Com versões em inglês, espanhol, francês e alemão, ação marca início de uma nova agenda de autodefesa dos povos indígenas
Um novo vídeo lançado hoje nas redes sociais questiona se governos e empresas estão agindo para defender ou para destruir a Amazônia, massacrando os povos nativos que habitam o bioma há séculos. Em formato de paródia dos noticiários cinematográficos produzidos durante a Segunda Guerra Mundial, o vídeo Climate War mostra quais setores produtivos estão contaminados pelas atividades ilegais que desmatam, queimam, contaminam rios e matam indígenas. E apresenta Jair Bolsonaro como um inimigo climático que precisa ser parado e responsabilizado por seus crimes antes que as consequências sejam graves demais para todo o planeta.
O formato escolhido, que remete à Segunda Guerra Mundial, visa explicitar que não se trata de crítica a um país, mas a um governante. Assim como os crimes da Segunda Guerra foram atribuídos a líderes dos governos envolvidos (alguns dos quais chegaram inclusive a serem julgados e condenados), o vídeo Climate Wars atribui os crimes que estão sendo cometidos na Amazônia a Bolsonaro e não ao Brasil. Ou seja, o ponto central do vídeo é a responsabilização de Jair Bolsonaro pelo ataque ao clima global, à biodiversidade da floresta e à vida dos povos nativos. Ele mostra que ficar do lado da Amazônia é uma atitude patriótica, de defesa do país, para garantir um Brasil vivo e viável para os brasileiros.
Apesar do tom de sátira, relacionar a devastação ambiental e o avanço de forças econômicas e criminosas sobre as florestas brasileiras a uma guerra não é exagero. Garimpeiros, madeireiros e invasores de terras demarcadas são um verdadeiro exército da destruição, invadindo territórios que legalmente não lhes pertencem, incentivados por Jair Bolsonaro. Além de uma ameaça imediata à sobrevivência dos povos indígenas, eles representam um risco global devido às consequências climáticas da destruição da maior floresta úmida do planeta.
Climate Wars marca também o início de uma nova agenda de autodefesa dos povos indígenas. Passada a pandemia, eles darão continuidade aos diálogos diretos com governos e parlamentares europeus e norte-americanos, além de uma aproximação com a China ainda este ano. “Queremos que eles apoiem o Brasil, mas da maneira certa, que é nos ajudando a frear a destruição de nossos ecossistemas, recursos naturais e do próprio clima”, declara Sônia Guajajara, da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil-APIB, que divulgou o vídeo em suas redes sociais.
Fruto da colaboração de ativistas e artistas brasileiros – pessoas que apoiam a luta da APIB e que compreendem a gravidade e as consequências da política ambiental do governo do Brasil – o vídeo tem versões em inglês, espanhol, francês e alemão. Ele não traz os créditos dos autores por dois motivos: primeiro, porque o foco deve ser na mensagem do vídeo, não nas pessoas; e segundo, pela assumida perseguição a ativistas que o governo federal vem promovendo com o uso de instrumentos de Estado e paraestatais.
Bolsonaro quer forçar a evangelização de povos indígenas. Atacou nossos direitos no Supremo, defendendo a questão do marco temporal. Teima em lutar contra o termo povos indígenas, sem entender que sim, somos brasileiros e também somos indígenas. Nenhuma terra indígena – apesar de mais de 600 processos – foi demarcada e muitos povos foram retirados dos territórios à força. O Ibama, ICMBio, Funai foram desmontados e perderam orçamento. Tudo passou para o exército, que foi incompetente, enquanto o desmatamento e as queimadas bateram os recordes da década. O Fundo Amazônia parou, perdemos o acordo com a União Europeia e investidores ameaçam tirar dinheiro de empresas brasileiras. Tudo isso é o Bolsonaro e sua política que ninguém entende, nem quem é de direita.
A APIB DEFENDE UMA AGENDA CAPAZ DE PRESERVAR A FLORESTA E OS INTERESSES DO BRASIL
7 Pontos de Demandas da APIB
Uma moratória de cinco anos ao desmatamento na Amazônia.
Aumento das penas para desmatamento e outros crimes ambientais, incluindo o congelamento de bens dos 100 piores criminosos.
Retomada imediata do PPCDAm – Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal, engavetado pelo governo Bolsonaro.
Demarcação de terras indígenas e quilombolas e criação, regularização e proteção de Unidades de Conservação.
Reestruturação dos órgãos federais responsáveis pela proteção do meio ambiente e dos direitos indígenas (Ibama, ICMBio e Funai).
