23/jun/2025
Foto: Andressa Zumpano/Articulação das Pastorais do Campo
A última sessão da Câmara de Conciliação do Supremo Tribunal Federal (STF), que debate a Lei 14.701/23 e é presidida pelo ministro Gilmar Mendes, está marcada para esta segunda-feira, 23 de junho. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) reivindica a suspensão do texto, que inseriu a tese do marco temporal e diversos crimes contra os povos indígenas no ordenamento jurídico brasileiro, e cobra respostas da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7.582, movida contra a legislação e protocolada em dezembro de 2023.
“Chega de adiamentos desta farsa. A câmara é um espaço inconstitucional que tenta negociar os direitos indígenas e realizar uma conciliação forçada. Queremos a suspensão da Lei do Genocídio Indígena, que tem promovido constantes violências contra nossos corpos e territórios”, afirma Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib.
Em 2023, ano em que a Lei 14.701 tramitou no Congresso Nacional e foi aprovada, foram registrados 200 assassinatos de indígenas no Brasil. Isso representa um aumento de 15% no número de vítimas em comparação com o ano de 2022, conforme aponta o relatório Violência contra os povos indígenas do Brasil, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
Nos anos seguintes, a Apib denunciou uma série de ataques contra diversos povos em todas as regiões do país, como o povo Guarani Mbya, no Rio Grande do Sul; Guarani Kaiowá, no Mato Grosso do Sul; Avá-Guarani, no Paraná; Parakanã, no Pará; e Pataxó, no estado da Bahia.
Com o encerramento, a proposta da câmara segue para a avaliação e votação dos demais ministros do Supremo. Anteriormente, o plenário do STF declarou a tese do marco temporal como inconstitucional. “Confiamos que o plenário da Corte não irá voltar atrás da sua decisão e se manterá ao lado dos povos indígenas e da democracia”, diz o coordenador executivo da Apib, Kleber Karipuna.
O movimento indígena convoca uma mobilização para esta segunda-feira, 23 de junho. A Apib convida organizações indígenas regionais e parceiros a se mobilizarem em seus territórios e redes sociais. O objetivo é pressionar e sensibilizar representantes dos três Poderes – Legislativo, Judiciário e Executivo – e impedir mais retrocessos aos direitos indígenas.
Proposta de Gilmar Mendes
Em fevereiro deste ano, o gabinete do ministro Gilmar Mendes apresentou uma minuta de proposta legislativa que prevê a retirada do marco temporal da Lei do Genocídio Indígena. Porém, o departamento jurídico da Apib aponta que o texto possui ao menos 10 retrocessos aos direitos indígenas, como: exploração em Terras Indígenas, mineração, consulta indígena enfraquecida, mudança nas demarcações, criminalização de retomadas, indenização de ocupantes não indígenas, interferência de Estados e Municípios, interferência de proprietários rurais, indenizações mais lentas e limite para revisão de Terras Indígenas.
De acordo com o site jornalístico InfoAmazonia, o artigo 21 da proposta do ministro, que trata da “exploração de minerais estratégicos”, foi inspirado em uma sugestão do advogado Luís Inácio Lucena Adams, representante do Partido Progressista (PP) na mesa de negociação. Adams também advoga para a Potássio do Brasil, mineradora canadense que obteve aprovação para instalar uma mina sobre um território reivindicado pelo povo Mura, no município de Autazes, Amazonas.
Retrospectiva
A Câmara de Conciliação foi criada pelo ministro Gilmar Mendes em abril de 2024, durante o Acampamento Terra Livre. Participam das audiências membros do Senado, da Câmara dos Deputados, do Governo Federal, governadores, representantes da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) e da Frente Nacional dos Prefeitos (FNP).
Para a Apib, o ministro ignorou o movimento indígena, que solicitou a inconstitucionalidade e suspensão da lei até a finalização do julgamento no STF da ADI 7.582. Em outra ação, a Articulação pede que todos os processos que tratam do marco temporal tenham como relator o ministro Edson Fachin, visto que ele foi responsável pelo Recurso Extraordinário (RE) 1017365, que tratou da Terra Indígena (TI) Ibirama La-Klãnõ, território do povo Xokleng.
