COP16: Confira a delegação da APIB na COP da Biodiversidade, realizada em Cali

COP16: Confira a delegação da APIB na COP da Biodiversidade, realizada em Cali

Foto: Kamikia Kisedje

A 16ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica da ONU (COP16), que ocorrerá em Cali, entre os dias 21 de outubro a 1 de novembro, traz ao centro das discussões o papel crucial dos povos indígenas na preservação dos biomas e na luta contra a perda da biodiversidade global. 

Considerados guardiões dos ecossistemas mais ricos e ameaçados do mundo, os povos indígenas trazem para a mesa de negociações não apenas suas demandas, mas também soluções fundamentadas em séculos de conhecimento tradicional.

Com o lema “Proteger Povos e Territórios indígenas é Defender a Biodiversidade”, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) estará presente na COP16 com 20 representantes indígenas, entre coordenadores executivos, lideranças e representantes indígenas do quadro técnico da Articulação. Além disso, as organizações das bases da APIB também estarão presentes.

Importância da Participação Indígena

Os povos indígenas desempenham um papel vital na conservação da biodiversidade. Estima-se que 80% da biodiversidade remanescente no mundo esteja em territórios tradicionais indígenas. Estes grupos possuem um conhecimento profundo das práticas sustentáveis de manejo da terra, das águas e dos recursos naturais, demonstrando como o equilíbrio entre seres humanos e meio ambiente pode ser mantido. Nossas práticas e visões de mundo, que promovem a harmonia com a natureza, são essenciais para alcançar as metas globais de preservação e sustentabilidade.

Durante a COP16, os povos indígenas estarão envolvidos em debates que definirão o futuro das políticas ambientais internacionais, especialmente em relação à conservação da biodiversidade e às mudanças climáticas. Suas vozes são fundamentais para moldar o futuro da preservação ambiental de uma forma inclusiva e equitativa.

A Luta por Reconhecimento e Direitos

Ainda assim, a participação indígena na COP16 não é isenta de desafios. Os povos indígenas enfrentam pressões crescentes sobre seus territórios devido ao desmatamento, mineração e projetos de infraestrutura.

Lideranças indígenas de todos os biomas do Brasil estarão presentes em Cali para discutir a implementação do Marco Global de Biodiversidade pós-2020, com foco no reconhecimento e proteção de seus territórios e na garantia de que seus conhecimentos tradicionais sejam reconhecidos como parte integrante das soluções globais.

Soluções Baseadas em Conhecimentos Tradicionais

Os povos indígenas têm insistido que qualquer solução ambiental de longo prazo deve ser construída com base em seus conhecimentos tradicionais. As soluções discutidas incluem a criação de áreas protegidas, onde práticas sustentáveis indígenas podem ser mantidas, além de estratégias para garantir a autonomia de seus territórios. As propostas focam em uma abordagem integrada, que une ciência moderna com saberes ancestrais.

A COP16, mais do que uma conferência global sobre biodiversidade, é uma oportunidade de transformar o modo como o mundo encara as soluções ambientais. O reconhecimento dos povos indígenas como atores principais na preservação da biodiversidade é uma necessidade urgente. Sua participação ativa em Cali representa não apenas uma demanda por respeito e direitos, mas também uma oferta ao mundo: um caminho para a sustentabilidade que é enraizado em respeito à natureza.

Confira a delegação da APIB na COP16

Alberto Terena – Coordenador Executivo da APIB pelo Conselho Terena

Dinamam Tuxá – Coordenador Executivo da APIB pela APOINME

José Benites – Coordenador Executivo da APIB pela Comissão Guarani Yvyrupá

Kleber Karipuna – Coordenador Executivo da APIB pela COIAB

Kretã Kaingang – Coordenador Executivo da APIB pela ARPINSUL

Marcos Sabaru – Liderança do Povo Tingui-Botó

Cris Pankararu – Representante do Povo Pankararu

João Victor Pankararu – Representante do Povo Pankararu

Voninho Guarani Kaiowá – Representante do Povo Guarani Kaiowá

Vanessa Kaingang – Representante do Povo Kaingang

Layne Tupinikim – Representante do Povo Tupinikim

Mariazinha Baré – Coordenadora Executiva da Articulação das Organizações e Povos Indígenas do Amazonas (APIAM)

Marilda Guarani – Representante do Povo Guarani

Maria Helena Guarani – Representante do Povo Guarani

Marília Terena – Representante do Povo Terena

Luiza Tuxá – Advogada da APOINME

Samela Sateré Mawé – Coordenadora de Comunicação da APIB

Tukumã Pataxó – Coordenador de Comunicação da APIB

Yago Kaingang – Coordenador de Comunicação da APIB

Kamikia Kisedje – Coordenador de Comunicação da APIB




Apib pede ao STF ingresso como Amicus Curie na ADI sobre Pacote de Veneno

Apib pede ao STF ingresso como Amicus Curie na ADI sobre Pacote de Veneno

A nova Lei dos Agrotóxicos (14.785/2023), chamada Pacote de Veneno, foi aprovada pelo Congresso Nacional em dezembro de 2023 e sancionada com vetos. O Partido dos Trabalhadores (PT), o Partido Socialismo e Liberdade (Psol), a Rede Sustentabilidade, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Confederação Nacional dos Trabalhadores Assalariados e Assalariadas Rurais (Contar) estão questionando as mudanças no Supremo Tribunal Federal através da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7701.

