Carta política da X Assembleia da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo – APOINME

Carta política da X Assembleia da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo – APOINME

CARTA POLÍTICA DA X ASSEMBLEIA DA ARTICULAÇÃO DOS POVOS E ORGANIZAÇÕES INDÍGENAS DO NORDESTE MINAS GERAIS E ESPÍRITO SANTO – APOINME.

“Eles arrancaram nossas folhas, quebraram nossos galhos, derrubaram nossos troncos. Mas, esqueceram do fundamental: arrancar nossas raízes!”

 -Maninha Xukuru

A Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste Minas Gerais e Espírito Santo – APOINME, organização indígena que representa os 10 (dez) estados da federação, pertencentes ao Nordeste brasileiro e dos estados de Minas Gerais e Espírito Santo, vem através das lideranças indígenas dos povos Pataxó, Tuxá, Tupinambá, Tremembé, Tapeba, Pankararu, Tupinikim, Anacé, Mendonça Potiguara, Pankaru, Pitaguary, Jenipapo- Kanidé, Tabajara, Potiguara, Guegues, Tapuia Tarairiú, Katokim, Pankará, Xokó, Guarani, Truká, Wassu Cocal, Kapinawá, Xukuru- Kariri, Kariri, Tapuia Kariri, Kamakã Mongoio, Kaxixó, Xakriabá, Pataxó Hãhãhãe, Maxakali, Krenak e Xukuru, presentes na X Assembleia da APOINME, realizada entre os dias 29 de novembro a 01 de dezembro, na Aldeia Sede Pataxó, no município de Carmésia-MG, evento que marca os 30 anos de fundação desta Articulação, tornar pública a presente carta política.

Articulamos e organizamos a X Assembleia Geral durante meses, foram dias de discussões e preparos constantes, presencial e de maneira remota, para que esse momento fosse concretizado e que tivesse a participação das lideranças jovens, mulheres e dos nossos anciões, para além dos Coordenadores e Coordenaras Indígenas eleitos. Todavia, em virtude de uma nova onda da pandemia do novo coronavírus e dos empecilhos da vulnerabilidade socioeconômica encontrados nas diversas comunidades indígenas da nossa área de abrangência, muitas outras lideranças de base não tiveram a possibilidade de se fazer presente nesse momento de construção, reestruturação, avaliação e renovação da nossa Organização. 

Durante esse último ano de mandato, a partir do mês de junho desse ano de 2022, aconteceram as eleições nas microrregiões da APOINME, dos 10 (dez) estados brasileiros, os quais foram eleitas as coordenadoras do departamento de mulheres, a representação de jovens para compor o departamento de juventude e as lideranças para constituir a coordenação de microrregião. Na mesma oportunidade, se fizeram presente uma equipe da coordenação da APOINME, composta pelo jurídico, coordenação geral/executiva, equipe técnica e comunicação, para acompanhar os diálogos e supervisionar as discussões, no que diz respeito também aos tramites legais e socioculturais das eleições, em cada uma das regiões de base da APOINME.

A APOINME é a representação legítima, pela defesa e promoção dos direitos indígenas do Nordeste do Brasil, e dos Estados de Minas Gerais e Espírito Santo. É com essa mesma legitimidade e responsabilidade que evidenciamos os interesses e anseios dos povos, que lutamos pelas reivindicações históricas de cerca de 80 povos indígenas, e que reivindicamos ao Estado brasileiro a construção de uma agenda positiva, que tenha como prioridade absoluta, e que possibilite assim a regularização dos territórios indígenas reivindicados legitimamente pelos nossos povos. 

Vivemos, lutamos e defendemos nossos territórios ancestrais a mais de 522 anos de invasão territorial. Nossos antepassados defenderam, cuidaram e nos ensinaram também a lutar e a cuidar da nossa Mãe Terra. Nossa área de abrangência foi a primeira a enfrentar o projeto colonial que expropriou e se apossou de grande parte dos nossos territórios sagrados, fazendo com que esses mesmos territórios servissem de sede para a catequização dos povos indígenas do Nordeste. Os antecessores a sofrerem uma série de violações aos direitos humanos e consuetudinários, a terem os corpos tombado frente ao projeto colonizador, a sofrerem a tentativa racista de integração dessas comunidades à sociedade não indígena e a experimentar a expropriação dos territórios indígenas, onde muitos desses são objetos de reivindicação ou áreas já devidamente retomadas e ocupadas.

Destarte, é notório que o cenário nacional em que cerca de 54% das terras indígenas no Brasil não possuem nenhum tipo de segurança jurídica e que a maioria dessas terras indígenas estão localizadas em nossa região. São nesses territórios, em que o cenário de conflitos e ameaças se dão de forma mais acentuada, que é possível analisar o resultado do processo de violações de direitos, individuais e coletivos, a partir, por exemplo, da criminalização e das ameaças às nossas lideranças, bem como das vidas dos nossos jovens indígenas que estão sendo ceifadas diariamente pela disputa territorial.

Ademais, no campo da regularização de terras indígenas, o atual governo de extrema direita, cumpriu com a promessa de não demarcar nenhuma terra indígena, destruindo a Política Indigenista brasileira, extinguindo instâncias de controle social e fragilizando todas as instituições que atuam com os nossos povos.

Dessa forma, temos consciência e convicção do importante papel desempenhado pelos povos indígenas do Brasil, em especial, os da região Nordeste e Leste, o qual exercemos com propósito principal de derrotar o projeto bolsonarista nas eleições em favor da possibilidade de um governo que atue em respeito a política indigenista, a partir de seu projeto progressista que tem como objetivo a reconstrução do nosso país e das suas instituições democráticas. Foi nessa perspectiva, que ainda na campanha eleitoral, apontamos o interesse de ajudar o presidente eleito, Luís Inácio Lula da Silva, a governar. Lula assumiu com os nossos povos o compromisso pela criação do Ministério dos Povos Originários e de fazer a nossa pauta avançar com a devida consulta e participação das nossas Organizações de base da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil- APIB, e portanto, não podemos perder a oportunidade de incidir diretamente no próximo governo. É com essa disposição que a APOINME apresenta as seguintes reivindicações prioritárias:

  1. Retomar os processos de regularizações fundiárias das terras indígenas no Brasil, priorizando áreas emblemáticas localizadas na nossa região de abrangência, por todo o processo histórico de violações cometidas contra os nossos povos indígenas;
  2. Fortalecer a Fundação Nacional do Índio- FUNAI, por meio da ocupação dos mais de mil cargos vagos, realização de concurso público regionalizado e com reserva de vagas para indígenas, ampliação de orçamento priorizando recursos para a regularização, gestão e proteção dos nossos territórios e a regulamentação do poder de polícia para os servidores que atuam na linha de frente junto aos nossos povos e territórios;
  3. Recompor o orçamento da Política Nacional de Atenção a Saúde dos Povos Indígenas, assegurando a continuidade dos serviços de saúde e saneamento em nossas comunidades, assegurando a inclusão de comunidades indígenas no  Sistema de Informação da Atenção à Saúde Indígena – SIASI, ampliação da força de trabalho e aperfeiçoamento do controle social mais alinhado com as instâncias representativas do Movimento Indígena Brasileiro e implantação imediata da Política Nacional de Atenção à Saúde Indígena nos estados em que os povos ainda não são assistidos;
  4. Criar o Ministério dos Povos Indígenas com a capacidade de implementar ações finalísticas de assistência às Comunidades Indígenas para a promoção e defesa de direitos, com dotação orçamentária própria a fim de viabilizar a retomada da regularização dos territórios indígenas, constituição de um fundo destinado a regularização, gestão e proteção de nossos territórios instituindo uma Ouvidoria para denunciar violações de direitos humanos em nossas comunidades, realizando ações interministeriais, intersetoriais e interinstitucionais com a capacidade de dialogar com os nossos povos por meio da recriação do Conselho Nacional de Política Indigenista- CNPI;
  5. Assegurar o cumprimento e obediência ao nosso direito a consulta prévia, livre e informada e ao consentimento ou não, quando empreendimentos de qualquer dimensão ou alguma medida administrativa ou legislativa for capaz de afetar os nossos modos de vida e os nossos territórios;
  6. Realizar o “revogaço” de todas as medidas adotadas pelo atual governo que resultou na retirada ou na violação dos nossos direitos, atuando ainda junto ao Congresso Nacional para impedir a tramitação de proposições legislativas que também tenham como objeto, a violação ou retirada dos nossos direitos;
  7. Nomear como Ministro dos Povos Indígenas o nome da liderança indígena, Ricardo Weibe Nascimento da Costa (Weibe Tapeba), conforme deliberação da X Assembleia Geral da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espirito Santo – APOINME.

Ademais, daremos um recado: a APOINME é uma das maiores organizações indígenas do Brasil e da América Latina, se fazendo necessário que os espaços de discussão sejam concedidos a partir, também, da importância dessa Articulação e da magnitude das suas ações junto à suas bases. 

Finalmente, permaneceremos nas nossas bases fortalecendo as nossas comunidades indígenas e dando visibilidade as nossas lutas diárias. E, reafirmamos mais uma vez o compromisso pela defesa dos nossos direitos, anteriormente firmados pelos nossos antepassados, nossos guerreiros e guerreiras que já tombaram na luta pela vida dos povos indígenas, das nossas crianças, dos anciões, mulheres e jovens. E seguiremos vigilantes às violações de direitos humanos e consuetudinários na defesa da vida das comunidades indígenas do Leste e Nordeste, caminhando pela união dos nossos povos e do fortalecimento da nossa APOINME.

Terra demarcada, vida garantida! APOINME somos todos nós!

(Paulo Tupinikim Coordenador Geral da APOINME)

Nota de apoio a indicação de Marivelton Baré ao GT de Transição do Governo

Nota de apoio a indicação de Marivelton Baré ao GT de Transição do Governo

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) prestam solidariedade ao nosso parente Marivelton Baré, presidente da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn), e repudia a perseguição política, que está sendo feita por uma minúscula parte do Setorial Nacional de Assuntos Indígenas do Partido dos Trabalhadores, contra Marivelton. 

O então coordenador do PT que trata nacionalmente sobre assuntos indígenas lançou uma nota pública, no dia 18 de novembro, para atacar o presidente da Foirn. O documento questiona a legitimidade de Marivelton para compor o Grupo de Trabalho do Governo de Transição para o tema de Povos Indígenas. “Marivelton e sua cúpula passaram quase quatro anos dizendo amém para o governo de Bolsonaro. Ele é um dos apoiadores da extrema direita”, afirma de forma mentirosa e leviana trecho da nota. 

A setorial do PT, reclama que foi ignorada pelo próprio partido, mas o coordenador, que assina o documento, prefere atacar Marivelton ao invés de exigir mais participação indígena na equipe de transição do Partido dos Trabalhadores. 

A Apib acredita ser legítimo que a setorial do PT busque ter assento no GT de transição para assuntos indígenas, mas jamais iremos tolerar ataques que deslegitimem o trabalho das nossas lideranças reconhecidas do movimento indígena, em especial nesse caso ao dirigente da Foirn, que desenvolve ações na defesa dos direitos dos povos indígenas, reconhecida nos territórios de atuação da organização, a nível nacional e internacionalmente também.  

Quando a equipe de transição anunciou os primeiros nomes que iriam compor o GT para Povos Indígenas, a Apib fez a pressão necessária para pedir mais participação de lideranças de outras regiões do Brasil com a finalidade de buscar um equilíbrio de representatividade política da diversidade dos povos indígenas neste espaço. O pedido foi aceito e não foi necessário atacar a legitimidade de nenhum parente para isso. 

A Apib, Coiab e todas as nossas organizações regionais de base reafirmam que apoiam a indicação de Marivelton Baré, da mesma forma que apoiamos todos os outros membros indígenas que estão compondo a equipe de transição do Governo Lula. Exigimos respeito com nosso parente Marivelton e acreditamos que a setorial do PT deve recorrer às instâncias devidas do seu próprio partido para articular participação nos espaços políticos criados. 

