecida como floresta dentro da definição da FAO, sendo hoje uma das regiões com avanço significativo do agronegócio e da pecuária, além da expansão da fronteira agrícola na região do  MATOPIBA, que já traz impactos para a contaminação dos solos e águas por conta do uso excessivo de agrotóxicos. A Mata Atlântica e a Caatinga também não estariam completamente reconhecidas como floresta apesar de estarem intensamente consumidas e ameaçadas por atividades industriais e pelo agronegócio, respectivamente. A Amazônia seria o único bioma com maior extensão reconhecida como floresta dentro das considerações da legislação anti desmatamento. Entretanto, cerca de 15% do bioma ficaria desprotegido com essa lei, como o caso do Lavrado, vegetação presente em partes do estado de Roraima, além de outras manchas de Cerrado presentes na Amazônia.  

Outra brecha da proposta da FERC é que exige apenas que cada país seja responsável pelo cumprimento das suas leis nacionais. No entanto, isso implica um grande risco no atual contexto de desmonte de políticas públicas promovido por um governo anti indigenista como o que existe atualmente no Brasil que poderia continuar comercializando certos produtos sem estar descumprindo nenhuma lei nacional. A proposta da lei também não fala sobre o direito de posse e usufruto exclusivo dos Povos Indígenas sobre suas terras nem da obrigação de cumprimento de leis internacionais como o artigo 169 da OIT. 

E a terceira e última debilidade da legislação apontada pela APIB é a que diz em relação aos produtos que poderiam ser rastreados e data limite de comercialização. O rascunho da lei incide sobre seis commodities: café, cacau, carne refrigerada e seca, óleo de palma, madeira, soja e derivados, (como ração feita com base de soja). A cadeia de produção desses produtos precisa ser avaliada antes de entrar na União Europeia para que nenhum deles provenha de terras desmatadas ou degradadas depois do 31 de Dezembro de 2020. A lei exclui a rastreabilidade de carne enlatada, milho e algodão, entre outros produtos de risco florestal. Ao mesmo tempo, a determinação temporal para a comercialização permite, por exemplo, que carne congelada, assim como cereais estocados (como a soja) que foram produzidos em pasto desmatado em 2019 possam ser comercializados.

Quais são as demandas da APIB em relação a legislação anti desmatamento (FERC)? 

A APIB apela ao Parlamento Europeu para que reconheça a realidade dos impactos multidimensionais e da responsabilidade das dinâmicas econômicas e comerciais europeias sobre as terras indígenas no Brasil. Para isso, solicita mais especificamente: 

  • São necessários mecanismos eficazes de rastreabilidade das cadeias de produção de commodities porque as pressões produtivas, econômicas e financeiras provocam um grande impacto ambiental e um aumento da violência contra os Povos Indígenas, principalmente contra suas lideranças.
  • Todos os biomas do Brasil precisam estar incluídos na lei europeia anti desmatamento, como uma resposta concreta à emergência climática e aos casos de violência que têm se multiplicado em nossos territórios, com o estímulo do governo brasileiro. A APIB quer que não seja utilizado o conceito da FAO sobre a definição de florestas, e assim permitir que para além da Amazônia, esta legislação também inclua a proteção do Cerrado, Pantanal, Pampas, Mata Atlântica e Caatinga
  • É preciso considerar a posição dos Povos Indígenas: ir além das metas estabelecidas nos acordos internacionais, considerar o papel vital que as comunidades indígenas desempenham nas responsabilidades climáticas como guardiões da floresta e levar em consideração opinião de quem sofre diretamente os impactos das cadeias de produção de commodities predatórias no Brasil. 

“Para nós Povos Indígenas nenhum bioma é diferente, todos fazem parte do território brasileiro que é um território indígena. E nós, os indígenas, estamos em todos esses biomas. Então é importante que a legislação europeia anti desmatamento considere todos eles”, declara Kretã Kaingang, coordenador executivo da APIB. “O que dói com a soja, o que dói com os assassinatos, o que dói com a invasão dos territórios, o que paralisa a demarcação de terras indígenas acontece em todos os biomas. A partir da inclusão de todos os biomas nessa legislação a gente tem uma força a mais para poder defender esses biomas. A gente já faz isso sem lei, mas a gente sabe que na Europa se compram produtos de todos esses biomas, não só da Amazônia, e a proteção deles influencia nas nossas vidas no dia a dia”, adiciona Kaingang. 

Mais detalhes no documento elaborado pela APIB: “Mensagem para o Parlamento Europeu sobre a urgência da aprovação da lei europeia anti-desmatamento (FERC)”.

Como foi feita a campanha de incidência da APIB no Parlamento Europeu? 

Na quinta 16 de junho a delegação da APIB e a Extinction Rebellion fizeram um ato em frente a Comissão Europeia para exigir que os parlamentares incluam as demandas dos Povos Indígenas na Lei de importação de commodities de risco florestal (FERC). (Consulta as fotos do ato aquí)

“A nossa incidência no Parlamento Europeu foi muito necessária para que colocássemos nossa situação como Povos Indígenas do Brasil no que diz respeito a commodities. Graças a esse diálogo com o Parlamento Europeu pode ser possível modificar a minuta da lei que nós chamamos em português de anti desmatamento. Nós estamos aqui diante de uma oportunidade para intervir internacionalmente como organizações indígenas, pois é difícil sermos ouvidos no contexto atual do Brasil com esse governo anti indígena e fascista, que visa somente lucro às custas de quem mora naquele chão como nós”, explica Crisanto Rudzö Tseremey’wá, liderança da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB).

Durante a estadia da comitiva em Bruxelas, outras reuniões importantes aconteceram como os encontros com José Manuel Fernandes, chair da delegação brasileira da União Europeia; Jérémy Decerle, eurodeputado francês; e Anne-Margreet Sas,  representante do tema de agricultura da comissão permanente do Reino Unido Holanda no Parlamento Europeu. Nos três encontros, os membros do parlamento se mostraram interessados em entender a conjuntura atual no Brasil sofrida pelos Povos Indígenas, mas alegaram que neste momento não seria viável a inclusão dos outros biomas na lei anti-desmatamento. Possivelmente, após a aprovação da lei pelo Parlamento (que deve ocorrer em Setembro de 2022), a inclusão de outros biomas e/ou de uma definição de florestas/vegetação mais abrangente poderá ser incluída na revisão da regulamentação, que deverá ocorrer em 2024. Esse foi o mesmo discurso utilizado pelos técnicos do Conselho geral de Meio Ambiente e o Centro de Pesquisa do Parlamento Europeu sobre a inclusão dos biomas. Eles também reiteraram que os direitos humanos, incluindo os dos Povos Indígenas, deveriam ser estabelecidos em outra legislação de devida diligência (ainda em elaboração pelo Parlamento) e não por uma lei anti desmatamento. Essas reuniões frustraram a delegação da APIB, em ver que o Parlamento Europeu não está assim tão comprometido em mitigar seu rastro de destruição para garantir o abastecimento de commodities.