Após o Supremo não atender às condições de participação dos indígenas na câmara, a Apib, em conjunto com suas sete organizações de base, se retirou da Câmara de Conciliação. Além da suspensão da lei, as organizações indígenas reivindicaram o reconhecimento da inadequação da criação da Comissão de Conciliação para tratar de ações que abordam a proteção dos direitos indígenas e a preservação da decisão do Supremo sobre o marco temporal.
“Neste cenário, a Apib não encontra ambiente para prosseguir na mesa de conciliação. Não há garantias de proteção suficiente, pressupostos sólidos de não retrocessos e, tampouco, garantia de um acordo que resguarde a autonomia da vontade dos povos indígenas. Nos colocamos à disposição para sentar à mesa em um ambiente em que os acordos possam ser cumpridos com respeito à livre determinação dos povos indígenas”, ressalta a Articulação no manifesto.
12/jun/2025
Foto: Samela Sateré Mawé/ Apib
A organização indígena pede ao STF a suspensão da Lei 14.701/2023 e denuncia inconstitucionalidades no projeto que tenta barrar homologações de terras Kaingang e Guarani em Santa Catarina e sustar o Art. 2º do Decreto 1775/1996.
Na segunda-feira, 09 de junho, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) apresentou manifestação ao Supremo Tribunal Federal (STF), no âmbito da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 87 e Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7582, contra o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 717/2024, aprovado pelo Senado Federal. A organização pede a suspensão da Lei 14.701/2023 e contesta a tentativa do Congresso de sustar decretos presidenciais que homologaram as Terras Indígenas Toldo Imbu e Morro dos Cavalos, em Santa Catarina e trecho do Decreto 1.775/1996, que detalha as fases do procedimento administrativo de demarcação.
Na manifestação, a Apib afirma que o PDL é inconstitucional e viola a separação entre os poderes ao invadir a competência do Executivo na demarcação de terras indígenas. A entidade também aponta que a proposta legislativa desrespeita decisões do STF que reconhecem o caráter administrativo e concreto dos atos de homologação, que não podem ser suspensos pelo Legislativo.
Outro ponto destacado pela Apib é a ausência de consulta livre, prévia e informada aos povos indígenas afetados, como previsto na Convenção 169 da OIT, da qual o Brasil é signatário. Para a organização, o Senado ignorou o direito dos povos Kaingang e Guarani e de todos os povos indígenas do Brasil de serem ouvidos antes da tramitação da medida, o que compromete a legalidade do processo.
A entidade também alerta para os riscos de retrocesso e insegurança jurídica com a tentativa de aplicar a Lei 14.701/2023 de forma retroativa. Segundo a Apib, a medida ameaça procedimentos demarcatórios já concluídos, contrariando o direito adquirido e o princípio do ato jurídico perfeito, protegidos pela Constituição.
A Apib pede ao STF que suspenda integralmente os efeitos da Lei 14.701/2023 ou, de forma subsidiária, os dispositivos que permitem a adequação de procedimentos demarcatórios em andamento. A organização afirma que a proposta legislativa é mais um instrumento político para obstruir o direito originário dos povos indígenas à terra, garantido pela Constituição de 1988.
No dia 11 de junho de 2025, o Relator Especial das Nações Unidas sobre os direitos dos Povos Indígenas reforçou o posicionamento da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) ao divulgar um novo comunicado em que expressa profunda preocupação com a aplicação contínua da tese do Marco Temporal. Em especial, ele destaca a gravidade da vigência da Lei nº 14.701/2023 e a recente aprovação do Projeto de Decreto Legislativo nº 717/2024, considerado um desdobramento direto dessa tese, como ameaças concretas aos direitos territoriais dos povos indígenas no Brasil.
11/jun/2025
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil publicou, por ocasião do “Seminário Territórios em Risco: os impactos da mineração em terras indígenas e a correlação com a Lei 14.701/2023 e a mesa de conciliação no STF”, realizado no Congresso Nacional, um documento sobre as ameaças e os impactos da mineração em Terras Indígenas (TIs). O documento analisa o panorama de propostas que desconstitucionalizam os direitos indígenas conduzidos, especialmente, pelo poder Legislativo.
No entanto, posições dentro do STF, como a do Ministro Flávio Dino, que têm apoiado a ideia de regulamentar a mineração em TIs, a falta de julgamento no STF da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) proposta pela Apib sobre a Lei do Genocídio Indígena (14.701/2023), as negociatas dentro da Câmara de Conciliação, do Ministro Gilmar Mendes, também se mostram críticas e representam sérias ameaças às vidas indígenas, aos biomas e à toda humanidade.
