Acesse o documento encaminhado aos governadores aqui
Cumprimentando, cordialmente a todos, aproveitamos para desejar que o ano de 2021 seja próspero para todos, e com mais esperanças em razão da possibilidade de enfrentarmos a pandemia por meio da vacinação massiva de nossos Povos e de toda a sociedade.
Reiteramos a preocupação da Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo – APOINME com essa nova onda de agravamento da situação da pandemia do Coronavírus e disseminação do Covid19 em todo Brasil, e em especial, com vida, a saúde, e a segurança alimentar dos Povos Indígenas da área de abrangência de nossa Organização. A taxa de mortalidade entre a população indígena continua mais alta que a mortalidade geral no Brasil pela COVID-19, hoje em 966 óbitos por milhão de habitantes. Conforme dados apurados pelo Comitê Nacional de Vida e Memória Indígena, organizado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) juntamente com suas organizações de base, já foram confirmados quase 45 mil casos de COVID-19 entre indígenas, levando a óbito 915 de nossos anciãos e lideranças, alcançando 161 diferentes povos indígenas no Brasil.
Destacamos que, na qualidade de Organização Indígena atuante na região, temos a responsabilidade de buscar articular atores e soluções, visando garantir a vida e a saúde de nossos Povos.
A APOINME é a principal organização interlocutora entre os povos indígenas da região e a sociedade envolvente, buscando assegurar o respeito a nossos direitos e a convergência entre as políticas públicas e as nossas visões, interesses e necessidades. Desse modo, para que a inclusão de nossas comunidades no processo de vacinação seja efetiva, construtiva, participativa, baseada em evidências científicas, e alinhada com as especificidades dos povos indígenas, a APOINME propõe uma ampliação do campo de diálogos diretos e atualizados com os gestores responsáveis pelas políticas de saúde na região.
Diante desse quadro, solicitamos, enfaticamente, o engajamento dos Governadores do Consórcio nas seguintes ações:
1. Mobilização deste Consórcio para que, nos Estados da área de abrangência da APOINME, o Sistema Único de Saúde garanta às comunidades indígenas, sempre que necessário, a realização de testes para a Covid-19 e o acesso aos serviços de saúde indispensáveis à prevenção das vidas e recuperação da saúde, sempre que necessário;
2. Articulação entre todas as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde com o SASI-SUS e os Distritos Sanitários Especiais Indígenas-DSEIs, a fim de garantir acesso à informação da situação epidemiológica e das ações que estão sendo realizadas em cada local: terras e aldeias indígenas;
3. Garantia de que os planos para atendimentos dos pacientes graves dos Estados e Municípios incluam a população indígena, deixando explícitos os fluxos e as referências para o atendimento em tempo hábil, em articulação com a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) e DSEIs;
4. E, por fim, mas principalmente, solicitamos informações atualizadas sobre o plano de vacinação e imunização, em especial no que tange ao atendimento às populações indígenas, e nos colocamos novamente à disposição para contribuir com os esforços de fazer a vacina chegar a todos os povos e territórios indígenas dos estados do Nordeste.
Acesse o documento encaminhado ao Ministério Público Federal com mais de 3 mil assinaturas aqui
Nós, abaixo assinados, oriundos de 65 povos indígenas do Amazonas, exigimos a vacinação contra a covid-19 para todos os povos indígenas do estado, inclusive o povo Warao.
Manifestamos nossas preocupações com relação às decisões do governo federal no Plano Nacional de Vacinação contra a Covid-19 e também no Plano Estadual de Imunização. Nos dois Planos estão explícitos que entre os grupos prioritários de imunização estão os povos indígenas aldeados atendidos pelos Distritos Sanitários Especiais Indígenas, num total de 410.348 indivíduos, excluindo claramente os indígenas denominados pelo governo de não aldeados.
Ressaltamos que, nós, indígenas que vivemos fora de nossas aldeias/comunidades somos vistos pelo Estado como uma espécie de desertores étnicos, como se tivéssemos desistido da nossa identidade ancestral e aderido a uma nova identidade da cidade, como se tivéssemos escolhido não ter mais os nossos direitos enquanto indígenas.
É assim que sentimos a omissão do Estado em nos prestar uma atenção diferenciada à saúde que considere e respeite as nossas especificidades étnicas, culturais e sociais.
Lembramos que, dos 896,9 mil indígenas recenseados pelo IBGE em 2010, 517.383 mil (57,7%) vivem em terras indígenas (TIs) e 379.535 mil, ou seja, 42,3%, vivem fora das terras indígenas, nas cidades ou na zona rural em TIs que estão nas primeiras etapas do procedimento administrativo de demarcação.
Para nós, povos indígenas do Amazonas, foram e ainda são gigantescos os desafios para gar- antir o isolamento social e o cumprimento da quarentena, por conta, principalmente, de aspectos sociais e culturais muito fortes na nossa convivência comunitária. Fora isso, existem dados científicos mostrando que doenças infecciosas introduzidas em nossas comunidades indígenas se espalham rapidamente atingindo grande parte dos nossos parentes, como acontece com a gripe, sarampo, catapora, e agora com a Covid-19, além de outras que já vitimaram centenas de indígenas.
Temos acompanhando de perto os efeitos da pandemia do novo coronavírus nos territórios indígenas. Está sendo alto o número de infectados e mortos, fazendo com que as consequências sejam ainda mais graves provocando a desestruturação das culturas e até o risco de extinção de alguns povos que possuem um número reduzido de pessoas.
Lembramos, ainda, que os povos indígenas possuem alta vulnerabilidade epidemiológica e san- itária, por isso aqueles que vivem em cidades acabam sendo muito mais expostos à contami- nação tornando-os mais suscetíveis a contraírem a Covid-19, principalmente por ser uma doença respiratória de fácil disseminação. O que requer tratamento diferenciado na oferta da saúde pública, tanto que na Lei no 14.021/2020 os povos indígenas foram incluídos no grupo de risco desta pandemia, necessitando de cuidados e atenção específica e prioritária pelos órgãos de saúde pública.
