CARTA DE TARUMÃ:  Declaração dos povos indígenas da Amazônia brasileira frente à crise climática

CARTA DE TARUMÃ: Declaração dos povos indígenas da Amazônia brasileira frente à crise climática

Nós, os povos indígenas da Amazônia brasileira, observamos há muito tempo as mudanças climáticas e seus efeitos em razão de mantermos uma relação ancestral com a Mãe Terra. Pois é dela que vem todo o nosso sustento e as explicações para os fenômenos que afetam a vida de todos os seres vivos e cosmológicos.

A crise climática está diretamente relacionada à ganância sobre as terras indígenas, aliada à erosão jurídica dos direitos indígenas e ambientais que está em trâmite no Brasil. O tempo em que estamos vivendo, no qual um vírus parou o mundo e afetou a rotina de bilhões de pessoas de todas as classes sociais e diferentes culturas, é fundamental para pensar seriamente na necessidade de respeitar a sociobiodiversidade presente em nossos territórios. Mas no Brasil, o governo atual é letal com políticas anti-ambientais, anti-climáticas e anti-indígenas. Nossos territórios, que são nossos de direito, estão sendo invadidos por garimpeiros e madeireiros; aldeias foram cercadas por fazendas de gado e soja; os rios são contaminados por agrotóxicos e mercúrio; a Floresta Amazônica está em chamas virando cinza; e governos e os fundos econômicos continuam apoiando financeiramente essa ganância desenfreada, a economia da destruição que mata e que destrói a vida e o planeta.

Todos precisam mais do que nunca ouvir nosso chamado, que nós, os povos indígenas estamos alertando há séculos a partir dos saberes ancestrais que orientam nosso modo de ver e entender o mundo. É neste contexto que mais uma vez chamamos a atenção para a necessidade de construir uma justiça climática inclusiva e participativa a partir das nossas cosmovisões, das salvaguardas e dos nossos territórios. É preciso ir além das metas estabelecidas nos acordos internacionais e passar a considerar o papel vital que nós, povos indígenas, desempenhamos nesse processo, e que deve ser implementado em eixos de responsabilidade socioambiental.

Chegamos ao ponto de não retorno. O recente relatório divulgado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), intitulado Climate Change 2021: the Physical Science Basis, demonstra de forma nítida que as mudanças climáticas causadas pela ganância do homem são irrefutáveis, irreversíveis e vão se agravar nos próximos anos e décadas se não tivermos ações práticas para alterar o quadro da crise climática, ambiental e social. De igual forma, mesmo se zerássemos as emissões de gases de efeito estufa, já teríamos um aumento significativo na temperatura global, o suficiente para efeitos catastróficos.

Não há outro caminho a não ser reconhecer, fortalecer e promover o importantíssimo papel desempenhado por nós, povos indígenas, dentro dos nossos territórios. Para nós, falar em justiça climática é justamente pensar o destino das presentes e futuras gerações e dos que escolheram outras formas de sociedade, como os povos isolados e de recente contato que se encontram na Amazônia. Isto está atrelado à necessidade de se respeitar as diversidades. A cosmologia indígena que nos faz compreender os sinais da Mãe Terra impõe o dever de reconhecer o ecocídio, em que os rios, lagos, animais, florestas e seres cosmológicos que ali habitam são sujeitos de direitos como nós, seres humanos, e devem ser respeitados. Por isso, falar em crise climática requer necessariamente reconhecer a importância das terras indígenas, e de nós, povos indígenas, que damos a vida para proteger a floresta e sua biodiversidade, cumprindo um papel fundamental no equilíbrio climático, beneficiando, assim, toda a Humanidade.

Entretanto, existe um caminho prático de solução que há muito tempo nós, os povos indígenas, viemos apontando: demarcar nossos territórios, mudanças no sistema de produção, plantar mais árvores, parar de queimar combustíveis fósseis e reduzir a pressão sobre a capacidade de carga da Terra. Este deve ser um compromisso de todos: governos, empresas e indivíduos.

Territórios protegidos e direitos respeitados são a solução. Não podemos nos deixar seduzir pela falsa ideia do mercado de carbono, falsas soluções baseadas apenas na natureza e mecanismos de financiamento que não condizem com nossa realidade. Oferecemos alternativas com base em nossos saberes tradicionais associados a inovações tecnológicas. A prática da agricultura deve estar atrelada à segurança alimentar. Chamamos atenção para a responsabilidade solidária de todas as partes envolvidas. As corporações e governos são responsáveis pela destruição em curso na Amazônia brasileira, mas apenas críticas não são suficientes, é preciso mais do que nunca adotar medidas enérgicas para salvaguardar os interesses ecológicos.

É urgente e essencial fortalecer fundos indígenas e mecanismos financeiros que dialoguem com a realidade indígena, como o Fundo Indígena da Amazônia Brasileira – Podaali. Tais recursos devem promover a implementação dos planos de vida dos povos indígenas e as políticas públicas socioambientais. No entanto, nenhum desses esforços surtirá efeito até que todas as terras indígenas sejam demarcadas, que 80% do bioma Amazônico esteja protegido, e que todas as partes tenham metas ambiciosas e que sejam alcançadas. Ou seja, é necessário mudar todo o sistema político e econômico atual.

É chegada a hora em que os povos indígenas da Amazônia Brasileira através da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB, sendo a maior organização indígena do Brasil, com o envolvimento de uma população estimada em mais de 480 mil indígenas, de 178 diferentes povos que ocupam 23% do território amazônico, conclama toda a sociedade do planeta a aliar-se aos povos indígenas em defesa da vida na terra.

A luta dos povos indígenas é de todo planeta!

