Comissão Interamericana de Direitos Humanos expressa preocupação e alerta sobre riscos do Marco Temporal

Comissão Interamericana de Direitos Humanos expressa preocupação e alerta sobre riscos do Marco Temporal

CIDH afirma que a tese contraria os padrões universais de direitos humanos colocando em risco a vida dos povos indígenas do Brasil

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) publicou, nesta quarta-feira (31/05), um comunicado para afirmar que a tese jurídica do Marco Temporal coloca em risco a vida dos povos indígenas do Brasil. A nota acontece na semana anterior à retomada do julgamento do Marco Temporal, no Supremo Tribunal Federal (STF), previsto para o dia 7 de junho e um dia após a Câmara dos Deputados ter aprovado o Projeto de Lei (PL) 490, que pretende tornar a tese em lei.

“A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) reitera sua preocupação com o possível reconhecimento jurídico da tese conhecida como “marco temporal” pelo Supremo Tribunal Federal (STF) do Brasil. A CIDH reafirma que a aplicação dessa tese contraria os padrões universais e interamericanos de direitos humanos, colocando em risco a própria existência dos povos indígenas”, reforça parte do comunicado.

Acesse a íntegra do comunicado da CIDH aqui
Saiba mais sobre o Marco Temporal aqui

Para a CIDH o Estado deve considerar os inúmeros casos em que povos indígenas foram deslocados à força de seus territórios por ações privadas ou por iniciativas do próprio Estado, e que, portanto, muitas vezes não estavam ocupando as terras reclamadas em 1988. Da mesma forma, é preciso considerar muitos deslocamentos ocorridos após 1988, que levaram ao reassentamento de muitas comunidades indígenas e tribais em outros territórios, os quais, na perspectiva da tese, também não teriam seus direitos reconhecidos.

“Devido à especial conexão que os povos indígenas possuem com seus territórios, o Sistema Interamericano de Direitos Humanos tem prestado atenção especial ao direito à propriedade coletiva. Isso se deve à estreita relação entre o território ancestral e as diversas práticas e tradições que compõem as cosmovisões desses coletivos, sendo esse vínculo uma condição essencial para a existência dos povos indígenas e tribais, o que requer medidas especiais de proteção.”, afirma o comunicado.

A Comissão reforça para que o Brasil tome “todas as medidas necessárias para fortalecer a proteção dos direitos dos povos indígenas e tribais, em conformidade com as normas interamericanas sobre o assunto. Da mesma forma, urge o Estado a abster-se de avançar com projetos de lei e interpretações legais que possam gerar riscos para os povos indígenas e tribais, incluindo o Projeto de Lei 490/2007 e outros.”

A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato deriva da Carta da OEA e da Convenção Americana de Direitos Humanos. A Comissão Interamericana está mandatada para promover a observância dos direitos humanos na região e atuar como órgão consultivo da OEA sobre o assunto. A CIDH é composta por sete membros independentes, eleitos pela Assembleia Geral da OEA em caráter pessoal, e não representam seus países de origem ou residência.

Apib e entidades acionam a ONU contra o PL 490 e Marco Temporal

Apib e entidades acionam a ONU contra o PL 490 e Marco Temporal

Foto @oguajajara / ascom Dep. Célia Xakriabá

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Conectas Direitos Humanos, Comissão Arns e o Instituto Socioambiental (Isa) pedem à ONU que reconheça a inconstitucionalidade do PL 490/2007, um projeto de lei que inviabiliza demarcações de terras indígenas, ameaçando territórios homologados e direitos fundamentais das comunidades.

O PL 490 defende o “marco temporal” e ignora violações de direitos históricos dos povos indígenas. A inconstitucionalidade da proposta, a falta de consulta e consentimento prévio e informado dos povos indígenas e os riscos à proteção ambiental e às mudanças climáticas são preocupações centrais.

Leia na íntegra aqui

Deputado Zeca do PT, de MS, ataca novamente indígenas e o secretário executivo do MPI

Deputado Zeca do PT, de MS, ataca novamente indígenas e o secretário executivo do MPI

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), por meio de seu departamento jurídico, e o Conselho do Povos Terena vem a público prestar solidariedade ao Secretário Executivo do Ministério dos Povos Indígenas, Dr. Eloy Terena e à Coordenadora Executiva da APIB Val Eloy Terena, em face de ataque proferido pelo Deputado Estadual Zeca do PT na Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul.