Os dados coletados e divulgados pela Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) nos mostram a gravidade dos efeitos da pandemia entre os povos indígenas do Amazonas: até o dia 14 de janeiro deste ano, foram registrados 8.137 indígenas infectados, dos quais 229 vieram à óbito, afetando 37 povos indígenas do estado. Sabemos que fora esses dados, existem muitos indígenas afetados que não estão em nenhum registro, ou seja, esse número pode ser ainda maior, lamentavelmente.
Diante desses dados é importante, ainda, alertar que a taxa de mortalidade entre os povos indígenas é maior que o restante da população brasileira, tanto pelos motivos acima indicados quanto pela falta de uma resposta rápida para a prevenção, assim como para os cuidados ime- diatos daqueles infectados nos lugares mais longínquos do país pelos órgãos de saúde pública do Estado Brasileiro.
Desta forma, estamos muito preocupados com o Plano de Vacinação contra a Covid-19 apresentado pelo governo federal no dia 10 de dezembro de 2020, que exclui mais de 50% da população indígena de todo o país que vive fora das terras indígenas demarcadas, sejam nas cidades ou nas áreas em processo de regularização fundiária.
Esta decisão política do governo federal, que é seguida pelo governo do Amazonas, pode deixar à míngua milhares de indígenas que poderão ser acometidos por esse terrível vírus, dessa forma:
Considerando que, os impactos da pandemia não são iguais para todas as pessoas e grupos sociais presentes na sociedade brasileira, alguns como os povos indígenas, com maior vulner- abilidade socioeconômica: condições precárias de moradia, falta de acesso à água e saneamento básico, falta de acesso ou acesso precário ao sistema de saúde e a leitos de tratamento intensivo; e organização política, social e de sobrevivência peculiares: vivendo em comunidades/aldeias, em centros urbanos ou mesmo em acampamentos;
Considerando, ainda, os resultados dos estudos técnicos feitos pelo Núcleo de Métodos Analíti- cos para Vigilância Epidemiológica do PROCC/Fiocruz e EMAp/FGV e pelo Grupo de Tra- balho sobre Vulnerabilidade Sociodemográfica e Epidemiológica dos Povos Indígenas no Bra- sil à Pandemia de COVID-19 de maio de 2020, em que nos apresenta que: “A população indígena urbana reside majoritariamente em municípios com alto risco para COVID-19, total- izando 227.128 (70%) indígenas nessa situação. Corresponde a 82,7%, 71,9%, 65,3% e 56% da população indígena urbana nas regiões Sul-Sudeste, Centro-Oeste, Nordeste e Amazônia Legal, respectivamente”;
Considerando, também, os estudos divulgados nesta sexta-feira (15) no periódico científico The Lancet Respiratory Medicine, uma das revistas mais prestigiadas do mundo, sobre os resultados de uma análise retrospectiva das 254.288 hospitalizações de pacientes com mais de 20 anos com diagnóstico de covid-19 no Brasil, entre 16 de fevereiro e 15 de agosto de 2020, onde foi observado que “na Região Norte os doentes chegaram mais graves. Eles tinham mais hipox- emia, mais estresse respiratório. O tempo entre dar entrada no hospital até a morte na Região Norte foi de sete dias; nas outras regiões, 10 a 12 dias. Além disso, quem foi internado em UTI na região Norte, teve uma mortalidade de 79%. No Sudeste, o mesmo número foi de 49%. A mortalidade geral de quem foi hospitalizado foi de 50% na região Norte e de 34% no Sudeste”. Ou seja, os pacientes infectados com a Covid-19 da região Norte têm maior probabilidade de vir a óbito que nas demais regiões do país;
Considerando, por fim, a estrutura e gestão da saúde no estado do Amazonas que não suporta e nem está preparada para salvar vidas a contento, como visto mundialmente na semana do dia 11 a 16 de janeiro, deste ano.
Vimos apresentar a nossa preocupação veemente com o pico da pandemia no Amazonas ini- ciada de forma drástica na cidade de Manaus, com a presença de uma variante mutante do coronavírus com maior índice de transmissibilidade, e que está se alastrando para o interior do estado, assim como para todo o Brasil e fora dele, afetando principalmente os mais vulneráveis, entre estes os povos indígenas.
EXIGIMOS ao Poder Executivo Municipal, Estadual e Federal que todos os povos indígenas do Amazonas entrem nos grupos prioritários de imunização contra a Covid-19 no estado, efeti- vando desta forma, os nossos direitos constitucionais.
ADAILDO JOSÉ ALVES DA SILVA, indígena residente na comunidade Morro D’Água, Baixa Grande do Ribeiro (PI), com a terra reivindicada em processo de demarcação como terra indígena, foi submetido a uma reintegração de posse decidida pelo Poder Judiciário, Comarca de Gilbués, e executada pela Polícia Militar, tendo que sair de sua casa na tarde do dia 14 de janeiro de 2021. Neste mesmo dia, à noite, expulsaram e queimaram a casa de seu filho, DORIAN NUNES DA SILVA. Hoje, 17 de janeiro de 2021, o grileiro foi até a comunidade e ameaçou de morte os indígenas. Anteriormente, no dia 25 de junho de 2020, derrubaram e queimaram as casas de Salvador, João e Jairo, são indígenas Gamela da comunidade Barra do Correntim – Bom Jesus (PI). A presente nota denuncia a situação a que os indígenas Gamela são submetidos no estado do Piauí com atuação do Poder Executivo e do Poder Judiciário, tendo o Poder Legislativo e o Ministério Público inertes diante do descumprimento da constituição. Quais os direitos foram descumpridos nesta violenta reintegração de posse?