Amazônia (Brasil), 15 de outubro de 2021

DEMARCAÇÃO JÁ: Não há solução para crise climática sem nós

DEMARCAÇÃO JÁ: Não há solução para crise climática sem nós

Compomos uma delegação indígena brasileira, que parte rumo a Glasgow, na Escócia, como representantes dos anseios e portadores das mensagens urgentes dos mais de 305 Povos Indígenas do Brasil.

Somos homens e mulheres, descendentes de gerações milenares de guardiões e guardiãs dos biomas da América do Sul, e nos irmanamos aos povos originários de todos os cantos de nossa Mãe Terra.

Em todos os continentes, os povos originários lutam para proteger suas terras e garantir a todas as espécies o direito de viver. Nossa luta é por nossas vidas e por nossos territórios, pela defesa das últimas terras ancestrais e pelo enfrentamento à crise climática em nosso planeta. Nossa luta é pela cura da Terra. Por isso, reiteramos a urgência da demarcação de nossos territórios.

Terra Indígena é garantia de futuro para toda a humanidade. Nossa relação com o território não é de propriedade, exploração, expropriação ou apropriação, mas de respeito e manejo de um bem comum, que serve a toda humanidade como pólos de contenção das dinâmicas extrativistas que provocam a crise climática. Até hoje – e isso não dizemos nós, mas a ONU e diversos institutos de pesquisa com a reputação mais elevada que a ciência ocidental pode demandar -, somos nós, Povos Indígenas, os maiores responsáveis pela preservação dos biomas do planeta.

Ao sair de nossas aldeias e atravessar o Oceano Atlântico rumo à mais importante convenção do clima que a governança global instituiu, trazemos nas malas nossos conhecimentos tradicionais e a autoridade para afirmar que nossos territórios são oásis de biodiversidade e modelos de solução climática. Nossa cultura e nossos saberes são originalmente ambientalistas, mesmo antes de este termo ser inventado.

Muitos que nos ouvem hoje não têm dimensão de toda a força que empenhamos nesta missão. Moldamos e protegemos nossos biomas ao preço do sangue de milhões de parentes. O genocídio dos povos originários, a perseguição aos defensores dos territórios e a captura ilegal de nossas terras, é o maior e mais disseminado crime que a humanidade produziu ao longo de sua história. Este é um crime continuado e presente, o qual denunciamos em todas as instâncias que ocupamos.

É fundamental, que o mundo compreenda que não existe solução para a cura da Mãe Terra que não tenha os pés no chão. Conectar-se com a terra, sentir suas necessidades, entender seus ciclos e seus desequilíbrios é fundamental para revertermos os danos causados nos últimos séculos pela sede de acumulação e descarte irresponsável, desigual e ecocida.

O que sentimos em nossas aldeias, territórios protegidos a tanta custa, são os devastadores sintomas do apocalipse climático. O genocídio indígena e a contínua expropriação de nossos territórios por investidas legislativas e interesses predatórios é um claro sinal de que nossas terras são as últimas Reservas de Futuro. O massacre dos povos indígenas é um presságio da devastação irreversível que faz vítimas em florestas, bosques, campos, savanas, em todos os biomas por todo o mundo. Não contido, levará a todos os seres viventes um fim trágico, doloroso e injusto.

Para as autoridades e especialistas que se reúnem agora em Glasgow, pedimos que tomem ações reais para a proteção dos nossos territórios e que trabalhem incansavelmente para um sistema de produção mais justo e menos poluente para todos e todas sociedades.

Vamos a Glasgow para mais uma vez alertar ao mundo, e nesta ocasião com ainda mais gravidade: a humanidade está conduzindo o destino de todos nós ao caos e à morte! Nossa Mãe Terra está exaurida.

O futuro do planeta e das espécies que o habitam dependem da nossa capacidade global de cooperação para defender e fortalecer os povos indígenas e comunidades locais, para garantir a seguridade dos territórios tradicionais face aos interesses econômicos predatórios, e para criar e promover soluções climáticas efetivas baseadas na natureza e nas comunidades que a protege.

Por isso, nos colocamos contra falsas soluções baseadas em inovações tecnológicas elaboradas a partir da mesma lógica desenvolvimentista e produtivista que provoca as mudanças climáticas. Criticamos soluções que não reconheçam os povos indígenas e comunidades locais como o ponto central na defesa das florestas, da diminuição do desmatamento e das queimadas, e como essenciais para a garantir que
a meta declarada de manter o aquecimento global abaixo de 1,5 graus Celsius.

Esperamos que esta mensagem chegue aos líderes globais, empresários e organizações da sociedade civil presentes na COP 26, vibre em seus corações, e refloreste suas mentes!

DEMARCAÇÃO JÁ!
Não existe solução para crise climática sem Povos e Terras Indígenas

BRASIL, 29 de outubro, 2021

Estudantes Indígenas sofrem perseguição e intimidação da UFOPA

Estudantes Indígenas sofrem perseguição e intimidação da UFOPA

Foto: Sofia B. H. Lisboa

Durante a semana dos povos indígenas, em abril de 2019, três lideranças indígenas e estudantes da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), reagiram a provocações do diretor de política e assistência estudantil representante da reitoria durante um debate sobre políticas de assistência estudantil e ações afirmativas. Os discentes Auricélia Arapiun, Alessandra Munduruku e  Willames Borari desde então vêm sofrendo perseguições e intimidações por parte da instituição. 

O desentendimento gerou processo interno da universidade contra os alunos.  Não satisfeitos só com a imposição de investigação interna, por meio de Processo Administrativo Disciplinar (PAD), os representantes da administração superior da instituição acionaram a Polícia Federal, que instaurou procedimento investigativo contra os estudantes indígenas. Os alunos foram procurados pela Polícia Federal na investigação, gerando neles abalos familiares, angústia, insegurança, afastamento e descrença na capacidade crítica da universidade.