Luiz Eloy Terena é referência da luta indigenista. Com atuação no Supremo Tribunal Federal e em Organismos Internacionais, o advogado é pós-doutor em Antropologia Social pela École des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS), doutor em Antropologia Social pelo Museu Nacional (UFRJ) e em Sociologia e Direito pela Universidade Federal Fluminense. Quando Coordenador do Departamento Jurídico da APIB, foi o primeiro advogado indígena a vencer uma ação de jurisdição constitucional na história do STF (ADPF 709), oportunidade em que o tribunal reconheceu a legitimidade da APIB para defender direitos em nome próprio na Suprema Corte brasileira e obrigou o Governo Bolsonaro a adotar medidas para conter o contágio de COVID-19 em terras indígenas.

Val Eloy Terena é uma importante liderança indigena de Mato Grosso do Sul, fundadora da comunidade indígena Tumuné Kalivonó no município de Campo Grande. Val sempre esteve à frente das lutas dos povos indígenas pela demarcação de seus territórios no Estado. Hoje integra a diretoria executiva da principal organização indígena do país. Por esse motivo exigimos respeito.

Nos solidarizamos e repudiamos os ataques sofridos por Eloy e Val Terena. O advogado indígena destacou-se na atuação e defesa de direitos indígenas; isso o credenciou a ocupar o cargo de Secretário-Executivo do Ministério dos Povos Indígenas (MPI) e contribui, ainda hoje, para que o Governo Lula possa adotar ações que torne os direitos previstos da Constituição de 1988 eficazes. Val Eloy está à frente do movimento indígena a nível local e nacional nas últimas eleições foi a mulher indigena mais bem votada do Estado, sem sombra de dúvidas se tivesse sido eleita estaria fazendo muito mais pelos povos indígenas, do que os próprios deputados.

Zeca do PT anunciou que solicitaria a demissão de Eloy na data da votação do PL 490/07 (marco temporal) na Câmara dos Deputados. Na ocasião, insinuou que os conflitos agrários entre fazendeiros e povos indígenas seriam incitados por Eloy enquanto agente público e que os povos indígenas que se organizam coletivamente para reivindicar seus direitos seriam “bandalheiros” que não querem trabalhar. Por fim, Zeca defendeu a indenização a fazendeiros que ocupam territórios indígenas “de boa fé”. Parecíamos assistir o posicionamento de um bolsonarista; é inconcebível que o parlamentar permaneça no Partido dos Trabalhadores, pois o PT elegeu a pauta dos povos indígenas como prioridade.

A verdade é que os povos indígenas se mobilizam contra o marco temporal por livre iniciativa e convicção do projeto genocida. E o Ministério dos Povos Indígenas, liderado pela Ministra Sônia Guajajara e por Eloy Terena, é de fundamental importância para garantir a posse e o usufruto dos territórios demarcados pelos povos indígenas.

Sem demarcação, não há democracia! O Poder Legislativo, seja ele nacional ou estadual, tem que servir aos povos originários e não restringir seus direitos e atacar suas lideranças como na data de ontem (30/05/2023).

Mauricio Serpa França
Coordenador Jurídico da APIB
OAB/MS 24.060

A LUTA CONTINUA: Após derrota na Câmara, Apib reforça mobilização contra PL 490 no Senado

A LUTA CONTINUA: Após derrota na Câmara, Apib reforça mobilização contra PL 490 no Senado

Foto @oguajajara / Ascom Dep. Céli Xakriabá

Apib reforça que as mobilizações contra o PL 490 seguem por todo o Brasil

A LUTA CONTINUA | A Câmara dos Deputados aprovou, na noite desta terça-feira (30), o Projeto de Lei (PL) 490, que pretende transformar a tese do marco temporal, em lei. 283 deputados votaram a favor do projeto e outros 155 votaram contra. Agora a proposta segue para ser votada no Senado.

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) afirma que A LUTA CONTINUA e que as mobilizações do movimento indígena contra essa proposta anti-indígena seguirá até que o projeto seja derrotado no Congresso Nacional.

“A nossa voz é a prova de bala! Mesmo assassinando vários indígenas, no Brasil, não adianta tentar nos silenciar, vamos continuar lutando”, afirmou a deputada federal Célia Xakriabá, que coordena a Bancada do Cocar na Câmara dos Deputados e a Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Povos Indígenas.