1. A dignidade da Pessoa Humana garantida no Art. 1o da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 como fundamento da nação brasileira;
2. Foram negados os direitos sociais do Art. 6°: “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”. A decisão do Poder Judiciário do estado do Piauí violou as garantias fundamentais: saúde em tempos de pandemia; alimentação; trabalho, moradia, segurança, proteção aos desamparados. O Poder Judiciário piauiense determinou e o Poder Executivo efetivou as violações e até este momento não há manifestação do Poder Legislativo nem do Ministério Público e Defensoria Pública da União (DPU);
3. Foram violados os direitos culturais dos povos indígenas, garantidos nos art. 215 e 216: Art. 215 “O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais. § 1o O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional” e Art. 216: “Constituem patrimôniop cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: I – as formas de expressão; II – os modos de criar, fazer e viver; (…)”. A decisão judicial violou o direito cultural dos povos indígenas, o patrimônio cultural brasileiro tanto material quanto imaterial, bem como violou os modos de criar, fazer e viver;
4. A decisão de despejo é indevida por está situada na justiça estadual, uma vez que as questões indígenas devem ser tratadas no âmbito da justiça federal. Ela violou concretamente o direito às terras indígenas, garantido no Art. 231, que garante: “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens. § 1o São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições. § 2o As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes. (…) § 5o É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, “ad referendum” do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco”. Como se pode notar as terras reivindicadas pelos indígenas não pode ser objeto de reconhecimento de outra posse;
5. O § 6o do Art. 231 considera: “São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé”;
6. A ação de violência praticada viola a CF-1988 e a legislação infraconstitucional, se o estado do Piauí quer representar o povo piauiense precisa corrigir imediatamente as violações realizadas em plena pandemia, desrespeitando as condições pandêmicas, tratando os povos indígenas como não humanos.
A presente nota denuncia a desumanização com que agiu o estado do Piauí, por meio do Poder Judiciário e do Poder Executivo, com a conivência dos demais poderes que permanecem inertes ao tempo em que reivindicamos que as violações sejam corrigidas e que as casas queimadas sejam edificadas pelo Poder Público piauiense.
Teresina (PI), 17 de janeiro de 2021. Povo Gamela de Bom Jesus, Baixa Grande do Ribeiro, Currais e Santa Filomena
Povo Tabajara Tapuio de Lagoa de São Francisco Povo Tabajara de Piripiri
Povo Tabajara Ypy do Canto da Várzea de Piripiri Povo Tabajara da Oiticica de Piripiri
Povo Kariri de Queimada Nova
Povo Gueguê do Sangue de Uruçuí
Povo Caboclos da Baixa Funda de Uruçuí
Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo – APOINME / Regional e Coordenação da Microregião do Piauí
Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia – PNCSA
Laboratório do Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia – PNCSA/UFPI
Grupo de Pesquisas Identidades Coletivas, Conhecimentos Tradicionais e Processo de Territorialização/UFPI
Grupo de Pesquisa em Antropologia, Diversidade, Interculturalidade e Educação – GPADIE/UFPI
Grupo de Pesquisa e Extensão Direitos Humanos e Cidadania – UFPI
Programa de Ações Integradas de Promoção de Direitos Humanos, Sociais e Cidadania – PRAIDIH/UFPI
Programa de Pesquisas sobre Povos Indígenas do Nordeste Brasileiro – PINEB Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Etnicidade – NEPE/UFPE
Associação Nacional de Ação Indigenista – ANAÍ
Grupo de Estudos com Povos Indígenas – GEPI/Unilab
Macondo: Artes, Culturas Contemporâneas e outras Epistemologias da UFRPE/UAST Comissão Pastoral da Terra – CPT do Maranhão
Rede de Agroecologia do Maranhão – RAMA
Conselho Indigenista Missionário – CIMI do Maranhão
Etnologia, tradição, ambiente e pesca artesanal – Etapa/UFRN
CAMTO – Cultura, Ambiente e Território da UFRB
ANJUKA- Centro de Memória dos Povos indígenas do Nordeste da UEFS – BA
Opará – Centro de Pesquisas em Etnicidades, Movimentos Sociais e Educação da UNEB
Laboratório de Pesquisas em Etnicidade, Cultura e Desenvolvimento – Laced/UFRJ Laboratório de Antropologia, Política e Comunicação – LAPA da UFPB
NEA NOVA CARTOGRAFIA SOCIAL da UFRB
Laboratório de Estudos sobre Ação Coletiva e Cultura – LACC da UPE
Núcleo de estudos Indígenas e Afrobrasileiros – NEABI da UFAM Coletivo de mulheres indígenas e quilombolas da UFG
Coletivo OcupARTHE
Núcleo de Estudos Afro-brasileiros – NEAB /UERN
Grupo de Estudos Culturais – GRUESC/RN
Grupo de Pesquisas em Ciências Humanas e Linguagens no Cerrado — IFPI Campus Uruçuí
Grupo de Trabalho ‘Os Índios na História’ / Associação Nacional de História – Anpuh – Seção Piauí
Movimento pela Paz na Periferia – MP3
Pastoral do Migrante da Arquidiocese de Teresina
Hélder Ferreira de Sousa – UFDPar
Núcleo de Estudos e Pesquisas em “Educação, Gênero e Cidadania” – NEPEGECI
Observatório das Juventudes e Violências na Escola – OBJUVE
Com versões em inglês, espanhol, francês e alemão, ação marca início de uma nova agenda de autodefesa dos povos indígenas
Um novo vídeo lançado hoje nas redes sociais questiona se governos e empresas estão agindo para defender ou para destruir a Amazônia, massacrando os povos nativos que habitam o bioma há séculos. Em formato de paródia dos noticiários cinematográficos produzidos durante a Segunda Guerra Mundial, o vídeo Climate War mostra quais setores produtivos estão contaminados pelas atividades ilegais que desmatam, queimam, contaminam rios e matam indígenas. E apresenta Jair Bolsonaro como um inimigo climático que precisa ser parado e responsabilizado por seus crimes antes que as consequências sejam graves demais para todo o planeta.