Ela propõe a flexibilização dos critérios para análise, aprovação e uso das substâncias químicas no Brasil. Entre as alterações estão a adoção de critério subjetivo para a análise de risco do uso de agrotóxicos, a exemplo de substâncias cancerígenas, sem que haja controle técnico ou social; a retirada da competência do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) sobre essas análises, deixando exclusivamente a cargo do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) e a previsão de dispensa de registro de agrotóxicos em processo sumário de 30 dias.

Portanto, a Lei nº 14.785/2023 direciona a regulamentação dos agrotóxicos aos interesses econômicos da agropecuária, em detrimento dos direitos à vida e à saúde da população brasileira e o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado. O que até então eram atribuições da Anvisa e do Ibama no processo de gestão.

A Apib busca incidir no julgamento e atuar pela suspensão da nova legislação, tendo em vista que os povos indígenas estão entre os mais afetados pela intoxicação por agrotóxicos. As pesquisas da Fiocruz e Abrasco vem mostrando um aumento exponencial de intoxicação de indígenas pelo uso de agrotóxicos no entorno de terras indígenas.

Segundo a Abrasco, foi registrado crescimento de 45,1% da utilização dessas substâncias, saltando de 495.764,55 toneladas para 719.507,44 toneladas consumidas nacionalmente entre 2013 e 2021. Os números podem ser conferidos no Dossiê da Abrasco: um alerta sobre os impactos dos agrotóxicos na saúde ( https://www.epsjv.fiocruz.br/sites/default/files/l241.pdf ).

Há evidências científicas de que os agrotóxicos são responsáveis diretos por 200 mil mortes anuais. O estado do Mato Grosso do Sul, por exemplo, “tem seis casos de intoxicação para cada 10 mil indígenas”. Os ruralistas se utilizam da pulverização de agrotóxicos como arma química para expulsar povos indígenas de seus territórios em conflitos fundiários, como é o caso dos Guarani e dos Kaingang.

Uma pessoa da comunidade de Ocoy, do Povo Indígena Avá-Guarani, no Paraná, relata os seguintes sintomas após o contato com o agrotóxico: “dor de cabeça, desconforto, tontura, porque quando o vento sopra traz tudo, então o cheiro prende tudo no ambiente e você começa a inalar o veneno e começa a sentir dor de cabeça, tontura e, muitas vezes, dor de estômago”.

De acordo com a pesquisadora e professora licenciada da USP, Larissa Bombardi, o Brasil vivencia um “colonialismo químico”, já que as substâncias nocivas à saúde e ao meio ambiente são produzidas pela Europa e Estados Unidos e utilizadas em países periféricos, acarretando danos à saúde da população, contaminação de alimentos e águas e comprometendo a biodiversidade. A própria legislação europeia proíbe uma série de substâncias que são exportadas e utilizadas no território brasileiro.

A Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial de Terras Indígenas (PNGATI) prevê expressamente o desestímulo do uso de agrotóxicos em terras indígenas, além de monitorar o cumprimento da Lei nº 11.460, de 21 de março de 2007, que veda o cultivo de organismos geneticamente modificados em terras indígenas

A nova legislação afrouxa a análise de risco sobre o uso de agrotóxicos e suprime o modelo tripartite de avaliação e gestão dos registros de agrotóxicos, configurando mais uma ameaça aos biomas, à caça, à pesca e à produção de alimentos. O uso em larga escala de agrotóxicos coloca em xeque os modos tradicionais de vida dos povos indígenas e sua relação intrínseca com suas terras.

No pleito ao STF para se tornar Amicus Curiae nas ADI’s, a Apib visa oferecer subsídios ao julgamento através de memoriais, da própria sustentação oral dos argumentos em Plenário e em eventual audiência pública sobre o tema.

Campanha Indígena 2024: Aumenta o número de indígenas eleitos em todo Brasil

Campanha Indígena 2024: Aumenta o número de indígenas eleitos em todo Brasil

Candidaturas indígenas receberam mais de 1 milhão de votos em todo o país nas eleições municipais, que registrou o maior número de indígenas disputando as eleições na história

A Campanha Indígena, iniciativa da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), registrou um crescimento 8% de indígenas eleitos, em 2024, em comparação com as eleições de 2020. Ao todo, 256 candidaturas indígenas conquistaram mandatos em câmaras municipais, em todas as regiões do país e em prefeituras de nove cidades. Levantamento da Campanha com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aponta um total de 1.635.530 votos dados a candidaturas indígenas, mostrando a crescente relevância na política partidária brasileira.

Entre os grupos raciais autodeclarados brancos, pardos, negros e amarelos, apenas os indígenas apresentaram crescimento, enquanto as demais tiveram uma redução de cerca de 20%. As candidaturas indígenas foram as que mais cresceram proporcionalmente nas eleições municipais deste ano, apesar das dificuldades persistentes em eleger representantes. Em 2024, 169 povos indígenas tiveram candidaturas concorrendo a cargos nas câmaras municipais e prefeituras em todas as regiões do Brasil.

De acordo com Kleber Karipuna, coordenador executivo da Apib pela Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), o objetivo da campanha sempre foi nítido: “Nossa proposta com a Campanha Indígena é fortalecer a participação dos povos indígenas nos espaços institucionais da política. Sabemos que a representatividade é uma arma poderosa na luta pelos nossos direitos e na construção de políticas que respeitem nossas vidas e nossos territórios.”

Apesar dos avanços na participação, a falta de investimentos financeiros em candidaturas indígenas e o baixo engajamento dos partidos ainda são grandes obstáculos para a eleição de representantes indígenas. Uma das principais lutas da Campanha Indígena é garantir que, nas próximas eleições, a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que estabelece cotas para candidaturas indígenas, com acesso a recursos do fundo eleitoral e mais tempo de propaganda, seja plenamente implementada.

Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib pela Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme), reforçou que ainda há muito a ser feito. “Os partidos precisam dar mais suporte para que as candidaturas indígenas tenham condições de concorrer de forma justa. Além disso, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) deve garantir a aplicação de uma medida de apoio às candidaturas indígenas através do fundo eleitoral, para equilibrar o jogo e promover a diversidade na política.”

Resultados

Os números de 2024 reforçam avanços dentro de um contexto ainda pouco favorável. Foram eleitos:

  • 198 vereadores e 36 vereadoras

  • 8 prefeitos e 1 prefeita

  • 9 vice-prefeitos e 4 vice-prefeitas

Além disso, 169 povos indígenas participaram da disputa eleitoral, consolidando ainda mais a pluralidade de vozes que se colocam à disposição para representar seus povos. Um destaque importante foi a região de São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, que teve 108 candidaturas indígenas.

Comparativo com 2020

A comparação com as eleições de 2020 mostra que, apesar do aumento geral, alguns desafios permanecem. Em 2020, foram eleitos 236 indígenas, enquanto em 2024 esse número subiu para 256. Houve um crescimento no número de vereadores (214 para 234) e vice-prefeitos (12 para 13). No entanto, o número de prefeitos eleitos caiu ligeiramente, de 10 para 9, e o de mulheres indígenas eleitas também sofreu uma leve redução, de 44 em 2020 para 41 em 2024.

Resultados regionais

A distribuição dos eleitos nas áreas de abrangência das organizações regionais da Apib foi significativa:

  • COIAB (Amazônia Legal): 106 indígenas eleitos, com destaque para o Amazonas (47 eleitos) e Roraima (12 eleitos).

  • Apoinme (Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo): 101 indígenas eleitos, com Pernambuco tendo a maior representação (31 eleitos).

  • Arpinsul, CGY e Arpinsudeste: 33 indígenas eleitos, com o Rio Grande do Sul se destacando com 17 vereadores indígenas.

  • Aty Guasu e Conselho Terena: 16 eleitos, com Mato Grosso do Sul tendo 15 vereadores indígenas.

Embora o crescimento da participação indígena nas urnas em 2024 seja um marco importante, a luta está longe de acabar. “A Campanha Indígena continuará promovendo a participação política dos nossos povos, reforçando a mensagem de que não há democracia plena sem a presença indígena nas decisões que afetam o país”, reforça Dinanam Tuxá.

Acesse campanhaindigena.info para conferir as candidaturas indígenas eleitas, em 2024.

Histórico

O movimento indígena tem uma longa história de luta por espaço nas instituições políticas brasileiras. O primeiro indígena registrado como eleito foi Manoel dos Santos, do povo Karipuna, em 1969, como vereador em Oiapoque (AP). Em 1976, o Cacique Ângelo Kretã venceu as eleições para vereador em Mangueirinha (PR), após uma batalha judicial para garantir seu direito de concorrer.

No âmbito federal, Mário Juruna foi o primeiro indígena eleito deputado em 1982, em um período que antecedeu o reconhecimento dos direitos indígenas na Constituição Federal de 1988. Desde então, o movimento indígena tem conquistado avanços significativos, como a eleição de Joenia Wapichana, em 2018, a primeira mulher indígena eleita deputada federal, e a candidatura histórica de Sonia Guajajara à presidência da República no mesmo ano. Em 2022, novos marcos foram atingidos com a eleição de Célia Xakriabá como a primeira deputada federal indígena por Minas Gerais e Sonia Guajajara como a primeira parlamentar federal por São Paulo.

A Campanha Indígena, promovida Apib, teve sua origem em 2017 com o manifesto “Por um Parlamento cada vez mais indígena”, que destacava a ausência de representantes indígenas no Congresso Nacional e os impactos negativos na luta dos povos. A partir de 2020, a Campanha Indígena foi formalmente lançada para enfrentar essa sub-representação e fortalecer a presença indígena nos processos eleitorais. Desde então, a campanha tem sido fundamental na mobilização de candidaturas indígenas em todo o país, buscando ampliar a representatividade política e garantir que os interesses dos povos indígenas sejam defendidos nas esferas institucionais.

Povo Mura será atingido pela mineração de potássio na Amazônia

Povo Mura será atingido pela mineração de potássio na Amazônia

As Terras Indígenas Lago do Soares e Urucurituba, município de Autazes (AM), estão ameaçadas pela empresa Potássio do Brasil, que está prestes a iniciar a exploração mineral. Nesta segunda-feira (30/09) a empresa iniciou as obras para a unidade de beneficiamento. A comunidade e o Ministério Público Federal denunciam uma série de irregularidades nos processos de consulta pública e autorização para a extração.

A Universidade Federal do Amazonas, que participou inicialmente de um acordo de cooperação chamado Projeto Autazes Sustentável, cancelou os atos de colaboração com a empresa Potássio do Brasil devido ao impasse jurídico em relação aos impactos do projeto sobre os direitos territoriais dos povos indígenas (artigo 231 da Constituição Federal) e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (artigo 225 da Constituição Federal).