Em nota técnica sobre o PL 490, a Apib alerta que a proposta, votada pelos deputados, hoje, e que agora deve ser analisada pelo Senado Federal, contém outras ameaças aos indígenas brasileiros. Segundo o documento, o projeto de lei propõe a liberação de construções de rodovias, hidrelétricas e outras obras em terras indígenas sem consulta livre, prévia e informada das comunidades afetadas, violando tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário como a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

O PL também autoriza qualquer pessoa a questionar procedimentos demarcatórios em todas as fases do processo (inclusive os territórios já homologados), flexibiliza a política indigenista do não contato com os povos indígenas em situação de isolamento voluntário e reformula conceitos constitucionais da política indigenista, como a tradicionalidade da ocupação, o direito originário e o usufruto exclusivo.

SUPREMO
Para a Apib, a defesa da Constituição Federal será feita pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que precisa julgar sobre a tese do Marco Temporal, no dia 7 de junho. O julgamento trata, no mérito, de uma ação possessória (Recurso Extraordinário n.º 1.017.365) envolvendo a Terra Indígena Xokleng Ibirama Laklaño, dos povos Xokleng, Kaingang e Guarani, e o estado de Santa Catarina. Com status de repercussão geral, a decisão tomada neste caso servirá de diretriz para todos os processos de demarcação de terras indígenas no país.

Em 2021, o julgamento foi suspenso após pedido de vista (mais tempo para analisar o caso) do ministro Alexandre de Moraes. A suspensão ocorreu após os votos do ministro Nunes Marques, favorável à tese anti-indígena, e do ministro relator, Luiz Edson Fachin, que votou contra ao marco temporal e favorável aos direitos indígenas.

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) tem acompanhado tanto a tramitação do PL 490 quanto o processo da tese no Supremo. Entre os dias 5 a 8 de junho, os povos indígenas irão acampar novamente em Brasília e promover mobilizações contra o Marco Temporal nas cinco regiões do país.

Saiba mais sobre o Marco Temporal aqui

Não ao Marco Temporal!

Por demarcação | pela justiça climática | pelo futuro do planeta | pelas vidas indígenas
| pela democracia | pelo direito originário e ancestral | pelo fim do genocídio | pelo
Direito à Vida

Solidariedade com a Deputada Federal Juliana Cardoso

Solidariedade com a Deputada Federal Juliana Cardoso

A articulação dos Povos Indígenas do Sudeste vem a público prestar solidariedade à Deputada Federal Juliana Cardoso PT/SP.

Juliana Cardoso é a primeira indígena eleita deputada federal na história do Partido dos Trabalhadores. Eleita por São Paulo, Juliana é indíegan do povo terena, nascida e criada na Zona Leste, periferia de São Paulo, e compõe a Bancada do Cocar na Câmara Federal.

Nos solidarizamos e repudiamos os ataques sofridos por Juliana, durante a votação na Câmara dos Deputados que aprovou, por 324 votos a favor e 131 contra, o requerimento de urgência para a votação Projeto de Lei 490/07 que visa implementar, via Congresso Nacional, a tese jurídica do marco temporal, que aguarda julgamento no Supremo Tribunal Federal- STF.

Esta solicitação trata-se de uma demanda da bancada ruralista e de parlamentares bolsonaristas, que celebraram a deliberação.

O projeto é uma gravíssima ameaça aos direitos constitucionais dos povos indígenas , uma vez que visa restringir a demarcação de terras indígenas. Com o patrocínio da bancada ruralista, agora, será encaminhado para votação em plenário.

O Partido Progressista, PP, solicitou ao deputado Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados, que abra processo contra a deputada Juliana Cardoso, por ter chamado apoiadores do marco temporal de ‘assassinos’. O partido encaminhou há pouco uma representação contra a deputada Juliana Cardoso (PT/SP) pedindo que o Conselho de Ética abra um processo “por quebra de decoro parlamentar”.

Em nota divulgada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), após aprovação do requerimento de urgência, lemos: “Esse PL viola os direitos constitucionais dos povos indígenas, afronta o artigo 231 da constituição, viola tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, gera enorme retrocesso ambiental, sobretudo, nega nosso direito originário à terra. É a continuidade do extermínio e da colonização promovida pelos ruralistas, que amam a boiada mais do que a vida”.