Brasília, 20 de novembro de 2022

O Ministério dos Povos Originários deve ser uma construção coletiva com o movimento indígena brasileiro

O Ministério dos Povos Originários deve ser uma construção coletiva com o movimento indígena brasileiro

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) está reunida em Brasília com grupo de lideranças indígenas políticas e técnicas que integram o “Grupo de Trabalho – Governança Indígena”

Além da incansável luta pelas demarcações e o direito à vida, a governança indígena tornou-se uma pauta essencial do movimento indígena. Desde a campanha eleitoral, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) dentro de suas estratégias de luta sempre priorizou a ocupação de espaços institucionais na perspectiva de ser protagonista na tomada de decisões nas instâncias de poder. Neste sentido, constitui exemplo importante a vitória nas últimas eleições das deputadas federais Sônia Guajajara e Célia Xakriabá, lideranças do movimento indígena.

Para a Apib, a vitória do presidente Lula contra o candidato da extrema direita constitui uma conquista histórica. Durante sua participação na 18ª edição da maior mobilização indígena do Brasil, o Acampamento Terra Livre (ATL), realizado em abril de 2022 e com a participação de mais de 8.000 (oito mil) indígenas, Lula prometeu, se eleito, que criaria o Ministério dos Povos Originários e faria um “revogaço” de todas as medidas anti-indígenas adotadas pelo atual governo.

No decorrer da campanha eleitoral, Lula reiterou que o Ministério dos Povos Originários seria criado e conduzido por uma liderança indígena e que a participação em outros espaços de governo seria consultada, debatida e indicada pelo movimento indígena. Após eleito, o Presidente Lula, anunciou a partir do Gabinete de Transição e durante a COP 27, a criação do Ministério dos Povos Originários.

A Apib e suas organizações regionais decidiu criar um Grupo de Trabalho (GT) para construir o “Plano de Governança Indígena” visando subsidiar a equipe que irá compor o Grupo Temático “Povos Originários” do Comitê de Transição Governamental, priorizando medidas para os 100 primeiros dias de governo.

O Plano é dividido em seis grandes eixos, sendo eles: 1. Direitos Territoriais Indígenas: Demarcação e Proteção Territorial; 2. Restabelecimento de/ou criação de instituições e políticas sociais para povos indígenas; 3. Retomada e/ou criação de instituições e espaços de participação e/ou controle social; 4. Agenda Legislativa: interrupção de iniciativas anti-indígenas no congresso e ameaças no judiciário; 5. Agenda ambiental; e 6. Articulação e incidência internacional e composição de alianças e parcerias.

Na manhã da quarta-feira, 16 de novembro, o Gabinete de Transição Governamental anunciou os nomes que vão compor o grupo temático “Povos Originários”, onde constam 8 (oito) indígenas designados pela equipe de transição. No entanto, reforçamos que a participação da Apib, maior organização indígena do Brasil, deve ser considerada, levando em conta a diversidade regional que a organização e o movimento indígena brasileiro têm como estrutura e de acordo com as indicações encaminhadas previamente pela organização ao Gabinete de Transição.

Neste momento, o “Grupo de Trabalho – Governança Indígena” indicado pelas organizações de base da Apib, está reunido em Brasília, e reitera a importância da decisão do movimento indígena incidir na transição de governo bem como na estrutura governamental do próximo período.

 

Sobre proteção urgente do Cerrado e outros ecossistemas naturais

Sobre proteção urgente do Cerrado e outros ecossistemas naturais

Nós da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais e Quilombolas (CONAQ) ressaltamos a nossa posição em defesa de todos os ecossistemas naturais do Brasil. É de extrema relevância que as negociações climáticas levem em conta florestas, mas também savanas, campos, áreas úmidas e todas as diversas expressões da natureza ao redor do mundo. Essas paisagens também contribuem para a luta contra a mudança do clima e fazem parte de soluções para um mundo com mais sustentabilidade, inclusão e justiça social.

Nós instamos à União Europeia a tomar as medidas necessárias urgentes para prevenir o desmatamento importado a partir de florestas, e também o desmatamento importado de outras áreas arbóreas nativas. Isso é crucial no contexto do Cerrado, uma vez que a maior parte da soja exportada para a União Europeia é produzida neste bioma tão ameaçado.

O Cerrado não é área degradada, é a savana mais rica do Planeta. É casa de centenas de povos, culturas e territórios indígenas, quilombolas, geraizeiros* e outras  populações e culturas  tradicionais. Também é a maior fronteira agrícola do mundo e de maior impacto da soja importada na Europa. Ferramentas de monitoramento já estão disponíveis para garantir a proteção do Cerrado – é só ter vontade política!

O mesmo vale para todos os outros ecossistemas naturais que não são florestas: Pampa, Pantanal, Caatinga e também Mata Atlântica.

Se a regulação europeia contra o desmatamento se restringir apenas a proteger florestas, ela terá um impacto muito limitado, já que cerca de 75% do Cerrado continuariam desprotegidos. Também 76% do Pantanal e dos Pampas e quase 90% da Caatinga. Além disso, a regulação europeia ainda teria um efeito perverso, pois aumentaria a pressão de destruição sobre esses ecossistemas  e seus povos.

Em última instância, ao restringir-se a florestas, a regulação europeia contra o desmatamento teria o efeito contrário do seu objetivo original. Portanto, essa lei precisa também incluir áreas de “outras áreas arbóreas nativas” (savanas primárias), e não apenas florestas nativas.

Isso permitiria aumentar a proteção do Cerrado de 26% para 82%, do Pantanal de 24% para 42% e da Caatinga de 11% para 93%. O Cerrado brasileiro está perdendo quase um milhão de hectares a cada ano, e essa destruição está aumentando. Uma eventual revisão da lei a ser discutida daqui a 2 anos não vai evitar a perda de milhões de hectares de ecossistemas valiosos, a emissão de milhões de toneladas de carbono, nem as agressões violentas a centenas de territórios e povos tradicionais. Por isso, reiteramos o nosso pleito:

A LEGISLAÇÃO EUROPEIA SOBRE DESMATAMENTO DEVE GARANTIR OS DIREITOS HUMANOS DE TODOS OS POVOS INDÍGENAS, QUILOMBOLAS E TRADICIONAIS E  CONTEMPLAR TODO O CERRADO E OUTROS ECOSSISTEMAS NATURAIS DESDE JÁ, INCLUINDO “OUTRAS ÁREAS ARBÓREAS” NATIVAS E PRIMÁRIAS NO ESCOPO DO TEXTO DE LEI A SER APROVADO AINDA NESTE ANO.