O formato escolhido, que remete à Segunda Guerra Mundial, visa explicitar que não se trata de crítica a um país, mas a um governante. Assim como os crimes da Segunda Guerra foram atribuídos a líderes dos governos envolvidos (alguns dos quais chegaram inclusive a serem julgados e condenados), o vídeo Climate Wars atribui os crimes que estão sendo cometidos na Amazônia a Bolsonaro e não ao Brasil. Ou seja, o ponto central do vídeo é a responsabilização de Jair Bolsonaro pelo ataque ao clima global, à biodiversidade da floresta e à vida dos povos nativos. Ele mostra que ficar do lado da Amazônia é uma atitude patriótica, de defesa do país, para garantir um Brasil vivo e viável para os brasileiros.
Apesar do tom de sátira, relacionar a devastação ambiental e o avanço de forças econômicas e criminosas sobre as florestas brasileiras a uma guerra não é exagero. Garimpeiros, madeireiros e invasores de terras demarcadas são um verdadeiro exército da destruição, invadindo territórios que legalmente não lhes pertencem, incentivados por Jair Bolsonaro. Além de uma ameaça imediata à sobrevivência dos povos indígenas, eles representam um risco global devido às consequências climáticas da destruição da maior floresta úmida do planeta.
Climate Wars marca também o início de uma nova agenda de autodefesa dos povos indígenas. Passada a pandemia, eles darão continuidade aos diálogos diretos com governos e parlamentares europeus e norte-americanos, além de uma aproximação com a China ainda este ano. “Queremos que eles apoiem o Brasil, mas da maneira certa, que é nos ajudando a frear a destruição de nossos ecossistemas, recursos naturais e do próprio clima”, declara Sônia Guajajara, da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil-APIB, que divulgou o vídeo em suas redes sociais.
Fruto da colaboração de ativistas e artistas brasileiros – pessoas que apoiam a luta da APIB e que compreendem a gravidade e as consequências da política ambiental do governo do Brasil – o vídeo tem versões em inglês, espanhol, francês e alemão. Ele não traz os créditos dos autores por dois motivos: primeiro, porque o foco deve ser na mensagem do vídeo, não nas pessoas; e segundo, pela assumida perseguição a ativistas que o governo federal vem promovendo com o uso de instrumentos de Estado e paraestatais.
Bolsonaro quer forçar a evangelização de povos indígenas. Atacou nossos direitos no Supremo, defendendo a questão do marco temporal. Teima em lutar contra o termo povos indígenas, sem entender que sim, somos brasileiros e também somos indígenas. Nenhuma terra indígena – apesar de mais de 600 processos – foi demarcada e muitos povos foram retirados dos territórios à força. O Ibama, ICMBio, Funai foram desmontados e perderam orçamento. Tudo passou para o exército, que foi incompetente, enquanto o desmatamento e as queimadas bateram os recordes da década. O Fundo Amazônia parou, perdemos o acordo com a União Europeia e investidores ameaçam tirar dinheiro de empresas brasileiras. Tudo isso é o Bolsonaro e sua política que ninguém entende, nem quem é de direita.
A APIB DEFENDE UMA AGENDA CAPAZ DE PRESERVAR A FLORESTA E OS INTERESSES DO BRASIL
7 Pontos de Demandas da APIB
Uma moratória de cinco anos ao desmatamento na Amazônia.
Aumento das penas para desmatamento e outros crimes ambientais, incluindo o congelamento de bens dos 100 piores criminosos.
Retomada imediata do PPCDAm – Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal, engavetado pelo governo Bolsonaro.
Demarcação de terras indígenas e quilombolas e criação, regularização e proteção de Unidades de Conservação.
Reestruturação dos órgãos federais responsáveis pela proteção do meio ambiente e dos direitos indígenas (Ibama, ICMBio e Funai).
Imposição do Código Florestal (principalmente a emenda de 2018 para penalização de produção em terra ilegal)
Construção de um arcabouço legal para Rastreabilidade da Cadeia de Suprimentos, a fim de dar transparência a atores comerciais internacionais e nacionais.
A APIB está de Luto. Morreu no ultimo domingo, 10 de janeiro do corrente, vítima da Covid – 19, aos 66 anos, o líder Lucio Paiva Flores. Lúcio Terena, como era mais conhecido, nasceu na aldeia Jaguapiru, no Estado Mato Grosso do Sul. Sociólogo e Mestre em Ciências da Religião, nos anos 90, morando em Cuiabá, estado de Mato Grosso. Fez parte da Diretoria do Conselho de Missão entre Índios (COMIN), depois mudou-se para Manaus – AM, onde trabalhou no Centro de Formação e no Departamento Etnoambiental da COIAB. Nos últimos 5 anos trabalhava, em Brasília, na Assessoria de Controle Social da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI).
Lúcio teve valiosas contribuições ao movimento indígena. Destacamos, dentre elas, a sua participação nas lutas que povos, organizações e lideranças indígenas enfrentaram para tornar realidade a criação, em 2010, da SESAI, e na formatação e execução do Projeto Gestão Ambiental de Terras Indígenas (GATI) iniciativa que visava impulsionar, depois, a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental das Terras Indígenas (PNGATI).
A APIB, que perde mais um de suas lideranças para o Novo Coronavirus, manifesta a todos os familiares de Lucio Terena as suas condolências e solidariedade fraterna. E que o Pai Tupã os conforte. Descansa em paz querido Lúcio Terena.
Brasília, 11 de janeiro de 2021 – A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) enviou hoje uma carta aberta ao presidente da BlackRock, Larry Fink, convocando a empresa de gestão de ativos a adotar uma política abrangente de respeito aos direitos dos povos indígenas e desmatamento zero/proteção às florestas. A carta foi enviada dias antes da carta anual de Fink, na qual ele frequentemente anuncia mudanças nas políticas da instituição e uma promessa recente da BlackRock de esclarecer ainda mais sua abordagem ao desmatamento.