Imposição do Código Florestal (principalmente a emenda de 2018 para penalização de produção em terra ilegal)
Construção de um arcabouço legal para Rastreabilidade da Cadeia de Suprimentos, a fim de dar transparência a atores comerciais internacionais e nacionais.
A APIB está de Luto. Morreu no ultimo domingo, 10 de janeiro do corrente, vítima da Covid – 19, aos 66 anos, o líder Lucio Paiva Flores. Lúcio Terena, como era mais conhecido, nasceu na aldeia Jaguapiru, no Estado Mato Grosso do Sul. Sociólogo e Mestre em Ciências da Religião, nos anos 90, morando em Cuiabá, estado de Mato Grosso. Fez parte da Diretoria do Conselho de Missão entre Índios (COMIN), depois mudou-se para Manaus – AM, onde trabalhou no Centro de Formação e no Departamento Etnoambiental da COIAB. Nos últimos 5 anos trabalhava, em Brasília, na Assessoria de Controle Social da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI).
Lúcio teve valiosas contribuições ao movimento indígena. Destacamos, dentre elas, a sua participação nas lutas que povos, organizações e lideranças indígenas enfrentaram para tornar realidade a criação, em 2010, da SESAI, e na formatação e execução do Projeto Gestão Ambiental de Terras Indígenas (GATI) iniciativa que visava impulsionar, depois, a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental das Terras Indígenas (PNGATI).
A APIB, que perde mais um de suas lideranças para o Novo Coronavirus, manifesta a todos os familiares de Lucio Terena as suas condolências e solidariedade fraterna. E que o Pai Tupã os conforte. Descansa em paz querido Lúcio Terena.
Brasília, 11 de janeiro de 2021 – A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) enviou hoje uma carta aberta ao presidente da BlackRock, Larry Fink, convocando a empresa de gestão de ativos a adotar uma política abrangente de respeito aos direitos dos povos indígenas e desmatamento zero/proteção às florestas. A carta foi enviada dias antes da carta anual de Fink, na qual ele frequentemente anuncia mudanças nas políticas da instituição e uma promessa recente da BlackRock de esclarecer ainda mais sua abordagem ao desmatamento.
A BlackRock é a maior gestora de ativos do mundo em commodities com risco de desmatamento, incluindo a Amazônia. Relatório recente da APIB e da Amazon Watch demonstrou que a instituição financeira detém sozinha US$ 8,2 bilhões em ações e títulos de empresas implicadas em violações de direitos indígenas e conflitos em seus territórios no Brasil, como Vale, JBS, Anglo American, Cargill e outras mais. Em relatório anterior, publicado em 2019, novamente a APIB e a Amazon Watch mostraram como a BlackRock investiu em empresas cúmplices de atividades ilegais de desmatamento na Amazônia brasileira.
“Os investimentos da BlackRock têm um impacto enorme em nossas vidas e comunidades. Esta instituição tem, portanto, grande responsabilidade sobre nosso futuro e a Amazônia. Porque se a floresta chegar ao seu ponto de não retorno, todo o planeta está em risco ”, afirma Luiz Eloy Terena, coordenador jurídico da APIB, na carta.
Apesar de ter adotado medidas, no início de 2020, para lidar com seus investimentos em setores que causam danos ao clima, a BlackRock não possui uma política sobre como lidar com investimentos que possam impactar os direitos de povos indígenas. Tampouco tem se comprometido a pressionar as empresas nas quais ela investe para atuar pelo fim do desmatamento nas florestas tropicais como a Amazônia.
Estudos mostram que as terras indígenas são a última barreira contra o desmatamento e a degradação das florestas. As áreas protegidas na Amazônia brasileira, onde vivem os povos das florestas, englobam Terras Indígenas (TI), reservas extrativistas (Resex) e Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS) que somam 128,5 milhões de hectares – uma área equivalente ao Pará. Essas grandes áreas correspondem a 56% do estoque de carbono total da Amazônia brasileira e atuam evitando significativamente as emissões potenciais associadas de gases de efeito estufa. Defender as áreas protegidas significa defender o equilíbrio da vida na Terra, combatendo o aquecimento global e as mudanças climáticas.
“A BlackRock começou a tomar algumas medidas a favor do clima, mas nenhuma ação climática está completa sem abordar o desmatamento, e nenhuma ação de desmatamento está completa sem salvaguardar os direitos indígenas. A BlackRock deve usar seu poder de mercado para impulsionar ativamente as empresas a descarbonizar, como a ciência deixa claro que é necessário, e acabar com as violações de direitos indígenas associadas à produção de commodities e exploração de petróleo”, afirma Moira Birss, Diretora de Clima e Finanças da Amazon Watch.
