ADAILDO JOSÉ ALVES DA SILVA, indígena residente na comunidade Morro D’Água, Baixa Grande do Ribeiro (PI), com a terra reivindicada em processo de demarcação como terra indígena, foi submetido a uma reintegração de posse decidida pelo Poder Judiciário, Comarca de Gilbués, e executada pela Polícia Militar, tendo que sair de sua casa na tarde do dia 14 de janeiro de 2021. Neste mesmo dia, à noite, expulsaram e queimaram a casa de seu filho, DORIAN NUNES DA SILVA. Hoje, 17 de janeiro de 2021, o grileiro foi até a comunidade e ameaçou de morte os indígenas. Anteriormente, no dia 25 de junho de 2020, derrubaram e queimaram as casas de Salvador, João e Jairo, são indígenas Gamela da comunidade Barra do Correntim – Bom Jesus (PI). A presente nota denuncia a situação a que os indígenas Gamela são submetidos no estado do Piauí com atuação do Poder Executivo e do Poder Judiciário, tendo o Poder Legislativo e o Ministério Público inertes diante do descumprimento da constituição. Quais os direitos foram descumpridos nesta violenta reintegração de posse?

1. A dignidade da Pessoa Humana garantida no Art. 1o da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 como fundamento da nação brasileira;

2. Foram negados os direitos sociais do Art. 6°: “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”. A decisão do Poder Judiciário do estado do Piauí violou as garantias fundamentais: saúde em tempos de pandemia; alimentação; trabalho, moradia, segurança, proteção aos desamparados. O Poder Judiciário piauiense determinou e o Poder Executivo efetivou as violações e até este momento não há manifestação do Poder Legislativo nem do Ministério Público e Defensoria Pública da União (DPU);

3. Foram violados os direitos culturais dos povos indígenas, garantidos nos art. 215 e 216: Art. 215 “O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais. § 1o O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional” e Art. 216: “Constituem patrimôniop cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: I – as formas de expressão; II – os modos de criar, fazer e viver; (…)”. A decisão judicial violou o direito cultural dos povos indígenas, o patrimônio cultural brasileiro tanto material quanto imaterial, bem como violou os modos de criar, fazer e viver;
4. A decisão de despejo é indevida por está situada na justiça estadual, uma vez que as questões indígenas devem ser tratadas no âmbito da justiça federal. Ela violou concretamente o direito às terras indígenas, garantido no Art. 231, que garante: “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens. § 1o São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições. § 2o As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes. (…) § 5o É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, “ad referendum” do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco”. Como se pode notar as terras reivindicadas pelos indígenas não pode ser objeto de reconhecimento de outra posse;

5. O § 6o do Art. 231 considera: “São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé”;

6. A ação de violência praticada viola a CF-1988 e a legislação infraconstitucional, se o estado do Piauí quer representar o povo piauiense precisa corrigir imediatamente as violações realizadas em plena pandemia, desrespeitando as condições pandêmicas, tratando os povos indígenas como não humanos.

A presente nota denuncia a desumanização com que agiu o estado do Piauí, por meio do Poder Judiciário e do Poder Executivo, com a conivência dos demais poderes que permanecem inertes ao tempo em que reivindicamos que as violações sejam corrigidas e que as casas queimadas sejam edificadas pelo Poder Público piauiense.

Teresina (PI), 17 de janeiro de 2021. Povo Gamela de Bom Jesus, Baixa Grande do Ribeiro, Currais e Santa Filomena

Povo Tabajara Tapuio de Lagoa de São Francisco Povo Tabajara de Piripiri
Povo Tabajara Ypy do Canto da Várzea de Piripiri Povo Tabajara da Oiticica de Piripiri

Povo Kariri de Queimada Nova

Povo Gueguê do Sangue de Uruçuí

Povo Caboclos da Baixa Funda de Uruçuí

Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo – APOINME / Regional e Coordenação da Microregião do Piauí

Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia – PNCSA

Laboratório do Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia – PNCSA/UFPI

Comissão Pastoral da Terra – CPT do Piauí

Conselho Indigenista Missionário – CIMI / Regional Nordeste

Grupo de Pesquisas Identidades Coletivas, Conhecimentos Tradicionais e Processo de Territorialização/UFPI

Grupo de Pesquisa em Antropologia, Diversidade, Interculturalidade e Educação – GPADIE/UFPI

Grupo de Pesquisa e Extensão Direitos Humanos e Cidadania – UFPI

Programa de Ações Integradas de Promoção de Direitos Humanos, Sociais e Cidadania – PRAIDIH/UFPI

Programa de Pesquisas sobre Povos Indígenas do Nordeste Brasileiro – PINEB Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Etnicidade – NEPE/UFPE
Associação Nacional de Ação Indigenista – ANAÍ
Grupo de Estudos com Povos Indígenas – GEPI/Unilab

Macondo: Artes, Culturas Contemporâneas e outras Epistemologias da UFRPE/UAST Comissão Pastoral da Terra – CPT do Maranhão
Rede de Agroecologia do Maranhão – RAMA
Conselho Indigenista Missionário – CIMI do Maranhão

Etnologia, tradição, ambiente e pesca artesanal – Etapa/UFRN

CAMTO – Cultura, Ambiente e Território da UFRB

ANJUKA- Centro de Memória dos Povos indígenas do Nordeste da UEFS – BA

Opará – Centro de Pesquisas em Etnicidades, Movimentos Sociais e Educação da UNEB

Laboratório de Pesquisas em Etnicidade, Cultura e Desenvolvimento – Laced/UFRJ Laboratório de Antropologia, Política e Comunicação – LAPA da UFPB
NEA NOVA CARTOGRAFIA SOCIAL da UFRB
Laboratório de Estudos sobre Ação Coletiva e Cultura – LACC da UPE

Núcleo de estudos Indígenas e Afrobrasileiros – NEABI da UFAM Coletivo de mulheres indígenas e quilombolas da UFG
Coletivo OcupARTHE
Núcleo de Estudos Afro-brasileiros – NEAB /UERN

Grupo de Estudos Culturais – GRUESC/RN

Grupo de Pesquisas em Ciências Humanas e Linguagens no Cerrado — IFPI Campus Uruçuí

Grupo de Trabalho ‘Os Índios na História’ / Associação Nacional de História – Anpuh – Seção Piauí

Movimento pela Paz na Periferia – MP3

Pastoral do Migrante da Arquidiocese de Teresina

Hélder Ferreira de Sousa – UFDPar

Núcleo de Estudos e Pesquisas em “Educação, Gênero e Cidadania” – NEPEGECI

Observatório das Juventudes e Violências na Escola – OBJUVE