Para detalhes técnicos sobre esse tema, acesse os seguintes documentos: 

Egito, Sharm el Sheikh, 15 de Novembro de 2022

ARTICULAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS DO BRASIL – APIB

Governo Bolsonaro apresenta relatório mentiroso no Conselho de Direitos Humanos da ONU em Genebra

Relatório afirma que Brasil se engajou na proteção dos povos indígenas durante a pandemia da Covid-19, o que não ocorreu

Neste 14 de novembro a situação dos direitos humanos no Brasil foi analisada na Revisão Periódica Universal (RPU) do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, um processo único que envolve uma revisão dos registros de direitos humanos de todos os Estados Membros da ONU. 

O relatório apresentado pelo Governo do Brasil afirma mentirosamente que desde o início da pandemia da Covid-19 o Brasil se engajou na proteção dos indígenas. Não podemos esquecer que o governo Bolsonaro utilizou-se da pandemia para exterminar os povos indígenas, com negligência e descaso em relação à vacinação e oferta de assistência médica aos povos originários. O  Brasil não efetivou uma política diferenciada para os povos indígenas durante a pandemia e contribuiu para as invasões territoriais e para o agravamento de problemas em todas políticas públicas e serviços às populações indígenas. Foi necessário que a Apib, em meio à pandemia, acionasse o Supremo Tribunal Federal para que o governo mantivesse medidas de proteção aos povos indígenas. 

A Apib denunciou ao mundo essa prática genocida de Bolsonaro, inclusive ao Tribunal Penal Internacional em Haia, uma vez que o sistema de justiça brasileiro se mostrou incapaz de investigar, processar e julgar essa conduta criminosa. 

Nós aguardamos que o relatório mentiroso apresentado pelo Brasil no Conselho de Direitos Humanos da ONU seja enfaticamente criticado pelos Governos, sociedade civil e comunidade internacional como um todo.

COP27: Demarcar Terras e Mentes para o futuro do planeta

COP27: Demarcar Terras e Mentes para o futuro do planeta

Nota da Apib para o novo Governo Lula e para o mundo 

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), em conjunto com suas organizações regionais de base, está presente na 27ª Conferência da ONU sobre Mudanças climáticas para reafirmar o que é preciso ser feito para que a crise global do clima seja enfrentada de frente: DEMARCAR NOSSAS TERRAS INDÍGENAS! 

Estamos no Egito com uma delegação indígena composta por mulheres, homens e jovens, que vivem em todos os 6 biomas existentes no Brasil. Ocupamos este espaço, pois sabemos que para que nossas Terras e Vidas sejam protegidas ainda é preciso demarcar as mentes da humanidade. Representantes de governos, ativistas, dirigentes de organizações de direitos humanos e socioambientais, precisam compreender e apoiar os povos indígenas nessa missão ancestral de cuidados com nossa MÃE TERRA. 

Para todo o mundo esta é a COP que marca a volta do Brasil para a discussão das agendas sobre mudanças climáticas, direitos humanos e socioambiental, depois dos últimos quatro anos de um desgoverno genocida e ecocida. A vitória eleitoral do presidente Lula, apoiada pela Apib e todas as suas organizações, marca um novo momento do Brasil no cenário nacional e internacional. 

Sem nossos territórios, os índices de emissão de gases de efeito estufa seriam ainda mais drásticos. Apenas em 2021, o Brasil registrou a maior alta no despejo de CO2 na atmosfera dos últimos 19 anos. Foram despejados 2,42 bilhões de toneladas desses poluentes. 

No cenário internacional, o Parlamento Europeu está em processo de aprovação da lei anti desmatamento e precisa garantir rastreabilidade de commoditiies para além das florestas.  Obrigar empresas produtoras de commodities a respeitarem a preservação da nossa biodiversidade e os direitos dos povos indígenas é fundamental neste momento. A lei da União Europeia precisa cobrar rastreabilidade das commodities de todos as vegetações nativas. Só assim os mercados consumidores estarão tomando ações para uma cadeia livre de desmatamento e sangue indígena. O Cerrado, a Caatinga, o Pampa e o Pantanal também precisam estar enquadrados no conceito de vegetação da Lei, para além das florestas como Amazônia e Mata Atlântica, independentemente da definição de florestas da Organização da ONU para a Alimentação e Agricultura (FAO). 

Da promessa feita por países e instituições filantrópicas na última COP26, em 2021, de garantir 1,7 bilhões para povos indígenas e comunidades locais, apenas 19% foi aplicado. Desse montante, somente 7% foi destinado diretamente para organizações de povos indígenas, segundo relatório do grupo de financiadores desta proposta. Ou seja, por mais um ano, povos indígenas seguem sendo diretamente impactados pela crise climática, mas sem acesso direto aos mecanismos financeiros para fortalecerem suas ações de enfrentamento.

Diante deste cenário nós do movimento indígena, representados pela Apib, reforçamos ao presidente Lula e toda sua equipe de transição que: 

  1. As demarcações das Terras Indígenas sejam colocadas como agenda central no enfrentamento das mudanças climáticas do Governo Lula; 
  2. As cinco Terras indígenas, que estão com todo o seu processo de Demarcação realizados e aguardam apenas o decreto de homologação, sejam assinados como ato de compromisso com os povos indígenas nos primeiros dias de governo; 
  3. O Governo Lula apoie a inclusão dos biomas Cerrado, Mata Atlântica, Caatinga, Pampa, Pantanal e Amazônia na Lei Anti Desmatamento do Parlamento Europeu;
  4. Compromisso com o desmatamento ZERO;
  5. Resposta sobre pedido feito pela Apib ao Governo de Transição de incluir a participação de lideranças indígenas nos espaços de construção do processo de transição para rediscussão sobre a agenda indígena dentro do Governo (Funai, Sesai…) e do recém criado Ministério dos Povos Originários;

 Egito, Sharm el Sheikh, 14 de novembro de 2022

ARTICULAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS DO BRASIL – APIB

Nota pública contra à redução orçamentária da saúde indígena proposta pelo governo de Jair Bolsonaro na PLOA 2023

Encaminhado ao Congresso Nacional pelo governo de Jair Bolsonaro, o Projeto de Lei Orçamentária de 2023 (PLOA) propõe um corte no orçamento do Subsistema de Saúde Indígena, que chega a casa dos 59%, se comparado com o orçamento autorizado em 2022.