Por outro lado, houve momentos de apoio como o encontro com deputados do Grupo dos Verdes do Parlamento Europeu, formado por Michèle Rivasi, Grace O’Sullivan, Francisco Guerreiro, Anna Cavazzini, entre outros. No almoço com parte da delegação indígena, fortaleceram a rede de apoio para que seja construída uma lei anti desmatamento ambiciosa, que atenda as demandas dos povos indígenas e daqueles que são os mais impactados pela produção de commodities. Além das reuniões com membros do Parlamento Europeu, a delegação da APIB aproveitou o momento para se reunir com sua rede de parceiros na Europa, como a FERN, Greenpeace, Global Witness, Friends of Earth para fortalecer as alianças e debater ações estratégicas de incidência para garantir o cumprimento dos direitos dos Povos Indígenas.

Consulta mais fotos do Tour da APIB na Europa: 

Qual é a importância de uma mobilização internacional dos Povos Indígenas? 

Em um cenário de desmonte das políticas públicas no Brasil e do avanço ilegal das indústrias (agronegócio, pecuária, mineração, energia, hoteleira), a demanda produtiva e econômica vinda da União Europeia e outros países e blocos econômicos por esses produtos alimenta e acelera os processos de invasão, expropriação e destruição dos Povos Indígenas e suas terras. O direito ao território está garantido pela Constituição Federal de 1988, pelo processo de demarcação, sendo de responsabilidade do poder Executivo Brasileiro. Porém, num cenário onde o presidente do Brasil é o maior inimigo dos Povos Indígenas e reforça o avanço do agronegócio e a fragilidade das instituições de fiscalização, cabe aos parceiros econômicos e comerciais do Brasil cobrarem e pressionarem para o cumprimento dos direitos originários dos Povos Indígenas.

Além disso, a APIB denuncia que os assassinatos do indigenista Bruno Araújo e do jornalista Dom Phillips não são casos isolados, mas consequência de uma violência sistemática promovida pelo Estado militarista e anti indígena comandado pelo genocida Bolsonaro. “Encontraram os corpos do Bruno Araújo e do Dom Phillips. Essa é a situação real do nosso país e por isso estamos aqui na Bélgica, para fazer essas denúncias e para dialogar com os deputados sobre as leis que estão sendo criadas aqui na Europa e que afetam diretamente as nossas vidas nos nossos territórios”, afirma Eunice Kerexu, coordenadora executiva da APIB. “Nós não estamos aqui para dizer que pare essa exportação, senão para reforçar a necessidade de criação de uma legislação que nos ajude a proteger nossas vidas e nossos territórios”, adiciona Kerexu. 

Sobre a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) 

A APIB é a maior instância de representação do movimento indígena brasileiro e tem, desde sua criação, cumprido com seu compromisso de lutar pela garantia dos direitos constitucionais dos Povos Indígenas. Seja em âmbito nacional ou internacional, a APIB  e suas sete organizações de base estão mobilizadas na proteção de territórios, comunidades e pessoas.

Os Povos Indígenas, articulados por meio de suas organizações regionais e pela APIB, buscam em todas as instâncias – nacionais e internacionais – a responsabilização dos culpados por essa destruição. Internacionalmente, a APIB, além de participar de eventos e debates climáticos, busca a responsabilização dos agentes motivadores das dinâmicas de invasão, exploração ilegal e destruição dos territórios indígenas, assim como incide no debate sobre a formulação da nova lei de importação de commodities de risco florestal (FERC). No Brasil, a APIB tem historicamente mobilizado o movimento indígena e enfrentado as políticas anti indígenas que tramitam no Supremo Tribunal Federal e na Câmara dos Deputados, conformando a linha de frente da proteção aos Povos e Terras Indígenas, e consequentemente, do meio ambiente e do futuro. Para proteger os territórios indígenas e garantir o respeito aos direitos constitucionais, a APIB resiste e avança em diferentes escalas. 

NOSSO SANGUE CLAMA POR JUSTIÇA!

NOSSO SANGUE CLAMA POR JUSTIÇA!

A Em no vem a público trazer sua dor e total revolta e indignação com a ação covarde da PM e do Estado do Mato Grosso do Sul contra a comunidade e território de Guapoy.

Este ataque já está sendo chamada em todos os nossos territórios de Massacre de Guapoy. Em mais uma ação ilegal da PM que tem agido como Cão de Guarda do ruralismo e da corja política ruralista no Estado, foram atacados crianças, jovens, idosos, famílias que decidiram, depois de muito esperar sem alcançar seu direito, retomar um território que sempre foi deles e que foi roubado no passado de nosso povo.

As imagens do Massacre falam por sí e são de fazer doer a alma do mais duro dos seres humanos. Tiros em jovens desarmados, violações a pessoas rendidas, disparos de helicóptero, tudo isso inclusive com uso de munição letal, deram o tom da covardia levada a cabo por um corpo policial que atuou sem mandado de reintegração de posse.

Inclusive é preciso denunciar que são dezenas de ações de despejo ilegal realizadas no mesmo modelo contra os povos do MS, sejam eles Kaiowa, e também contra outros povos como os Kinikinau, desde 2016, apenas não sendo maior o número porque na pandemia nos deixaram para morrer por falta de iniciativa de saúde do Estado, não precisando os policiais irem fazer o serviço sujo.

Logo na sequência do Massacre, típico de quem se adianta para esconder e acobertar o próprio crime, o secretário de segurança do convocou uma coletiva de imprensa cheia de mentiras e absurdos – chavões antigos que destilam preconceito contra nós, como associação de indígenas com drogas e sendo colocados genericamente como paraguaios – que nem mesmo se sustentam frente as inúmeras imagens que já vão ganhando o mundo.

Será que a criança , caída atingida por uma bala de borracha, que consiste em uma das imagens corresponde ao tráfico de drogas? Já são dois mortos, podendo ser maior o número (a comunidade fala em pelo menos 04) e ao menos 10 feridos. Nos solidarizamos ao mesmo tempo com o ataque realizado no mesmo dia do Massacre contra a comunidade de Kurupi\Santiago Kue, onde a PM junto com fazendeiros abriu fogo contra famílias, por pouco não causando o mesmo estrago.

Nós, da Aty Guasu, levaremos a todas as esferas esse Massacre e não desistiremos até que os responsáveis sejam punidos e responsabilizados. Exigimos a imediata prisão e responsabilização do Governador do Estado do MS, do comando da BOP/PM, e do secretário de segurança do Estado do MS.

Da mesma forma, queremos e exigimos a investigação e prisão de mais três pessoas. Do servidor Nilton da Funai de Amambai e do servidor José da funai de Ponta Porã por coparticipação e facilitação do Massacre.

Neste sentido, nossa dor não termina e diante dos áudios e provas, também pedimos a investigação e prisão do Capitão da reserva de Amambai, por facilitação do massacre. Não podemos permitir que divisões internas sejam instrumentalizadas pelo Poder Público e que isso nos tire a vida.