Na nota, o Departamento Jurídico da APIB, aborda povos que estão em vias de serem atingidos pela mineração, como o Povo Mura, e outros casos em que os impactos já são irreversíveis, como os Povos Krenak, Tupinikim, Guarani, Pataxó e Pataxó Hã-hã-hãe, Xikrin Mebêngôkre, Mebêngôkre Kayapó, Guarani Mbya, Yanomami.
De acordo com o documento, empresas e setores interessados querem trazer investimentos estrangeiros para viabilizar a transição energética através da exploração de “minerais da transição”, que estão justamente dentro de territórios protegidos. Além disso a mineração é a substituição de um modelo violento por outro com a falsa promessa de desenvolvimento.
As consequências dessa exploração são incalculáveis: desmatamento em larga escala; Contaminação de rios, solos e aquíferos; Intensificação de conflitos sociais; Uso intensivo de água, terra e energia; Introdução de grandes fluxos migratórios, inclusive de deslocamentos Forçados; Violações de direitos humanos; Danos à saúde coletiva e aos ecossistemas. Além disso, a mineração legalizada incentiva e favorece a expansão do garimpo ilegal.
Um estudo publicado na revista Nature revelou que, na Amazônia brasileira, entre 2005 e 2015, o desmatamento na Amazônia pela mineração industrial foi 12 vezes maior do que a área concedida para as minas. O impacto real se estende por meio de estradas, infraestrutura, portos e outros vetores de degradação.
Por outro lado, as Terras Indígenas são comprovadamente barreiras de proteção ambiental e climática, perdendo menos de 1% de sua cobertura vegetal nativa, em contraste com os 28% verificados em áreas privadas.
O avanço da mineração sobre nossas terras compromete a imagem diplomática e a credibilidade climática do país, visto que estamos prestes a receber a COP30.
Confira o documento completo no link: MINERAÇÃO_EM_TERRAS_INDÍGENAS_o_que_está_em_jogo_para_o_Brasil
06/jun/2025
Apib denuncia retrocessos no Congresso e no STF e convoca mobilização nacional em defesa dos direitos territoriais indígenas
Com a aprovação do Projeto de Decreto Legislativo (PDL) nº 717/2024 no Senado Federal, que suspende a demarcação das Terras Indígenas Toldo Imbu e Morro dos Cavalos, em Santa Catarina, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), maior referência do movimento indígena brasileiro, convoca para a próxima segunda-feira, 9 de junho, uma mobilização nacional.
Em Brasília, os povos indígenas irão se concentrar a partir das 12h para um ato no Museu Nacional. A Apib convida organizações indígenas regionais e movimentos parceiros a somarem na luta contra o desmonte dos direitos indígenas no Congresso Nacional e a Câmara de Conciliação do Supremo Tribunal Federal (STF), que discute a Lei do Genocídio Indígena (Lei nº 14.701/2023).
O PDL foi aprovado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e no plenário do Senado em caráter de urgência no dia 28 de maio. Apresentado pelo Senador Esperidião Amin (Progressistas), o texto também prevê a suspensão do art. 2º do Decreto nº 1775/1996 que regulamenta o procedimento administrativo de demarcação de terras indígenas no Brasil. O projeto alega que os decretos não observaram as novas regras impostas pela Lei nº 14.701, como a participação de estados e municípios no processo demarcatório.
Porém, a Apib ressalta que esta legislação altera o art. 231 da Constituição Federal e institui a tese do marco temporal. A tese limita o direito à demarcação apenas às comunidades que ocupavam seus territórios até 5 de outubro de 1988 e já foi declarada inconstitucional pelo plenário do STF em 2023. Na Corte, a Apib protocolou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) e solicitou que a Lei do Genocídio Indígena, como é conhecida.
O PDL 717 segue para votação na Câmara dos Deputados. O departamento jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil aponta quatro riscos com aprovação do projeto: violência e conflitos fundiários, retrocesso jurídico e político, descumprimento da constituição e tratados internacionais e ameaça ao meio ambiente. Saiba mais aqui.