Em maio de 2019, na reunião anual de acionistas da BlackRock em Nova York, conforme descrito na carta, Eloy Terena solicitou diretamente a Larry Fink para que a instituição considerasse os impactos de seus investimentos nas violações de direitos indígenas e na destruição da Amazônia no Brasil. Meses depois, o mundo testemunhou perplexo a Amazônia em chamas. Por trás do fogo e da derrubada da floresta, estão interesses econômicos
poderosos: a criação de gado, o comércio ilegal de madeira e a produção de soja. Por trás das empresas produtoras de commodities, como JBS e Cargill, estão financiadores poderosos como a BlackRock. Em outubro de 2019, Sônia Guajajara, coordenadora-executiva da APIB, escreveu uma carta à Blackrock, quando a instituição financeira concordou em se reunir com as lideranças da APIB. Apesar de uma ligação ter ocorrido em dezembro, a BlackRock não deu prosseguimento para um encontro presencial acordado para março de 2020. A APIB, em razão da pandemia, buscou realizar esse encontro de modo virtual, mas não teve retorno da instituição.
Recomendações
No relatório Cumplicidade na Destruição III e nesta carta enviada hoje, qualquer tentativa da BlackRock ou de outros gestores de ativos de abordar a proteção de florestas e respeito aos direitos dos povos indígenas com as empresas de seu portfólio deve incluir os seguintes critérios:
Comprometer-se com políticas de desmatamento zero, de garantia dos direitos humanos e respeito aos direitos indígenas, com metas verificáveis e relatórios de progresso disponibilizados publicamente.]
2. Criar ou reforçar mecanismos internos de controle e monitoramento, para garantir que não haja investimentos em áreas de destruição ambiental, violações de direitos humanos e conflitos em Territórios Indígenas.
3. Exigir que as empresas de seus portfólios desenvolvam políticas vinculantes que salvaguardem os direitos indígenas, como o direito à Consulta Livre, Prévia e Informada; que eliminem o desmatamento de suas cadeias produtivas e que adotem medidas de transparência em relação a seus fornecedores como critério para receber financiamento ou investimento.
4. Conduzir periodicamente diligências próprias do seu portfólio de empresas com base nos mais altos padrões de direitos humanos e socioambientais, independente do nível de relacionamento direto ou indireto.
5. Excluir do seu portfólio empresas que possuam sistemáticas violações de direitos socioambientais e de direitos humanos e que se recusem a implementar políticas abrangentes de desmatamento zero e respeito aos direitos indígenas.
A Guarda Municipal da cidade de Florianópolis ameaça despejar famílias indígenas que estão na capital catarinense para vender artesanatos. A ordem foi dada na manhã de hoje (7) pelo prefeito Gean Loureiro. As famílias estão em um acampamento provisório no Terminal Saco dos Limões (TISAC), sendo coagidas pela polícia em mais um episódio de descaso e racismo da Prefeitura contra os povos indígenas.
Há três anos que o TISAC vem sendo utilizado como acampamento para os indígenas. Mulheres, homens e crianças de diversas comunidades de Santa Catarina vão até Florianópolis para vender artesanato como forma de buscar autonomia econômica e garantir a sobrevivência quando retornarem às aldeias.
O terminal está há 15 anos desativado e é usado provisoriamente devido a falta de uma Casa de Passagem na Capital, um direito que deveria ser garantido e que é uma promessa não cumprida do prefeito.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e a Articulação dos Povos Indígenas do Sul (Arpinsul), juntamente com nossas organizações indígenas de base, manifestam repúdio pela violência, autoritarismo e falta de atendimento da prefeitura de Florianópolis. Todo nosso apoio às famílias! Seguimos acompanhando o desdobramento dessa situação!
O governo federal desde sua posse vem atacando os povos indígenas, ou ignorando as nossas demandas, e o sucateamento dos órgãos indigenistas são um exemplo disso. O novo ataque atinge diretamente nosso território, com a nomeação de um policial militar para o cargo de coordenador regional do Amapá e Norte do Pará da FUNAI.
A Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Estado do Amapá e Norte do Pará (APOIANP), é a instância máxima do movimento indígena da nossa região, que reivindica do Estado e da sociedade brasileira o respeito total aos direitos fundamentais dos povos indígenas reconhecidos pela Constituição Federal, vem de público manifestar o nosso veemente repúdio contra a portaria de número 1595, publicada no último dia 14, que nomeou o Sr. Ilton Lima da Silva, para a coordenação regional Amapá e Norte do Pará na Fundação Nacional do Índio.