Não ao Marco Temporal!

Por demarcação | pela justiça climática | pelo futuro do planeta | pelas vidas indígenas| pela democracia | pelo direito originário e ancestral | pelo fim do genocídio | pelo
Direito à Vida.

Articulação dos Povos Indígenas da Região Sudeste – ARPINSUDESTE

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB

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PL 490 e MP 1154 representam retrocesso para os direitos dos povos indígenas e para a preservação dos biomas brasileiros, afirmam lideranças da Apib

PL 490 e MP 1154 representam retrocesso para os direitos dos povos indígenas e para a preservação dos biomas brasileiros, afirmam lideranças da Apib

Imagem: Andressa Zumpano/Articulação das Pastorais do Campo

A Apib ressalta que as medidas fazem parte de uma agenda anti-indígena que ataca os direitos fundamentais dos povos originários 

O Projeto de Lei 490/07 que pretende transformar em lei a tese do marco temporal teve o requerimento de urgência aprovado pela Câmara dos Deputados no dia 24 de maio. A tese afirma que os povos indígenas só teriam direito à demarcação das terras se estivessem em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal. Além disso, uma comissão mista, integrada por deputados e senadores, também aprovou o texto da Medida Provisória 1154 que retira a competência da demarcação de terras indígenas do Ministério dos Povos Indígenas (MPI). 

Com as aprovações, a MP, que ainda será votada no plenário da Câmara dos Deputados e no Senado, devolve para o Ministério da Justiça e Segurança Pública as demarcações dos territórios ancestrais. O PL 490 segue para votação na Câmara já na próxima sessão, no dia 30 de maio. Lideranças da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) afirmam que o PL e a MP representam retrocesso para os direitos dos povos indígenas e para a preservação dos biomas brasileiros. 

“O que vimos no dia 24 é uma vergonha para a política nacional. Com o PL 490 e a Medida Provisória, o Congresso quer inviabilizar as demarcações de terras indígenas. Isso é um grande retrocesso para os direitos dos povos originários e para a preservação do meio ambiente, visto que somos nós os verdadeiros guardiões dos biomas brasileiros”, diz Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib. 

Tuxá e outras lideranças indígenas estiveram na Câmara dos Deputados para acompanhar a sessão da comissão mista, mas foram impedidos pelos integrantes da sessão que debatia a MP 1154.

Um estudo publicado pela Organização Mapbiomas Brasil atesta que ao longo de 30 anos as terras indígenas perderam apenas 1% de toda a vegetação nativa, causado em grande medida pela invasão desses territórios por grileiros, madeireiros, garimpeiros e mineradores. Já nas áreas privadas, a perda de vegetação nativa foi de 20,6%11. Dados da Organização das Nações Unidas (ONU) também apontam que os territórios tradicionais indígenas abrangem 28% da superfície terrestre do mundo, mas abrigam 80% de toda a biodiversidade planetária. 

Kleber Karipuna, também coordenador da Apib, ressalta que a corrida para aprovação das medidas no Congresso é uma retaliação à retomada do julgamento do marco temporal no Supremo Tribunal Federal (STF), prevista para o dia 7 de junho. “Essas medidas e o julgamento no STF podem definir o futuro dos povos indígenas no Brasil. Não demarcar terras indígenas, direito previsto na Constituição Federal, é colocar em jogo a vida dos parentes e parentas. É legalizar as violações ocorridas no passado e incentivar o extermínio dos povos originários”. 

A nota técnica Nº05/2023 do departamento jurídico da Apib aponta, além do marco temporal, outras ameaças aos indígenas brasileiros apresentadas no PL 490. Segundo o documento, o projeto de lei propõe a liberação de construções de rodovias, hidrelétricas e outras obras em terras indígenas sem consulta livre, prévia e informada das comunidades afetadas, violando tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário como a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

O PL também autoriza qualquer pessoa a questionar procedimentos demarcatórios em todas as fases do processo (inclusive os territórios já homologados), flexibiliza a política indigenista do não contato com os povos indígenas em situação de isolamento voluntário e reformula conceitos constitucionais da política indigenista, como a tradicionalidade da ocupação, o direito originário e o usufruto exclusivo.