Ocorre que o desentendimento se deu no âmbito interno da universidade, em evento acadêmico tradicional dos indígenas da UFOPA, de modo que, a ocorrência interna poderia ser apurada através de processo administrativo e instâncias internas de mediação de conflitos desta natureza. Mas o reitor da instituição optou em judicializar o processo,  confrontando alunos indígenas com a polícia federal, afrontando a autonomia universitária e o devido debate crítico que fundamenta a universidade. Afinal, se não for a universidade lócus privilegiado do debate crítico, duro e profundo, onde seria?

A universidade vem praticando racismo institucional em não tratar  estudantes indígenas com a qualidade e atenção que eles merecem. Em denúncia, os estudantes afirmam que o  reitor chegou a fazer um tribunal étnico-racial, colocando os estudantes indígenas na frente de  outros estudantes da universidade para expor bolsas estudantis, em uma tentativa de demonstrar que os estudantes indígenas são privilegiados. Assim, o reitor incentivou uma rivalidade na instituição e causou transtornos e assédio.

Outra questão é que nunca foi usada metodologia por parte da universidade para uma escuta e diálogo para acolher os estudantes indígenas. Ao contrário das necessidades, os profissionais despreparados usam de violências institucionais e preconceituosas para perseguir e para desmoralizar, provocando situações como a que aconteceu com Auricélia Arapiun, que passa pelo segundo processo interno na universidade. Em 2018 foi aberto um processo que logo foi arquivado e recentemente reabriram o processo que pode reter o seu diploma de conclusão do curso. 

Auricélia é estudante e liderança indígena, vice-coordenadora do Conselho Indígena Tapajós Arapiuns (CITA), organização que representa sociopolíticamente 13 povos da região Baixo Tapajós.  

A permanência dos estudantes indígenas  na universidade e a conclusão de seus cursos é um ato político e uma conquista para seu povo, sobretudo em um país onde as universidades excluem sua participação. As perseguições e intimidações precisam parar, e a segurança, e a qualidade de vida dos estudantes precisam ser asseguradas pela universidade. 

 

Infância e natureza na perspectiva indígena 

Infância e natureza na perspectiva indígena 

Foto tirada por Xuli Ribeiro na Segunda Marcha das Mulheres indígenas 2021

por Aldenora Pimentel e Kamuu Dan Wapichana

A infância não é para nós o ponto inicial. O começo está na ancestralidade e na dinâmica viva com que a memória nos constrói, fortalece e nos impulsiona para as experiências. Não é o meio e nem só o final. A infância tem a mesma relevância de contribuição em todo o processo de resiliência dos povos originários, pois é durante todo o percurso que se aprende a importância de cada indivíduo na coletividade.

As crianças não são só futuro, pois para ela existir, a responsabilidade do presente é fundamento essencial e agora, mais do que nunca, esse compromisso se torna emergencial. Por isso, não é possível separar os debates sobre cultura, educação, trabalho, brincadeiras, saúde, meio ambiente, direito e outros. Para nós, tudo está intrinsecamente interligado à nossa espiritualidade ancestral e à nossa sobrevivência.

Nosso esforço é garantir todas as existências, e isso só é possível mantendo a saúde da Mãe Terra. Todas as energias são voltadas para essa defesa, para a continuidade do legado dos guardiões da natureza, que exercem esse cuidado e que lutam diariamente para assegurar a dignidade coletiva dos seres. Todos somos protagonistas, e também as crianças cumprem um papel fundamental nesse cordão de resistência permanente, carregando no sangue e na memória a história de luta, a beleza do fortalecimento, a leveza do acreditar e do fazer. 

Cada passo é um aprendizado, uma conexão. Cada ser é uma história, mas não existe história sem território. Nossa história está inteiramente vinculada ao território a que pertencemos. No entanto, não se trata apenas do espaço geográfico onde nascemos, mas também da conexão que a ancestralidade nos permite agregar, sentir, vivenciar, transmitir e compartilhar conhecimentos. Na infância se aprendem valores, mas também é ali que as crianças nos ensinam que a força não se sustenta quando estamos sozinhos, e que ganhamos experiência com a coletividade. 

Estamos passando por um momento muito difícil atualmente, no qual essa conexão e esse equilíbrio estão sendo rompidos com o avanço do agronegócio e da degradação do meio ambiente, e até podendo afirmar que, em muitos lugares, as mulheres estão ficando inférteis. Como pensar em futuro sem assegurar o princípio da vida?

Não há espaço para as crianças em um contexto em que, com a cobiça pelos recursos naturais e terras indígenas, só resta a beira das estradas para muitas famílias, como é o caso dos Guarani Kaiowá e de tantos outros que foram expulsos de seus territórios ancestrais. Passam por uma situação complicada os Yanomami nas terras indígenas em Roraima, onde sofrem com a contaminação dos rios, fonte de toda existência. Com a exploração do minério em suas terras, seus corpos começam a adquirir o inimaginável e o desconhecido que trazem morte e destruição. E após as cidades invadirem nossas aldeias e avançarem para o progresso, como nós podemos falar de futuro para nossas crianças tendo um presente que fere e mata? Só nos resta ensinar aos pequeninos o fervor ao lutar por nossa própria existência?

Queremos mais que uma lembrança de um dia termos passado por essas terras. Queremos continuar tendo o direito de mantermos nossas diferenças que tanto nos igualam e nos tornam únicos coletivamente. Que nos fazem acreditar até sempre que, independente de nossas crenças, ideologias, idades e conhecimentos, podemos conviver. E indo mais além… que podemos bem viver. 

Nessa relação única, os olhares indígenas infantis afirmam que somos um só, e por isso o respeito é o principal elemento que deve ser praticado diariamente, e que a sabedoria ancestral se manifesta em todas as formas de vida.