Após a aprovação do texto, a Apib registrou uma denúncia na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e na Organização das Nações Unidas (ONU). Nos documentos enviados à CIDH e ONU, a Apib alerta que a decisão dos senadores susta atos concretos do Presidente da República, o que é inconstitucional, e compromete a segurança jurídica dos povos indígenas em todo o país.
Mais ameaças
Além do PDL, outra ameaça apontada pelo movimento indígena é a continuidade da Câmara de Conciliação do Supremo e o Projeto de Lei nº 6.093/2023. As atividades da câmara encerrariam em abril, mas foram adiadas até o dia 25 de junho. Em agosto do ano passado, a Articulação deixou a câmara pois o considera ilegítimo e inconstitucional.
Para a Apib o espaço de negociação foi instituído sem a devida consulta aos povos indígenas, o que viola artigo 6º da Convenção 169 da OIT. A câmara também ignorou recursos e denúncias apresentados ao longo do tempo pela organização, reconhecida por sua legítima representação indígena.
“Mais uma vez, reiteramos a preocupação com o andamento das audiências conduzidas pelo ministro Gilmar Mendes. Sob a justificativa de reunir sugestões e buscar alternativas de “meio-termo” entre os interesses dos povos indígenas e do agronegócio, seu gabinete extrapolou os limites do papel de relator, ultrapassando o escopo da Lei nº 14.701/2023 e dos debates travados na Comissão Especial”, diz nota da organização indígena.
Já o Projeto de Lei nº 6.093/2023, propõe uma série de mudanças no procedimento administrativo de demarcação de terras. Em tramitação na Câmara dos Deputados, o projeto é de autoria da deputada federal Coronel Fernanda (PL/MT), e prevê a instituição da tese do marco temporal, a retirada da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) da coordenação dos processos demarcatórios e quer submeter a homologação das terras ao Congresso Nacional.
PL da devastação
Somando às ameaças já apontadas, o Projeto de Lei nº 2.159/2021, conhecido como PL da Devastação, representa um ataque direto aos direitos dos povos indígenas e à proteção ambiental no Brasil. O projeto propõe a flexibilização do licenciamento ambiental, permitindo o autolicenciamento e dispensando análises técnicas prévias, o que pode resultar em obras de alto impacto sem avaliação adequada dos danos ao meio ambiente, à saúde e aos modos de vida das comunidades.
Especificamente para os povos indígenas, o PL restringe a participação de órgãos de proteção aos direitos indígenas ao licenciamento de atividades apenas sobre as terras indígenas já homologadas, gerando insegurança jurídica para inúmeras comunidades que ocupam tradicionalmente suas terras. Além disso, o projeto ignora o direito à consulta livre, prévia e informada, assegurado pela Convenção 169 da OIT, tratado internacional do qual o Brasil é signatário, desrespeitando compromissos internacionais e fragilizando ainda mais a proteção dos direitos coletivos indígenas.
02/jun/2025
O PDL nº 717 suspende a demarcação das Terras Indígenas Toldo Imbu e Morro dos Cavalos (SC) e o Art. 2º do Decreto nº 1775/96, gerando insegurança jurídica em todo o país.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) denunciou à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e à Organização das Nações Unidas (ONU) a aprovação, no Senado Federal, do Projeto de Decreto Legislativo (PDL) nº 717/2024, que suspende a demarcação das Terras Indígenas Toldo Imbu e Morro dos Cavalos, localizadas no estado de Santa Catarina.
O projeto foi aprovado no plenário do Senado na última quarta-feira, 28 de maio, com apenas três votos contrários. O texto também susta o Art. 2º do Decreto nº 1775/1996, que detalha o procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas. Agora, o projeto segue para a Câmara dos Deputados.
“Vivemos um retrocesso! Vivemos um desrespeito a Constituição Federal de 1988, no que tange o Artigo 231. Não podemos aceitar que cláusulas pétreas sejam desrespeitadas, não podemos aceitar nossos direitos sendo rasgados!”, diz a Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib.
Nos documentos enviados à CIDH e ONU, a Apib alerta que a decisão dos senadores susta atos concretos do Presidente da República, o que é inconstitucional, e compromete a segurança jurídica dos povos indígenas em todo o país. Segundo a organização, o projeto é baseado na Lei 14.701/2023, que transformou em lei a tese do marco temporal, de modo a limitar o direito à demarcação apenas às comunidades que ocupavam seus territórios até 5 de outubro de 1988, e alterou profundamente o rito do procedimento administrativo de demarcação. Sob o argumento de garantir a participação dos ruralistas, a lei criou uma série de entraves à demarcação das terras indígenas.