“O Projeto de Lei 490/07 é inconstitucional, pois viola os direitos fundamentais dos povos indígenas previstos na Constituição. Além disso, o direito à terra é originário. Sem território não há saúde e não há educação para os povos originários. Isso compromete diretamente os serviços ambientais prestados pelos povos indígenas com a conservação das vegetações nativas que tem consequências no regime de chuvas, por exemplo”, afirma Maurício Terena, advogado indígena e coordenador do departamento jurídico da Apib. 

Marco temporal no STF

O julgamento do Marco Temporal está paralisado há quase dois anos no Supremo Tribunal Federal (STF). O julgamento trata, no mérito, de uma ação possessória (Recurso Extraordinário n.º 1.017.365) envolvendo a Terra Indígena Xokleng Ibirama Laklaño, dos povos Xokleng, Kaingang e Guarani, e o estado de Santa Catarina. Com status de repercussão geral, a decisão tomada neste caso servirá de diretriz para todos os processos de demarcação de terras indígenas no país.

Em 2021, o julgamento foi suspenso após pedido de vista (mais tempo para analisar o caso) do ministro Alexandre de Moraes. A suspensão ocorreu após os votos do ministro Nunes Marques, favorável à tese anti-indígena, e do ministro relator, Luiz Edson Fachin, que votou contra ao marco temporal e favorável aos direitos indígenas.

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) tem acompanhado tanto a tramitação do PL 490 quanto o processo da tese no Supremo. Entre os dias 5 a 8 de junho, os povos indígenas irão acampar novamente em Brasília e promover mobilizações contra o marco temporal nas cinco regiões do país. “Vamos acampar novamente em Brasília e lutar pelos direitos indígenas, porém isso pode e deve ocorrer em qualquer território. Parentes e parentas, erga sua faixa e seu maracá e vamos lutar juntos!”, Val Eloy, coordenadora executiva da Apib pelo Conselho Terena. 

 

O marco temporal é inconstitucional, nosso território é ancestral

O marco temporal é inconstitucional, nosso território é ancestral

A luta pela vida não pode ser somente uma pauta dos povos indígenas, precisa ser uma luta do povo brasileiro

Por Samela Sateré Mawé*

Imagem: @kamikiakisedje

O Brasil é terra indígena, mas o futuro dos povos indígenas do Brasil está em jogo com o marco temporal.

A tese está em tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF) e o seu julgamento deve retornar no dia 7 de junho. O marco temporal estabelece que os nossos povos só têm direito à demarcação das terras que estivessem sob sua posse no dia 5 de outubro de 1988 —data da promulgação da Constituição Federal—, ou que naquela data estivessem sob disputa física ou judicial comprovada.

Mas nossa história não começa em 1988. Nossos povos estavam aqui muito antes da Constituição, da criação de nossas fronteiras e da fundação do Estado brasileiro. Somos originários!

Somos mais de 305 povos indígenas no Brasil, estamos em todos os estados e biomas brasileiros. Desde a invasão dos europeus, temos que lidar com a violação dos nossos corpos e territórios, sempre lutando contra ataques e estupros.

A tese do marco temporal é defendida pelo agronegócio e por setores que pretendem explorar os territórios tradicionais. Ela fere a vida da população originária e representa um risco para a biodiversidade e para o ambiente, pois coloca em risco a demarcação de terras indígenas —inclusive daquelas que já foram demarcadas.

As terras indígenas demarcadas e as unidades de conservação são as regiões com maior preservação da biodiversidade, pois somos nós, povos indígenas, os principais guardiões dos biomas.

O marco temporal também chegou no Congresso Nacional por meio do projeto de lei (PL) 490/2007. Nesta quarta-feira (24), a Câmara aprovou requerimento de urgência para a tramitação do projeto.

O PL busca transferir a competência de demarcação de terras indígenas do Executivo para o Legislativo com o objetivo de inviabilizar as demarcações dos territórios ancestrais.

O PL também quer permitir a construção de rodovias, hidrelétricas e outras obras dentro das terras indígenas, sem consulta prévia às comunidades afetadas. Ações como essas têm impactos ambientais e culturais irreversíveis e contribuem para o extermínio dos povos indígenas.

Entendemos o território como uma extensão dos nossos corpos, não havendo diferença entre os seres humanos e as árvore, os animais e os rios. Sentimos na pele quando queimam e desmatam, matando as árvores e os seus moradores, seres vivos e encantados.