Fomos arrancados de nossos territórios e nossa própria história nos foi negada. Por isso, voltar o olhar carinhoso para as crianças se faz tão necessário, pois as mudanças geradas pela ganância e pela opressão afastam a infância ainda mais de nossas origens, costumes e tradições. O dinheiro parece continuar ter mais importância que a vida! Como permanecer com esse vínculo e com esse cuidado se continuam a nos arrancar do seio da Mãe Terra?

Agora é o momento para refletir e agir! Uma mão unida à outra nutre a alma, aquece o coração e fortalece a caminhada. Passos para o bem viver, mesmo por caminhos diferentes, sinais de respeito à vida. Experiência e cuidado manifestam aprendizado coletivo que nos constrói e nos transforma em sementes férteis, e assim não deixamos de ser crianças, continuamos a aprender e a nos relacionar bem com todos os seres.

Porque aqui usamos nós e não somente mencionamos a palavra criança? Porque a infância está em nós até o final, basta olharmos para dentro de nós para lembrar quem realmente somos. Independente de onde estivermos, esse será nosso lugar de fala e resiliência!

Aldenora Pimentel 

Licenciada em Pedagogia pela Universidade Estadual de Roraima (UERR) e Especialista em Residência Agrária com Habilitação em Cultura, Arte e Comunicação pela UnB. Pesquisadora na área de literatura indígena contemporânea com foco no suporte pedagógico e formação de profissionais da educação sobre a temática indígena em sala de aula.

 Kamuu Dan Wapichana (Filho do Sol) 

Mestre dos saberes tradicionais, estudante de Gestão Ambiental na Universidade de Brasília, escritor, contador de histórias, educador socioambiental popular, permacultor, nascido em Boa Vista-RR, de origem do Povo Wapichana.

Grileiro tenta atropelar liderança indígena no território de Comexatibá

Grileiro tenta atropelar liderança indígena no território de Comexatibá

Por comunidades tradicionais e indígenas de Cumuruxatiba

O município de Prado, no extremo sul baiano, é palco dos conflitos por terra mais antigos do Brasil. Desde que esta paradisíaca costa recebeu a invasão portuguesa, expulsando os indígenas, moradores originários do local, a violência e a pistolagem é promovida por grileiros e latifundiários que ameaçam as vidas da população nativa. 

Na última quarta-feira, 20 de outubro, houve mais uma tentativa de atentado. Lucas Lessa avançou o carro sobre Xawã Pataxó (Ricardo) quebrando sua moto e provocando alguns arranhões. “A gente acabou de ter um ataque aqui na comunidade, no território, onde o pessoal dos Lessa estava. Justamente o Lucas Lessa com homens no carro. A gente explicando pra ele a decisão que tem do STF, do ministro Dias Toffoli para esse território da Aldeia Kaí… Ele infelizmente jogou o carro em cima da gente, a gente teve que se defender com nosso tacape. Ele veio em direção a mim com o carro e consegui se livrar do atropelamento. Mas ele quebrou minha moto também, passou por cima da moto. Aí estamos comunicando os companheiros. A gente não vai deixar mais as nossas praias serem fechadas e nosso território ser tomado”, denunciou Xawã. 

Ao tentar denunciar a violência na delegacia de polícia de Prado, alguns minutos depois, a liderança indígena se deparou com Lucas que acabava de dar um depoimento. O delegado, por sua vez, se recusou a ouvir a denúncia da vítima.

A tentativa de coerção é motivada pela disputa em torno principalmente das Praias do Moreira e do Calambrião, que vem sendo cercadas por grileiros para criar condomínios de luxo. Os acessos tradicionalmente utilizados pelas comunidades extrativistas, marisqueiros e indígenas foram cercados, impedindo a passagem destes povos e dos turistas que frequentam a região. 

No último sábado, 16, as comunidades se uniram para reabrir uma das estradas, que leva à Praia da Biquinha. Um loteamento ilegal também está em curso na Praia do Moreira, que é parte da Resex Corumbau (Reserva Extrativista Marinha de Corumbau). As comunidades denunciam e tentam retirar as cercas para conter a especulação imobiliária promovida pela chegada de estrangeiros e milionários. No mesmo território encontra-se a aldeia Kaí, que segundo o Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) integra o Território Indígena de Comexatibá, mais conhecido pelos turistas como Cumuruxatiba.

“Essa questão não é só de Pataxó, não é só dos pescadores que nesse momento de fome estão impedidos de pescar, de pegar o seu peixe, porque a carne esta cara. É também do interesse nacional. Foi nesse lugar que baixou o primeiro barco das caravelas através de Nicolau Coelho. Isso é um patrimônio nacional e mundial da humanidade. Esse patrimônio está sendo tomado de nós brasileiros. O que está acontecendo aqui é um verdadeiro atentado contra a memória nacional e contra a terra Pataxó e os povos indígenas do Brasil. Está tudo invadido, ninguém tem mais acesso a praia”, alerta Maria Geovanda Batista, professora e pesquisadora da Universidade do Estado da Bahia e acompanha a causa há anos.

 

 

Quem é Lucas Lessa

 

Lucas Lessa é filho do advogado José Carlos Lessa, envolvido no esquema de compra e venda ilegal de lotes do INCRA, de acordo as denúncias feitas pela imprensa em 2011. Ele reside em uma mansão à beira da Praia da Japara Grande e transformou o que deveria ser um lote da reforma agrária em restaurante particular. A família Lessa, natural do Rio de Janeiro, adquiriu ilegalmente uma série de lotes à beira da praia, inclusive na Praia do Calambrião, onde possuem outra mansão. Lucas é advogado, porém se passa por pescador no distrito de Cumuruxatiba. 