Ainda em tempo, exigimos que o MPF de Ponta Porã, que tem se mostrado lento em compreender a realidade imposta, assuma seu dever em defender nossos direitos imediatamente, sob o risco de ser conivente com todos estes atos de violência contra nosso povo.

Aty Guasu, 25 de junho de 2022.

Baixe nota aqui

Agrobanditismo mata e fere indígenas durante ataque contra os povos Kaiowá e Guarani

Agrobanditismo mata e fere indígenas durante ataque contra os povos Kaiowá e Guarani

Durante a retomada do território ancestral Guapoy, no município de Amambai, Mato Grosso do Sul, os indígenas que estavam no local foram surpreendidos por um ataque armado, conduzido pela polícia militar. A violência começou na madrugada de quinta-feira e se estendeu até o início da manhã desta sexta-feira (24). Como resultado, três indígenas estão desaparecidos, duas mulheres e uma criança de sete anos, no município de Amambai. Além delas, pelo menos outros seis ficaram feridos. Um jovem de 25 anos foi baleado com três tiros. Ele foi levado para o Hospital Regional de Amambai, mas não resistiu. Outro jovem foi morto a tiros após ataque feito com uso de um helicóptero.

“Já são dois mortos, podendo ser maior o número (a comunidade fala em pelo menos 04) e ao menos 10 feridos. Nos solidarizamos ao mesmo tempo com o ataque realizado no mesmo dia do Massacre contra a comunidade de Kurupi\Santiago Kue, onde a PM junto com fazendeiros abriu fogo contra famílias, por pouco não causando o mesmo estrago.”, relata Grande Assembleia da Aty Guasu Guarani e Kaiowá em nota.

Confira nota na íntegra aqui

As denúncias feitas pela Aty Guasu é de que as pessoas feridas que foram ao hospital, em Amabai, estão sendo presas após receberem alta médica.

A polícia militar da região agiu como milícia dos fazendeiros, participando dos ataques. Como afirmou o coordenador jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Eloy Terena, “no Mato Grosso do Sul o “Estado de Direito” fracassou. A polícia militar, em regime de milícia privada dos fazendeiros, promove despejos sem ordem judicial. Já virou rotina. Um estado onde o Agrobanditismo impera a custo do sangue indígena”.

Em nota a Aty Guasu exige “a imediata prisão e responsabilização do Governador do Estado do MS, do comando da BOPE/PM, e do secretário de segurança do Estado do MS. Da mesma forma, queremos e exigimos a investigação e prisão de mais três pessoas. Do servidor Nilton da Funai de Amambai e do servidor José da funai de Ponta Porã por coparticipação e facilitação do Massacre.”

Desde o mês de maio há relatos de tensão na área, que está em nome de uma empresa e estaria arrendada para lavoura. O território retomado é parte da aldeia Amambai, a segunda maior em população no estado, com cerca de 7 mil indígenas. O MPF (Ministério Público Federal) e Polícia Federal foram acionados e estão acompanhando a situação.

Indígenas de todo o Brasil lutam para que STF acabe com a ameaça do Marco Temporal

Indígenas de todo o Brasil lutam para que STF acabe com a ameaça do Marco Temporal

Ao todo, foram 40 ações, em todas as regiões do Brasil, envolvendo dezenas de territórios, entre atos políticos e fechamentos de BR, além de atos em 40 sedes da Funai realizados pelos servidores em greve
foto Alass Derivas

As vozes dos povos originários brasileiros ecoaram pelos grotões mais profundos do país e nas redes sociais, nesta quinta-feira (23). As mobilizações convocadas pela Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil) marcaram o dia em que o Supremo Tribunal Federal (STF) deveria votar a tese do marco temporal ou Caso Xokleng, uma decisão que afetará todos os territórios indígenas do Brasil, no entanto, a matéria foi adiada pela terceira vez. “Quando estamos diante de um governo autoritário, esperamos coragem da Suprema Corte para resguardar o direito fundamental dos povos indígenas”, cobrou Eloy Terena, representante jurídico da Apib.

Também estiveram entre as reivindicações a justiça pelos assassinatos do jornalista Dom Philips e do indigenista Bruno Pereira e a exoneração do presidente da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), Delegado Marcelo Xavier, pela condução de uma política anti-indígena à frente do órgão. Ao todo, foram 40 ações, em todas as regiões do Brasil, envolvendo dezenas de territórios, entre atos políticos e fechamentos de BR, além de atos em 40 sedes da Funai realizados pelos servidores em greve. No extremo sul da Bahia, território Comexatibá, em Prado, o povo Pataxó realizou a retomada da fazenda Santa Bárbara. A área era utilizada para produção de eucalipto, com amplo uso de agrotóxicos, o que poluiu e reduziu o fluxo das águas do Rio Cahy. Para Eloy, os atos de hoje “demonstram de forma categórica o quanto os povos indígenas estão sendo vítimas dessa política de genocídio implementada através de uma Funai anti-indígena. E o quanto a demora do julgamento do Marco Temporal faz com que as violências contra os povos indígenas aumentem”.

Em São Paulo, centenas de pessoas mostraram solidariedade à causa, se reunindo aos indígenas em frente ao Masp, no final da tarde. Em Brasília, a mobilização foi na Praça dos Três Poderes, em frente ao STF, onde foram feitos rituais sagrados. Na sequência foi lançado o Documentário feito por jovens indígenas, “Luta pela Terra”. A obra reúne imagens e sentimentos em um dos momentos mais importantes da luta dos povos originários contra o marco temporal e o julgamento do Recurso Extraordinário 1.017.365, que trata da demarcação de terras indígenas do país.

Em Brasília, participaram indígenas dos povos Terena, Kaingang, Tuxá, Xokleng, Tupinambá, Karapó, Guarani Nhandeva, Guarani Kaiowá, Takaywrá, Cinta Larga, Karipuna, Tukano, Macuxi, Wapichana, Taurepang, Mura e Marubo, que, ao longo desta semana, realizaram uma série de reuniões e audiências: com parlamentares no Congresso Nacional; na Comissão Nacional de Direitos Humanos (CNDH); no Conselho Nacional de Justiça (CNJ); no Supremo Tribunal Federal; na Fundação Nacional do Índio (Funai); além do “Seminário Sobre o Regime Constitucional das Terras Indígenas no Brasil”, na Universidade de Brasília (UnB), que reuniu indígenas, parceiros, acadêmicos e juristas.

Funai militarizada

Sob o comando de um delegado bolsonarista, o Marcelo Xavier, a Funai parou totalmente os processos de demarcação de terras. Recentemente, durante as buscas por Bruno e Dom, o papel da fundação se restringiu a difamar as organizações indígenas e acusar os indigenistas de entrarem no território do Vale do Javari sem autorização, o que não era verdade.