Com isso, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) torna público nesta sexta-feira (28/10) uma nota contra a redução orçamentária da saúde indígena. A Apib manifesta indignação e preocupação com o futuro sombrio desenhado por Bolsonaro para a saúde dos povos originários do país.

Vinculado ao Sistema Único de Saúde (SASI/SUS), o Subsistema é organizado a partir de 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs), que garantem às comunidades de difícil acesso à atenção básica e o atendimento preventivo e cotidiano à saúde para os seus moradores.

O Subsistema faz parte das responsabilidades do Governo Federal e é uma conquista do movimento indígena que integra as políticas públicas específicas e diferenciadas para os povos indígenas, conforme consta na Constituição Federal de 1988.

Confira a nota na íntegra:

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APIB declara apoio a Lula no 2º turno das Eleições presidenciais

APIB declara apoio a Lula no 2º turno das Eleições presidenciais

Foto: @kaititopramrefoto

Mobilização ‘Aldear a Política’, que contabilizou 446 mil votos em candidatos indígenas no 1º turno e as organizações de base da Apib reforçam apoio a Lula.

Em carta aberta aos Povos Indígenas e ao Brasil, divulgada nesta quinta-feira, 13.10, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) declarou, oficialmente, apoio ao candidato Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno das Eleições presidenciais 2022. O posicionamento foi anunciado durante coletiva de imprensa realizada na sede do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal, em Brasília.

O evento reuniu representantes de várias etnias, membros da coordenação executiva da Apib, além das candidatas eleitas pela Bancada Indígena, Célia Xakriabá (MG) e Sônia Guajajara (SP) e de mulheres integrantes da Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga). 

“As candidaturas indígenas que fizeram parte da Bancada Indígena da Apib tiveram mais de 446 mil votos nas urnas. Demonstramos a força da mobilização coletiva para ocupação das Casas Legislativas estadual e federal, encabeçando, principalmente, a questão da identidade territorial por meio da retomada da demarcação de territórios, principal luta do movimento indígena”, diz trecho do documento. 

O chamado convoca as bases para atuar, por meio de sensibilização, junto a quem não votou no primeiro turno seja por abstenção ou pela opção do voto nulo ou em branco.  Além disso, reforça a necessidade do retorno às demarcações e proteção dos territórios, a reestruturação das instituições responsáveis pelas políticas públicas voltadas aos povos originários e a retomada dos compromissos ambientais internacionais assumidos pelo Brasil em relação ao clima e ao meio ambiente. 

A carta traz ainda, em oito pontos, uma análise de conjuntura do contexto de violações contra os direitos humanos, cometidos pelo atual governo ao longo dos últimos quatro anos. Entre elas estão: a paralisação da demarcação de terras indígenas; omissão e morosidade no atendimento às comunidades, principalmente no período da pandemia de Covid-19; desmonte de instituições e políticas públicas específicas e diferenciadas garantidas na Constituição Federal de 88; violação do direito de consulta livre, prévia e informada assegurada aos povos pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT); e propositura de leis antiindígenas, em consonância com o Congresso Nacional. 

“Vamos construir um novo horizonte, de respeito total aos nossos direitos fundamentais, à nossa vida e dignidade, no marco de uma nova relação com o Estado brasileiro, multiétnico e cultural, que ainda tem muitas dívidas a pagar pelo histórico de violência e morte, física e cultural, que por séculos vitimou os nossos povos e comunidades”, destaca outro trecho da carta aberta.

“Neste momento, somos um movimento unificado. Viemos romper com o racismo da ofensa, retomar o Brasil que foi arrancado de nós; Nunca existiu Brasil sem a nossa presença. Nossa candidatura trouxe uma reflexão diferente: vimos pessoas que votavam em mulheres e em outros candidatos presidenciais. Agora, não existem duas pautas, não se trata de partido, mas de plano de vida ou plano da morte”, afirmou a deputada eleita pela Bancada Indígena, Célia Xakriabá (PSOL-MG). 

Ela lembrou ainda que, em 2021, a Apib denunciou o presidente Jair Bolsonaro junto Tribunal de Haia por crimes contra a humanidade, que incluiu o desmantelamento das estruturas públicas de proteção socioambiental e aos povos indígenas, o que desencadeou invasões nas Terras Indígenas, desmatamento e incêndios nos biomas brasileiros, além do aumento do garimpo e da mineração nos territórios. A denúncia foi atualizada em junho, incluindo a negligência nas buscas por Bruno da Cunha Araújo Pereira e Dom Phillips e a barbárie no território Yanomami.

A deputada Sônia Guajajara (PSOL-SP) lembrou que os povos indígenas sempre estiveram na luta pela cobrança de seus direitos, em todos os governos, e que este fato nunca significou ignorar lacunas deixadas em gestões anteriores. 

“O voto no presidente Lula é para podemos ter o direito de continuar brigando por nossas pautas. Sempre fomos recebidos. Enquanto nossas pautas não forem atendidas, nossos povos estiverem em segurança nos territórios, a gente não vai deixar de exigir ou cobrar essa responsabilização do estado brasileiro”, afirmou a deputada eleita por São Paulo. 

“A política e o projeto de genocídio deste governo não tem comparação a nenhum outro momento histórico do Brasil. Não podemos adiar o processo de retomada da democracia”, completou. 

 Aldear o Congresso

Na ocasião, as deputadas eleitas Sônia Guajajara e Célia Xakriabá, avaliaram como positivo o movimento ‘Aldear a Política’, que trabalhou de forma articulada e coletiva em todo o Brasil para conseguir aumentar o número de representantes da Bancada Indígena no Congresso Nacional.

O resultado foi um crescimento de 100% em relação à última eleição proporcional, em 2018, quando a deputada federal Joênia Wapichana tornou-se a primeira mulher indígena eleita como deputada federal.