Esse ato de repudio toma como base a inexistência de conexões ou contribuições do nomeado em trabalhos técnicos ou científicos ligados a temática indigenista, o que nos leva a considerar a indicação como ideológica. A falta de vínculo do nomeado com as entidades representativas dos povos indígenas intimida nossos povos, em nossas lutas, e ainda, nos faz pensar no avanço e fortalecimento da política de militarização do estado brasileiro.
Diante disso, nós nos posicionamos contrários a essa indicação e pontuamos e exigimos:
1.Que seja revogada a portaria nº 1.595;
2.Que seja respeitado o que esta previsto na Constituição federal, que colocou fim ao integracionismo e à tutela, agregando ao ordenamento jurídico brasileiro os tratados internacionais assinados pelo Brasil, como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas e, a Declaração Americana dos Direitos dos Povos Indígenas. Instrumentos esses, que asseguram aos povos indígenas a manutenção da dinâmica própria de seus usos e costumes por meio de uma política indigenista que garanta o respeito a seus direitos coletivos e que promova seu desenvolvimento econômico, social e cultural, em novos parâmetros de qualidades diferenciados;
3.Que sejamos consultados, e ainda que sejam consideradas as indicações feitas por nós, indígenas da região, para a direção, corpo técnico e administrativo dos órgãos indigenistas, garantindo assim uma maior participação indígena no quadro dos servidores;
Por fim, reafirmamos a nossa autonomia e a nossa determinação de avançar na luta pela nossa organização e pela garantia dos nossos direitos, repudiando quaisquer tentativas de retrocesso em nossas conquistas e exigimos que nossa voz seja ouvida e que essa nomeação seja revogada.
Macapá – AP, 04 de janeiro de 2020
Coordenação Geral – ARTICULAÇÃO DOS POVOS E ORGANIZAÇÕES INDÍGENAS DO AMAPÁ E NORTE DO PARÁ – APOIANP
Apib denuncia situação alarmante no Polo Base devido a demissão de 18 profissionais da saúde indígena, incluindo profissionais indígenas. Falta de viaturas, equipamentos e material também agravam a situação.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) recebeu denúncias de demissões arbitrárias na saúde indígena no Polo Base de Dourados, localizado no Mato Grosso do Sul. A situação é grave, pois tanto o combate ao novo coronavírus quanto o atendimento de infectados estão prejudicados. Foi no Polo Base de Dourados que foram registrados os primeiros casos de infecção por Covid-19 entre os povos Guarani e Kaiowá, bem como os primeiros óbitos.
A situação em Dourados é mais um caso de racismo institucional, pois os profissionais demitidos são, principalmente, indígenas que atuam na saúde indígena. Um dos casos de demissão que mais gera revolta é o da enfermeira Indianara Kaiowá, coordenadora técnica do Polo Base que esteve na linha de frente do atendimento a indígenas infectados pelo novo coronavírus. Além de Indianara, mais 17 profissionais foram demitidos no Mato Grosso do Sul e outros três aguardam a finalização de processos internos.
Segundo relatos de lideranças locais, há uma clima de perseguição por parte de Joe Saccenti Júnior, coronel da reserva que foi nomeado pelo Ministério da Saúde como coordenador do Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) de Mato Grosso do Sul no final de setembro. De acordo com as denúncias, qualquer profissional da saúde indígena que comente ou questione as decisões tomadas pelo DSEI recebe advertência e/ou demissão.
Relatos de profissionais demitidos também denunciam que, na fase mais crítica da pandemia, enquanto os trabalhadores não indígenas pediram demissão ou ficaram em casa por serem de grupos de risco, foram os profissionais de saúde indígena que ficaram na linha de frente no polo base e na CASAI, que ficou sem chefia e sem agente administrativo por um período em decorrência da situação da pandemia e das demissões.
O general, que nega a situação, alega que apenas psicólogos e técnicos de enfermagem contratados exclusivamente para atuar no combate ao Covid-19 foram desligados, seguindo burocracias contratuais. No entanto, a pandemia continua, as contaminações e óbitos seguem impactando os povos indígenas. Dados do Comitê Nacional pela Vida e Memória Indígena, registrados até 4 de janeiro, apontam que 94 indígenas morreram, no Mato Grosso do Sul, em decorrência de Covid-19.
A população atendida no Polo Base chegou a apelar para que o Conselho Distrital de Saúde Indígena, órgão responsável por acompanhar e deliberar sobre questões da saúde indígena, tome providências. No início do mês, o Conselho de Mulheres Kaiowá e Guarani enviou uma carta de repúdio ao Ministério Público Federal comunicando a situação no estado.