Em resposta a isso, os servidores da fundação entraram em greve e aderiram às manifestações de hoje. Junto aos trabalhadores da Funai, Dinamam Tuxá, da coordenação da Apib, condenou as práticas da instituição. “Hoje a Funai se encontra sob o poder das grandes corporações, pessoas ligadas às forças armadas que não tem conhecimento técnico e científico para conduzir qualquer tipo de processo ligado à política indigenista. E o reflexo disso é a criminalização do movimento indígena, a perseguição dos servidores da Funai, dos quadros que têm notórios saberes sobre o tema e a violência”.

Entenda o Marco Temporal

A tese do marco temporal pretende restringir as demarcações de terras indígenas apenas àquelas áreas que estivessem sob a posse comprovada dos povos originários em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. A tese do indigenato, por outro lado, reconhece a posse indígena da terra como originária, ou seja, anterior à criação do próprio Estado brasileiro. Para o movimento indígena é fundamental que o marco temporal seja negado pelo STF o quanto antes, pois a proposta é um incentivo para traficantes, garimpeiros, madeireiros e invasores dos territórios.

Juristas reafirmam a inconstitucionalidade do Marco Temporal e cobram coragem do STF para materializar a carta magna

Juristas reafirmam a inconstitucionalidade do Marco Temporal e cobram coragem do STF para materializar a carta magna

“Somos defensores das florestas e da Constituição”, assim a fala de Dinamam Tuxá, da coordenação da Apib, abriu o debate sobre o Direito Indígena Originário, no Seminário Nacional Sobre Regime Constitucional das Terras Indígenas no Brasil. Um evento científico e político realizado na tarde desta quarta-feira (22), na Faculdade de Direita da Universidade de Brasília.

O seminário buscou debater as questões jurídicas em torno da tese do Marco Temporal, reunindo diversos especialistas para construir uma sólida defesa dos direitos dos povos originários do Brasil. Como explicou o representante jurídico da Apib, Eloy Terena, o “julgamento do Caso Xokleng afeta todas as terras indígenas, por isso chamamos de julgamento do século, é o futuro dos territórios na pauta do STF”. Dinamam Tuxá, durante a mesa de abertura, completou: “as arbitrariedades e a violência são reflexo do desmonte de uma política e precisamos que a suprema corte se posicione sobre o que está na constituição. Estamos tratando do direito originário, que antecede a constituição do Estado brasileiro. Para nós, é uma questão de segurança jurídica e o não julgamento está insuflando e legitimando as invasões. Essa tese dentro, das terras indígenas, já está em vigor”.

A deputada federal indígena, Joênia Wapichana, afirmou que “a própria expressão marco, já representa uma ferida, uma tentativa de impor limite”. O projeto de lei que ela propôs para mudar o uso termo índio para indígena (que significa nativo, originário da terra), foi recentemente vetado por Bolsonaro.

Constitucionalização do direito indígena

Durante o primeiro debate ficou claro que os artigos presentes na Carta Magna brasileira são resultado de costuras políticas, que apesar serem inovadores, passaram por um longo embate entre interesses e forças dentro de uma assembleia constituinte que não teve nenhum representante indígena.

Lideranças como Megaron, Raoni e apoiadores do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) organizaram mobilizações dos povos em Brasília para ter voz, ao mesmo tempo em que a mídia fez uma campanha difamadora dos povos. O Dr. Marcio Santilli lembrou que diante daquelas lutas, “nem o pior genocida da constituinte teve a coragem de propor essa aberração chamada Marco Temporal”.

Já Paulino Montejo, do conselho político da Apib, homenageou os “tantos parentes que deram a vida para arrancar esse texto constitucional” e que estiveram presentes nos sucessivos Acampamentos Terra Livre desde de 2004, em Brasília.

Os debatedores destacaram o papel central da antropologia para formular o pensamento que contrapõe o integracionismo, com a visão pluriétnica dos povos originários. Paulino ressaltou que o processo do Brasil não está dissociado da América Latina, a chamada de Abya Ayala – Terra Florida, Terra Madura – e que os invasores torturaram e mataram muitas pessoas no processo de “subjugação indígena a um modelo monocultural e classista”, como dos Astecas que foram reduzidos de 25 milhões para 1 milhão. No Brasil de 5 milhões de indígenas, restaram 900 mil. “Temos que falar da invasão da colonização, da monarquia, da república, da ditadura e da invasão da ultradireita, encabeçada por Bolsonaro. Somos vítimas de diversas invasões, nada de falar de descoberta do brasil”, criticou Paulino. Para ele, ainda é preciso “materializar o texto constitucional, quando se fala de autonomia”.

Regime Constitucional

O Prof. Dr. Daniel Sarmento (UERJ) contextualizou o “cenário de completo desmonte das instituições, em que a Funai não se torna apenas omissa, se torna um órgão que exerce uma série de políticas anti-indígenas”. Ele utilizou algumas premissas metodológicas importantes para o debate. A centralidade da perspectiva intercultural, na qual “a voz dos povos indígenas tem que ser ouvida e tem que ser relevante”, ou seja, não basta discutir território, é preciso compreender como se dá esse entendimento para os próprios indígenas. A ADPF 709, decisão do próprio Supremo em favor dos povos, e a convenção 169 da OIT, que tem uma série de dispositivos para amparar as demarcações, bem como a Declaração das Nações Unidas sobre povos indígenas. Trata-se de jurisprudências da corte internacional de direitos humanos que não podem ser ignoradas nesta matéria.

Sarmento assinalou que “há uma mobilização intensa de forças conservadoras que não estão localizadas apenas no poder executivo, mas também no poder legislativo, mas que nem mesmo uma emenda constitucional pode suprimir ou desnaturar um direito fundamental. Ela desfruta da imediata aplicabilidade, ou seja, não depende de outras leis para gerar efeitos, não depende de valorações políticas”. Portanto, “o poder judicial tem o dever incontornável de fazer valer imediatamente esse direito”. Algo que o presidente da república não está seguindo, visto que já houve confissão explícita de que ele não demarcaria “nenhum centímetro de terra indígena”.

O Prof. Dr. Conrado Hubner (USP) destacou que o STF é quem precisa de um marco temporal. A corte precisa “reconhecer na sua pauta as urgências constitucionais do país. Cada adiamento custa vidas, custa violências, é um grande desrespeito e descaso com a esfera pública brasileira”. Para ele, a tese em questão é uma fraude hermenêutica histórica e um grande desvio do papel do STF. Já que “é o STF que nos deve a certeza e a segurança de que esse texto constitucional importa” e cada adiamento é um ato de “leniência e tolerância à delinquência política que a gente assiste”. Hubner, asseverou ainda que, “coragem é uma virtude institucional, tão importante quanto habilidade intelectual de hermenêutica. E a coragem de um tribunal se mede em tempos como os de hoje”.

Thula Pires (PUC-Rio), fez a última intervenção. Como crítica do colonialismo jurídico, ela trouxe à memória as leis do final do século 17, quando a resistência indígena forçou o reconhecimento legislativo dos povos pelas autoridades coloniais. As instituições do período questionavam a humanidade em pessoas indígenas e este reconhecimento, segundo a estudiosa, foi “sempre condicionado, sempre limitado, sempre impondo restrições bastante violentas, como a evangelização”.