“Este é um recado para além do saldo eleitoral: estamos trazendo uma voz importante de um Brasil que reconhece que nós existimos e que estamos vivendo um ecocídio contra a humanidade”, afirmou. Xakriabá afirmou que os povos indígenas representa 5% da população mundial, responsável pela proteção de mais de 80% do patrimônio natural do planeta. 

“A presença da Joênia (Wapichana) no Congresso foi fundamental para a gente entender que era necessário ampliar nossa voz. A forma de fazer campanha no Brasil ainda é muito desigual, mas conseguimos chegar e estaremos lá fazendo jus a esse voto e a essa consciência política ambiental para salvar a mãe Terra”, afirmou Sônia Gujajara. 

Ela ressaltou que priorizará a retomada da demarcação das terras indígenas, a Politica Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGAT) e o Conselho Nacional de Políticas Indigenistas (CNPI), por meio de alianças com candidatos eleitos provenientes de movimentos e segmentos sociais sub-representados no Parlamento. O objetivo é formar uma linha de enfrentamento da agenda de retrocessos na Câmara dos Deputados.

ATL 2022

Há 28 anos, em 1994, as organizações dos povos indígenas do Brasil pautavam a democracia junto ao presidente Lula. Na ocasião, a liderança Fausto Mandulão, de Roraima, fez a entrega de um manifesto, solicitando a proteção dos direitos constitucionais à terra, à saúde, à educação e à representatividade dos povos nas instâncias do governo. 

Em abril deste ano, a Apib divulgou carta compromisso endereçada ao então pré-candidato Luiz Inácio Lula da Silva, durante a 18° edição do Acampamento Terra Livre (ATL), maior mobilização nacional indígena que reuniu mais de 8 mil parentes de 200 povos diferentes. 

Na ocasião, o movimento indígena anunciou os cinco eixos de ação necessários para assegurar a defesa dos direitos fundamentais dos povos indígenas no Brasil: Direitos territoriais indígenas: demarcação e proteção aos territórios indígenas (Eixo 1); Retomada dos espaços de participação e controle social indígenas (Eixo 2); Reconstrução de políticas e instituições indígenas (Eixo 3); Interrupção da agenda anti-indígena no congresso federal (Eixo 4) e Agenda ambiental (Eixo 5). 

 

Carta da Apib aos povos indígenas e ao Brasil: Por que votar em Lula dia 30 de Outubro

Carta da Apib aos povos indígenas e ao Brasil: Por que votar em Lula dia 30 de Outubro

Foto: @scarlettrphoto

O resultado das eleições do 1º turno, em 2 de outubro, certamente gerou um sentimento de frustração nos cidadãos e cidadãs que votaram no ex-presidente Lula e que tinham a expectativa de “mandar para casa” o neofascista Jair Bolsonaro e dar um passo fundamental para o enterro do bolsonarismo – fenômeno político que aglutina desde 2018 os setores mais reacionários e de extrema-direita do país, turbinado pelos partidos de direita que compõem o chamado Centrão no Congresso Nacional e que ainda conseguem iludir amplos setores da população.

Bolsonaro conseguiu reverter o cenário desfavorável que vinha prevalecendo nas pesquisas durante a campanha. Numa guerra-relâmpago em que associou Lula ao tema da corrupção, unificou e fortaleceu o antipetismo, se apresentou como “homem do povo”, conseguindo esconder com mentiras deslavadas (dizendo, por exemplo, que sempre deu atenção especial às mulheres) as maldades que cometeu durante seu governo, como: a fome que atinge mais de 33 milhões de pessoas, discursos de ódio, racismo, misoginia e LGBTQIA+fobia; ódio explícito aos povos originários e quilombolas; negacionismo e deboche para com as pessoas morrendo durante a pandemia de Covid-19; aumento do desemprego e da fome; desmonte da política ambiental e dos órgãos de controle e fiscalização; extinção ou aparelhamento de distintos colegiados de participação e controle social; liberação de armas, sobretudo, a proprietários rurais; incentivo às invasões e, portanto, à violência e prática de atos ilícitos em terras da União e áreas protegidas (terras e territórios indígenas, territórios quilombolas, reservas extrativistas, parques nacionais, unidades de conservação), principalmente, na Amazônia; corrupção e redução ou contingenciamento de recursos de serviços públicos fundamentais, como saúde e educação, em favor do orçamento secreto disponibilizado a parlamentares de sua base de apoio para fins eleitorais. Em suma, ameaças recorrentes à ordem institucional e democrática e ao Estado de Direito.

Do mesmo modo, é temerosa a nova composição do Congresso Nacional que saiu das urnas ainda mais conservadora. O bolsonarismo não só levou Bolsonaro ao segundo turno, como também elegeu muitos dos seus, assim como o Partido Liberal (PL), legenda do candidato, que terá a maior bancada tanto no Senado Federal quanto na Câmara dos Deputados, além de um centrão mais fortalecido.

Não há dúvidas que essa base parlamentar irá priorizar no Senado Federal, inclusive ainda este ano, a aprovação do “pacote da destruição”, que envolve a desregulamentação do licenciamento ambiental, a legalização de agrotóxicos já proibidos na Europa e a aprovação de novas normas para a regularização fundiária, que visam legalizar a grilagem em terras públicas da União. Na Câmara dos Deputados, no mesmo sentido, sob comando do mau político Arthur Lira, direitos conquistados no pacto constitucional de 1988 poderão sofrer graves reveses.

O cenário é frustrante e assustador, porém o resultado do primeiro turno mostrou que mais da metade dos eleitores votou contra Bolsonaro (cerca de 60%). Apenas Lula obteve o voto de mais de 57,2 milhões de eleitores (48,43% dos votos válidos), colocando-se à frente na disputa presidencial com 6,1 milhões de votos de vantagem, faltando apenas 1,6% para vencer nesta primeira rodada. Daí, nota-se o quanto é relevante ter o ex-presidente na disputa, porque sem ele se torna inimaginável o futuro do nosso país, da democracia, dos direitos fundamentais consagrados na Constituição Federal e do Estado de direito.