O MPF relata irregularidades como:

· A empresa Potássio do Brasil pretende explorar um território indígena tradicional, ocupado pelo Povo Mura há mais de 200 anos, e que já possui Portaria da Funai, publicada em 2023, para que seus estudos avancem e definam seus limites territoriais (Terra indígena Soares/Urucurituba em Autazes/AM);

· Além de se sobrepor à terra indígena em processo de demarcação, a base de exploração minerária fica a menos de 3 km da terra indígena Jauary, e a cerca de 6 km da terra indígena Paracuhuba;

· O fato de o empreendimento pretendido ter impactos socioambientais em territórios indígenas impõe, nos termos da legislação, que o órgão licenciador seja federal (Ibama). No entanto, a empresa apresentou pedidos de licenciamento perante o órgão ambiental do estado do Amazonas, o Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam);

· Qualquer ato administrativo ou legislativo que impacte direitos dos povos indígenas ou comunidades tradicionais (como quilombolas, ribeirinhos, extrativistas, entre outros) deve observar os termos da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que exige a consulta das populações de forma prévia (anterior), livre, informada, de boa-fé e culturalmente adequada (na língua própria se necessário, respeitando o tempo de cada povo) sobre tais medidas;

· O povo Mura aprovou seu protocolo de consulta em 2019, após mais de dois anos de reuniões e debates entre as comunidades e aldeias dos municípios de Careiro da Várzea e Autazes, mas os termos foram descumpridos pela empresa Potássio do Brasil, sendo relatadas fraudes e cooptações;

· Durante as tratativas, houve ameaças a defensores de direitos humanos, lideranças indígenas e agentes da sociedade civil que se opuseram ao projeto;

· O IPAAM, órgão ambiental estadual, além de incompetente para proceder ao licenciamento no caso concreto, concedeu licenças individuais para cada estrutura diferente solicitada pela empresa Potássio do Brasil, promovendo um fracionamento do licenciamento ambiental, sem analisar globalmente os impactos socioambientais e socioeconômicos das atividades.

A empresa, apesar de receber o nome Potássio do Brasil, é na verdade canadense e está prestes a abrir uma oferta pública de ações (IPO) na bolsa de Nova York. A Apib denunciou a situação ao Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) na América do Sul.

“O caso desperta ampla preocupação a nível nacional, por se desenhar como um “projeto piloto” para a autorização de mineração em terras indígenas. A empresa vem promovendo, há anos, a fragmentação social do Povo Mura, acumulando diversas denúncias de assédio e cooptação de lideranças indígenas”, denuncia o documento.

Mais um jovem Guarani Kaiowá é encontrado morto no Mato Grosso do Sul

Mais um jovem Guarani Kaiowá é encontrado morto no Mato Grosso do Sul

No dia em que a Câmara de Conciliação do STF realizou outra reunião, mais um jovem Guarani Kaiowá foi encontrado morto, no município de Antônio João, a 207 quilômetros de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul.

Fred Morilha, de apenas 16 anos, foi encontrado sem vida na beira da estrada para a Terra Indígena Nhanderu Marangatu, nesta segunda-feira, 23.

A polícia está investigando o caso, mas as lideranças acreditam que ele tenha sido mais uma vítima do agrobanditismo. Trata-se da mesma região onde Neri Guarani Kaiowá foi assassinado pela polícia militar na última quarta-feira, 18.

Agora são sete vidas indígenas perdidas no território, que foi declarado como de posse dos povos originários pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) em 2002 e homologado por meio de decreto presidencial em 2005, mas esse processo foi judicializado no mesmo ano e se encontra paralisado até hoje.

A vigência da Lei 14.701/2023 e esta Câmara da Morte são os motivos para o acirramento dos conflitos na região. A ruralista que se diz proprietária da área, Roseli Ruiz, foi indicada como especialista para participar da Câmara, pelos partidos PL e Republicanos. Ela usa do diploma de antropóloga para criar laudos contrários à demarcação de terras indígenas.

Os indígenas denunciam que as terras, localizadas próximas à fronteira com o Paraguai, estavam sendo utilizadas pela fazendeira para produção de substâncias ilícitas. A violência contra os parentes Guarani Kaiowá se arrasta por mais de duas décadas. É uma prática do agrobanditismo, legitimada pela ação do próprio Estado do MS.

É o caso de Neri, quando a PM chegou na área de conflito atirando contra os indígenas, o que resultou na morte do jovem e deixou uma parenta baleada na perna, além de mais duas pessoas baleadas com tiros de borracha. Os barracos da retomada foram destruídos. A PM arrastou o corpo de Neri para a beira da mata e demorou vários dias para que a família pudesse sepultá-lo.

Por isso, a APIB ajuizou, a ADPF 1059, no STF. A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental tem objetivo de corrigir tal postura de violação do direito à vida.

A obrigação do governo do Mato Grosso do Sul é garantir a segurança dos povos indígenas, não utilizar dos aparatos de segurança pública para assassinar pessoas.

Respeite o direito indígena!
Basta de violência contra nossos corpos e nossos territórios!

Ação violenta da polícia mata jovem do povo Guarani e Kaiowá

Ação violenta da polícia mata jovem do povo Guarani e Kaiowá

Na manhã desta quarta-feira (18) um jovem do povo Guarani e Kaiowá foi assassinado pela polícia em ação violenta na Terra Indígena Nhanderu Marangatu, Município de Antônio João no Mato Grosso do Sul.

Segundo informações, a polícia militar chegou atirando, ação que resultou na morte do jovem Neri, e que deixou também uma parenta baleada na perna, assim como os barracos da retomada foram destruídos. A violência teria começado pela madrugada e se estendeu pela manhã.

Além de matar e balear os parentes, a polícia ainda arrastou o corpo do parente desfalecido para a mata, o que gerou ainda revolta entre os parentes Guarani e Kaiowá.