A jurista ressaltou que o mesmo documento determina o reconhecimento obrigatório das terras indígenas, “mesmo que as terras tenham sido concedidas em sesmarias a particulares”, os direitos indígenas são “direitos primários e naturais sobre a terra”. Por isso, para ela, “qualquer outra decisão do Supremo pode ser cobrada internacionalmente pelo extermínio da população brasileira”.

PARA NÃO ENTERRARMOS MAIS NOSSOS PARENTES PRECISAMOS ENTERRAR DEFINITIVAMENTE O MARCO TEMPORAL.

PARA NÃO ENTERRARMOS MAIS NOSSOS PARENTES PRECISAMOS ENTERRAR DEFINITIVAMENTE O MARCO TEMPORAL.

Mais uma vez estamos em Brasília, na Capital Federal, com uma comitiva de muitas lideranças de vários territórios de nosso povo para pedir as autoridades que nos ajudem a alcançar o nosso direito mais básico enquanto seres humanos. O direito de continuar existindo. Para nós a existência física e cultural depende da demarcação de nosso território.

Trazemos nesta viagem duas grandes dores. A primeira é uma dor de solidariedade aos parentes do Javari que perderam um amigo. Bruno Pereira, assim como Dom Phillips foram covardemente assassinados por defenderem os direitos indígenas e da Natureza. Essa dor, foi sentida na nossa carne, não so dos povos do Javari, mas sim na carne dos povos indígenas de todo o pais. Bruno e Dom morreram pelos motivos que nos – Guarani e Kaiowa – morremos diariamente: A transformação deste Governo em uma grande milícia apoiadora de Agro-Negócios, o sucateamento dos órgãos indigenistas e a negação de nossos direitos constitucionais.

Nós Guarani e Kaiowa, quando recebemos a notícia de Bruno e Dom, já estávamos de luto. Luto pelo menino Alex Lopes, o quarto da família Lopes a ser assassinado covardemente na mesma região do MS. No caso de Alex, seu único erro foi de sair de casa para pegar lenha para família, não voltou mais pois foi assassinado por um capataz. Tanto Bruno e Dom, quanto Alex foram covardemente assassinados pelo mesmo motivo, independente do que faziam ou estavam fazendo. Morreram porque onde deveria existir Terra Indígena, existe trafico. Onde deveria existir rezas e ritos dos povos, existe crime. Sobre os nossos territórios e ao redor deles se estende estes Agro-negócios ilegais e imorais que matam muitos indígenas e aliados, enquanto nos que lutamos pela vida encontramos ate hoje apenas a morte.

Alex Lopes, 17 anos, foi o vigésimo segundo Guarani e Kaiowa assassinado no contexto da luta pela Terra no MS – eh sim, morreu por conta da Terra, uma vez que se nossa reserva de Takuaperi não tivesse sido diminuída e lá não tivessem chegado fazendas, Alex não teria morrido. Sabidamente nós os Guarani e Kaiowa somos o segundo maior povo do pais com a pior situação territorial entre todos os povos, hoje somos um povo praticamente sem Terra que vive a margem das rodovias. Não é coincidência que sejamos o povo que carrega contra si o maior índice de assassinatos. Terra é vida, a falta dela, morte.

Abaixo listamos nossos parentes executados desde Marçal, nosso grande Lider:
1 Marçal de Souza 1983
2 Samuel Martins 2000
3 Adriano pires 2000
4 Marcos veron 2003
5 Dorvalino Rocha 2005
6 Dorival Benites 2005
7 Amilton Lopes 2006
8 churite Lopes 2007
9 Ortiz Lopes 2007
10 Oswaldo Lopes 2009
11 Rolando Vera 2009
12 Genivaldo vera 2009
13 Osvaldo pereira 2009
14 Teodoro Ricardi 2010
15 Nizio Gomes 2011
16 José Barbosa 2012
17 Denilson Barbosa 2013
18 Oziel Gabriel 2013
19 Marinalva Manoel 2014
20 Simeão vilhalva 2015
21 Clodiodi aquileu 2016
22 Alex Lopes 2022

Senhoras e Senhores, autoridades deste pais, como vocês sabem o Marco Temporal, se for aprovado irá significar para o nosso povo um número absurdo de despejos e mais um número absurdo de sangue, luta e morte. Se hoje nós os Guarani e Kaiowa vivemos em menos de 0,2 por cento do que deveria se nosso território, viveremos onde com o Marco Temporal, talvez todos juntos em um grande cemitério tradicional. Pedimos o apoio de todos vocês, pois o que temos para dizer é: É preciso enterrar o marco temporal para que deixemos de enterrar nossos parentes.
FORA O MARCO TEMPORAL
DEMARCACAO JÁ

Povos indígenas do Tapajós realizam acampamento de resistência na Praça São Sebastião, em Santarém

Povos indígenas do Tapajós realizam acampamento de resistência na Praça São Sebastião, em Santarém

O primeiro acampamento “Santarém Território Indígena” contará com a presença de representantes dos 13 povos do baixo Tapajós 

O Conselho Indígena Tapajós e Arapiuns (CITA) realiza o primeiro acampamento de resistência indígena da região Oeste do Pará. Com o nome “Acampamento Santarém Território Indígena: Luta pela vida”, a mobilização ocorrerá entre os dias 20 e 25 de junho na Praça São Sebastião, no bairro Prainha, em Santarém, com debates relacionados a demarcação de territórios, educação indígena e mudanças climáticas, além de projetos de leis e grandes empreendimentos que atacam diretamente os direitos dos povos originários. 

O acampamento faz parte da jornada nacional de mobilização do movimento indígena e dá continuidade às lutas contra a tese do marco temporal, que seria julgada no Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 23 de junho, mas foi retirada da pauta, resultando no adiamento do Acampamento Luta Pela Vida 2022, que aconteceria em Brasília. 

Em Santarém, a mobilização acontece em uma semana emblemática para os povos indígenas: o “aniversário” do município. Para o senso comum, a cidade comemora 361 anos no dia 22 de junho, no entanto, arqueólogos afirmam que Santarém é considerada a cidade mais antiga do Brasil, com indícios da presença indígena no território há pelo menos 10 mil anos. Por isso, os povos do baixo Tapajós ocupam as ruas com o objetivo de retomar seu território de origem após o processo de tentativa de apagamento histórico. 

“O nosso principal tema do acampamento é o marco temporal, mas também essa mobilização é uma demarcação de território. É dizer que nós existimos, nós estamos aqui, que Santarém é um território indígena. Apesar de 361 anos que comemoram do aniversário de Santarém, isso não apaga a nossa existência, muito menos a nossa história. Nós somos milenares aqui nessa região”, declarou Auricélia Arapiun, coordenadora do CITA. 