É importante observar, ainda, que esta vitória expressiva de Lula certamente demonstrou um notável avanço e foi resultado da retomada das lutas e mobilizações dos movimentos sociais, sindicais e populares, dos partidos da Federação e da Frente Ampla costurada pelo ex-presidente em torno de um projeto de defesa da democracia, de mudança e reconstrução do Brasil. De fato, vê-se que Lula prima pela justiça social e pelo respeito às diversidades étnicas e culturais, de gênero e de orientação sexual, ao lutar contra o autoritarismo, contra o império da violência e do ódio, contra o racismo e contra o desprezo pelo povo, pela vida e pela dignidade humana –  consubstanciais a Bolsonaro e a sua horda de seguidores, civis, fundamentalistas, militares e milicianos.

ALDEAR O CONGRESSO

Reforçamos o resultado histórico para o movimento indígena nessas eleições. Os estados de São Paulo e Minas Gerais elegeram Sônia Guajajara e Célia Xakriabá como representantes no Congresso Nacional. O saldo representa um crescimento de 100% em relação à última eleição proporcional, em 2018, quando a deputada federal Joênia Wapichana tornou-se a primeira mulher indígena eleita como deputada federal.

As candidaturas indígenas que fizeram parte da Bancada Indígena da Apib tiveram mais de 446 mil votos nas urnas. Demonstramos a força da mobilização coletiva para ocupação das Casas Legislativas estadual e federal, encabeçando, principalmente, a questão da identidade territorial por meio da retomada da demarcação de territórios, principal luta do movimento indígena.

Acrescentamos a esse avanço a eleição de candidatos e candidatas provenientes de movimentos e segmentos sociais sub-representados no Parlamento. A união dessas forças sociais no Congresso Nacional será a linha de frente no enfrentamento da agenda de retrocessos na Câmara dos Deputados.

MAS POR QUE NÓS, POVOS INDÍGENAS, DEVEMOS VOTAR EM LULA?

Não é só por esse cenário de maldades que definem o candidato Bolsonaro que os povos indígenas devem votar no ex-presidente Lula. Reforçamos a carta aberta entregue à Lula durante o Acampamento Terra Livre, dia 12 de abril. “Precisamos interromper esses processos de destruição. Nossa luta é por nossos Povos, sim, mas também pelo futuro de todos e todas as brasileiras e pela humanidade inteira! É hora de construirmos um projeto civilizatório de país e de mundo.”

Na recente história democrática do Brasil, nunca os direitos dos povos indígenas foram tão execrados como neste mandato de Jair Bolsonaro que, publicamente, desde antes de sua eleição em 2018, escolheu os nossos povos como inimigos e tomou a determinação de desmontar a política indigenista, sucatear e entregar a Fundação Nacional do Índio (Funai) à gestão da Frente Parlamentar Agropecuária  (FPA), isto é, à bancada ruralista.

Dessa forma, os direitos fundamentais dos nossos povos foram submetidos a um regime de regressão e supressão, seja por meio de medidas administrativas (circulares, instruções normativas, portarias ou decretos), jurídicas (pareceres  e determinações da Advocacia Geral da União (AGU) e da Funai, ou de dezenas de iniciativas legislativas (Medidas Provisórias – MPs, Projetos de Lei – PLs, Projetos de Emenda Constitucional – PECs, Decretos Legislativos, Projetos de Lei Complementar) que colocam em risco a nossa vida e continuidade enquanto povos social, étnica e culturalmente diferenciados, representantes dos mais de 305 povos diferentes e falantes de mais de 274 línguas.

Bolsonaro massacrou os direitos indígenas, dentre outras, com as seguintes políticas e atos governamentais:

  1. Paralisou totalmente a demarcação e proteção das terras indígenas, ameaçando de descaracterização e extinção os nossos povos, particularmente aqueles em situação de isolamento voluntário. Para que isso acontecesse, entre outras medidas, desmantelou a Funai, com a redução orçamentária ou não aplicação dos recursos disponíveis, com a exoneração de técnicos especialistas, nas distintas áreas, e com a contratação de cargos comissionados e nomeação de coordenadores regionais, na sua maioria militares, totalmente sem preparo para lidar com as questões indígenas, tornando o órgão, assim, numa “Fundação Anti-Indígena”.
  1. Incentivou e legitimou, com sua política de devastação, as mais variadas formas de invasão nas nossas terras e territórios – protagonizadas por grileiros, desmatadores, madeireiras, pecuaristas, garimpeiros, pescadores e caçadores ilegais e traficantes –, às quais se somam a expansão das fronteiras agrícolas, dos monocultivos caros ao agronegócio (eucalipto, soja transgénica, cana de açúcar, milho transgênico, palma africana, laranja, etc), a mineração industrial e os empreendimentos de infraestrutura (hidrelétricas – grandes ou pequenas –, portos e estradas).
  1. Com essa política, Bolsonaro foi conivente com o aumento dos conflitos e da violência contra os nossos povos. Comunidades foram vítimas de massacres (como o caso dos Guarani kaiowá), lideranças foram criminalizadas e assassinadas em distintas regiões do país (Mato Grosso do Sul, Roraima, Maranhão, Bahia) por defenderem o seu território, mulheres foram estupradas e crianças morreram por contaminação do mercúrio ou desnutrição e falta de assistência médica.
  1. Como consequência de sua política negacionista, a respeito da ciência e das vacinas, e pelo descaso, omissão e morosidade no atendimento aos nossos povos e comunidades, Bolsonaro foi responsável pela morte de mais de 1300 de nossos parentes durante a pandemia de Covid-19, até ser forçado a tomar medidas sob determinação judicial, após a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 709) pleiteada pela APIB junto ao Supremo Tribunal Federal (STF).
  1. Desmontou as instituições e políticas públicas específicas e diferenciadas conquistadas pelas lideranças que nos antecederam na Constituição Federal de 1988, relacionadas com a saúde, a educação, o esporte, a cultura, alternativas econômicas e espaços de participação e controle social.
  1. Em efeito, Bolsonaro extinguiu distintos colegiados em que os nossos povos eram representados, principalmente a Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI) – espaço paritário de diálogo, articulação, orientação e monitoramento das ações do governo. Inviabilizou a implementação do Plano Integrado da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental nas Terras Indígenas (PNGATI), com o fim do Comitê Gestor. Da mesma forma, suprimiu a participação da APIB e organizações membro no Fórum de Presidentes de Conselhos Distritais (FCONDISI) e de representantes da sociedade civil no Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) e no Conselho de Segurança Alimentar (CONSEA), entre outros.
  1. Bolsonaro desrespeitou totalmente o direito de consulta livre, prévia e informada assegurada aos nossos povos pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), lei com status constitucional, sobre quaisquer assuntos administrativos e legislativos que os afetam. Ignorou, portanto, os protocolos comunitários construídos pelos nossos povos e comunidades para eventual caso de possibilidade de consulta.
  1. O candidato em questão, em comum acordo com seus líderes no Congresso Nacional – a bancada ruralista e evangélica, principalmente, e o presidente da Câmara Arthur Lira –, promoveu proposituras de lei, dentre as que se destacam o PL 191, relativo à mineração em terras indígenas que, além da mineração industrial, quer legalizar o garimpo, e o PL 490 que, além de transferir para o Congresso Nacional a prerrogativa de demarcar as terras indígenas, busca a aprovação do Marco Temporal, medida que estabelece a data de promulgação da Constituição (5 de outubro de 1988) como referência do reconhecimento do nosso direito territorial. Essas iniciativas, junto com o pacote de destruição em trâmite no Senado Federal, e a eventual aprovação desfavorável a nós pelo Marco Temporal na Suprema Corte, se aprovadas, implicarão na supressão fatal do nosso direito originário e congênito, às terras que tradicionalmente ocupamos, homologadas ou não.