A violência da polícia teve início na última quinta-feira (12), em que três parentes foram baleados pela PM na T.I. Nhanderu Marangatu. Uma das vítimas ainda segue hospitalizada após ter levado tiro de arma de fogo no joelho, as outras duas vítimas foram baleadas com bala de borracha. Segundo informações, a Força Nacional não está na região.

As tramitações do Marco Temporal, através da Lei 14.701/2023, Câmara da Morte (Câmara de negociação) e PEC 48/2023 tem feito com que os ataques aos povos indígena venham se intensificando, principalmente através da milícia chamada invasão zero.

Diante do contexto de violência contra os parentes Guarani e Kaiowá que se perpetua por ao longo dos anos, em 2023 a APIB ajuizou, no Supremo Tribunal Federal a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 1059 (ADPF). A ação é voltada para corrigir as violações de diversos preceitos fundamentais em relação à segurança dos povos indígenas no Mato Grosso do Sul.

O Ministro Gilmar Mendes é o relator desta ADPF, após um ano e mesmo com várias sinalizações da APIB sobre o cenário de violência contra os Guarani e Kaiowá, continua sem andamento efetivo.

Nossos direitos precisam ser respeitados! Chega de violência contra nossos corpos e nossos territórios!

Leia a nota da Aty Guasu

 

Brasil é o segundo país no mundo com maior número de assassinatos de defensores ambientais

Brasil é o segundo país no mundo com maior número de assassinatos de defensores ambientais

Brasil e Colômbia são os países que mais concentram assassinatos de defensores ambientais no mundo. O relatório da ONG Global Witness divulgado na segunda-feira (9), mostrou que um ativista foi assassinado a cada dois dias em 2023.

Os Povos Indígenas (85) e afrodescendentes (12) representaram 49% do total de homicídios do mundo, mostrando que a disputa, a grilagem de terras e as violências nestes territórios continuam sendo mais intensas, o que gera maior vulnerabilidade para os povos originários. Desde 2012, 766 indígenas foram mortos, representando 36% de todos os assassinatos de defensores do meio ambiente.

No Brasil, aconteceram pelo menos 25 assassinatos e na Colômbia foram 79, o número mais alto já registrado em um país num único ano. Entre eles, o ataque de fazendeiros, organizados pelo movimento de extrema direita, Invasão Zero, em área de retomada do povo Pataxó Hã Hã Hãe, no sul da Bahia resultou o assassinato de Nega Pataxó. Além da organização dos ruralistas, as pressões institucionais e a lei do marco temporal em vigor, são estímulos para acentuar os conflitos nos territórios.

O relatório mostra que a América Latina foi a região com mais mortes, com 166, 85% do total. Mas a Global Witness destaca que os dados podem estar subestimados, já que muitos homicídios não são relatados, especialmente em áreas rurais e em alguns países.

A Ásia também se destaca pela violência contra ambientalistas: 468 defensores foram assassinados nos últimos 11 anos. Destes, 64% nas Filipinas (298), seguida de Índia (86), Indonésia (20) e Tailândia (13).

Os dados brasileiros presentes no relatório foram coletados pela Comissão Pastoral da Terra (CPT). O dossiê anual dos conflitos no campo mostrou que houve um recorde em 2023, com 2.203 ocorrências. Destas, 1.724 foram causadas por invasões, expulsões, despejos, ameaças, destruição de bens ou pistolagem sofridas por pequenos agricultores, comunidades tradicionais e populações indígenas.

Com a mudança no governo federal, de 2022 para 2023 houve uma queda de 26% nos registros de assassinatos no Brasil, porém o país continua ocupando o segundo lugar entre os que mais matam. A troca no governo federal, com a eleição do presidente Lula (PT) gerou expectativas para reverter os retrocessos em políticas públicas, que facilitaram o avanço da exploração dos recursos naturais e o aumento da invasão de territórios ocorridos durante a gestão Jair Bolsonaro (PL).

“Até agora, houve progresso. O governo restabeleceu o financiamento para proteger a amazônia e restaurou a agência de assuntos indígenas que Bolsonaro desmantelou”, afirma o relatório.

“No entanto, as mudanças de políticas continuam sendo desafiadoras diante de um Congresso conservador dominado por ruralistas, que apoiam os interesses de proprietários de terras privadas em detrimento da reforma agrária pública”, continua a análise.

Já a Colômbia enfrenta a disputa territorial e o narcotráfico, especialmente nas regiões sudoeste de Cauca (26), Nariño (9) e Putumayo (7). “Uma mistura de cultivo de coca, tráfico de drogas e conflito armado devastou essas regiões, com defensores e comunidades frequentemente pegos no fogo cruzado”, explica o texto.

O país receberá a Convenção de Biodiversidade (COP16) da Organização das Nações Unidas (ONU), em outubro. E o governo colombiano prometeu trazer o tema dos defensores ambientais para o centro dos debates do evento.

Lula, demarque as Terras Indígenas Tupinambá

Lula, demarque as Terras Indígenas Tupinambá

Povo comemora reencontro com manto sagrado, mas Terras indígenas de Olivença e Belmonte aguardam apenas a assinatura do ministro da justiça.

 

O Povo Tupinambá vai se encontrar com o presidente Lula nesta quinta-feira, 12/09, no Rio de Janeiro, na cerimônia de repatriação do manto sagrado, que passou mais de 300 anos em um museu na Dinamarca.