No Baixo Tapajós, os povos indígenas resistem ao dilema do avanço do agronegócio, exploração madeireira ilegal e grandes empreendimentos que adentram seus territórios. O acampamento irá tratar sobre os projetos de lei como o 191/2020 que tenta liberar a atividade garimpeira nos territórios indígenas e pode impactar ainda mais os povos da região do Tapajós. Em janeiro deste ano, o Rio Tapajós foi destaque nacional pela mudança de cor das águas no curso do rio próximo a Alter do Chão, distrito de Santarém, ocasionadas pela atividade garimpeira ilegal na região.

A mobilização pretende construir um espaço de resistência, discussão e mobilização pelos direitos dos povos indígenas. A defesa dos territórios e a garantia de políticas públicas pela qualidade de vida, como educação e saúde também serão pauta de reivindicação. 

Segundo Auricélia Arapiun o acampamento no baixo Tapajós articula a resistência que vem sendo construída pelos povos indígenas da Amazônia e em todo Brasil.  “É um ato que vai representar a Amazônia no contexto atual que nós estamos vivendo de tantos retrocessos e tantas violações contra os nossos direitos. A gente está se juntando aos parentes da Amazônia, aos parentes do Brasil todo que também vão fazer suas manifestações. Aqui a gente permanece com o nosso acampamento que é um marco da nossa história, é um sonho que nós estamos realizando, dar visibilidade pra luta dos povos indígenas do Baixo Tapajós”, pontuou. 

Estarão presentes em Santarém indígenas das 13 etnias representadas pelo Conselho Indígena Tapajós e Arapiuns: Tapajó, Tupaiu, Tapuia, Munduruku, Munduruku-Cara Preta, Maytapu, Tupinambá, Arapium, Arara Vermelha, Jaraqui, Apiaká, Kumaruara e Borari. 

Programação 

O Acampamento Santarém Território Indígena terá cinco dias de programação e contará com dezenas de atividades. O enfrentamento ao marco temporal e aos grandes projetos dentro dos territórios serão destaques na programação que contar também com plenárias sobre juventudes, mulheres, educação escolar e superior e comunicação. 

Além disso, em todos os dias de acampamento a população de Santarém poderá conhecer e consumir produtos produzidos pelos povos indígenas na Feira de Artesanato, que estará localizada na Praça São Sebastião.  

A programação completa pode ser encontra nas redes sociais do cita: @citabt e está sujeita a alterações. 

 

Apib convoca mobilização pela votação do Marco Temporal no próximo 23 de junho

Apib convoca mobilização pela votação do Marco Temporal no próximo 23 de junho

No dia 23 de junho o movimento indígena de todo Brasil vai realizar uma série de manifestações para pedir ao Supremo Tribunal Federal (STF) que retome a pauta do Marco Temporal para votação. Estão sendo convocadas ações nos territórios, nas aldeias e nas redes sociais. 

“Precisamos fazer com que os ministros derrubem de uma vez por todas a ideia absurda de datar nossa existência no território brasileiro. Não vamos aceitar que nosso futuro seja despedaçado por ações desse governo genocida. Somos raiz e continuidade da vida”, afirmou Dinamam Tuxá, da coordenação executiva da Apib. 

O julgamento da tese estava previsto para esta data, no entanto foi suspenso e ainda não possui data para retornar. A Apib havia previsto um grande acampamento nacional em Brasília, que também foi adiado. Porém, o povo Xokleng vai realizar uma manifestação na capital. 

Para a Apib, a votação do Marco Temporal é importante para ligar um sinal vermelho às posturas anti-indígenas do atual governo. “Bolsonaro não só acabou com a demarcação de terras no Brasil como colocou militares e pessoas que até hoje querem catequizar, doutrinar e exterminar nossa cultura em cargos de instituições fundamentais para a garantia dos nossos direitos”. Há mais de 3 anos não ocorre uma demarcação de terra, enquanto a situação de invasão de territórios por criminosos, conflitos, assassinatos e ameaças se multiplicam. 

Entenda o julgamento do Marco Temporal

A tese do Marco Temporal tomou força após a promoção de posturas anti-indígenas pelo governo de Jair Bolsonaro. De acordo com esta tese, a demarcação de uma terra indígena só poderia acontecer se fosse comprovado que os povos originários estavam sobre o espaço requerido antes de 5 de outubro de 1988, data da promulgação da atual Constituição Federal. A tese que se contrapõe ao Marco Temporal se chama Indigenato. De acordo com a Tese do Indigenato a posse da terra pelos indígenas é um título congênito, ao passo que a ocupação é um título adquirido. 

Como defendeu o ministro Fachin, os direitos constitucionais indígenas são cláusulas pétreas “visto que estão atrelados esses direitos à própria condição de existência dessas comunidades e de seu modo de viver”. Hoje no Brasil, há mais de 300 processos de demarcação de terras indígenas que estão em aberto. A decisão pode definir o rumo desses processos.

APIB apresenta novas denúncias contra Bolsonaro ao Tribunal Penal Internacional

APIB apresenta novas denúncias contra Bolsonaro ao Tribunal Penal Internacional

Povos indígenas acusam o presidente pela morosidade nas buscas de Bruno e Dom, além de crime de genocídio e crimes contra a humanidade por extermínio, perseguição e outros atos desumanos. 

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) enviou nesta terça-feira (14) uma nova manifestação ao Tribunal Penal Internacional (TPI), o Tribunal de Haia, na Holanda. O documento atualiza a denúncia realizada pela Articulação em 09 de agosto de 2021, que atribui a Jair Bolsonaro a responsabilidade pela prática de crime de genocídio e de crimes contra a humanidade por extermínio, perseguição e outros atos desumanos. Dessa vez os fatos referem-se ao período de janeiro a maio de 2022, incluindo a negligência nas buscas por Bruno da Cunha Araújo Pereira e Dom Phillips e a barbárie no território Yanomami.

A Apib ressalta a persistência e a intensificação da política anti-indígena de Jair Bolsonaro, com agravamento dos seus efeitos sobre os povos indígenas. O Presidente “ataca sistematicamente os povos indígenas brasileiros por meio da destruição intencional das instituições de proteção dos direitos indígenas e socioambientais, além de atacá-los por meio de discursos que têm feito segmentos da sociedade brasileira perceberem os povos indígenas como obstáculo à sua prosperidade”, afirmou comunicado da APIB. As consequências do desmonte institucional estão cada dia mais visíveis, como o recente desaparecimento do jornalista e do indigenista, o aumento da invasão e apropriação de terras indígenas por não indígenas, o desmatamento, o garimpo e a mineração, além do impacto desproporcional da pandemia de Covid-19 entre os povos originários.

A atuação da Nova Funai 

A APIB denunciou também a transformação de instituições e políticas de Estado criadas para defesa de direitos dos povos indígenas em aparato voltado para a destruição e a perseguição destes. De acordo com a retrospectiva das ações da FUNAI sob o governo de Jair Bolsonaro, presentes nesta denúncia, o órgão implementou a “política anti-indígena do Presidente brasileiro, criando medidas administrativas com o objetivo de desproteger indígenas localizados em terras não homologadas, além de atos infralegais que facilitaram o acesso de terceiros às terras, bem como a completa paralisação dos processos demarcatórios”. E ainda, a APIB chama a atenção do Tribunal da Haia para a alteração constante no quadro de trabalhadores da fundação, que vem sendo ocupado por  funcionários abertamente contrários aos interesses dos povos indígenas. 