A BlackRock é a maior gestora de ativos do mundo em commodities com risco de desmatamento, incluindo a Amazônia. Relatório recente da APIB e da Amazon Watch demonstrou que a instituição financeira detém sozinha US$ 8,2 bilhões em ações e títulos de empresas implicadas em violações de direitos indígenas e conflitos em seus territórios no Brasil, como Vale, JBS, Anglo American, Cargill e outras mais. Em relatório anterior, publicado em 2019, novamente a APIB e a Amazon Watch mostraram como a BlackRock investiu em empresas cúmplices de atividades ilegais de desmatamento na Amazônia brasileira.
“Os investimentos da BlackRock têm um impacto enorme em nossas vidas e comunidades. Esta instituição tem, portanto, grande responsabilidade sobre nosso futuro e a Amazônia. Porque se a floresta chegar ao seu ponto de não retorno, todo o planeta está em risco ”, afirma Luiz Eloy Terena, coordenador jurídico da APIB, na carta.
Apesar de ter adotado medidas, no início de 2020, para lidar com seus investimentos em setores que causam danos ao clima, a BlackRock não possui uma política sobre como lidar com investimentos que possam impactar os direitos de povos indígenas. Tampouco tem se comprometido a pressionar as empresas nas quais ela investe para atuar pelo fim do desmatamento nas florestas tropicais como a Amazônia.
Estudos mostram que as terras indígenas são a última barreira contra o desmatamento e a degradação das florestas. As áreas protegidas na Amazônia brasileira, onde vivem os povos das florestas, englobam Terras Indígenas (TI), reservas extrativistas (Resex) e Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS) que somam 128,5 milhões de hectares – uma área equivalente ao Pará. Essas grandes áreas correspondem a 56% do estoque de carbono total da Amazônia brasileira e atuam evitando significativamente as emissões potenciais associadas de gases de efeito estufa. Defender as áreas protegidas significa defender o equilíbrio da vida na Terra, combatendo o aquecimento global e as mudanças climáticas.
“A BlackRock começou a tomar algumas medidas a favor do clima, mas nenhuma ação climática está completa sem abordar o desmatamento, e nenhuma ação de desmatamento está completa sem salvaguardar os direitos indígenas. A BlackRock deve usar seu poder de mercado para impulsionar ativamente as empresas a descarbonizar, como a ciência deixa claro que é necessário, e acabar com as violações de direitos indígenas associadas à produção de commodities e exploração de petróleo”, afirma Moira Birss, Diretora de Clima e Finanças da Amazon Watch.
Em maio de 2019, na reunião anual de acionistas da BlackRock em Nova York, conforme descrito na carta, Eloy Terena solicitou diretamente a Larry Fink para que a instituição considerasse os impactos de seus investimentos nas violações de direitos indígenas e na destruição da Amazônia no Brasil. Meses depois, o mundo testemunhou perplexo a Amazônia em chamas. Por trás do fogo e da derrubada da floresta, estão interesses econômicos
poderosos: a criação de gado, o comércio ilegal de madeira e a produção de soja. Por trás das empresas produtoras de commodities, como JBS e Cargill, estão financiadores poderosos como a BlackRock. Em outubro de 2019, Sônia Guajajara, coordenadora-executiva da APIB, escreveu uma carta à Blackrock, quando a instituição financeira concordou em se reunir com as lideranças da APIB. Apesar de uma ligação ter ocorrido em dezembro, a BlackRock não deu prosseguimento para um encontro presencial acordado para março de 2020. A APIB, em razão da pandemia, buscou realizar esse encontro de modo virtual, mas não teve retorno da instituição.
Recomendações
No relatório Cumplicidade na Destruição III e nesta carta enviada hoje, qualquer tentativa da BlackRock ou de outros gestores de ativos de abordar a proteção de florestas e respeito aos direitos dos povos indígenas com as empresas de seu portfólio deve incluir os seguintes critérios:
Comprometer-se com políticas de desmatamento zero, de garantia dos direitos humanos e respeito aos direitos indígenas, com metas verificáveis e relatórios de progresso disponibilizados publicamente.]
2. Criar ou reforçar mecanismos internos de controle e monitoramento, para garantir que não haja investimentos em áreas de destruição ambiental, violações de direitos humanos e conflitos em Territórios Indígenas.
3. Exigir que as empresas de seus portfólios desenvolvam políticas vinculantes que salvaguardem os direitos indígenas, como o direito à Consulta Livre, Prévia e Informada; que eliminem o desmatamento de suas cadeias produtivas e que adotem medidas de transparência em relação a seus fornecedores como critério para receber financiamento ou investimento.
4. Conduzir periodicamente diligências próprias do seu portfólio de empresas com base nos mais altos padrões de direitos humanos e socioambientais, independente do nível de relacionamento direto ou indireto.
5. Excluir do seu portfólio empresas que possuam sistemáticas violações de direitos socioambientais e de direitos humanos e que se recusem a implementar políticas abrangentes de desmatamento zero e respeito aos direitos indígenas.
A Guarda Municipal da cidade de Florianópolis ameaça despejar famílias indígenas que estão na capital catarinense para vender artesanatos. A ordem foi dada na manhã de hoje (7) pelo prefeito Gean Loureiro. As famílias estão em um acampamento provisório no Terminal Saco dos Limões (TISAC), sendo coagidas pela polícia em mais um episódio de descaso e racismo da Prefeitura contra os povos indígenas.
Há três anos que o TISAC vem sendo utilizado como acampamento para os indígenas. Mulheres, homens e crianças de diversas comunidades de Santa Catarina vão até Florianópolis para vender artesanato como forma de buscar autonomia econômica e garantir a sobrevivência quando retornarem às aldeias.