Durante o evento, eles reivindicam a demarcação das terras indígenas de Olivença e de Belmonte, na Bahia, que estão com os processos das portarias declaratórias prontos para serem assinados e aguardam apenas o ato do Ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski.

O manto retornou ao Brasil em 11 de julho, mas demorou até esta semana para que o povo Tupinambá tivesse acesso a ele. Foi a comunidade que reivindicou o retorno de seu “ancião mais antigo”. A devolução ao país contou com a articulação entre instituições do Brasil e da Dinamarca.

Na segunda-feira, 09/09, eles divulgaram um manifesto em que também pedem o retorno do manto para o território indígena, com a criação de um museu. Para o povo, este retorno representa um bom presságio na luta pela demarcação do território. Há mais de 15 anos os 47 mil hectares das terras Tupinambá de Olivença foram delimitados. E a Terra Indígena Tupinambá de Belmonte, que soma 10 mil hectares, está delimitada desde 2013.

A cerimônia foi organizada pelo Ministério dos Povos Indígenas (MPI), em conjunto com os Ministérios da Educação e da Cultura e conta com a parceria do Ministério das Relações Exteriores.

Após os rituais, o povo tupinambá poderá visitar o manto em uma sala da Biblioteca Central do Museu Nacional, que é vinculado à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). De acordo com o MPI, “todo o evento foi organizado em diálogo permanente com o povo para garantir o direito sagrado dos indígenas em relação ao artefato”.

O manto é feito com penas vermelhas de pássaros guará fixadas em uma rede de fibras naturais e é usada tradicionalmente por caciques e líderes indígenas em rituais. Existem outros dez como este espalhados na Europa. Eles foram trocados ou saqueados no início da colonização.

Povo Tupinambá reencontra manto sagrado após mais de 300 anos

Povo Tupinambá reencontra manto sagrado após mais de 300 anos

O povo Tupinambá reencontrou o manto sagrado, roubado pela colonização há mais de 300 anos. O manto estava em um museu na Dinamarca, foi repatriado e se encontra na biblioteca do Museu Nacional, no Rio de Janeiro. 

Cerca de 200 indígenas, entre crianças, jovens, adultos e anciões celebraram sua ancestralidade cantando juntos “Nós somos os filhos, netos e bisnetos, do manto tupinambá”, enquanto tocavam seus maracás e dançavam em roda, nesta segunda-feira, 09/09.

Para o povo, o manto é seu ancião mais antigo e este retorno representa um bom presságio na luta pela demarcação do território. Há mais de 15 anos os 47 mil hectares das terras Tupinambá foram delimitados e o povo aguarda os últimos passos para a demarcação. 

“Vivemos num território que tem 47 mil hectares, em três municípios, e abriga 8 mil tupinambás vivendo do extrativismo, da pesca, da agricultura. Ocupamos 80% desse território, porque fizemos nossa retomada e não resta mais nenhum impedimento para que o governo brasileiro assine a portaria declaratória do povo tupinambá”, disse o cacique Sussuarana Morubyxaba Tupinambá. “A vinda do povo tupinambá aqui é em vigília, em ritual, mas a gente também quer que os nossos governantes façam valer o que está na Constituição e demarquem o território tupinambá de Olivença. Sem esse território, não podemos viver”, defende.

A anciã Yakuy Tupinambá leu um manifesto redigido por indígenas de 23 comunidades da Bahia. O documento critica posturas dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário em relação à falta de transparência do processo de repatriação e acesso ao manto, além da morosidade quanto à demarcação das terras originárias e a tese do marco temporal.

“Reiteramos nossa insatisfação com a postura colonizadora personificada pelo Estado brasileiro, através das autarquias representativas que mais uma vez dilaceram nossos direitos originários e, muito mais que isso, fere profundamente o que mais prezamos: a nossa crença e a nossa fé”, afirma o manifesto.

O manto é uma vestimenta de 1,8 metro de altura, confeccionada com penas vermelhas de ave guará sobre uma base de fibra natural. As visitações para o público ainda serão definidas pelo Museu Nacional, que zela pela integridade do manto. Mas o povo Tupinambá reivindica o retorno do manto para o território originário, com a construção de um museu. Outros dez mantos ainda estão sob posse de museus na Europa.

 

Agro é fogo: o negócio por trás das queimadas e a instituição do marco temporal

Agro é fogo: o negócio por trás das queimadas e a instituição do marco temporal

No dia 31/08 uma mancha de fogo com mais de 500km de extensão encobriu a Amazônia. Em menos de um mês, as queimadas consumiram 2,5 milhões de hectares da floresta. No Pantanal, atingiram quase 1,9 milhão de hectares, cerca 12,5% do território. No Cerrado 18.620 focos foram registrados, totalizando 44,6% do total de hectares queimados em todo Brasil. Na Mata Atlântica, estado de São Paulo, ocorreu o maior registro histórico de focos ativos de calor, 2,6 mil, desde o início das medições de satélite, em 1998*.

Os incêndios que se espalharam durante todo mês de agosto não são meras consequências do período de estiagem. É claro que a falta de chuvas contribui para a propagação do fogo. Porém, há indícios de outras causas para o salto dos focos de calor no Brasil: são 68 mil, um número 105% maior que em 2023.

No caso de São Paulo, o dia 23 de agosto marcou os registros de satélite com incêndios coordenados e de alta intensidade, indicando uma possível ação criminosa. De acordo com o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), as imagens de um satélite que capta focos de calor na parte da manhã e no final da tarde, mostraram que, entre suas duas passagens, o número de focos foi de 25 para 1.886 no estado. “Uma anomalia muito grande, quando todos os olhos deveriam estar pra Amazônia”, avaliou Ane Alencar, diretora de Ciência do Ipam.