O cenário é grave, além das demissões, nenhum investimento nas condições de trabalho dos profissionais de saúde tem sido efetivo para dar conta da demanda de atendimento (a compra de insumos muitas vezes depende do financiamento colaborativo feito pelas organizações indígenas e sociedade civil) e ainda há a preocupação com uma segunda onda de contaminação de Covid-19 no país. Outra situação denunciada é a falta de transporte para equipes de saúde que acaba deixando toda comunidade sem atendimento por um período o dia, em geral no período vespertino, como ocorre desde o início de Dezembro de 2020 até o presente momento
Os povos Kaiowá e Guarani solicitam providências e audiências com os responsáveis para averiguar e resolver a situação em prol do fortalecimento da saúde indígena, tendo em vista que a pandemia ainda está ocorrendo. A Apib endossa a luta por atendimento básico justo e eficiente aos povos indígenas do Mato Grosso do Sul.
Nota técnica preliminar envolvendo aspectos etnohistóricos e socioambientais da Retomada Indígena Xokleng Konglui na Floresta Nacional São Francisco de Paula/RS
por Rafael Frizzo
A presente nota técnica contém informações preliminares de natureza entohistórica e socioambiental relacionadas ao movimento de retomada ancestral do Povo Xokleng Konglui sobre porção territorial em área da Floresta Nacional de São Francisco de Paula, Unidade de Conservação de Uso Sustentável, considerada a primeira Unidade de Conservação (UC) no Estado do Rio Grande do Sul.
Partindo do presente etnográfico, este documento sintetiza referências empíricas colhidas junto à comunidade indígena Xokleng e o seu entendimento sobre a FLONA como território de reconhecimento étnico tradicional; movimento, este, não isolado a outras manifestações originárias no sul do Brasil, frente à paralisação dos processos demarcatórios no Brasil.
Considerando o despacho da decisão que concedeu a expedição de reintegração de posse, no dia 24 de dezembro, contrária à permanência da comunidade originária na “área de infraestrutura”, conforme zoneamento da referida UC, fazem-se necessárias, portanto, a apresentação de alguns subsídios empíricos envolvendo considerações da comunidade sobre a presença imemorial do Povo Xokleng no Estado do Rio Grande do Sul, mais especificamente, na área da FLONA; sobretudo, considerando o velamento histórico em que seus antepassados foram condicionados no processo de descimento, esbulho e genocídio sobre seus corpos e territórios a partir do empreendimento de colonização e expansão das frentes madeireiras entre as terras baixas dos vales litorâneos e os campos de cima da serra, ao longo dos séculos XIX e XX.
No entanto, está nota não pretende ser exaustiva. Sob uma perspectiva socioambiental do Bem Viver, propõem-se a enfatizar o necessário diálogo entre os órgãos competentes para o reconhecimento interinstitucional da gestão de conflitos sob o desafio das sobreposições entre unidades de conservação e territórios indígenas, avançando sugerir para o regime de uma “dupla afetação” como “gestão compartilhada” entre as instituições competentes, visando à compatibilização de direitos fundamentais e humanos do caso concreto, considerando elementos, como:
O extenso conhecimento publicado em literatura especializada sobre o passado arqueológico e histórico e o presente etnográfico da Presença Xokleng como Povo Indígena Macro Jê Meridional nos Campos de Cima da Serra no sul do Brasil: a citarem-se a arqueologia sobre “os buracos de bugres” em José Alberione dos Reis, a história dos ancestrais Botocutos Xokleng em Lauro Pereira Cunha, os trabalhos antropológicos da etnografia dos Xokleng Laklanõ em Silvio Coelho dos Santos, como os mais recentes estudos de elementos fundamentis linguísticos realizados pelo antropólogo indígena Nanblá Gakran, da etnia Xokleng;
O registro de 45 Sítios Arqueológicos no Cadastro Nacional de Sítio Arqueológicos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (PHAN) para a região do Município de Francisco de Paula, incluindo registros na área da FLONA com remanescentes dos Povos Indígenas Macro Jê Meridional;
O reconhecimento de processos demarcatórios de Terras Indígenas da FUNAI pelo Estado do Rio Grande do Sul, como consta no Atlas Socioeconômico (2020), em “processo de estudo”, relacionados à Etnia Xokleng, no Município de São Francisco de Paula, e condizente às terras Zagaua e Zág;