Quando dragas de garimpo ou hidrelétricas bloqueiam os rios sagrados, é como se entupissem nossas veias e artérias. Grileiros, fazendeiros e pistoleiros invadem nossos territórios, nos ameaçam e nos matam com o intuito de usufruir dos nossos recursos.

O marco temporal representa tudo isso. É uma tese perversa, que legitima a violência contra os nossos corpos-territórios. Há sangue indígena nas mãos e na ponta das canetas dos ministros.

O reconhecimento dessa tese representaria uma inversão de papéis: o colonizador viraria dono da terra, enquanto o indígena seria visto como invasor.

O marco temporal nega a presença dos nossos povos neste território. Nega nossas práticas de subsistência, a nossa ciência, o nosso canto, nossa pintura e a nossa culinária.

Além disso, essa tese ignora que muitos indígenas foram assassinados e expulsos de seus territórios ancestrais. Portanto, não poderiam estar nas suas terras sagradas na data da promulgação da Constituição.

Sobretudo, o marco temporal é inconstitucional. O artigo 231 da Constituição Federal garante aos povos indígenas o direito originário sobre as terras que tradicionalmente ocupam:

“Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.”

Segundo a nota técnica da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) sobre o marco temporal, as terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas são a principal condição da manutenção de sua sobrevivência física e cultural.

Para os povos indígenas, não existe dignidade sem suas terras. É nelas onde estão os recursos necessários para o seu desenvolvimento econômico e onde têm liberdade para expressar suas culturas, tradições e espiritualidades.

O direito à terra é um direito fundamental, inalienável e imprescritível. A sensação que fica é que o Estado desrespeita sua própria Constituição, e que os não indígenas violam as leis criadas por eles mesmos, mudando-as e manipulando-as quando lhes convém.

Vivemos sob a lei dos não indígenas, mas todos vivem sobre nossas terras.

luta pela vida não pode ser somente uma pauta dos povos indígenas. Precisa ser uma lutado povo brasileiro, que preza pela mãe terra, pelos biomas, pela Amazônia, assim como nós.

A votação sobre o marco temporal no STF está prevista para 7 de junho, e os povos indígenas realizarão uma mobilização em Brasília do dia 5 ao dia 8 do mesmo mês. Juntos, estamos mobilizados para que nossas pautas sejam ouvidas e atendidas pelo Supremo.

Pela justiça climática, pelo futuro do planeta, pelas vidas indígenas, pela democracia, pelo direito originário e ancestral, pelo fim do genocídio, pelo direito à vida e por demarcação já, nós, povos indígenas, gritamos: não ao marco temporal!

*Texto originalmente publicado na coluna do PerifaConnection na Folha de São Paulo: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/perifaconnection/2023/05/o-marco-temporal-e-inconstitucional-nosso-territorio-e-ancestral.shtml

Apib anuncia tema e mudança na mobilização contra Marco Temporal

Apib anuncia tema e mudança na mobilização contra Marco Temporal

A mobilização irá ocorrer do dia 5 a 8 de junho e reforça o enfrentamento contra a crise climática

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) anuncia nesta quarta-feira (18/05) o tema e alteração na data da mobilização contra o Marco Temporal. Com os dizeres “Pela justiça climática, pelo futuro do planeta, pelas vidas indígenas, pela democracia, pelo direito originário/ancestral, pelo fim do genocídio, pelo direito à vida, por demarcação já: Não ao Marco Temporal!”, o acampamento agora irá ocorrer do dia 5 a 8 de junho em Brasília, no Distrito Federal. Inicialmente a mobilização encerraria no dia 9 de junho, como anunciado no Acampamento Terra Livre (ATL)

A mobilização irá ocorrer durante a retomada do julgamento do Marco Temporal no Supremo Tribunal Federal (STF), previsto para o dia 7 de junho e deve definir o futuro dos povos indígenas do Brasil. Juliana Kerexu, coordenadora executiva da Apib pela Comissão Guarani Yvyrupa, explica que a escolha do tema foi feita para reforçar a importância da derrubada do Marco Temporal e da demarcação de terras indígenas no debate climático.

”Não há justiça climática e futuro do planeta sem demarcação dos territórios ancestrais. Isso porque somos nós, povos indígenas, os verdadeiros guardiões das florestas. O Marco Temporal ignora a nossa existência antes de 1988 e coloca em risco a vida da população originária e de toda a humanidade”, diz Kerexu. 