A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, declarou que os incêndios na Amazônia, no Pantanal e Sudeste do país apresentam um movimento atípico que podem indicar uma ação criminosa de quem está ateando fogo propositadamente. “Do mesmo jeito que nós tivemos o ‘dia do fogo’ [em 2019], há uma forte suspeita que isso esteja acontecendo de novo. No caso do Pantanal, a gente estava tendo ali a abertura de dez frentes de incêndios por semana. No caso da Amazônia, nós identificamos o mesmo fenômeno. E em São Paulo, não é natural, em hipótese alguma, que em poucos dias você tenha tantas frentes de incêndio envolvendo concomitantemente vários municípios”, afirmou.

 

Quem ganha com o fogo?

Pode parecer loucura, um setor que depende da natureza criar desastres ambientais. Porém, o presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Rodrigo Agostinho, explica que o agravamento da crise climática, o desmatamento de anos anteriores, a falta de conscientização e, principalmente, a mudança na estratégia de desmatamento influencia nas queimadas atuais.

“É muito essa lógica: eu vou acabar com a floresta. Não preciso desmatar. Porque o desmatamento é caro. O fogo é muito mais barato, só comprar gasolina e sair espalhando”, o que justifica incêndios tão intensos apesar da diminuição do desmatamento da Amazônia. O fogo é o meio mais eficiente para os ruralistas escaparem à fiscalização do Ibama.

Além disso, os desmatadores têm vantagens na Bovespa, que canaliza R$560 bilhões do agronegócio e que não conta com mecanismos de punição para crimes ambientais. E mais, na lógica da queima do café em 1930, se há um excesso de mercadoria disponível os preços caem, mas qualquer sinal da indisponibilidade do produto no mercado pode gerar aumentos substanciais nos preços.

Mais da metade dos focos em São Paulo aconteceu em fazendas privadas, registradas no Sistema de Gestão Fundiária (Sigef). Apenas 11 deles estavam localizados em terras públicas, como assentamentos e terras indígenas. 81,29% deles estavam em áreas de uso agropecuário como as ocupadas pela cana-de-açúcar e pela pastagem.  Entre as áreas queimadas estão grandes empresas, como São Martinho SA e Raízen SA. E as cotações internacionais do açúcar subiram no final de agosto, logo após as queimadas.

 

Garimpo e fogo

Já o mapeamento na Amazônia mostrou que as Terras Indígenas Kayapó (PA), Munduruku (PA) e Sararé (MT) tiveram mais incêndios que outras, com 1.111 focos. O Ibama e a Funai veem indícios de ação de garimpeiros, já que são áreas fortemente afetadas pelo garimpo ilegal.

Os números do Inpe mostraram que a Terra Indígena Kayapó, no sul do Pará, teve 746 focos de calor. O território onde vivem cerca de 5 mil kayapós mebengôkres foi o que registrou maior número de queimadas na Amazônia em agosto.

A terra indígena munduruku, no sudoeste do Pará, teve 217 focos de calor. Lá vivem 9.257 indígenas dos povos munduruku e apiaká. Esta área é a segunda com maior exploração garimpeira ilegal no país. Em 2023 houve apenas 163 focos.

E a terceira terra indígena com mais queimadas é uma área pequena, que abriga 250 pessoas do povo nambikwara. O território Sararé, no sudoeste de Mato Grosso, próximo à fronteira com a Bolívia registrou 148 focos de calor. No ano passado, a terra Sararé não registrou queimadas, no entanto, houve uma super invasão pelo garimpo em um ano.

A Funai estima que 2 mil invasores estiveram no território. O coordenador do posto de vigilância da Funai, André Augusto Rodrigues, afirmou em entrevista que boa parte do fogo resulta de retaliação de garimpeiros, que chegaram, a fazer um cerco ao posto.

“O fogo prejudica operações e atrasa ações aéreas, em razão da densa fumaça”, explica o coordenador. No dia 18 de agosto, começou uma operação para desintrusão do território, que desativou acampamentos e escavadeiras hidráulicas.

Nestas Terras Indígenas não há brigadas do Prevfogo (Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais). E os processos de desintrusão dos territórios exigem do governo federal mais que ações esporádicas, visto que ações pontuais resultam em retaliação, no retorno dos garimpeiros e mais ameaças às vidas e aos territórios.

Sobre as queimadas, o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, afirmou que existem atualmente 29 inquéritos instaurados na Amazônia e Pantanal, e foram abertos mais dois em São Paulo, para apurar as evidências de queimadas criminosas.

 

Brasileiros(as) sofrerão a emergência

Para completar o cenário, as previsões apontam que a seca amazônica deste ano repetirá a seca extrema em 2023. Toda essa devastação afeta os rios e o regime de chuvas. As queimadas poluem os rios e suas nascentes, e as cinzas transportadas para o leito dos rios nas primeiras chuvas degradam a qualidade da água.

Em consequência, as grandes cidades sentirão mais uma vez a escassez de água potável, com racionamento e aumento das contas para os trabalhadores no final do mês. Bem como o secamento dos rios prejudica a produção de energia hidrelétrica, outra conta que o trabalhador deverá sentir no bolso.