A ampla trajetória jurídica de repercussão geral no processo da Terra Indígena Ibirama no Estado de Santa Catarina, a qual tramita no Supremo Tribunal Federal (ACO 1100) sob a relatoria do Excelentíssimo do Ministro Dr. Edson Fachin, aguardando julgamento;
O contexto de concessões de parques e florestas sem ter sido observada a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no tocante à necessidade de proceder-se com a consulta livre, prévia e informada dos povos indígenas e tradicionais em todas as fases do processo, no âmbito do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), como modelo do Programa Nacional de Desestatização (PND) das Unidades de Conservação Florestais, incluindo à Floresta Nacional de Canela e a Floresta Nacional de São Francisco de Paula, conforme a Resolução No 113, de 19 de Fevereiro de 2020 e o Decreto No 10.381, de 28 de Maio de 2020;
O instrumento de gestão que 14, DE SETEMBRO DE 2020),
DESPACHO No 11, DE Floresta Nacional de São Francisco de Paula aprovou o Plano de Uso Público da sem consulta e reconhecimento dos aspectos Socioculturais dos Povos Indígenas, especialmente da etnia Xokleng, considerando que a demanda foi registrada formalmente desde o ano de 2011 perante o Ministério Público Federal, conforme informações dispostas no Inquérito Civil n. 1.29.002.000553/2020-21;
Ademais, que, o referido Inquérito Civil n. 1.29.002.000553/2020-21, instaurado pela Procuradoria da República no Município de Caxias do Sul, para apuração da regularidade e andamento dos estudos realizados pela FUNAI relativos à reivindicação do Povo Indígena Xokleng sobre área da Floresta Nacional de São Francisco de Paula, atendendo, em parte, os questionamentos sobre a falta de prosseguimento de competência da referida fundação com a constituição de Grupo de Trabalho (GT), conforme pedidos encaminhados desde os anos 2015 e 2019, pela Sra. Kullung Teie Xokleng, ambos reconhecidos por servidores da FUNAI, em reunião virtual recente (gravada e com disponibilização de ata) com as partes envolvidas no Ministério Público Federal de Caxias do Sul/RS, no dia 18 de dezembro de 2020.
O “I Seminário sobre Unidades de Conservação e Conflitos
Etnoambientais”, realizado no período de 8 a 10 de dezembro de 2010, no Hotel São Sebastião, em Florianópolis (SC), organizado pelo Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Sociobiodiversidade (CNPT-SC) e a Coordenação Regional 9 (CR9), com o apoio da Diretoria de Extrativismo/Gerência Indígena do MMA e da Gerência de Gestão Socioambiental/Coordenação de Conflitos, do ICMBio, para discussão e a elaboração de estratégias a fim de solucionar os conflitos etnoambientais entre UC e comunidades indígenas, onde participaram representantes de UCs envolvidas em conflitos com comunidades indígenas, direta e indiretamente, incluindo gestores da Floresta Nacional de São Francisco de Paula;
O documento de “Qualificação de Reivindicação” encaminhada pelos Xokleng para a identificação como terra tradicional junto à Coordenação Regional do Litoral Sul da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), registrando-se parte do histórico da ocupação Xokleng na porção nordeste do Estado do Rio Grande do Sul, redigida e assinada pelo indigenista especializado Ricardo de Campos Lening (antropólogo/biólogo) e a agente indigenista Fernanda Cerqueira (geógrafa), junto ao Serviço de Gestão Ambiental e Territorial de Terras Indígenas (SEGATI);
1.1 O Bem Viver como alternativa outra para conceber sobreposições
Os movimentos críticos socioambientais propostos pelos horizontes do Bem Viver apontam como alternativa possível o caminho da conservação da vida sem a separação das culturas que dão sentido concreto a defesa dos territórios (Acosta, 2015; Solón, 2016; Escobar, 2016). A este posicionamento ecológico e político de efeitos profundos sobre a notável presença de Povos indígenas e comunidades tradicionais nas regiões rurais e áreas urbanas, conexas por sistemas de proteção da natureza, Victor M. Toledo (2014), chama a atenção para o olhar “polifônico da bioculturalidade” da América Latina:
[…] el largo proceso de humanización de la naturaleza, producto de su historia social y ecológica, ha hecho que cada especie de planta, grupo de animales, tipo de suelo o de paisaje, de montaña o manantial, casi siempre conlleve un correspondiente cultural: una expresión lingüística, una categoría de conocimiento, uma historia o una leyenda, un significado mítico o religioso, un uso práctico, o una vivencia individual o colectiva. (TOLEDO, 2014. p.16).