A Lei 14.701 é nomeada pelo movimento indígena como Lei do Genocídio Indígena e do marco temporal. A Apib destaca que a legislação é alvo de questionamentos no Supremo Tribunal Federal (STF), que chegou a declarar a tese inconstitucional em setembro de 2023.
A organização recorda ainda declarações do secretário-geral da ONU, António Guterres, que em abril reafirmou a não negociabilidade dos direitos indígenas. No mesmo contexto, o relator especial da ONU, Bernard Duhaime, apontou que o marco temporal ignora o histórico de remoções forçadas de comunidades indígenas, especialmente durante o regime militar.
A Apib reforça que a Corte Interamericana de Direitos Humanos já decidiu que a perda de território por expulsão não pode impedir o reconhecimento da posse tradicional. Para a entidade, a aprovação do projeto e a vigência do marco temporal representam sérias ameaças aos direitos indígenas, à preservação ambiental e à luta contra as mudanças climáticas. Por isso, a Articulação dos Povos Indígenas solicita que a ONU cobre esclarecimentos do Estado brasileiro, monitore o processo legislativo e inclua o caso como exemplo de ameaça sistêmica aos direitos indígenas.
30/maio/2025
Manifestação enviada ao STF aponta omissões do Governo Federal em ações nas TIs Apyterewa, Trincheira Bacajá e Karipuna e cobra mudanças estruturais para garantir a segurança e os direitos dos povos indígenas.
O departamento jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) protocolou, nesta sexta-feira (30/05), manifestação nos autos da ADPF 709 apontando as falhas observadas na condução dos processos de pós-desintrusão das terras indígenas Apyterewa, Trincheira Bacajá e Karipuna por parte do Governo Federal, de forma a sugerir alterações estruturais nos planos atuais e futuros no intuito de garantir a voz dos povos indígenas em tais ações.
A Apib, igualmente, informou ao Supremo Tribunal Federal sobre os recentes episódios de violência na Terra Indígena Apyterewa, a qual, recentemente, sofreu 6 (seis) ataques por pistoleiros com inteterreses de manter a prática da pecuária ilegal dentro do território tradicional, ainda que sob a égide do plano de sustentabilidade pós-desintrusão. A situação é semelhante na Terra Indígena Karipuna, a qual, mesmo com a elaboração de plano para idênticos fins, padece com a abertura de trechos para possibilitar a invasão com fins de extração ilegal de madeira.
A Apib considera as atividades de desintrusão e sustentabilidade pós-desintrusão como essenciais para a proteção da vida, segurança e a manutenção da tradição dos povos indígenas. Entretanto, alerta que para a realização de um plano de pós-desintrusão eficaz e que, de fato, proteja os territórios e povos indígenas neles residentes, é preciso a permanência constante de equipes da Funai, Ibama e ICMBio nas terras indígenas, além de uma melhoria nos procedimentos de monitoramento (remoto e presencial), maior vigilância e fiscalização, bem como a obrigatória elaboração de planos de recuperação ambiental e reocupação territorial das comunidades.
A ADPF 709 foi ajuizada pela Apib em 2020 em vista à omissão do Estado Brasileiro na proteção dos direitos fundamentais dos povos indígenas, especialmente diante da pandemia da Covid-19, para fins de adoção de medidas emergenciais para proteger a saúde e a vida das comunidades indígenas, com foco particular nos povos indígenas isolados e de recente contato. Ao longo do processo, houve a determinação para elaboração de 7 planos de desintrusão referentes a 8 terras indígenas: Yanomami, Apyterewa, Trincheira Bacajá, Munduruku, Karipuna, Araribóia, Kaypó e Uru-Eu-Wau-Wau.
30/maio/2025
Documento propõe mecanismos concretos de integração entre os tratados da Rio-92 com protagonismo de povos indígenas e comunidades locais
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), em parceria com a Plataforma CIPÓ e a World-Transforming Technologies (WTT), submeteu uma contribuição oficial à Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), em resposta à solicitação da COP16 (decisão 16/22), que busca opiniões sobre formas de fortalecer a coerência política entre as três convenções criadas na Rio-92: a CDB, a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC) e a Convenção de Combate à Desertificação (UNCCD).