As populações mais intensamente afetadas, entretanto, são aquelas que dependem diretamente da agricultura, da caça e da pesca. As comunidades indígenas e ribeirinhas são as primeiras a sentirem na pele as dificuldades para manter seu modo de vida, o que gera uma situação de extrema vulnerabilidade. Na Amazônia, comunidades inteiras ficam isoladas porque seu principal meio de transporte é fluvial. O governo do estado já decretou emergência pela estiagem em 62 municípios, e mais de 75 mil famílias estão sofrendo pela falta de água e alimentos.

As famílias agricultoras ficam cada vez mais dependentes da irrigação, de pacotes tecnológicos do agronegócio (que são vendidos como solução do problema) e dos empréstimos bancários. As perdas na produção geram endividamento, a perda das terras, o êxodo para cidades e o aumento da concentração fundiária.

A crise climática, portanto, afeta toda a população brasileira. Ela não diz respeito apenas as minorias, se trata de uma emergência que o país (e o mundo) enfrenta. O Estado brasileiro e a sociedade precisam agir para reverter o problema, antes que essa realidade nos torne uma sociedade pobre em natureza e rica de enfermidades crônicas.

 

Marco temporal é agro

Enquanto o fogo consome o Brasil, a influência do agro dentro das instituições caminha a passos largos para desfigurar os direitos indígenas constitucionais, uma investida dos ruralistas no Congresso Nacional com a conivência de partes do executivo e do judiciário.

A lei do Marco Temporal está em vigor. E com isso, os ruralistas estão desencadeando novos ataques sobre as Terras Indígenas, utilizando armas como as queimadas.

No legislativo, tramita a PEC 48, que altera a constituição para retirar o direito indígena originário e inserir a tese inconstitucional. Uma prova de que todos os deputados e senadores que aprovaram a lei, tinham pleno conhecimento da sua ilegalidade.

No Supremo Tribunal Federal, ao contrário do que era esperado, o debate e a defesa da cláusula pétrea da constituição se tornou uma câmara de conciliação forçada, na qual, qualquer discordância da nossa parte, seria levada para votação. Com a representação indígena em menor número, qualquer proposta poderia ser aprovada. A Apib se retirou desta armadilha.

Mas a lei de número 14.703/2023, abriu brechas como o abono para invasores de terra indígena, que pode ser considerada de “boa-fé” e dar direito a indenização. Nesse caso, o invasor pode continuar no território até a finalização do processo de demarcação. Ela também proíbe o redimensionamento de terra indígena demarcada, mesmo quando houver erro do Estado. O direito de usufruto exclusivo foi flexibilizado. As terras já demarcadas podem ser contestadas por terceiros. Estados e municípios passam a interferir nos processos demarcatórios que até então cabiam somente à união, tornando-os ainda mais demorados. A lei ainda permite, leia-se incentiva, a cooperação entre indígenas e não indígenas para exploração dos territórios. Além, é claro, de exigir a comprovação da presença indígenas nas terras na data de 05 de outubro de 1988.

Tudo isso, somado ao apagamento que é consequente das queimadas, está criando um abismo entre o Estado e a efetiva proteção e justiça aos povos que primeiro tiveram a posse das terras brasileiras. Portanto, as queimadas, a manipulação das leis pela bancada ruralista e a articulação nacional do movimento de extrema direita conhecido como Invasão Zero, fazem parte de um mesmo projeto de país, que visa desestruturar a democracia brasileira em favor de um pequeno grupo de coronelistas criminosos. Um projeto que ficou escancarado durante o governo Bolsonaro e continua em curso no governo Lula.

A consequente crise ambiental/climática gerada por isso tudo, para esse grupo elitista é mero detalhe ou um delírio “esquerdista”, “coisa de comunista”. Mas o Inpe registrou no último mês uma concentração tão alta de gases poluentes, que foi percebida da Amazônia ao Sul do Brasil, alcançou dez estados, o Peru, a Bolívia e o Paraguai. Isto ocorre porque, os chamados “rios voadores”, correntes de ar que transportam a umidade da Amazônia para outras regiões da América do Sul, foram transformados em imensos corredores de fumaça.

 

Resposta indígena

Os povos indígenas resistem, estão permanentemente mobilizados e lutam para defender seus territórios, suas vidas e de toda população. As terras indígenas, como sabemos, são as mais preservadas e, ainda assim, as menos assoladas pelos incêndios.

A Terra Indígena Rio dos Índios, por exemplo, foi homologada há pouco mais de um ano. Ela está localizada no município de Vicente Dutra, no noroeste do Rio Grande do Sul, e abriga uma comunidade de cerca de 230 indígenas kaingang.

A homologação daria o direito à demarcação de 713 hectares, porém, os indígenas estão ocupando pouco mais de 100 hectares, devido a uma liminar da Justiça, movida por políticos e ruralistas locais. Mesmo com as condições adversas, a comunidade deu início a um projeto de reflorestamento que busca reabilitar as matas, plantando centenas de árvores nativas e frutíferas através da escola indígena e parcerias, projeto que envolve os jovens, as crianças e os mais antigos da comunidade.

Este é apenas um exemplo do caminho que o Brasil precisa seguir para superar a fumaça que encobre o futuro possível. Sem a demarcação das terras indígenas, vamos continuar caminhando para ampliar desastres e viver em crise. A ancestralidade nos ensina que é possível construir o caminho do bem viver, com respeito e integrado à natureza. O futuro do Brasil é indígena.

* Os dados são do levantamento do Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Lasa-UFRJ) e do Programa Queimadas, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

Fontes:

“Desmatamento é caro, fogo é mais barato”, explica presidente do Ibama, sobre queimadas

Fogo e lamaçal

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