 

O assentamento Cumuruxatiba foi homologado no Plano Nacional de Reforma Agrária em 1987 e abrangia 268 beneficiários. No entanto, as dificuldades para o estabelecimento das famílias assentadas com a morosidade na implantação das políticas da reforma agrária e a pressão exercida por fazendeiros e empresários, gananciosos sobre as riquezas litorâneas, gerou a mercantilização das terras públicas. Hoje o assentamento está completamente desconfigurado, há mansões construídas para veraneio e locação para pessoas ricas, já que a diária pode chegar até mil reais durante o verão. 

 

Conflito centenário

 

O território que originou a vila de Cumuruxatiba, pequena área urbanizada, e o PA Cumuruxatiba, é habitado pela etnia Pataxó desde os tempos de Pindorama. Alguns documentos nos relatórios da FUNAI registram a presença destes indígenas desde 1577, numa área que abrange as praias acima da vila, a Fazenda Paraíso e a suposta Fazenda dos Lessa e segue sentido Norte até Caraíva. Durante séculos eles foram massacrados e forçados ao êxodo, tendo suas aldeias incendiadas, como é o caso conhecido como Fogo de 51. As ameaças recorrentes deixaram o povo em situação de extrema vulnerabilidade diante das diversas invasões.

Mesmo o projeto de assentamento, que pela lei deveria beneficiar prioritariamente os nativos, foi criado sem considerar a existência dos Pataxós. Além do INCRA, houve a sobreposição feita pelo então Ibama (hoje ICMBio), que criou Unidades de Conservação (UC) com as áreas de ocupação histórica dos Pataxó. Trata-se do Parque Nacional do Monte Pascoal, implantado sobre o Território Indígena Barra Velha do Monte Pascoal, e o Parque Nacional do Descobrimento, sobreposto ao TI Comexatibá (Cahy/Pequi).

Desde 1999 os Pataxós deflagraram a retomada de seu território e fundaram cinco aldeias no entorno da vila de Cumuruxatiba: Kaí, Pequi, Tibá, 2 irmãos e Gurita. Atualmente há uma decisão do Supremo Tribunal Federal em benefício dos Pataxó que reafirma seu direito sobre as terras, no entanto não há nenhum tipo de fiscalização do Estado que garanta a segurança e a efetividade deste direito. A atuação do governo Bolsonaro tem estimulado a violência e a ampliação dos conflitos, ao mesmo tempo em que atua no desmonte da FUNAI. As comunidades apontam a demarcação como saída para o conflito e seguem resistindo nas áreas de retomada. 

“A gente precisa de apoio das autoridades porque estamos passando um momento tão difícil, a carestia taí, tem muitas pessoas que não conseguem comprar um quilo de carne, estão na fila do osso. E isso a gente não quer para o nosso povo. A gente quer melhoria, não só para nós indígenas, como para todos os brasileiros que entenderem a nossa luta”, apela o Cacique da Aldeia Tibá, José Fragoso.

 

Às vésperas da Conferência do Clima da ONU, Londre recebe o 1.º Festival de Cinema Indígena Brasileiro

Às vésperas da Conferência do Clima da ONU, Londre recebe o 1.º Festival de Cinema Indígena Brasileiro

O 1.º Festival de Cinema Indígena Brasileiro traz para Londres uma seleção de curtas, longas, documentários e animações produzidas por onze cineastas de sete diferentes povos com filmes legendados em inglês. O programa celebra os rituais e a herança cultural dos povos indígenas e reafirma o direito por suas terras e à expressão cultural, direitos esses que estão sendo desmantelados nos últimos anos. Os cineastas abordam essas questões de forma poética e provocativa na primeira edição deste festival, que busca abrir conversas sobre nosso papel na preservação do planeta e o que podemos aprender com os povos indígenas.
Com curadoria do renomado cineasta Takumā Kuikuro, do Território Indígena do Xingu, na bacia amazônica brasileira, e Christian Fischgold, pesquisador visitante da Universidade de Manchester, o festival amplifica as vozes muitas vezes não ouvidas dos povos indígenas do Brasil. O programa está dividido em três vertentes: O Direito à Terra (sexta, 22)*, combina trabalhos sobre diferentes formas de luta indígena — simbólica, prática, política,  mitológica — pelo direito à terra; A Dimensão Ritual (sábado, 23) documenta e celebra os povos Maxakali e Kisedjê no Brasil rural — e mostra que enquanto os rituais podem ser políticos, o político também pode ser ritualístico. Oralidade, Filme e História (domingo, 24)- traz perspectivas históricas, sociais e filosóficas das comunidades Parakanã, Guarani — Nhandewa e Guarani — Kaiowá.
A noite de abertura será seguida de uma conversa com os curadores do festival, cineastas e um líder indígena da APIB, Brasil. A conversa será moderada por Paul Heritage, Professor de Drama e Performance na Queen Mary University de Londres e Diretor da PPP.

Veja o programa completo aqui.

Destaques
Equilibrium, uma videoarte etno-midiática da jornalista e educadora Tupinamba Olinda Muniz Wenderley. Dois filmes de animação, A Celebração dos Espíritos e Konãgxeka: O Dilúvio Maxakali trazem as cores da natureza e as tradições de dois grupos. Nũhũ yãg mũ yõg hãm: Esta terra é nossa terra! é o vencedor do prêmio de Melhor Filme Internacional no Sheffield Doc / Fest deste ano. O festival apresenta ainda duas produções de Alberto Alvares: Sonho de Fogo, uma interpretação de um sonho – um presságio de doença, segundo as tradições Guarani Nhandewa, e Tekowenhepyrun: A Origem da Alma, que é um testemunho dos sábios da aldeia do diretor, que acredita que a alma é a ligação entre o corpo e o espírito. Alberto, um dos mais importantes cineastas indígenas da última década, teve suas obras expostas em Bienais de Artes e festivais internacionais de cinema. Ava Yvy Vera: A Terra do Povo Relâmpago, uma representação da luta dos povos Guarani-Kaiowá pelo direito à terra que ganhou reconhecimento internacional após o lançamento de uma carta conjunta em 2012, protestando contra os assaltos e avanços do agronegócio brasileiro. O provocador Zawxiperkwer Ka’a registra as atividades dos Guardiões da Floresta, grupo que luta contra a extração ilegal de madeira e trabalha pela proteção dos Awá-Guajá, um dos grupos indígenas isolados mais ameaçados do leste da Amazônia.