Yanomamis e Povos indígenas isolados e de recente contato são destaque

Nos últimos meses houve uma ampliação significativa da atividade garimpeira na Terra Indígena Yanomami, segundo relatório elaborado pela Hutukara Associação Yanomami e pela Associação Wanasseduume Ye’kwana. Estudos científicos demonstram que este aumento implica em mais desmatamento, contaminação e assoreamento de rios, aumento da contaminação por malária e mercúrio, o consequente aumento de doenças associadas, da desnutrição, e caos social. O garimpo atualmente é praticado com maquinário pesado, para extração em larga escala e, como a madeira, está integrado a cadeias globais de comércio. 

Jair M. Bolsonaro tem criado condições propícias e incentivado o ingresso às terras indígenas daqueles que fornecem aos povos os meios para que eles se exterminem. Os garimpeiros têm construído alianças com indígenas que agem em prol do garimpo, municiando-os com armas de fogo, modificando o caráter e as consequências de certos conflitos, a exemplo do que ocorreu nas comunidades Yanomami Tirei e Pixanehabi, em Abril.

Já as “portarias de restrição de uso” designadas pela Funai deveriam proibir a entrada de pessoas não autorizadas nos territórios onde se localizam povos indígenas isolados e de recente contato em territórios não demarcados. Era de costume de outros governos prever a validade da portaria por intervalos de no mínimo dois anos, dado se tratar de povos e territórios de difícil acesso e de interação negociada. No entanto, atualmente, o presidente dificulta a renovação dos instrumentos, reduz seus prazos para o insuficiente período de seis meses e, no caso da Terra Indígena Jacareúba/Katawixi (AM), vencida em 12 de dezembro de 2021, nem mesmo o renova. 

Desaparecimento do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips também é noticiado

O desaparecimento do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips no dia 05 de junho também foi noticiado. A Polícia Federal investiga o caso e, de acordo com seus próprios pronunciamentos públicos, no momento trabalha primordialmente com a hipótese de crime. A APIB ressaltou que este desaparecimento, a omissão estatal na realização das buscas e a possível ocorrência de um crime são efeitos da política anti-indígena de Jair Bolsonaro.

O documento entregue  em Haia se junta a outras Comunicações enviadas anteriormente por diversas instituições. Atualmente, os casos contra o Presidente Jair Bolsonaro referentes aos crimes praticados contra os povos indígenas estão em avaliação preliminar de jurisdição. Esta avaliação analisa se há uma base para sugerir que um crime relevante de competência do Tribunal Penal Internacional foi cometido. Trata-se da primeira de três etapas que integram o exame preliminar do Tribunal. Também será feita a análise sobre critérios de admissibilidade e se a investigação servirá aos interesses da justiça. Depois destas etapas, a Procuradoria do TPI poderá abrir oficialmente uma investigação e denunciar o presidente.

Mensagem para o Ministério de Relações Exteriores sobre a urgência da aprovação da lei europeia anti-desmatamento

Mensagem para o Ministério de Relações Exteriores sobre a urgência da aprovação da lei europeia anti-desmatamento

Ao Ministro de Relações Exteriores

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) está atenta ao debate da Lei sobre importação de produtos com risco florestal (FERC) e vem por meio desta reforçar e apelar ao Ministério que reconheça a realidade dos impactos multidimensionais e da responsabilidade das dinâmicas económicas e comerciais europeias sobre as terras indígenas no Brasil. A lei em debate é de suma importância para os Povos Indígenas do Brasil, pois influencia diretamente os promotores das violações de direitos humanos, a demarcação das terras indígenas e a manutenção da biodiversidade que os Povos do Brasil vem a milênios protegendo e salvaguardando.

Para garantir que a nova lei tenha impacto positivo efetivo, e em tempo hábil para o enfrentamento climático, os Povos Indígenas do Brasil, por meio da APIB, pedem atenção para as seguintes considerações:

1. Recorte territorial reconhecido de acordo com a definição da FAO:

A definição atual de florestas dentro da proposta de lei, de acordo com a FAO, desconsidera grande parte da realidade indígena brasileira, já que ignora outros biomas para além da Amazônia e Mata Atlântica. Os Povos Indígenas, vêm enfrentando o genocidio e o desaparecimento de seus povos e terras há mais de 500 anos em todo território nacional, de tal forma que é necessário reconhecer a luta histórica pela manutenção das florestas, e outras vegetações naturais existentes no Brasil.

Se levada em conta a atual definição, a proposta de lei seria aplicada em apenas 15% da região do Pantanal, um dos biomas mais atingidos com as queimadas nos últimos anos, e desconsidera por completo o bioma Pampas no sul do país, onde se desenrolam histéricos processos de invasão e ocupação de terras indígenas, ocasionados principalmente pelo avanço da soja e pecuária. O bioma Cerrado, responsável por salvaguardar as reservas aquíferas do Brasil, teria apenas ¼ de sua área reconhecida como floresta dentro da definição da FAO, sendo hoje uma das regiões com avanço significativo do agronegócio e da pecuária, além da expansão da fronteira agrícola na região do MATOPIBA (Acrônimo a partir da região formada pelos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), que já traz impactos para a contaminação dos solos e águas por conta do uso excessivo de agrotóxicos.

2. Impactos e ameaças da pressão da produção das commodities sobre os Povos e territórios indígenas.

Originais protetores e mantenedores da biodiversidade, hoje os Povos Indígenas sofrem diversas violências, ameaças e impactos sobre suas vidas, corpos e territórios. Os modos de vida específicos dos Povos Indígenas estão intrinsecamente ligados à manutenção da biodiversidade, dos recursos naturais e da continuidade da vida.

Terra Indígena é garantia de futuro para toda a humanidade. A relação com o território não é de propriedade, exploração, expropriação ou apropriação, mas de respeito e manejo de um bem comum, que serve a toda humanidade. Porém, essa porção fundamental para a sobrevivência dos povos indígenas e para o bem comum segue em constante ameaça. A pressão pelo desmatamento nos territórios indígena é intensa, por meio de invasões, mineração, expansão agrícola e outras atividades ilegais que ocorrem dentro dos territórios, colocando em risco a vida dos povos que ali habitam.

A violências e violações de direitos constitucionais é constante. Os Povos que defendem e habitam as florestas enfrentam não apenas o desmatamento, queimadas e destruição de sua biodiversidade, mas também convivem diariamente com situações extremas de violência, racismo e expropriação de seus territórios originários.