O terminal está há 15 anos desativado e é usado provisoriamente devido a falta de uma Casa de Passagem na Capital, um direito que deveria ser garantido e que é uma promessa não cumprida do prefeito.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e a Articulação dos Povos Indígenas do Sul (Arpinsul), juntamente com nossas organizações indígenas de base, manifestam repúdio pela violência, autoritarismo e falta de atendimento da prefeitura de Florianópolis. Todo nosso apoio às famílias! Seguimos acompanhando o desdobramento dessa situação!
O governo federal desde sua posse vem atacando os povos indígenas, ou ignorando as nossas demandas, e o sucateamento dos órgãos indigenistas são um exemplo disso. O novo ataque atinge diretamente nosso território, com a nomeação de um policial militar para o cargo de coordenador regional do Amapá e Norte do Pará da FUNAI.
A Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Estado do Amapá e Norte do Pará (APOIANP), é a instância máxima do movimento indígena da nossa região, que reivindica do Estado e da sociedade brasileira o respeito total aos direitos fundamentais dos povos indígenas reconhecidos pela Constituição Federal, vem de público manifestar o nosso veemente repúdio contra a portaria de número 1595, publicada no último dia 14, que nomeou o Sr. Ilton Lima da Silva, para a coordenação regional Amapá e Norte do Pará na Fundação Nacional do Índio.
Esse ato de repudio toma como base a inexistência de conexões ou contribuições do nomeado em trabalhos técnicos ou científicos ligados a temática indigenista, o que nos leva a considerar a indicação como ideológica. A falta de vínculo do nomeado com as entidades representativas dos povos indígenas intimida nossos povos, em nossas lutas, e ainda, nos faz pensar no avanço e fortalecimento da política de militarização do estado brasileiro.
Diante disso, nós nos posicionamos contrários a essa indicação e pontuamos e exigimos:
1.Que seja revogada a portaria nº 1.595;
2.Que seja respeitado o que esta previsto na Constituição federal, que colocou fim ao integracionismo e à tutela, agregando ao ordenamento jurídico brasileiro os tratados internacionais assinados pelo Brasil, como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas e, a Declaração Americana dos Direitos dos Povos Indígenas. Instrumentos esses, que asseguram aos povos indígenas a manutenção da dinâmica própria de seus usos e costumes por meio de uma política indigenista que garanta o respeito a seus direitos coletivos e que promova seu desenvolvimento econômico, social e cultural, em novos parâmetros de qualidades diferenciados;
3.Que sejamos consultados, e ainda que sejam consideradas as indicações feitas por nós, indígenas da região, para a direção, corpo técnico e administrativo dos órgãos indigenistas, garantindo assim uma maior participação indígena no quadro dos servidores;
Por fim, reafirmamos a nossa autonomia e a nossa determinação de avançar na luta pela nossa organização e pela garantia dos nossos direitos, repudiando quaisquer tentativas de retrocesso em nossas conquistas e exigimos que nossa voz seja ouvida e que essa nomeação seja revogada.
Macapá – AP, 04 de janeiro de 2020
Coordenação Geral – ARTICULAÇÃO DOS POVOS E ORGANIZAÇÕES INDÍGENAS DO AMAPÁ E NORTE DO PARÁ – APOIANP
Apib denuncia situação alarmante no Polo Base devido a demissão de 18 profissionais da saúde indígena, incluindo profissionais indígenas. Falta de viaturas, equipamentos e material também agravam a situação.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) recebeu denúncias de demissões arbitrárias na saúde indígena no Polo Base de Dourados, localizado no Mato Grosso do Sul. A situação é grave, pois tanto o combate ao novo coronavírus quanto o atendimento de infectados estão prejudicados. Foi no Polo Base de Dourados que foram registrados os primeiros casos de infecção por Covid-19 entre os povos Guarani e Kaiowá, bem como os primeiros óbitos.
A situação em Dourados é mais um caso de racismo institucional, pois os profissionais demitidos são, principalmente, indígenas que atuam na saúde indígena. Um dos casos de demissão que mais gera revolta é o da enfermeira Indianara Kaiowá, coordenadora técnica do Polo Base que esteve na linha de frente do atendimento a indígenas infectados pelo novo coronavírus. Além de Indianara, mais 17 profissionais foram demitidos no Mato Grosso do Sul e outros três aguardam a finalização de processos internos.
Segundo relatos de lideranças locais, há uma clima de perseguição por parte de Joe Saccenti Júnior, coronel da reserva que foi nomeado pelo Ministério da Saúde como coordenador do Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) de Mato Grosso do Sul no final de setembro. De acordo com as denúncias, qualquer profissional da saúde indígena que comente ou questione as decisões tomadas pelo DSEI recebe advertência e/ou demissão.
Relatos de profissionais demitidos também denunciam que, na fase mais crítica da pandemia, enquanto os trabalhadores não indígenas pediram demissão ou ficaram em casa por serem de grupos de risco, foram os profissionais de saúde indígena que ficaram na linha de frente no polo base e na CASAI, que ficou sem chefia e sem agente administrativo por um período em decorrência da situação da pandemia e das demissões.
O general, que nega a situação, alega que apenas psicólogos e técnicos de enfermagem contratados exclusivamente para atuar no combate ao Covid-19 foram desligados, seguindo burocracias contratuais. No entanto, a pandemia continua, as contaminações e óbitos seguem impactando os povos indígenas. Dados do Comitê Nacional pela Vida e Memória Indígena, registrados até 4 de janeiro, apontam que 94 indígenas morreram, no Mato Grosso do Sul, em decorrência de Covid-19.
A população atendida no Polo Base chegou a apelar para que o Conselho Distrital de Saúde Indígena, órgão responsável por acompanhar e deliberar sobre questões da saúde indígena, tome providências. No início do mês, o Conselho de Mulheres Kaiowá e Guarani enviou uma carta de repúdio ao Ministério Público Federal comunicando a situação no estado.