Nas palavras do coordenador da Rede de Etnoecologia e Patrimônio Biocultural do México, está em jogo o paradigma entre a conservação da biodiversidade inserida nos sistemas nacionais de áreas protegidas e seus consequentes efeitos sobre a diversidade biocultural dos sistemas de conhecimentos dos Povos indígenas e comunidades tradicionais. Para outro “paradigma da conservação”, em defesa da bioculturalidade, Toledo aponta necessária originalidade de enfrentamento e revisão das concepções que impuseram a países essencialmente polifónicos – como o caso do Brasil – monólogos convencionais provenientes da tradição científica ocidental sobre experiências vividas e essencialmente conservadas comunitariamente (TOLEDO, 2014, p.17). Sugere, portanto, o autor, que abordagens epistemológicas de análise sejam respostas para ações de princípios políticos nos sistemas nacionais e internacionais de áreas protegidas, oportunizando alternativas críticas a temas tão “controversos” e cada vez mais sujeitos a “opções centrais” entre os “dilemas” do mundo contemporâneo em suas dinâmicas sociais e de transformações (TOLEDO, 2014, p. 18).
Los dilemas entre la globalización y la autogestión local y regional, entre los paradigmas científicos y las lecciones históricas y cuturales de los pueblos originarios, entre la investigación y planeación unidirecional o con la participación social, y entre los paradigmas de la civilización industrial y los paradigmas alternativos. Se trata, en fin, de pasar de los monólogos derivados de una visión cientificista y tecnocrática a la polifonía de una realidad esencialmente diversa. (TOLEDO, 2014, p.18).
Autores como Frederick Turner (1990) e Antônio Carlos Diegues (1994) demonstram quanto o “espírito ocidental contra a natureza” e a invenção de “mitos sobre naturezas intocadas” influenciaram na criação de áreas naturais protegidas, idealizadas ao longo do processo histórico de invenção da modernidade. Reflexões outras de Diegues (2000) sobre a perspectiva da Etnoconservação remetem como os papéis da diversidade social, cultural e biológica, a partir de correntes preservacionistas e conservacionistas, promoveram evidente poder nas relações simbolicamente constituídas em detrimentos dos povos tradicionais e indígenas.
A criação e implantação de Unidades de Conservação (UCs) como espaços de proteção ao meio ambiente foram estabelecidas pela Lei n. 9.985/2000 do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), como espaços territoriais de características naturais relevantes, legalmente constituídas pelo poder público, entre limites definidos e com objetivos específicos de conservação da biodiversidade; sendo a principal política de conservação da diversidade biológica em território nacional, indo ao encontro dos anseios promovidos pela Convenção da Diversidade Biológica (CDB), um dos mais importantes Tratados internacionais pactuados durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente no Rio de Janeiro (ECO-92).
Nós, da retomada Xokleng, de São Francisco de Paula, viemos a público para informar que, diante da decisão da Justiça Federal de Caxias do Sul e referendada provisoriamente pelo Ministro Luís Fux, presidente do Supremo Tribunal Federal, a qual concede a reintegração de posse ao ICMBio, contrariando, portanto, o direito originário sobre nossas terras e que foram sobrepostas pela Floresta Nacional, vamos nos retirar voluntariamente de dentro dos limites da Flona e, provisoriamente, ocuparemos algum espaço de terra pública, até que a Funai assuma suas responsabilidades no sentido de nos prestar apoio.
Também, com o acompanhamento do Ministério Público Federal, exigimos que a Funai proceda aos estudos circunstanciados de identificação e delimitação de nossa terra. Jamais abriremos mão desse direito!
Nós decidimos retomar a terra, em 12 de dezembro, para atender ao chamado de nossos ancestrais, eles nos guiam, nos dão força e querem que façamos a proteção desse território, porque está ameaçado pela política predatória e devastadora do governo federal, que, inclusive, já determinou que a Floresta Nacional seja desestabilizada, vendida, privatizada e, portanto, entregue para a exploração econômica.
Eles querem destruir nossa terra, a mesma de onde arrancaram nossas famílias no passado. Mas nós não desaparecemos, estamos aqui vivos, fortes e protegidos por nosso Espírito Maior e nossos ancestrais. Seguiremos lutando pela terra. A retomada foi uma sinalização aos poderes públicos e aos nossos inimigos de que nossa presença se faz forte e clama por justiça. Não vão nos amedrontar com ameaças de remoção forçada e muito menos nos intimidar através de medidas judiciais protelatórias ao nosso direito.
Nossa retomada é sopro de vida, sinal de esperança e símbolo de luta e resistência.
Seguiremos unidos aos demais Povos do Brasil contra as injustiças, pela demarcação de todas as terras, defendendo-as e combatendo a tese do marco temporal e as demais manobras políticas e jurídicas criadas para nos roubar a terra e inviabilizar a Constituição Federal de 1988.