O documento apresenta recomendações concretas para fortalecer a articulação entre os tratados, colocando os Povos Indígenas e Comunidades Locais (IPLCs) como elos fundamentais para a implementação coordenada e efetiva dos compromissos internacionais. A proposta se organiza em torno de três eixos estratégicos:
- Integração dos sistemas de conhecimentos tradicionais e locais (ILK);
- Participação digna e efetiva de Povos Indígenas e Comunidades Locais;
- Mecanismos de financiamento e monitoramento transparentes e participativos.
Entre as recomendações está o fortalecimento da coordenação entre órgãos científicos como IPBES, IPCC e SPI, para incorporar saberes indígenas nos processos de produção e comunicação de conhecimento. O texto também defende a criação de um mecanismo permanente e coordenado entre as convenções que assegure a presença qualificada de lideranças indígenas nos fóruns decisórios, com infraestrutura adequada, financiamento desburocratizado e segurança em seus deslocamentos.
Além disso, o documento propõe o alinhamento dos sistemas de financiamento e monitoramento das convenções e a criação de linhas de financiamento direto para povos indígenas, com ênfase em fundos comunitários autogeridos, como Jaguatá, Nusantara, Podáali e FIRN. A ideia é garantir que os recursos cheguem diretamente às comunidades que atuam na linha de frente das soluções para as crises do clima, biodiversidade e degradação da terra.
A submissão reafirma que não é possível construir respostas justas e eficazes para os desafios ambientais globais sem considerar os sistemas de conhecimento e os direitos dos povos indígenas e comunidades locais.
Para saber mais, leia a recomendação na íntegra em:
Português
Inglês
28/maio/2025
Foto: Conselho Indígena Missionário
O PDL 717 segue para votação no plenário do Senado em caráter de urgência
A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal aprovou, na manhã desta quarta-feira, 28 de maio, o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) nº 717/2024, que suspende a demarcação das Terras Indígenas Toldo Imbu e Morro dos Cavalos, localizadas no estado de Santa Catarina.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) considera a decisão grave e afirma que ela representa um ataque aos direitos dos povos indígenas. A organização repudia a medida e alerta que ela abre um perigoso precedente, podendo levar à revogação de outras demarcações ou impedir a homologação de territórios ainda não regularizados.
“O Senado, mais uma vez, afronta o texto constitucional, a divisão e a competência dos poderes ao tentar sustar os efeitos da homologação dos territórios indígenas Morro dos Cavalos e Toldo Imbu. Esse é mais um episódio que evidencia como as bancadas com interesses sobre terras indígenas têm atuado, articulando e fazendo lobby dentro da política brasileira, especialmente no Congresso Nacional”, ressalta Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib.
O coordenador esteve no Senado e acompanhou as articulações. Dinamam também critica a posição do Governo Federal no processo: “A Presidência da República precisa atuar de forma mais incisiva. O que vimos hoje foi o esvaziamento da bancada governista na defesa de um decreto que homologou duas terras indígenas, assinado pelo presidente Lula. Hoje ficou ainda mais evidente que não há uma orientação clara do governo para que seus senadores aliados atuem de forma firme. Mas seguiremos vigilantes. Não vamos aceitar retrocessos!”, disse ele.
Agora, o PDL 717 segue para votação no plenário do Senado em caráter de urgência. O departamento jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil aponta quatro riscos com aprovação do projeto:
- Violência e Conflitos Fundiários: A suspensão das demarcações pode aumentar a violência no campo, favorecendo invasões ilegais e agravando os conflitos entre indígenas e setores do agronegócio.
- Retrocesso Jurídico e Político: A sustação da demarcação das TIs Toldo Imbu e Morro dos Cavalos cria um precedente para a revisão de outras demarcações já consolidadas, ameaçando o direito dos povos indígenas em todo o Brasil.
- Descumprimento da Constituição e Tratados Internacionais: O PDL afronta o artigo 231 da Constituição Federal, que reconhece os direitos indígenas sobre suas terras tradicionais, e também desrespeita a Convenção 169 da OIT, que obriga consulta prévia, livre e informada aos povos indígenas em decisões que os afetam.