O cenário é grave, além das demissões, nenhum investimento nas condições de trabalho dos profissionais de saúde tem sido efetivo para dar conta da demanda de atendimento (a compra de insumos muitas vezes depende do financiamento colaborativo feito pelas organizações indígenas e sociedade civil) e ainda há a preocupação com uma segunda onda de contaminação de Covid-19 no país. Outra situação denunciada é a falta de transporte para equipes de saúde que acaba deixando toda comunidade sem atendimento por um período o dia, em geral no período vespertino, como ocorre desde o início de Dezembro de 2020 até o presente momento
Os povos Kaiowá e Guarani solicitam providências e audiências com os responsáveis para averiguar e resolver a situação em prol do fortalecimento da saúde indígena, tendo em vista que a pandemia ainda está ocorrendo. A Apib endossa a luta por atendimento básico justo e eficiente aos povos indígenas do Mato Grosso do Sul.
Nota técnica preliminar envolvendo aspectos etnohistóricos e socioambientais da Retomada Indígena Xokleng Konglui na Floresta Nacional São Francisco de Paula/RS
por Rafael Frizzo
A presente nota técnica contém informações preliminares de natureza entohistórica e socioambiental relacionadas ao movimento de retomada ancestral do Povo Xokleng Konglui sobre porção territorial em área da Floresta Nacional de São Francisco de Paula, Unidade de Conservação de Uso Sustentável, considerada a primeira Unidade de Conservação (UC) no Estado do Rio Grande do Sul.
Partindo do presente etnográfico, este documento sintetiza referências empíricas colhidas junto à comunidade indígena Xokleng e o seu entendimento sobre a FLONA como território de reconhecimento étnico tradicional; movimento, este, não isolado a outras manifestações originárias no sul do Brasil, frente à paralisação dos processos demarcatórios no Brasil.
Considerando o despacho da decisão que concedeu a expedição de reintegração de posse, no dia 24 de dezembro, contrária à permanência da comunidade originária na “área de infraestrutura”, conforme zoneamento da referida UC, fazem-se necessárias, portanto, a apresentação de alguns subsídios empíricos envolvendo considerações da comunidade sobre a presença imemorial do Povo Xokleng no Estado do Rio Grande do Sul, mais especificamente, na área da FLONA; sobretudo, considerando o velamento histórico em que seus antepassados foram condicionados no processo de descimento, esbulho e genocídio sobre seus corpos e territórios a partir do empreendimento de colonização e expansão das frentes madeireiras entre as terras baixas dos vales litorâneos e os campos de cima da serra, ao longo dos séculos XIX e XX.
No entanto, está nota não pretende ser exaustiva. Sob uma perspectiva socioambiental do Bem Viver, propõem-se a enfatizar o necessário diálogo entre os órgãos competentes para o reconhecimento interinstitucional da gestão de conflitos sob o desafio das sobreposições entre unidades de conservação e territórios indígenas, avançando sugerir para o regime de uma “dupla afetação” como “gestão compartilhada” entre as instituições competentes, visando à compatibilização de direitos fundamentais e humanos do caso concreto, considerando elementos, como:
O extenso conhecimento publicado em literatura especializada sobre o passado arqueológico e histórico e o presente etnográfico da Presença Xokleng como Povo Indígena Macro Jê Meridional nos Campos de Cima da Serra no sul do Brasil: a citarem-se a arqueologia sobre “os buracos de bugres” em José Alberione dos Reis, a história dos ancestrais Botocutos Xokleng em Lauro Pereira Cunha, os trabalhos antropológicos da etnografia dos Xokleng Laklanõ em Silvio Coelho dos Santos, como os mais recentes estudos de elementos fundamentis linguísticos realizados pelo antropólogo indígena Nanblá Gakran, da etnia Xokleng;
O registro de 45 Sítios Arqueológicos no Cadastro Nacional de Sítio Arqueológicos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (PHAN) para a região do Município de Francisco de Paula, incluindo registros na área da FLONA com remanescentes dos Povos Indígenas Macro Jê Meridional;
O reconhecimento de processos demarcatórios de Terras Indígenas da FUNAI pelo Estado do Rio Grande do Sul, como consta no Atlas Socioeconômico (2020), em “processo de estudo”, relacionados à Etnia Xokleng, no Município de São Francisco de Paula, e condizente às terras Zagaua e Zág;
A ampla trajetória jurídica de repercussão geral no processo da Terra Indígena Ibirama no Estado de Santa Catarina, a qual tramita no Supremo Tribunal Federal (ACO 1100) sob a relatoria do Excelentíssimo do Ministro Dr. Edson Fachin, aguardando julgamento;
O contexto de concessões de parques e florestas sem ter sido observada a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no tocante à necessidade de proceder-se com a consulta livre, prévia e informada dos povos indígenas e tradicionais em todas as fases do processo, no âmbito do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), como modelo do Programa Nacional de Desestatização (PND) das Unidades de Conservação Florestais, incluindo à Floresta Nacional de Canela e a Floresta Nacional de São Francisco de Paula, conforme a Resolução No 113, de 19 de Fevereiro de 2020 e o Decreto No 10.381, de 28 de Maio de 2020;
O instrumento de gestão que 14, DE SETEMBRO DE 2020),
DESPACHO No 11, DE Floresta Nacional de São Francisco de Paula aprovou o Plano de Uso Público da sem consulta e reconhecimento dos aspectos Socioculturais dos Povos Indígenas, especialmente da etnia Xokleng, considerando que a demanda foi registrada formalmente desde o ano de 2011 perante o Ministério Público Federal, conforme informações dispostas no Inquérito Civil n. 1.29.002.000553/2020-21;
Ademais, que, o referido Inquérito Civil n. 1.29.002.000553/2020-21, instaurado pela Procuradoria da República no Município de Caxias do Sul, para apuração da regularidade e andamento dos estudos realizados pela FUNAI relativos à reivindicação do Povo Indígena Xokleng sobre área da Floresta Nacional de São Francisco de Paula, atendendo, em parte, os questionamentos sobre a falta de prosseguimento de competência da referida fundação com a constituição de Grupo de Trabalho (GT), conforme pedidos encaminhados desde os anos 2015 e 2019, pela Sra. Kullung Teie Xokleng, ambos reconhecidos por servidores da FUNAI, em reunião virtual recente (gravada e com disponibilização de ata) com as partes envolvidas no Ministério Público Federal de Caxias do Sul/RS, no dia 18 de dezembro de 2020.