O anúncio da Apib ocorre após os povos indígenas decretarem emergência climática no dia 26 de abril. O decreto foi lido durante a programação do ATL 2023 e apresenta 18 reivindicações a todos os poderes do Estado, entre  demarcação das terras indígenas em todos os biomas, especialmente aquelas que aguardam apenas a fase de homologação. Leia a carta aqui

A coordenadora da Apib pelo Conselho Terena, Val Eloy, conta que a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil está acompanhando de perto os bastidores do julgamento no STF. “Estamos articulando incidências políticas, com a opinião pública e com o movimento de base. O direito ao território indígena é originário e tenho esperanças de que o Marco Temporal será derrubado”. 

Sobre a mudança na data da mobilização, a coordenadora complementa: “O ATL e a mobilização contra o Marco Temporal ocorrem com menos de um mês entre elas. Vamos acampar novamente em Brasília e lutar pelos direitos indígenas, porém isso pode e deve ocorrer em qualquer território. Parentes e parentas, erga sua faixa e seu maracá e vamos lutar juntos!”. 

Julgamento

O julgamento do Marco Temporal está paralisado há quase dois anos e é apontado pela Apib como uma tese anti-indígena, pois a teste afirma que os povos indígenas só teriam direito à demarcação das terras se estivessem em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. 

O julgamento trata, no mérito, de uma ação possessória (Recurso Extraordinário n.º 1.017.365) envolvendo a Terra Indígena Xokleng Ibirama Laklaño, dos povos Xokleng, Kaingang e Guarani, e o estado de Santa Catarina. Com status de repercussão geral, a decisão tomada neste caso servirá de diretriz para todos os processos de demarcação de terras indígenas no país.

Em 2021, o julgamento foi suspenso após pedido de vista (mais tempo para analisar o caso) do ministro Alexandre de Moraes. A suspensão ocorreu após os votos do ministro Nunes Marques, favorável à tese anti-indígena, e do ministro relator, Luiz Edson Fachin, que votou contra ao marco temporal e favorável aos direitos indígenas.

Funai alertou Ministério da Justiça sobre o avanço do garimpo na TI Yanomami, mas o documento foi engavetado pelo governo Bolsonaro

Funai alertou Ministério da Justiça sobre o avanço do garimpo na TI Yanomami, mas o documento foi engavetado pelo governo Bolsonaro

Nos últimos anos, o movimento indígena realizou mais de 20 denúncias sobre a situação no território. Todas elas também foram ignoradas pelo antigo governo.

Em agosto de 2022, a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) enviou para o Ministério da Justiça (MJSP) um relatório detalhado do garimpo na Terra Indígenas Yanomami, em Roraima. O documento foi recebido e engavetado pela equipe do MJSP em menos de 48 horas, como revelado pelo site UOL na última sexta-feira (12/05). 

Segundo o UOL, o ofício da Funai foi enviado à Superintendência da Polícia Federal em Roraima e à Secretaria de Operações Integradas do Ministério da Justiça no dia 12 de agosto. O documento passou a ser movimentado na secretaria no dia 15 e paralisou dia 17. 

O relatório aponta que um servidor da Funai sobrevoou o território em 25 de maio de 2022. A operação da Funai tinha como objetivo produzir informações de inteligência para uma operação em parceria com o Ministério da Justiça, prevista para o segundo semestre. O que não ocorreu. 

Entre os dados apresentados no documento, foram encontrados 32 pontos ativos de garimpo em cerca de 800 km percorridos nas calhas dos rios Uraricoera, Couto Magalhães, Auaris, Parima e Mucajaí. Os garimpeiros também mantinham ao menos 18 pistas de pouso só na área inspecionada, além de 13 pontos de apoio e três áreas descritas como portos. Um avião de grande porte também foi fotografado na região. 

O aumento do garimpo ilegal, a escalada da violência e a crise de saúde na Terra Indígena Yanomami foi constantemente denunciada por lideranças e organizações do movimento indígena nos últimos anos. O Conselho Indígena de Roraima (CIR), a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), a associação Yanomami Hutukara e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), realizaram mais de 20 denúncias exigindo providências para a garantia da vida do povo Yanomami, mas todas elas foram ignoradas pelo governo Bolsonaro.