Para alem dos impactos ocasionados diretamente pelo avanço da produção das commodities (produtos do agronegócio e pecuária), como contaminação dos solos e rios por pesticidas pulverizados no ar, invasão das terras indígenas para produção ilegal, desmatamento e venda de madeira ilegal, os Povos Indígenas enfrentam ataques diretos a seus povos, comunidades, famílias e corpos.

A perseguição às lideranças, e até seu assassinato, é uma infeliz realidade vivida pelos Povos originários. Aqueles que se colocam na defesa da natureza, da biodiversidade e da manutenção da vida global, são perseguidos, criminalizados, presos e assassinados, com a completa omissão do Estado brasileiro. E infelizmente essa perseguição e violência se estendem aos apoiadores da luta dos povos indígenas, como o caso recente do desaparecimento do indigenista Bruno Pereira e jornalista correspondente do The Guardia, Don Philips, que estavam denunciando os ataques sofridos pelos Povos Indígenas na região do Vale do Javari – a segunda maior terra indígena do Brasil (uma área quase do tamanho de Portugal)

A invasão de terras, para a produção ilegal de commodities, leva ao confronto direto com as comunidades de origem, aumentam exponencialmente situacoes de violência baseadas em gênero e abuso de menores, além de implantar dinâmicas de abuso de álcool e drogas por meio da chegada massissa de invasores ocupados com a derrubada de árvores, garimpo, e produção de gado,

Mesmo reconhecido constitucionalmente desde 1988, a demarcação das terras indígenas ainda não foi concluída no Brasil. As terras indígenas ainda não homologadas enfrentam forte pressão das dinâmicas econômicas, que tiram proveito da omissão do Estado brasileiro para avançar sobre as áreas protegidas pelos, e garantida para os Povos indígenas. Atualmente, tal lacuna torna tais terras vulneraveis nao apenas diante da producao de commodities como tambem abrem brechas para a presenca de faccoes do crime organizado, que operam o narcotrafico assim como a exploracao ilegal de madeira. A presença de facções criminosas também aumentam a pressão sobre a juventude indigena, não sendo raro ações de aliciamento e recrutamento de jovens para o crime organizado.

3. A fragilidade institucional do Brasil perante a proteção das terras indígenas.

Contar unicamente com as legislações e agências nacionais não traz segurança para os Povos Indígenas, que atualmente testemunham o desmonte das políticas públicas, regulações e instituições de proteção.
O governo Bolsonaro foi responsável pela desestruturação da política de proteção e monitoramento das terras indígenas, desde a extinção de recursos públicos para as agências de proteção até a perseguição e exoneração de profissionais historicamente comprometidos com a pauta indígena.

Contar com a estrutura de defesa e proteção dos Povos Indígenas existente hoje no Brasil deixa graves lacunas para a efetividade da lei europeia.

De 2010 a 2020, a área ocupada pelo garimpo dentro de terras indígenas cresceu 495%, segundo dados do Map Biomas. Isso representa um aumento de 41 vezes no desmatamento causado por uma prática ilegal e violenta aos povos indígenas e que o congresso brasileiro, pressionado pelo presidente Jair Bolsonaro, pretendo legalizar via o projeto de Projeto de Lei 191/2020.
Além desse projeto de lei que pretende abrir as áreas indígenas para a devastação da floresta e de vidas, há todo um pacote de destruição em pauta no Congresso Nacional que insiste no fim das demarcações e na revisão de Terras Indígenas (Projeto de Lei 490/2007), que legaliza a grilagem de terras públicas (Projeto de Lei 510/2021), entre outros que flexibilizam a estrutura de proteção legislativa aos territórios e povos indígenas.

Para além das ameaças legislativas, há o próprio presidente do Brasil, que vem cumprindo seu papel quando afirmou, ainda em campanha em 2018, que não demarcaria nenhum milímetro de terra indígena. Em seu governo, todas as demarcações estão paralisadas e correm risco de serem extintas caso o Marco Temporal seja julgado no Supremo Tribunal Federal do Brasil. O julgamento do Marco Temporal é considerado o julgamento do século pelos povos indígenas, pois define o futuro da demarcação dos territórios. Caso a suprema corte decida em favor dessa tese, o direito ao território e a proteção dos mesmos pode ser extinta. Este PL é um dos principais ataques do Poder Legislativo aos direitos reconhecidos aos povos indígenas na CF/88. É considerada pela APIB como uma “tentativa de genocídio”. A principal alteração do PL 490 acabaria por inviabilizar as demarcações das terras indígenas através da incorporação em lei da tese do marco temporal, como um dos requisitos taxativos a ser observado para o reconhecimento de áreas tradicionalmente ocupadas. O julgamento, que se iniciou em 2021, foi cancelado três vezes esse ano.

4. Emergência climática

Não existe solução para a crise climática sem os Povos Indígenas.
As mudanças climáticas são mais percebidas pelos povos indígenas, pois mantemos uma relação íntima com a Mãe Natureza: dela vem todo o nosso sustento e ela nos dá todas as explicações para os fenômenos que afetam nossas vidas. Entendemos a sua língua. Olhar para o céu, sentir a temperatura, ouvir a batida da terra são coisas que aprendemos desde muito cedo, por meio da educação indígena, que nos prepara para o manejo do mundo, nos traz sentido para a vida. Mas por todo lugar que passamos, temos ouvido percepções pessoais em relação ao desequilíbrio no clima.

Até mesmo nos grandes centros urbanos muita gente já percebe seus efeitos no cotidiano. As transformações começam a despertar os instintos de todos. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) está reforçando para o mundo a centralidade dos povos e seus territórios para o enfrentamento da crise climática. Estamos observando governos e organizações buscarem soluções tecnológicas e ferramentas que possam ajudar a atual crise, mas é necessário entender que a principal tecnologia social já foi desenvolvida pelos povos indígenas: os territórios tradicionais e as culturas indígenas.
Estes espaços cumprem um papel fundamental no equilíbrio climático, beneficiando, assim, toda a Humanidade. Mas para que eles sejam preservados é preciso preservar também o modo de vida dos povos originários. Com o seu próprio meio de vida, os indígenas garantem essa harmonia e o bem-estar para além de suas terras.

Os países da União Europeia, grandes compradores de commodities do Brasil, podem nos ajudar na proteção de nossas vidas e nossos territórios. Por isso, estamos aqui na Europa e demandamos diretrizes fortes e ambiciosas para a FERC, como: (1) garantir que todos os biomas sejam incluídos na legislação; (2) que se mantenha a inclusão sobre o respeito aos direitos internacionais dos Povos Indígenas, devido a fragilidade da legislação nacional e (3) que essa lei seja levada para votação o mais rápido possível para o Parlamento Europeu, pois a cada período de demora, acelera-se a destruição de nossas vidas e territórios

A aprovação da FERC, com diretrizes fortes e ambiciosas para a proteção dos nossos direitos e biomas se faz urgente, para que se mande uma mensagem ao governo brasileiro e àqueles que se beneficiam dos ataques aos povos indígenas: a Europa não será mais conivente com a violência contra os Povos Indígenas. Garantir seus direitos é garantir a vida da humanidade.