“O direito à terra, a proteção da floresta e a ênfase na possibilidade de um modo de vida diferente são componentes políticos dos filmes selecionados. A câmera e o cinema têm uma importância fundamental, seja como instrumento de criação etnográfica ou de proteção em zonas de conflito”.  Takumā Kuikuro e Christian Fischgold
“Os povos indígenas estão liderando a luta contra as mudanças climáticas. Eles precisam
urgentemente de nosso apoio em sua resistência contra a destruição de seus modos de vida
tradicionais. ” Paul Heritage

O 1º Festival de Cinema Indígena do Brasil no Reino Unido é produzido pela People’s Palace Projects
em parceria com o ICA. Financiado pela Queen Mary University of London, University of Manchester,
Arts Council England e UK Research and Innovation através do Global Challenges Research Fund,
apoiado pela APIB – Articulação dos Povos Indígenas do Brasil.

Apib pede no STF terceira dose para indígenas e imunização de adolescentes contra Covid-19

Apib pede no STF terceira dose para indígenas e imunização de adolescentes contra Covid-19

Pedido de reforço da imunização é para indígenas idosos, imunossuprimidos e profissionais de saúde, que estão dentro dos critérios previstos pelo Ministério da Saúde.

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) entrou nesta quinta-feira (14) com uma petição no Supremo Tribunal Federal (STF) para garantir o reforço da imunização contra Covid-19 entre indígenas que vivem dentro de Terras Indígenas homologadas ou não e para os que moram nas cidades. O pedido reforça ainda a necessidade de priorizar a vacinação de adolescentes indígenas com idades entre 12 e 17 anos no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra Covid-19 do Ministério da Saúde (MS).

A solicitação enviada ao STF faz parte da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 709 (ADPF 709), protocolada pela Apib, em junho de 2020, para garantir que o Governo Federal cumpra seu papel de proteger os povos indígenas durante a pandemia da Covid-19. A petição pede que o reforço das doses obedeça aos critérios previstos pelo MS que prioriza a aplicação da terceira dose em pessoas idosas, profissionais de saúde e quem tenha comorbidades.

“Até o presente momento não se tem informações por parte da Secretaria Especializada de Saúde Indígena (SESAI) sobre a continuidade da vacinação deste público, fez-se necessário trazer ao conhecimento de V. Excelência tais fatos, de modo que seja assegurada a administração da dose de reforço para os indígenas que estão dentro dos critérios previstos no Plano (idosos, imunossuprimidos e profissionais de saúde), independente do contexto em que estejam inseridos (aldeados em terras indígenas homologadas ou não homologadas, ou em contexto urbano), conforme já determinado por este juízo”, enfatiza trecho da petição.

A solicitação para a vacinação de adolescentes foi realizada com base em pesquisas que demostram que a mortalidade de jovens indígenas é que a de nao indígenas em todas as regioes do país. “O impacto da Covid-19 em crianças e adolescentes indígenas, que apresentam maior mortalidade do que não indígenas. O referido estudo se deu a partir da comparação de taxas de mortalidade específicas por idade reportadas pela SESAI, a partir do SIASI, e aquelas obtidas para a população geral, a partir do SIVEP-Gripe”, informa parte do documento enviado ao ministro Roberto Barroso.

Acesse petição completa aqui

Ativistas comemoram falta de oferta para áreas próximas a Noronha e Atol das Rocas em leilão da ANP

Ativistas comemoram falta de oferta para áreas próximas a Noronha e Atol das Rocas em leilão da ANP

Eles temiam que a exploração desses blocos e os ofertados na Bacia de Pelotas, no litoral de Santa Catarina, trouxessem risco à fauna e flora marinhas

Por Carol Knoploch
RIO — Ativistas que fizeram protesto contra a 17ª Rodada de leilão de petróleo da Agência Nacional do Petróleo (ANP) nesta quinta-feira, comemoraram a falta de oferta para a exploração dos blocos das bacias de Pelotas (na área do litoral catarinense) e Potiguar (área de Fernando de Noronha e Atol das Rocas, no litoral Rio Grande do Norte e Ceará), áreas de preservação ambiental.

Cerca de 150 ativistas protestaram em frente ao hotel Windsor Barra da Tijuca, onde aconteceu a licitação na manhã desta quinta-feira. Teve até manifestante vestido de tiranossauro rex na frente do local.

— Isso significa uma enorme derrota para o governo e para a ANP e confirma o que estávamos dizendo há tempos. É inviável a exploração em áreas de proteção ambiental. Saímos do Rio de Janeiro aliviados. Ao menos por ora. Foram meses de mobilização em vários estados e municípios do movimento ambientalista e climático brasileiros e continuaremos — declarou Juliano Bueno de Araújo, diretor do Observatório de Petróleo e Gás e do Instituto Arayara.
Entre os 92 blocos ofertados havia alguns próximos aos arquipélagos que formam o Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha e a Reserva Biológica do Atol das Rocas.

Além do resultado vazio para os blocos da chamada Bacia Potiguar, onde se localiza a área do arquipélago e da reserva biológica, não houve propostas para a Bacia de Pelotas, também considerada como região de sensível preservação

Lances apenas para Bacia de Santos
Igualmente não houve lances para blocos da Bacia de Campos. Apenas cinco blocos da Bacia de Santos, onde está a maior parte do pré-sal brasileiro, foram arrematados — quatro pela Shell e um em parceria da Shell com a Ecopetrol. No total, foram arrecadados R$ 37,14 milhões, sem ágio.