Confira os dados apresentados pela Funai ao MJSP na reportagem publicada pelo UOL: https://bit.ly/42vygHE 

Investigação 

No dia 30 de janeiro de 2023, o Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que a Procuradoria-Geral da República (PGR), o Ministério Público Militar (MPM), o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJ) e a Superintendência Regional da Polícia Federal de Roraima investiguem a participação do Governo Bolsonaro nos crimes de genocídio e omissão de socorro do povo Yanomami.

A decisão ocorreu após a Apib, por meio de seu departamento jurídico, pedir ao STF o cumprimento da desintrusão no território Yanomami, que já tinha sido determinada nos autos da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental no Supremo Tribunal Federal (ADPF Nº 709), mas não foi cumprida por Bolsonaro. 

ATL 2023: Documento final reafirma a necessidade de avançar nas demarcações de terras indígenas

ATL 2023: Documento final reafirma a necessidade de avançar nas demarcações de terras indígenas

Foto: @kamikiakisedje/APIB

Por uma semana, cerca de seis mil indígenas e 200 povos estiveram acampados na Praça da Cidadania, em Brasília, para a 19ª  edição do Acampamento Terra Livre (ATL), maior mobilização indígena do Brasil

Em carta de encerramento divulgada na sexta-feira (28/04), ao fim do Acampamento Terra Livre (ATL) 2023, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e suas sete regionais destacam a demarcação de terras como ação prioritária para a garantia dos direitos originários no país. O documento reúne as principais discussões e reivindicações da mobilização, que ocorreu de 24 a 28 de abril, na Praça da Cidadania, em Brasília. 

No último dia de evento, o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, assinou os decretos de homologação de seis Terras Indígenas (TI), sendo elas: TI Arara do Rio Amônia (AC), TI Tremembé da Barra do Mundaú (CE); TI Rio dos Índios (RS); TI Avá-Canoeiro (GO); TI Kariri-Xocó (AL) e TI Uneiuxi (AM). O ato quebrou um jejum de quase cinco anos sem a garantia deste direito fundamental dos povos indígenas. 

A Articulação reconhece as vitórias da mobilização, com o retorno de demarcações de territórios indígenas. Um das TI,  Uneiuxi, localizada no estado Amazonas, tem a presença de povos em isolamento voluntário. O processo para sua efetivação já caminhava a passos lentos, há 40 anos. A recriação do Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI) e a criação do Comitê Gestor da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI) somam às conquistas desta edição do Acampamento. 

No documento, a Apib ressalta ainda que a violência nos territórios continuam, impondo uma realidade que não permite comemorar os avanços institucionais já ocorridos em 2023. Durante o ATL, as lideranças indígenas presentes destacaram a resistência do povo Yanomami, que enfrenta uma situação grave de violência e violação de direitos causada pela invasão do território e exigiram a liberdade dos nove indígenas do povo Guarani e Kaiowá presos por lutarem contra os interesses de imobiliárias. Ao fim do dia, puderam comemorar a libertação dessas nove pessoas. 

“Nesse sentido afirmamos: Nossa luta continua! Há mais de 500 anos resistindo ao genocídio, entendemos que nossa vitória só sera declarada quando tivermos todas as nossas terras demarcadas. Em 2023, o 19 ATL foi a primeira grande mobilização, em Brasília, após os atos golpistas do dia 8 de janeiro. Mais uma vez, nós povos indígenas, ensinamos como se faz a luta democrática por direitos nas ruas e nas redes”, afirma um trecho da carta. 

Além do documento de encerramento, o Acampamento Terra Livre também entregou uma carta diretamente ao presidente Lula. No documento nomeado como “Sem demarcação não há democracia!”, tema do ATL 2023, a Articulação reconhece os avanços, mas aponta as suas preocupações como o posicionamento da Advocacia Geral da União (AGU) ao Marco Temporal, que teve seu julgamento marcado para o dia 7 de junho, e a falta de um cronograma para a retomada da política de demarcação e proteção das terras indígenas.

Ao longo da programação do ATL, os povos indígenas decretaram emergência climática e anunciaram uma mobilização contra o Marco Temporal para os dias 5 a 9 de junho.

Leia os documentos na íntegra abaixo:

O futuro indígena é demarcar HOJE!

Sem demarcação não há democracia!