- Ameaça ao Meio Ambiente: As Terras Indígenas cumprem um papel fundamental na preservação ambiental. A revogação de suas demarcações pode levar ao desmatamento, degradação dos biomas e perda da biodiversidade.
O que diz o PDL 717
Apresentado pelo Senador Esperidião Amin, o projeto suspende os decretos que homologaram a demarcação das Terras Indígenas Toldo Imbu e Morro dos Cavalos, além do Art. 2º do Decreto nº 1775/1996, que orienta o procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas.
O texto alega que os decretos não observaram as novas regras impostas pela Lei nº 14.701/2023, apontada pelo movimento indígena como Lei do Genocídio Indígena. A legislação transformou o marco temporal e diversos crimes contra os povos originários em lei.
O PDL afirma que o Decreto nº 1775/1996 e a demarcação dessas terras devem ser suspensas por suposta falta de participação de estados, municípios e terceiros interessados. Entretanto, a Apib ressalta que a medida desconsidera que tais terras foram reconhecidas por meio de amplos estudos técnicos e consultas às comunidades indígenas e populações afetadas.
“A demarcação das Terras Indígenas Toldo Imbu e Morro dos Cavalos é resultado de um processo histórico e legalmente embasado. O PDL em questão representa uma afronta aos direitos indígenas, ao meio ambiente e à segurança jurídica. Por isso, é fundamental que o Congresso Nacional rejeite essa medida e garanta a proteção dos territórios tradicionais”, diz nota da Apib.
Leia a nota completa aqui.
27/maio/2025
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil manifesta total solidariedade à Ministra de Estado do Meio Ambiente e Mudança Climática, Marina Silva, que foi alvo de violência política de gênero durante a sessão da Comissão de Infraestrutura do Senado.
Ela foi convidada para a reunião para prestar informações sobre a criação de uma unidade de conservação marinha, porém foi desrespeitada em diversos momentos e teve o direito de fala cortado pelo Senador do PL de Rondônia, Marcos Rogério.
A ministra insistiu na fala, afirmando que não é uma “mulher submissa”, e o senador retrucou: “me respeite, ministra, se ponha no seu lugar”, gerando a reação dos demais presentes. Marina continuou posicionando o trabalho do ministério. “Ao defender o meio ambiente eu estou defendendo os interesses estratégicos do Brasil”, declarou.
Então, o senador Plínio Valério (PSDB-AM), continuou os ataques dizendo que a ministra não merecia respeito. “Olhando para a senhora, estou falando com a ministra, e não com uma mulher”, afirmou. “Eu sou as duas coisas”, retrucou Marina. “A mulher merece respeito, a ministra, não”, concluiu ele. Há dois meses, o mesmo representante da direita disse que gostaria de enforcar Marina. Marina Silva se retirou e, em seguida, a sessão foi encerrada.
O ataque acontece uma semana após a casa aprovar a lei de desmanche do licenciamento ambiental. O chamado PL da Devastação (2159/2021) que tramita agora na Câmara de Deputados. Autoridades classificaram o tratamento direcionado à Ministra como “absurdo” e “misógino”.
Repudiamos os atos desprezíveis e antidemocráticos dentro do Senado. Somamos nossa indignação aos demais representantes dos reais interesses do povo brasileiro.
Os ataques contra a ministra são mais que uma expressão do machismo e racismo enraizados nas instituições brasileiras, eles fazem parte do projeto dominante no poder legislativo, que promove o desmonte das leis e a destruição do meio ambiente em favor do lucro de poucos.
23/maio/2025
Foto: Yago Kaingang/Apib
Em Londres e Bruxelas, Apib pressiona por políticas que protejam os povos indígenas e o meio ambiente
Entre os dias 12 e 16 de maio, as lideranças indígenas Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), e Alessandra Korap Munduruku, coordenadora da Associação Indígena Pariri, participaram de reuniões com deputados do Grupo dos Socialistas e Democratas do Parlamento Europeu em Bruxelas, na Bélgica, e também com Parlamentares e autoridades britânicas, em Londres, Reino Unido. O objetivo da agenda foi tratar dos impactos do acordo União Europeia-Mercosul, que pode aumentar o desmatamento e a violência contra os povos indígenas no Brasil, além de reivindicar metas mais ambiciosas na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), que ocorrerá em novembro, em Belém (PA).