Araújo liderou o protesto desta quinta-feira e contou com ativistas de Pernambuco, Santa Catarina, Ceará, Paraná e Rio Grande do Norte, além do Rio de Janeiro.

Ele disse que este é um momento crítico e que teme pela manutenção destas bacias em leilões futuros.

— O momento é difícil para não dizer terrível do movimento ambientalista, climático, das comunidades tradicionais e da indústria da pesca e turismo, além é claro, dos impactos climaticos que vamos sofrer fruto de leilões do tipo — desabafa Araújo.

Ele complementou:

— A sociedade civil e governos sérios como o de Santa Catarina e Pernambuco se mobilizaram e judicializaram várias ações. Não houve suspensão, é verdade. Mas saímos vitoriosos com o resultado do leilão.

Ações na Justiça
A ONG moveu cinco ações civis públicas e entrou na Justiça com oito mandatos de segurança coletiva na tentativa de suspender o leilão.

A 17ª Rodada chegou a ser questionada na Justiça. Em junho, uma decisão da Justiça Federal da 4ª Região havia determinado a retirada dos blocos da Bacia de Pelotas do leilão. A determinação foi revertida posteriormente.

Na noite de quarta-feira, o governo de Pernambuco, em cujo litoral está Fernando de Noronha, se somou a uma ação do partido Rede Sustentabilidade no Supremo Tribunal Federal (STF) para pedir a suspensão do leilão. A licitação é contestada em tribunais de Pernambuco, Distrito Federal, Santa Catarina e no STF.

Questões ambientais
A 17ª Rodada de Licitações da ANP marca a retomada dos leilões de petróleo no país. O último foi o chamado megaleilão, em 2019, que também teve um resultado frustrante para o governo. De acordo com a ANP, estavam habilitadas para participar do leilão, além da Petrobras, as petroleiras Chevron, Shell, Total, Ecopetrol, Murphy Karoon, Wintershall e 3R Petroleum.

As bacias onde estão os 92 blocos ocupam uma região de quase 54 mil quilômetros quadrados nos litorais de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Pernambuco, Ceará e Rio Grande do Norte.

Araújo cita que cerca de 90% da frota de pesca embarcada do país trabalham na região de Santa Catarina, um dos pontos incluídos no leilão, mas que não houve proposta. Segundo ele, a perda estimada para quem trabalha nesta área, em 20 anos, seria de R$ 70 bilhões. Ele diz que esses são dados coletados em audiência pública na Assembleia Legislativa de Santa Catarina.

— O pescado depende deste ambiente preservado.

Além disso, chamou a atenção para outro ponto crítico: a preservação de várias espécies de baleias. Explica que a rota migratória da baleia azul pode ser afetada assim como os berçários de outras espécies (ele se refere ao litoral de Santa Catarina e a ilha de Fernando Noronha).

— Se a questão da baleia azul não chama a atenção, pense então nas suas férias. Ninguém quer viajar para onde o mar está banhado de óleo e não tem peixe para comer. A questão turística e da economia que ela gera está integrada.

Transição energética
O biólogo Paulo Horta, professor de ecologia marinha e oceonografia na Universidade Federal de Santa Catarina, afirmou que se sente feliz, mas não por completo. Ele levantou outra questão fundamental para o ambiente, além da preservação imediata das bacias Potiguar e Pelotas: a transição energética.

Ele aponta para a queima de combustível fóssil ao citar que os blocos vendidos na bacia de Santos, no leilão da ANP, tem potencial para bilhões de barris de petróleo.

Lembra que o leilão se realizou justamente na véspera da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas deste ano, a COP26, que está marcada para novembro. E após alarmante relatório do IPCC sobre mudanças climáticas divulgado no último mês pela ONU.

— Isso é ruim do ponto de vista diplomático, inclusive. Foi péssimo o momento, uma vez que o mundo discute como diminuir a queima do combustível fóssil. Poderíamos estar em outro patamar, o da discussão sobre transição energética e o impacto na economia global. O petróleo foi importante no seu devido contexto de tempo e agora as próprias empresas entendem melhor suas obrigações moral e ética na transição que o planeta precisa — opinou Paulo.

Daniel Galvão, mestre em oceonagrafia e professor universitário do Instituto Federal do Ceará, foi prático ao comentar o resultado do leilão:

— Era o único possível porque as áreas sem lances são áreas de proteção ambiental forte e mesmo que alguma empresa as comprasse, enfrentaria batalha judicial eterna e sem precedentes. O cenário é de saturação, de risco ambiental planetário — falou Galvão, um dos líderes do movimento Salve Maracaípe, de Pernambuco. — Em casos assim, o lucro é da empresa, é privado. Mas o dano é socializado, todos perdem

Galvão criticou a atuação do governo federal em insistir neste leilão após batalha com ambientalistas e lembrou que até hoje “este mesmo governo não concluiu a origem do oléo do maior desastre ambiental que o Brasil sofreu, em 2019, no Nordeste e no litoral do Espírito Santo e Rio de Janeiro.”

À época, o Salve Maracaípe identificou o vazamento, denunciou, investigou e até colocou a mão na massa para a retirada, segundo ele de mais de mil toneladas de óleo “no braço”.

 

Matéria originalmente publicada no jornal O Globo em 07/10/2021

A aula é no MEC: estudantes indígenas e quilombolas realizam ato no MEC na manhã desta quinta, 7

A aula é no MEC: estudantes indígenas e quilombolas realizam ato no MEC na manhã desta quinta, 7

Foto: Regis Guajajara

Na manhã desta quinta-feira, 7 de outubro, a aula será no Ministério da Educação (MEC), afirmam os mais de 700 estudantes indígenas e quilombolas que constroem o I Fórum Nacional de Educação Superior Indígena e Quilombola. A marcha está prevista para às 9h, a partir do acampamento instalado na Funarte, em Brasília.