O “I Seminário sobre Unidades de Conservação e Conflitos
Etnoambientais”, realizado no período de 8 a 10 de dezembro de 2010, no Hotel São Sebastião, em Florianópolis (SC), organizado pelo Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Sociobiodiversidade (CNPT-SC) e a Coordenação Regional 9 (CR9), com o apoio da Diretoria de Extrativismo/Gerência Indígena do MMA e da Gerência de Gestão Socioambiental/Coordenação de Conflitos, do ICMBio, para discussão e a elaboração de estratégias a fim de solucionar os conflitos etnoambientais entre UC e comunidades indígenas, onde participaram representantes de UCs envolvidas em conflitos com comunidades indígenas, direta e indiretamente, incluindo gestores da Floresta Nacional de São Francisco de Paula;
O documento de “Qualificação de Reivindicação” encaminhada pelos Xokleng para a identificação como terra tradicional junto à Coordenação Regional do Litoral Sul da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), registrando-se parte do histórico da ocupação Xokleng na porção nordeste do Estado do Rio Grande do Sul, redigida e assinada pelo indigenista especializado Ricardo de Campos Lening (antropólogo/biólogo) e a agente indigenista Fernanda Cerqueira (geógrafa), junto ao Serviço de Gestão Ambiental e Territorial de Terras Indígenas (SEGATI);
1.1 O Bem Viver como alternativa outra para conceber sobreposições
Os movimentos críticos socioambientais propostos pelos horizontes do Bem Viver apontam como alternativa possível o caminho da conservação da vida sem a separação das culturas que dão sentido concreto a defesa dos territórios (Acosta, 2015; Solón, 2016; Escobar, 2016). A este posicionamento ecológico e político de efeitos profundos sobre a notável presença de Povos indígenas e comunidades tradicionais nas regiões rurais e áreas urbanas, conexas por sistemas de proteção da natureza, Victor M. Toledo (2014), chama a atenção para o olhar “polifônico da bioculturalidade” da América Latina:
[…] el largo proceso de humanización de la naturaleza, producto de su historia social y ecológica, ha hecho que cada especie de planta, grupo de animales, tipo de suelo o de paisaje, de montaña o manantial, casi siempre conlleve un correspondiente cultural: una expresión lingüística, una categoría de conocimiento, uma historia o una leyenda, un significado mítico o religioso, un uso práctico, o una vivencia individual o colectiva. (TOLEDO, 2014. p.16).
Nas palavras do coordenador da Rede de Etnoecologia e Patrimônio Biocultural do México, está em jogo o paradigma entre a conservação da biodiversidade inserida nos sistemas nacionais de áreas protegidas e seus consequentes efeitos sobre a diversidade biocultural dos sistemas de conhecimentos dos Povos indígenas e comunidades tradicionais. Para outro “paradigma da conservação”, em defesa da bioculturalidade, Toledo aponta necessária originalidade de enfrentamento e revisão das concepções que impuseram a países essencialmente polifónicos – como o caso do Brasil – monólogos convencionais provenientes da tradição científica ocidental sobre experiências vividas e essencialmente conservadas comunitariamente (TOLEDO, 2014, p.17). Sugere, portanto, o autor, que abordagens epistemológicas de análise sejam respostas para ações de princípios políticos nos sistemas nacionais e internacionais de áreas protegidas, oportunizando alternativas críticas a temas tão “controversos” e cada vez mais sujeitos a “opções centrais” entre os “dilemas” do mundo contemporâneo em suas dinâmicas sociais e de transformações (TOLEDO, 2014, p. 18).
Los dilemas entre la globalización y la autogestión local y regional, entre los paradigmas científicos y las lecciones históricas y cuturales de los pueblos originarios, entre la investigación y planeación unidirecional o con la participación social, y entre los paradigmas de la civilización industrial y los paradigmas alternativos. Se trata, en fin, de pasar de los monólogos derivados de una visión cientificista y tecnocrática a la polifonía de una realidad esencialmente diversa. (TOLEDO, 2014, p.18).
Autores como Frederick Turner (1990) e Antônio Carlos Diegues (1994) demonstram quanto o “espírito ocidental contra a natureza” e a invenção de “mitos sobre naturezas intocadas” influenciaram na criação de áreas naturais protegidas, idealizadas ao longo do processo histórico de invenção da modernidade. Reflexões outras de Diegues (2000) sobre a perspectiva da Etnoconservação remetem como os papéis da diversidade social, cultural e biológica, a partir de correntes preservacionistas e conservacionistas, promoveram evidente poder nas relações simbolicamente constituídas em detrimentos dos povos tradicionais e indígenas.
A criação e implantação de Unidades de Conservação (UCs) como espaços de proteção ao meio ambiente foram estabelecidas pela Lei n. 9.985/2000 do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), como espaços territoriais de características naturais relevantes, legalmente constituídas pelo poder público, entre limites definidos e com objetivos específicos de conservação da biodiversidade; sendo a principal política de conservação da diversidade biológica em território nacional, indo ao encontro dos anseios promovidos pela Convenção da Diversidade Biológica (CDB), um dos mais importantes Tratados internacionais pactuados durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente no Rio de Janeiro (ECO-92).