Entre os impactos negativos do acordo entre a UE e o Mercosul, a Apib alerta que ele aumenta a cota de importação de carne bovina para a UE (com tarifas reduzidas) em 99 mil toneladas por ano, o que representa um aumento de 50% em comparação com as atuais exportações de carne bovina do Mercosul para o bloco europeu. Estimativas sugerem que essa cota poderia acelerar as taxas de desmatamento na região do Mercosul em pelo menos 5% ao ano. Outras projeções apontam que o impacto da cota de carne bovina pode resultar em um desmatamento adicional entre 620 mil e 1,35 milhão de hectares em cinco anos.
Em relação à soja, as autoridades consideram que o Acordo não promoveria uma expansão de sua produção dado que a soja brasileira já conta com isenção de alíquota de importação para o bloco europeu. Entretanto, a Apib aponta que o aumento da produção de gado promovida pelo Acordo, levará a um aumento indireto da produção de soja para produção de ração para a expansão da pecuária. Além disso, as lideranças destacaram impactos indiretos do Acordo a partir da demanda pela expansão da infraestrutura para o escoamento da produção de commodities, como a construção da Ferrogrão e de portos que já estão promovendo desmatamento e invasão de territórios indígenas.
Sobre os direitos indígenas, o texto do acordo UE-Mercosul menciona apenas o “consentimento prévio e informado”, em oposição ao direito internacionalmente reconhecido de “consentimento livre, prévio e informado” — ou seja, omite o elemento crucial de que o consentimento deve ser obtido sem coerção ou intimidação. Além disso, o texto limita a obrigação de obter o consentimento dos povos indígenas a um cenário muito restrito: a inclusão nas cadeias de suprimentos, em vez de proteger seus direitos frente às ameaças das atividades econômicas facilitadas pelo acordo.
“Pedimos que todos eles, na maioria parlamentares social-democratas, que votem contra este acordo. O projeto não pode ser mais modificado, então este é um momento decisivo de articulação com o parlamento europeu”, contou Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib.
O parlamento europeu deve votar o acordo UE-Mercosul entre outubro de 2025 e fevereiro de 2026.
Financiamento direto para os povos indígenas
Outro tema da agenda internacional foi a COP30. Dinamam e Alessandra explicaram aos parlamentares que esperam que o legado da conferência seja o avanço na demarcação de terras indígenas.
Eles também denunciaram a contradição do Estado do Pará, que sediará a conferência, mas tem permitido o garimpo ilegal e firmado acordos de crédito de carbono sem a consulta livre, prévia e informada aos povos indígenas. Além disso, criticaram o pacote de leis anti-indígenas do Congresso Brasileiro, como a Lei 14.701/2023, que legalizou o marco temporal e diversos crimes contra os povos indígenas.
Com isso, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil pediu que os parlamentares europeus se comprometessem com metas mais ambiciosas na COP30, como o anúncio da ampliação do financiamento direto aos povos indígenas e o reconhecimento territorial em nível global.
Lei Antidesmatamento
Além do acordo UE-Mercosul e da COP30, a Apib destacou a importância da Lei Antidesmatamento (EUDR) e da criação de legislações que promovam a fiscalização de commodities.
O Regulamento da União Europeia sobre Produtos Livres de Desmatamento (EUDR), também conhecida como Lei Antidesmatamento, é uma legislação que visa garantir que algumas commodities importadas pela União Europeia não estejam associadas ao desmatamento e à degradação florestal. Assim, o EUDR exige que empresas comprovem que os produtos que importam e vendem na UE não vêm de áreas desmatadas ou degradadas. A lei entra em vigor em dezembro de 2025.
“O Brasil sempre se opôs à EUDR, mas nós, povos indígenas, sempre fomos a favor. Estamos cansados de compromissos sem implementações. Queremos mais legislações, como a Lei Antidesmatamento, que visem a rastreabilidade das commodities. Dessa forma iremos impedir o desmatamento e invasão dos territórios indígenas”, diz Dinamam Tuxá.
O coordenador executivo da Apib também afirma que é necessário incluir nestas regulações todos os biomas brasileiros e mais commodities. “O desmatamento na Amazônia diminuiu, mas no Cerrado aumentou quase na mesma proporção. É preciso incluir fiscalização em todos os biomas, não só nas florestas. Temos que considerar também mais commodities e minérios, como o ouro”, ressalta ele.