Os estudantes esperam ser recebidos pela equipe ministerial para tratar do acesso e permanência de indígenas e quilombolas no ensino superior brasileiro. Enquanto isso, profissionais já formados com o auxílio do programa permanência, irão realizar um “aulão” em frente ao órgão.

“Temos muitos estudantes novos, que ainda irão ingressar na universidade e eles precisam saber dessa luta”, afirma Samehy Pataxó, uma das coordenadoras do Fórum de Estudantes Indígenas e Quilombolas.

Izana Rocha Quilombola, destaca “ser preciso nos manter e manter os nossos dentro e permanentes nas universidades. Ocupando os espaços que nos é negado todos os dias. Essa luta não é só nossa, é também pelos que virão”.

A antipolítica do atual governo tem afetado o acesso e permanência de estudantes de baixa renda na Universidade, ainda mais quilombolas e indígenas. De 2018 a 2021, o programa teve um corte superior a 50%, dos 22 mil estudantes atendidos em todo país, apenas 10 mil seguem tendo acesso ao programa.

Segundo Edimilson Costa Silva, representando o Ministério da Educação, não houve aumento na oferta de vagas por falta de recursos no orçamento para o programa. Embora a previsão era incluir mais 4 mil novos estudantes ao programa, mas o MEC não obteve a aprovação do orçamento correspondente, destacou o representante do órgão de educação na audiência pública realizada na Câmara dos Deputados, nesta terça-feira, 5.

Em mobilização permanente, o I Fórum Nacional de Educação Superior Indígena e Quilombola reúne estudantes de 50 universidades públicas e privadas de todas as regiões do país. Com o tema “Os desafios do acesso e permanência de quilombolas e indígenas no ensino superior brasileiro”, o evento está sendo realizado de 4 a 8 de outubro, em forma de acampamento instalado no espaço da Funarte, em Brasília.

Organizado por estudantes indígenas e quilombolas, com a colaboração de organizações de apoio à causa. O Fórum faz parte do conjunto de manifestações realizadas desde de junho deste ano, entre elas os acampamentos ‘Luta Pela Terra’ e ’Luta Pela Vida’, a II Marcha Nacional das Mulheres Indígenas e Movimento Nacional dos Estudantes Quilombolas (MONEQ).

Ministério Publico denuncia homem por estupro e morte da adolescente indígena Daiane Kaingang

Ministério Publico denuncia homem por estupro e morte da adolescente indígena Daiane Kaingang

A denúncia foi feita na sexta-feira (1º) e divulgada pelo MP nesta terça-feira (5). O homem foi acusado dos crimes de estupro de vulnerável e homicídio com seis qualificadoras (meio cruel, motivo torpe, dissimulação, recurso que dificultou a defesa da vítima, para assegurar a ocultação de outro crime e feminicídio).

Segundo a Polícia Civil, o homem segue preso preventivamente.

De acordo com o promotor de Justiça Miguel Germano Podanosche, o denunciado conduziu o carro por uma localidade no interior de Redentora, ciente de que ali aconteciam alguns bailes naquela noite, e passou a oferecer carona a jovens indígenas que se movimentavam a pé pelas imediações.

“A vítima aceitou a carona e foi conduzida até o local do crime, especialmente selecionado em razão de ele o conhecer muito bem, dado que sua família havia possuído, em outros tempos, uma propriedade lindeira por ele frequentada. Lá, a ofendida, embriagada excessivamente, sem poder resistir, foi estuprada, estrangulada e morta”, explica.

Conforme a denúncia, a prática decorreu de motivo torpe, correspondente ao desprezo do denunciado pela população originária Kaingang e seus integrantes (etnofobia), nutrido pela falsa ideia de que tal comunidade e as autoridades constituídas reagiriam com passividade ao estupro em razão de sua condição de indígena.

“Convém esclarecer que o denunciado estava procurando sua vítima em eventos sabidamente frequentados por jovens indígenas, havendo, inclusive, oferecido carona a outras garotas da mesma etnia, de modo que se pode afirmar que o fato de a ofendida integrar tal etnia foi fator determinante para que ela fosse objeto preferencial da escolha do denunciado”, destaca o promotor.

Relembre o caso

Segundo a polícia, Daiane saiu de casa em um sábado, dia 31 de julho, por volta das 16h, para encontrar amigos com quem iria para uma festa na Vila São João. Depois do evento, ela não voltou para casa.

A Polícia Civil descobriu que Daiane recebeu uma carona do acusado entre 2h e 3h do dia 1º de agosto, após a festa. Quatro dias depois, a jovem caingangue foi encontrada morta por um agricultor.

De acordo com o delegado Vilmar Schaefer, o acusado é morador da região. “Houve menosprezo e discriminação contra a vítima por ser indígena, baixa idade e estar em situação de vulnerabilidade”, diz o delegado.

A violência contra os povos indígenas tem se intensificado a cada dia. Assassinam nossos jovens, nossas mulheres, nossas lideranças; roubam nossas terras e querem tirar nossos direitos. A violência contra as mulheres indígenas é intensa desde a invasão portuguesa. Mulheres que são a vida do nosso povo, mulheres que curam mulheres guerreiras.

A Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpinsul) e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), em conjunto com todas as organizações regionais de base, repudiam toda e qualquer violência contra mulheres indígenas e exige que a justiça seja feita a quem cometeu tal atrocidade.

Não podemos aceitar que nossas vidas continuem sendo ceifadas, e que nossos direitos sejam retirados, ainda mais quando falamos do nosso direito maior, o direito à vida!

Somos Daiane Griá Kaingang
Exigimos justiça!

#vidasindígenasimportam
#emergênciaindígena