Nem um palmo de terra a menos e nem uma gota de sangue a mais. Convocamos a todos a unir forças contra as políticas de governo que violam nossos direitos e com coragem e determinação vamos combater as ações genocidas do Bolsonaro.
São Francisco de Paula, 02 de Janeiro de 2021. Povo Xokleng, em luta pela terra e pela vida.
O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) entrou ontem (29) com uma solicitação no Supremo Tribunal Federal (STF) para evitar a reintegração de posse contra o povo Xokleng, no Rio Grande do Sul (RS). A decisão para a retirada das famílias foi tomada pela Justiça Federal, no dia 23 durante feriado de natal, e contraria determinação do STF, que suspendeu quaisquer ações de reintegração de posse enquanto durar a pandemia e está em vigor desde o dia 6 de maio.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) entrou no dia 26 com pedido de intervenção da CNDH no caso para impedir a reintegração de posse. “Diante desta violação de direitos humanos que coloca em risco a vida, a integridade física e os direitos territoriais do povo indígena Xokleng, a APIB, entidade que integra o CNDH com representante habilitado como Conselheiro Titular, solicita ao ilustre Conselho, que se manifeste perante o Supremo Tribunal Federal, de modo a intervir antes que uma violação de direitos humanos seja consumada.” destaca trecho do pedido feito pelo coordenador executivo da Apib, Dinamam Tuxá, que também é membro do CNDH.
A Defensoria Pública da União, representando a liderança Cunllugn Vei-Tcha Teie e outros integrantes do povo Xokleng, propôs Reclamação ao Supremo Tribunal Federal (STF), em vistas da flagrante afronta à decisão vinculante da Corte Suprema.
As famílias Xokleng iniciaram uma retomada do território tradicional há duas semana, em uma área da Floresta Nacional de São Francisco de Paula localizada na Serra Gaúcha no município de São Francisco de Paula, no RS. O pedido para retirada das famílias foi feito pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBIO) e atendido, em plantão, pela Justiça Federal do RS.
A retomada do povo Xokleng integra um importante movimento de retomada das terras indígenas invadidas na região Sul do país, que foi iniciada na década de 1970. Por séculos os Xokleng foram vítimas de um brutal processo de colonização que quase levou ao completo desaparecimento do povo, que tradicionalmente ocupavam os territórios que estavam localizados no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Devido às inúmeras invasões e violências os Xokleng foram expulsos dos seus territórios fazendo com que hoje estejam mais concentrados no estado de Santa Catarina.
É urgente o acompanhamento da Fundação Nacional do Índio (Funai) deste processo de retomada, que é um direito do povo Xokleng que busca voltar a ocupar seu território tradicional no Rio Grande do Sul.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), juntamente com a Articulação dos Povos Indígenas do Sul (ArpinSul) e todas as organizações indígenas que compõem a Apib, manifestam apoio à retomada São Francisco de Paula, do povo Xokleng.
Leia nota da Apib e Arpinsul em apoio a retomada do povo Xokleng aqui
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (@apiboficial) encaminhou ontem (29) uma solicitação de urgência para que o Supremo Tribunal Federal (STF) tome medidas para proteger os povos indígenas isolados da atuação de missionários evangélicos. O pedido busca fazer com que o STF determine a inconstitucionalidade de um trecho da Lei 14.021/20 que permite a permanência de missões de cunho religioso em territórios onde há comunidades de indígenas isolados
O apelo da Apib acontece após o presidente do STF, Luiz Fux, recusar a análise da inconstitucionalidade de parte da lei por não considerar o assunto urgente e nesse sentido pede que a decisão seja reconsiderada.
A Lei 14.021/20 cria mecanismos de proteção aos povos indígenas durante a pandemia, mas durante seu processo de aprovação um trecho da lei foi modificado e prejudica os povos indígenas isolados beneficiando missões evangélicas.
“As missões de cunho religioso que já estejam nas comunidades indígenas deverão ser avaliadas pela equipe de saúde responsável e poderão permanecer mediante aval do médico responsável”, esse é o trecho da lei que o apelo da Apib ao STF solicita que seja considerado inconstitucional.
A APIB pede urgência no caso, pois a lei perderá efeito no dia 31 de dezembro e, depois dessa data, não haverá mais razão para analisar a inconstitucionalidade do trecho questionado. Sem a análise, os missionários que já estão em terras indígenas poderão permanecer nas regiões, impactando na cultura dos povos originários e oferecendo riscos à cultura, saúde e vida desses povos.