Por tudo isso é que neste cenário de polarização, não entre esquerda e direita, mas entre centro-esquerda e extrema-direita, entre democracia e regime autoritário – ditatorial –, entre paz e violência, e entre justiça social e desigualdades, é que os povos indígenas devem votar no ex-presidente Lula no segundo turno das eleições, marcado para o dia 30 de outubro.  Da mesma forma, é por tudo isso que nós, povos indígenas, devemos votar nos candidatos ao governo estadual que estejam identificados com a nossa causa e que, por ventura, estejam disputando o segundo turno com candidatos bolsonaristas.

Tomar lado neste momento é uma responsabilidade e tanto com a vida dos nossos povos, das nossas atuais e futuras gerações, é um imperativo ético e um dever de lealdade à memória dos nossos ancestrais e lideranças que deram a vida para assegurar o pouco que nos sobrou após as sucessivas atrocidades, práticas genocidas, esbulhos e todo tipo de violência praticada pelos invasores de todos os tempos contra os nossos povos e territórios.

Nesse sentido, é imprescindível que os povos, organizações e lideranças indígenas de todas as regiões do país se empenhem totalmente na Campanha Lula Presidente pelo Brasil da Esperança. Não podemos nos intimidar. O direito de manifestação e o livre exercício do voto é garantido pela Constituição Federal. Vamos nos envolver em panfletagens, bandeiraços e diálogos com as nossas bases, sem violência. Vamos sensibilizar a quem não votou no primeiro turno – a quem se absteve –, ou a quem votou nulo ou em branco. Enfim, vamos nos mobilizar, para que ao se eleger o Presidente Lula, possamos continuar a nossa luta de forma autônoma, em defesa dos nossos direitos, resgatando as nossas conquistas arrancadas com muita luta em governo anteriores. Vamos construir um novo horizonte, de respeito total aos nossos direitos fundamentais, à nossa vida e dignidade, no marco de uma nova relação com o Estado brasileiro, multiétnico e cultural, que ainda tem muitas dívidas a pagar pelo histórico de violência e morte, física e cultural, que por séculos vitimou os nossos povos e comunidades.

PELO BEM VIVER DOS NOSSOS POVOS, LULA PRESIDENTE!

Brasília – DF, 13 de outubro de 2022.

ARTICULAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS DO BRASIL – APIB

Apib repudia aprovação de novo Estatuto e mudanças na estrutura da Funai

Apib repudia aprovação de novo Estatuto e mudanças na estrutura da Funai

Decreto aprovado no dia 7 outubro extingue comitês regionais e do Conselho Fiscal

A Articulação dos Povos Indígenas (Apib) manifesta preocupação e repudia o decreto n. 11.226/2022, publicado no dia 7 de outubro, que aprova o Estatuto e o Quadro Demonstrativo dos Cargos em Comissão e das Funções de Confiança da Fundação Nacional do Índio (Funai).

O decreto remaneja e transforma cargos em comissão em funções de confiança, extingue os comitês regionais e do Conselho Fiscal, bem como determina o fim das atribuições das Coordenações Regionais, Coordenações das Frentes de Proteção Etnoambiental e Coordenações Técnicas Locais.

O decreto remaneja e transforma cargos em comissão em funções de confiança, extingue os comitês regionais e do Conselho Fiscal, bem como determina o fim das atribuições das Coordenações Regionais, Coordenações das Frentes de Proteção Etnoambiental e Coordenações Técnicas Locais.

Em nota jurídica, a Apib afirma que o decreto que aprova o novo Estatuto fere o princípio da consulta dos povos indígenas, consagrado no art. 6º, da Convenção 169 da OIT, norma que faz parte do ordenamento jurídico brasileiro.

Funai anti-indígena

Com Marcelo Xavier na presidência da fundação, desde 2019 a Funai atua como instrumento da política anti-indígena do Governo Bolsonaro. Um exemplo disso é que a fundação passou a retardar processos de demarcação de Terras Indígenas que já estavam em andamento, pedindo uma nova análise de cerca de 27 processos de demarcação que já estavam em seus trâmites finais.

Já em abril de 2020, a Funai editou a Instrução Normativa (IN) nº 09/2020, que permite a certificação de propriedades privadas em áreas de ocupação tradicional, o que facilita invasões em territórios indígenas e legitima a grilagem. Com isso, em maio do mesmo ano, mais 72 fazendas foram certificadas em terras indígenas não homologadas.

Confira a linha do tempo completa da Funai de Marcelo Xavier aqui: https://apiboficial.org/foraxavier/

Leia a análise jurídica da Apib abaixo:

Análise_Decreto_N.11226_2022_Funai